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A Condessa Vésper - Unama

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www.nead.unama.br<br />

— Caprichos de mulher! explicava um dos amigos do cocheiro, e citava<br />

proverbialmente que "A mulher só não se casa com o carrapato, por não saber qual<br />

é o macho!"<br />

O fato é que então Laura gostava bem do seu padeiro. Um dia ofereceu-lhe<br />

uma cigarreira de miçangas, que bordara durante um mês inteiro, e esse trabalho foi<br />

muito apreciado no bairro. Alguém profetizou logo que ali estava uma menina de<br />

grande futuro.<br />

— Dêem-lhe asas! Dêem-lhe asas! resumia o da teoria do carrapato; e verão<br />

depois o que sairá dali! Mas não será amarrada ao Vela de Sebo, que a Laurita há<br />

de ser algum dia alguma cousa!<br />

Laura conhecia vários livros; romances quase todos. O pai às vezes lhe<br />

ouvia falar de cousas estranhas para ele, com um sorriso cheio de respeito e<br />

iluminado de amor. Quando ela dava na aula o D. João de Castro e dizia depois em<br />

casa a sua lição em voz alta e corrida, o pobre cocheiro extasiava-se,<br />

acompanhando com a fisionomia os menores gestos e movimentos da filha. E se<br />

alguém da sua roda precisava de uma carta de mais circunstâncias, ou de um<br />

desenho para certo bordado, ou de molde para um vestido de festa, não ia a mais<br />

ninguém; procurava Laura, e ela sempre resolvia a dificuldade.<br />

O pai sentia por tudo isso um grande orgulho.<br />

— Não! lá certeza de que dei à pequena uma educação de princesa, isso é<br />

que tenho! dizia ele e acrescentava: — A Laura até o francês sabe! Tragam-lhe aí<br />

qualquer livrinho em francês, e se ela não o destrinchar logo, aqui está quem dá as<br />

mãos à palmatória!<br />

Do outro lado do relógio havia uma imagem de Nossa Senhora da<br />

Conceição, fundida em porcelana e pintada vistosamente de cores vivas.<br />

Servia-lhe de peanha um globo representando o mundo, sobre o qual uma<br />

cobra se debatia debaixo de um dos pés da Virgem.<br />

Nossa Senhora da Conceição era a padroeira daquela boa gente e, no dia<br />

que lhe conferiu o calendário cristão, nunca deixou ela de ter ali sua ladainha e a<br />

suas velas de cera. Vinha já de longe esse costume, a mãe de Jorge, em tempos de<br />

melhor fortuna, havia tido um rico oratório consagrado àquela Santa; esse oratório<br />

naufragou uma vez com o seu homem, que era embarcadiço, e desde então foi<br />

substituído pela modesta imagem de porcelana que, ao lado do sisudo relógio, fazia<br />

pendant com Bonaparte.<br />

Já, na pequena sala de jantar fumegava lá dentro a ceia, que a avozinha<br />

acabava de retirar do fogo.<br />

Jorge declarou que tinha o estômago no espinhaço e chamou os hóspedes<br />

para a mesa, mas Ambrosina pediu que a deixassem descansar, e Alfredo prometeu<br />

fazer-lhe companhia ao café, desde, porém, que tivesse tomado um banho que lhe<br />

arranjaram, e vestido um par de calças que lhe emprestara o serviçal dono da casa.<br />

A narração que à sua família fez o cocheiro de tudo o que havia sucedido<br />

essa noite à desditosa Ambrosina, causou grande comoção. Laura, principalmente,<br />

se mostrou em extremo impressionada, e parecia disposta a proporcionar à<br />

interessante hóspede todos os serviços que dependessem do seu desvelo. O caso<br />

lhe fizera vibrar a fibra adormecida do seu temperamento romântico. A visionária<br />

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