biografias de aprendizagens de mulheres encarceradas - Centro de ...

Tenho pai, mas só que eu não considero ele como um pai. [...], eu vim
conhecer ele eu tinha 15 anos quando conheci meu pai. Minha mãe sempre
falava dele de mal [...], diz ela que uma vez ela foi pedir uma lata de leite a
ele aí ele mandou ela me enterrar num buraco viva. Aí eu nunca tive um
amor por meu pai né? Só de mãe, e nem de mãe tanto né? Porque a minha
mãe que eu tinha, que era minha mãe, Deus levou ela, eu fiquei muito triste.
A de criação, ela sempre... me botou na escola, fez tudo por mim. E Irmãos
você tem? Irmão eu só tenho por parte de pai, minha mãe só teve eu, a
minha mãe verdadeira. (Isabel).
[Meu pai] se separou da minha mãe e formou outra família. Aí eu vim morar
em João Pessoa com a minha mãe e o meu irmão. Só que eu tenho mais
irmãos. [...] Os outros já tinham independência né? Uma morava em Minas,
sempre morou em Minas. E a outra morava aqui em João Pessoa, mas ai ela
foi fazer faculdade. São cinco e eu sou a caçula. (Judite)
Eu não tenho nem família, não tem nem por onde ninguém se lembrar mais
de mim. Olha, minha mãe ela, eu tava com 9, 10 anos quando ela fugiu. Ela
disse a vizinha : fique com minha filha ai que eu venho já! . Foi, e até
hoje...! [...] Eu vivi mais na rua eu. E seu pai? Meu pai eu nunca nem vi não,
eu via ela (Madalena).
[...] minha mãe ficou viúva muito cedo, tinha o meu irmão que hoje tem 54
anos, tem a outra filha, que é a primeira filha dela que tem quase 60 anos, e
eu. São quantos filhos? São quatro filhos, sendo que um já é falecido. Hoje
nós somos duas mulheres e um homem, um já é falecido (LIA).
A realidade acima exposta nos aponta alguns achados. O primeiro deles é que o
arranjo tradicional de família (pai, mãe e filhos) não fez parte das biografias de nenhuma
encarcerada. Em quase todos os casos acima, vimos arranjos compostos por acréscimo e
excesso de parentes (o caso da família de Diná), arranjos compostos por mães solteiras ou
sem companheiros e seus filhos (o caso das famílias de Isabel, Judite e Lia), arranjos
compostos de famílias incompletas (onde faltam alguns filhos, como nos casos também de
Judite e de Lia) e vimos, por outro lado, desarranjos familiares (o caso de Madalena, por
exemplo), dada a ausência de qualquer referência familiar no processo de construção
biográfica.
Essas constatações que expressam os novos arranjos familiares dessa sociedade em
situação de incertezas reforçam o que dizem os estudiosos desse assunto, sobre a
caracterização das relações familiares na contemporaneidade. Eles alegam que aquele modelo
de família tradicional, reproduzido culturalmente, está passando por um período de transição.