A Condessa Vésper - Unama

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19.04.2013 Views

www.nead.unama.br Ambrosina, sem compreender semelhante crise, procurava inutilmente estancar as lágrimas da pobre moça. Entretanto, abriu-se a porta do interior da casa, e a criada apareceu, dizendo que um homem procurava por D. Ambrosina Moscoso. — Um homem?! exclamou esta, erguendo-se espantada. — Diz que da parte da justiça... explicou a criada, hesitante. Ambrosina sentiu uma pontada no coração. Laura correu para dentro, e a outra, logo que recuperou o sangue frio, perguntou à mucama que espécie de gente a procurava. — É um moço magro, cara lisa, um sinal de bigode, bem vestido. — Louro?! — Não senhora. — Ah! Respiro! E, tomando uma resolução: — Que entre, para a sala. O sujeito era Melo Rosa, que se fez reconhecer desde o corredor com a sua alegria espalhafateira e artificial. — Ora, finalmente! gritou ele com uma gargalhada, quando se achou defronte de Ambrosina. Não contavas com esta surpresa, heim, minha bela espertalhona? — Confesso que não, e até mais, que ela depõe largamente contra o seu espírito!... — Isso agora é que é de mau gosto, e não parece vir de ti. Concordo em que não estimes a minha visita, mas não em que o declares! E a primeira vez que te vejo denunciar pela fisionomia uma contrariedade... E dizendo isto, o Meio se havia instalado comodamente em uma cadeira de braços. Ambrosina, assentada defronte dele, inspecionava-lhe a cor das meias, o feitio do casaco e a extravagância da gravata. — Onde teria aquele tipo arranjado dinheiro para embonecar-se daquele modo?... dizia ela consigo. — Mas, enfim?... perguntou. Qual é o motivo da sua visita? o que o traz aqui? — Pois não percebeste ainda? — Juro que não. — Estás a fazer-te esquerda, meu amor! — É birra! — Mas, que diabo! não percebeste, filha, que fui logrado por ti e procuro chamar a mim o que me pertence de direito? Olha que sempre me obrigas a umas franquezas!... — Pois ainda o não entendi... Explique-se! — Mas, como não entendeste?. 152

www.nead.unama.br — Decerto! sei que o senhor quis defraudar em certa quantia o homem com quem eu estava, e eu não consenti... Aí tem o que sei! — Perdão; não é isso o que tu sabes! O que tu sabes é que nós combinamos os dois passar a perna ao Gabriel em vinte contos de réis, e pôr-nos ao fresco, deixando o pato com cara de tolo! Queres franqueza, toma! Ora, tu sozinha não darias conta da marosca e solicitaste o meu concurso. Eu formei o plano do ataque, e os resultados foram excelentes; apenas, em vez de ser para nós ambos, foram unicamente para ti.... — E daí?... — Daí é que não estou absolutamente disposto a deixar-me lograr! Quero a minha parte! — Quem rouba a ladrão... — Terá os anos de perdão que quiseres; mas, ou divides o bolo comigo, ou vou daqui mesmo denunciar-te à polícia, e corto-te todos os vôos... Escolhe! — Ora, vá pentear monos! disse Ambrosina, erguendo-se e afetando serenidade. — Ah! não queres? Pois fica então sabendo que estás presa. — Ora, moço, outro ofício! — Zombas, heim? Pois já devias saber que sou empregado secreto da polícia!... — Devia tê-lo desconfiado, isso é verdade! — Mas, enfim? Ainda uma vez: Queres?! — Não! casa. és! E Ambrosina acompanhou com surpresa os movimentos de Melo Rosa. Ele ergueu-se, foi até à janela e fez sinal para a rua. — O que significa isto?! — Saberás depois... A autoridade competente te dirá! — Olha que peste! — Filha, é o mundo! Vais comparecer em presença do chefe de polícia! Ambrosina, que correra à janela, viu espantada três praças lhe invadirem a — Mas, você é muito ordinário! exclamou ela com os dentes cerrados. — Podes bramar à vontade! — Um canalha! um valdevinos! um gatuno! — Dize o que quiseres! Só me não podes chamar uma cousa, que é o que tu E disse o nome. Ambrosina estremeceu até à raiz dos cabelos. Olhou de frente para o Melo, e teve ímpetos de matá-lo; mas um rumor na escada a pôs em sobressalto. Os soldados iam penetrar na sala. Com a subida dos praças, Laura acudiu de dentro e atirou-se aflita nos braços da amiga. Ambas romperam em soluços. — Ah! Ah! já quebraram de força? Pois é aviar, que tenho mais que fazer! 153

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Ambrosina, sem compreender semelhante crise, procurava inutilmente<br />

estancar as lágrimas da pobre moça.<br />

Entretanto, abriu-se a porta do interior da casa, e a criada apareceu, dizendo<br />

que um homem procurava por D. Ambrosina Moscoso.<br />

— Um homem?! exclamou esta, erguendo-se espantada.<br />

— Diz que da parte da justiça... explicou a criada, hesitante.<br />

Ambrosina sentiu uma pontada no coração.<br />

Laura correu para dentro, e a outra, logo que recuperou o sangue frio,<br />

perguntou à mucama que espécie de gente a procurava.<br />

— É um moço magro, cara lisa, um sinal de bigode, bem vestido.<br />

— Louro?!<br />

— Não senhora.<br />

— Ah! Respiro!<br />

E, tomando uma resolução:<br />

— Que entre, para a sala.<br />

O sujeito era Melo Rosa, que se fez reconhecer desde o corredor com a sua<br />

alegria espalhafateira e artificial.<br />

— Ora, finalmente! gritou ele com uma gargalhada, quando se achou<br />

defronte de Ambrosina. Não contavas com esta surpresa, heim, minha bela<br />

espertalhona?<br />

— Confesso que não, e até mais, que ela depõe largamente contra o seu<br />

espírito!...<br />

— Isso agora é que é de mau gosto, e não parece vir de ti. Concordo em<br />

que não estimes a minha visita, mas não em que o declares! E a primeira vez que te<br />

vejo denunciar pela fisionomia uma contrariedade...<br />

E dizendo isto, o Meio se havia instalado comodamente em uma cadeira de<br />

braços. Ambrosina, assentada defronte dele, inspecionava-lhe a cor das meias, o<br />

feitio do casaco e a extravagância da gravata. — Onde teria aquele tipo arranjado<br />

dinheiro para embonecar-se daquele modo?... dizia ela consigo.<br />

— Mas, enfim?... perguntou. Qual é o motivo da sua visita? o que o traz<br />

aqui?<br />

— Pois não percebeste ainda?<br />

— Juro que não.<br />

— Estás a fazer-te esquerda, meu amor!<br />

— É birra!<br />

— Mas, que diabo! não percebeste, filha, que fui logrado por ti e procuro<br />

chamar a mim o que me pertence de direito? Olha que sempre me obrigas a umas<br />

franquezas!...<br />

— Pois ainda o não entendi... Explique-se!<br />

— Mas, como não entendeste?.<br />

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