biografias de aprendizagens de mulheres encarceradas - Centro de ...
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Ressalte-se que a entrevistada respon<strong>de</strong> a três processos por ter cometido mais <strong>de</strong> uma<br />
ação <strong>de</strong>lituosa (roubo, estelionatário, tráfico <strong>de</strong> drogas). Quando cometeu seu primeiro <strong>de</strong>lito,<br />
ela já não estava morando na casa on<strong>de</strong> trabalhava, tinha voltado a morar com a sua mãe e a<br />
ajudava, naquele perído, na casa em que ela (a mãe) trabalhava: Antes da minha primeira<br />
queda eu ajudava ela (a mãe), eu ia um dia sim e um dia não. Porque eu via a situação <strong>de</strong>la<br />
né? Ela paga aluguel, tem um marido que não ajuda em nada, é que nem gigolô. (ISABEL).<br />
Vê-se, pois, que o ofício <strong>de</strong> empregada doméstica da mãe foi reproduzido pela filha.<br />
Esse tipo <strong>de</strong> trabalho é, na verda<strong>de</strong>, praticado por inúmeras crianças brasileiras, no entanto,<br />
por estar sob a proteção do lar, a socieda<strong>de</strong> não o consi<strong>de</strong>ra como prejudicial às crianças<br />
(FERREIRA, 2001). De acordo com Cipola (2001), isso ocorre porque há pouca consciência<br />
<strong>de</strong> que o trabalho infantil [...] fere os direitos <strong>de</strong> cidadania, inibe a escolarida<strong>de</strong> e o<br />
<strong>de</strong>senvolvimento integral, traz riscos aos meninos e meninas praticantes, além <strong>de</strong> outras<br />
distorções ainda não estudadas (CIPOLA, 2001, p.13).<br />
Por outro lado, o fato <strong>de</strong> a mãe <strong>de</strong> Isabel não se importar e até querer vê-la trabalhando<br />
(para ajudá-la), não <strong>de</strong>ve ser encarado apenas como uma forma <strong>de</strong> exploração, visto que [...]<br />
o trabalho infantil no Brasil é também uma questão cultural e está ligada à pobreza e às<br />
<strong>de</strong>ficiências do sistema educacional<br />
(CIPOLA, 2001, p.30-31).<br />
Nessas circunstâncias <strong>de</strong> vida, em que Isabel combina em sua trajetória a experiência<br />
<strong>de</strong> trabalho doméstico (ajudando a mãe) e a experiência escolar, foi que ela, motivada pelas<br />
amigas do mesmo bairro, foi chamada a praticar o seu primeiro roubo. As amigas, que já<br />
tinham experiência nesse sentido, teriam argumentado antes com Isabel, na tentativa <strong>de</strong><br />
convencê-la sobre os benefícios que isso lhes proporcionaria, como por exemplo, <strong>de</strong>ixar <strong>de</strong><br />
viver na humilhação, pedindo a um e a outro o que precisava . Mesmo temerosa, como<br />
relatou, Isabel aceitou a proposta e resolveu participar do grupo que assaltaria uma casa do<br />
bairro vizinho ao em que morava. Esse foi, portanto, o primeiro <strong>de</strong>lito cometido por Isabel.<br />
Por causa <strong>de</strong>le, ela foi encarcerada pela primeira vez. Porém, por não terem<br />
conseguido provar a sua participação - já que, no diário escolar, estava registrada a sua<br />
presença, recebeu, em pouco tempo, o alvará <strong>de</strong> soltura. Ao sair da prisão, Isabel foi acusada<br />
<strong>de</strong> estelionato. Ela conta que, enquanto estava presa, colocaram o dinheiro <strong>de</strong> um roubo <strong>de</strong><br />
terras localizadas em Recife em sua conta corrente. Afirmou que não sabia como isso teria<br />
ocorrido e que soube da existência <strong>de</strong>sse dinheiro em sua conta somente quando saiu do<br />
presídio e foi informada pela pessoa que teria feito a transação. Por esse e por outro <strong>de</strong>lito em<br />
que se envolveu <strong>de</strong>pois (o tráfico <strong>de</strong> drogas), ela foi presa e ficou cumprindo a pena em<br />
regime semiaberto, ou seja, trabalhava o dia todo e voltava à noite para dormir no presídio.