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www.nead.unama.br<br />
Friburgo. Penetrou no segredo da revolução que os pernambucanos urdiam.<br />
Assoprava-a, incitava-a. E não ficou Pôs-se, como Hoogstraten, a mandar para a<br />
Holanda acusações terríveis contra Maurício.<br />
O <strong>Príncipe</strong> <strong>de</strong> <strong>Nassau</strong>, <strong>de</strong>ntro do belo Palácio <strong>de</strong> Friburgo, governava sem<br />
arrepios os seus domínios. Mal sonhava, porém, que, na treva minando-lhe a<br />
reputação, corroendo-lhe o prestígio, andavam três inimigos <strong>de</strong> morte: Arcisiewsky,<br />
na Holanda, a atiçar os membros do Conselho dos Dezenove; aqui, fortalecendo a<br />
intriga, Carlos Tourlon e Teodósio Hoogstraten a forjarem <strong>de</strong>lações venenosíssimas.<br />
O palácio <strong>de</strong> Friburgo<br />
A "Casa da Justiça" era rente do Palácio <strong>de</strong> Friburgo, <strong>de</strong>la, naquele dia,<br />
estavam os escabinos em câmara.<br />
Paulo Damas, o escolteto, abancara-se na sege <strong>de</strong> espaldar. Em torno <strong>de</strong>le,<br />
junto à mesa inundada <strong>de</strong> papéis, sentavam-se os outros juizes.<br />
Eram nove os escabinos. Quatro flamengos, quatro da terra, um presi<strong>de</strong>nte.<br />
O presi<strong>de</strong>nte, por força <strong>de</strong> estatuto, <strong>de</strong>via ser <strong>de</strong> Holanda. Resultava disso que os da<br />
terra não compareciam às sessões. Era inútil tal comparecimento. O voto <strong>de</strong>les <strong>de</strong><br />
nada valia: arrasava-o a superiorida<strong>de</strong> numérica dos outros. Daí, <strong>de</strong>ssa abstenção,<br />
vinha a soberania absoluta dos conquistadores, esse predomínio incontrastável que<br />
gozavam em resolver irrecorrivelmente todas as questões. Justiça, se é que jamais<br />
houve Justiça nesses escusos tempos, atamancavam-se os belgas como bem<br />
queriam. Do lado em que <strong>de</strong>sse o vento, ai era.<br />
Nesse dia, nessa sessão, iam os escabinos julgar quatro soldados<br />
portugueses, suspeitos <strong>de</strong> haverem matado uma rês na campanha. João Blaar, o<br />
facínora, bradava alto:<br />
— São quatro grandíssimos bandidos! Foram eles os que roubaram a rês <strong>de</strong><br />
Ippo Ceulen. Roubaram e carnearam. A ossada ainda está na Várzea do Capiberibe.<br />
Portanto, senhores, nada <strong>de</strong> meias medidas com tal canalha. É forca, senhores! É<br />
forca; e forca sem dó!<br />
Frei Manuel pediu licença para <strong>de</strong>fendê-los. Paulo Damas assentiu. O<br />
religioso levantou-se. Fez-se súbito silêncio.<br />
Nisto, à entrada do salão, ecoou áspero rumor <strong>de</strong> passos. Uni quase<br />
tumulto. Todos voltaram-se rápidos. Gaspar Dias, arregalando os olhos, não pô<strong>de</strong><br />
conter esta exclamação fragorosa:<br />
— André Vidal <strong>de</strong> Negreiros!<br />
Era <strong>de</strong> fato André Vidal. O paraibano surgiu acompanhado <strong>de</strong> Rodrigo<br />
Mendanha. Todos olharam com respeito aquele belo guerrilheiro, homem garboso,<br />
moreno e guapo, que era o mais audacioso dos inimigos <strong>de</strong> Holanda.<br />
Gaspar Dias, alvoroçado e acolhedor, os braços abertos, precipitou-se para<br />
recebê-lo:<br />
— Deus salve e guar<strong>de</strong> a Vosmecê, André Vidal!<br />
— E a Vosmecê, tornou o soldado: que Deus salve e guar<strong>de</strong>, Gaspar Dias!<br />
Paulo Damas, erguendo-se, saudou o paraibano com reverencioso aceno <strong>de</strong><br />
cabeça. Os escabinos cumprimentaram-no também com polida mesura. Gaspar<br />
Dias, maneiroso e afável, foi logo dizendo:<br />
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