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A Condessa Vésper - Unama

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www.nead.unama.br<br />

E o grande fato é que, ao fim de algum tempo, todo o seu esforço principiava<br />

já a produzir o desejado efeito, e o caixeiro contava todos os meses o fruto das suas<br />

economias, amontoadas com o sacrifício de todos os instantes.<br />

Pôde então realizar uma idéia, que lhe trabalhava havia muito no cérebro:<br />

escrever no Jornal do Comércio uma série de mofinas contra o coronel.<br />

Moscoso, uma noite depois do trabalho, foi à redação daquela folha e<br />

entregou a primeira à publicação.<br />

A mofina dizia assim:<br />

"Pergunta-se ao coronel Pinto Leite por que razão S. S. não entra em<br />

explicação de contas a respeito de certa viúva da cidade?... — A sentinela."<br />

Consistiu nestas estranhas palavras a primeira mofina do comendador.<br />

Ninguém as sabia explicar, não tinham fundamento algum, eram inventadas; mas<br />

quem as lesse ficaria com o juízo suspenso, diria talvez consigo que ali andava<br />

misteriosa e grossa maroteira; e era isso justamente o que Moscoso desejava, era<br />

levantar dúvida, promover desconfiança, arranjar qualquer prevenção contra o<br />

coronel.<br />

Este, quando viu a mofina, riu-se, persuadindo-se vítima de algum engano.<br />

Mas em breve se convenceu do contrário, porque o fato começou a repetir-se.<br />

Moscoso punha já de parte certa verba para aquela despesa; a mofina<br />

entrou no seu orçamento ao lado do dinheiro para o cabeleireiro e para o rol da<br />

roupa suja. De quinze em quinze dias apareciam elas impreterivelmente, com uma<br />

regularidade impressionadora.<br />

O coronel já não ria, sacudia os ombros, e ao ver passar o redator-chefe do<br />

jornal, o Luís de Castro, torcia o nariz com repugnância.<br />

Entretanto, pouco depois, Ana foi pedida por um empregado público, e o pai<br />

deu-a de bom grado.<br />

Moscoso, por portas travessas, fez o que pôde para desmanchar o<br />

casamento. Serviu-se da carta anônima, não trepidou em difamar a filha do coronel,<br />

atribuindo ao próprio pai dela a autoria da sua desonra; mas nada disso produziu<br />

efeito, e o invejoso teve de roer na obscuridade de seu ódio mais essa decepção.<br />

Ah! o que o havia de vingar eram as mofinas! para isso estava ali o Jornal do<br />

Comércio!<br />

E Moscoso meneava a cabeça, com a calma e a resignação de quem tem<br />

toda a confiança na sua paciência e plena certeza de alcançar os seus fins.<br />

— Havia de vingar-se, olé! repetia consigo de vez em quando. Seu tempo de<br />

gozo havia de chegar!...<br />

Por essa época sucedeu que o dono da casa comercial em que estava ele<br />

empregado, fosse acometido mais fortemente pela moléstia que padecia.<br />

Moscoso tornou-se desvelado e incansável com o patrão, a quem passou a<br />

servir de enfermeiro. Perdia noites, andava na ponta dos pés, só falava à meia voz e<br />

vivia amarelo, feio e taciturno.<br />

Assim se passaram cinco meses, sem uma queixa, sem uma exigência.<br />

Afinal o patrão uma noite o chamou ao quarto e, mostrando-lhe uma rapariga, que<br />

criara e com quem vivia, disse-lhe com as lágrimas nos olhos:<br />

— Moscoso! eu sou um homem rico, tenho esta pequena que eduquei como<br />

filha, sinto que vou morrer e não deixo família para herdar. Mortifica-me a idéia de<br />

ficar aí tanto dinheiro, que representa o meu trabalho da vida inteira exposto a cair<br />

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