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ANAIS DO I CONGRESSO NACIONAL DE FILOSOFIA DA UNICENTRO I CONAFIL – 22 A 26/06/2009 – ISSN: 2175-3059 seguir uma regra, sem saber necessariamente justificá-la. Na arte é possível dominar uma técnica e esse dominar uma técnica não necessariamente se coloque como um saber científico e nem pode ser expresso em proposições. Na religião é possível compreender um ritual, sem que necessariamente precisemos entendê-lo no sentido da ciência; podemos rezar sem que essa oração seja um conjunto de proposições ou que estejamos preocupados com a verdade do que estamos proferindo. Nesse sentido, não se pode deixar de dizer que Wittgenstein entendia que havia uma variedade de saberes e que a tentativa de reduzir todos eles a uma única forma de conhecimento é um erro gramatical, fruto do mau entendimento da linguagem e das práticas que constituem esses saberes. Na verdade, o principal erro no que tange à redução do conhecimento é considerar como único saber válido, o saber constituído por proposições, ou seja, por sentenças passíveis de verdade ou falsidade. Para Wittgenstein, há saberes práticos, compreensões que extrapolam o conhecimento proposicional, e há coisas que somos capazes de fazer sem que possamos traduzi-las em proposições, como no exemplo de uma poesia ou oração. O conhecimento então não se reduz somente ao conhecimento proposicional, mas a conhecimentos que podem ser entendidos como saberes que são frutos de nossas práticas cotidianas, desenvolvidas dentro de um determinado jogo. Esse conhecimento prático é fruto geralmente da repetição ou treinamento ou de práticas cotidianas e pode ser traduzido como uma certa capacidade de fazer determinadas atividades. Assim, ele pode ser entendido como um saber fazer 1 , ou ser capaz de fazer ou poder fazer Apesar de Wittgenstein ter mostrado a possibilidade de variedade de saberes, é interessante perceber que ele não chegou a sistematizar tais idéias, ou conceituar estes saberes. é necessário olharmos de forma mais sistemática essa possibilidade de divisão de saberes. Para isso, não podemos nos furtar da apresentação das 1 Aqui o ‗fazer‘ não deve ser entendido somente no sentido de fazer algo com material, mas também atividades que requerem pensamento abstrato como no caso de seguir uma série de números na matemática, como bem o coloca Wittgenstein no parágrafo 151 das Investigações. I Congresso Nacional de Filosofia da UNICENTRO/PR – Guarapuava/PR II Colóquio Kant da Sociedade Kant Brasileira – Seção Paraná – SKB/PR Página9

ANAIS DO I CONGRESSO NACIONAL DE FILOSOFIA DA UNICENTRO I CONAFIL – 22 A 26/06/2009 – ISSN: 2175-3059 ideias desenvolvidas por Gilbert Ryle que tentou mostrar que além do conhecimento como crença verdadeira e justificada, existiria um outro saber que é fruto do treinamento. Essas ideias estão bem desenvolvidas em sua obra The concept of mind, mais precisamente no capítulo 2 de tal obra intitulado: Knowing how and knowing that. Para Ryle, Quando nós falamos de intelecto, ou melhor, dos poderes intelectuais e performances das pessoas, estamos nos referindo primariamente aquela classe especial de operações que constituem teorias. O objetivo destas operações é o conhecimento de proposições verdadeiras ou fatos. [...] Outros poderes humanos seriam classificados como mentais somente se eles mostrassem ser de algum modo guiados pela compreensão intelectual de proposições verdadeiras. Ser racional seria ser capaz de reconhecer verdades e as conexões entre elas. Agir racionalmente seria, consequentemente, ter alguma propensão não-teórica controlada por alguma apreensão de verdades sobre a conduta da vida. 1 Aqui, neste trecho, Ryle nos apresenta como a filosofia caracteriza o saber. Na contemporaneidade, conhecer é ser guiado pela razão ou ter um aparato de conhecimentos racionais. Tal ideia é tão difundida que até mesmo coisas simples do dia-a-dia deveriam ser entendidas dentro de teorias sobre como funcionam as coisas. Aquilo que não se encaixa dentro da ideia de verdade deveria ser deixada de lado por não se constituir em conhecimento. Tais ideias são típicas, por exemplo, do positivismo lógico ou círculo de Viena, no qual só era considerado conhecimento aquilo que poderia ser transformado em proposição. O problema nessa descrição do conhecimento é que em nosso dia-a-dia não estamos preocupados somente com teorias ou proposições. Nossa linguagem é capaz de criar jogos onde os fatos ou proposições são deixados de lado, como no caso da poesia e até mesmo de sentenças morais. Para Ryle há ―muitas atividades que revelam diretamente qualidades de mente, ainda que não sejam nenhuma 1 RYLE, G. The Concept of Mind. London: The Penguin Group, 1990, p. 27. I Congresso Nacional de Filosofia da UNICENTRO/PR – Guarapuava/PR II Colóquio Kant da Sociedade Kant Brasileira – Seção Paraná – SKB/PR Página10

ANAIS DO I CONGRESSO NACIONAL DE FILOSOFIA DA UNICENTRO<br />

I CONAFIL – 22 A 26/06/2009 – ISSN: 2175-3059<br />

ideias desenvolvidas por Gilbert Ryle que tentou mostrar que além <strong>do</strong> conhecimento<br />

como crença verdadeira e justificada, existiria um outro saber que é fruto <strong>do</strong><br />

treinamento. Essas ideias estão bem desenvolvidas em sua obra The concept of<br />

mind, mais precisamente no capítulo 2 de tal obra intitula<strong>do</strong>: Knowing how and<br />

knowing that.<br />

Para Ryle,<br />

Quan<strong>do</strong> nós falamos de intelecto, ou melhor, <strong>do</strong>s poderes intelectuais e<br />

performances das pessoas, estamos nos referin<strong>do</strong> primariamente aquela classe<br />

especial de operações que constituem teorias. O objetivo destas operações é o<br />

conhecimento de proposições verdadeiras ou fatos. [...] Outros poderes humanos<br />

seriam classifica<strong>do</strong>s como mentais somente se eles mostrassem ser de algum<br />

mo<strong>do</strong> guia<strong>do</strong>s pela compreensão intelectual de proposições verdadeiras. Ser<br />

racional seria ser capaz de reconhecer verdades e as conexões entre elas. Agir<br />

racionalmente seria, consequentemente, ter alguma propensão não-teórica<br />

controlada por alguma apreensão de verdades sobre a conduta da vida. 1<br />

Aqui, neste trecho, Ryle nos apresenta como a filosofia caracteriza o saber. Na<br />

contemporaneidade, conhecer é ser guia<strong>do</strong> pela razão ou ter um aparato de<br />

conhecimentos racionais. Tal ideia é tão difundida que até mesmo coisas simples <strong>do</strong><br />

dia-a-dia deveriam ser entendidas dentro de teorias sobre como funcionam as<br />

coisas. Aquilo que não se encaixa dentro da ideia de verdade deveria ser deixada de<br />

la<strong>do</strong> por não se constituir em conhecimento. Tais ideias são típicas, por exemplo, <strong>do</strong><br />

positivismo lógico ou círculo de Viena, no qual só era considera<strong>do</strong> conhecimento<br />

aquilo que poderia ser transforma<strong>do</strong> em proposição.<br />

O problema nessa descrição <strong>do</strong> conhecimento é que em nosso dia-a-dia não<br />

estamos preocupa<strong>do</strong>s somente com teorias ou proposições. Nossa linguagem é<br />

capaz de criar jogos onde os fatos ou proposições são deixa<strong>do</strong>s de la<strong>do</strong>, como no<br />

caso da poesia e até mesmo de sentenças morais. Para Ryle há ―muitas atividades<br />

que revelam diretamente qualidades de mente, ainda que não sejam nenhuma<br />

1 RYLE, G. The Concept of Mind. Lon<strong>do</strong>n: The Penguin Group, 1990, p. 27.<br />

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II Colóquio Kant da Sociedade Kant Brasileira – Seção <strong>Paraná</strong> – SKB/PR<br />

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