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Maria Ivone Mendes da Silva de Correia Costa As - Repositório ...

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<strong>As</strong> (re)citações <strong>de</strong> Eurípi<strong>de</strong>s na Me<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> Mário Cláudio 71<br />

palavras <strong>da</strong> heroína <strong>de</strong> Eurípi<strong>de</strong>s fragmentam-se no novo texto e <strong>de</strong>ixam espaço para que a<br />

actriz-personagem que agora lhes empresta a voz se inscreva como sujeito <strong>da</strong> enunciação.<br />

Ao apropriar-se <strong>de</strong>ste modo do texto original cria-se um confronto entre sujeito e texto,<br />

tanto num plano intra-dramático como extra-dramático. A personagem recita as falas<br />

porque a repetição lhe permite um confronto com o texto antigo e, ao comentá-lo, procura<br />

encontrar-lhe um sentido. O autor usa a citação como uma forma <strong>de</strong> reescrita dramática<br />

que repete e o texto original, fragmentando-o, um procedimento dramático eficaz para que<br />

se crie um leque <strong>de</strong> ressonâncias que, paradoxalmente, sejam capazes <strong>de</strong> gerar dissonâncias<br />

e novos sentidos.<br />

A coexistência <strong>de</strong> a<strong>de</strong>reços cénicos que cal<strong>de</strong>iam o universo <strong>da</strong> mítica saga <strong>de</strong><br />

Me<strong>de</strong>ia e Jasão com a nossa contemporanei<strong>da</strong><strong>de</strong> (e.g.: o gravador, o telefone e a ca<strong>de</strong>ira <strong>de</strong><br />

ro<strong>da</strong>s) contribui, também, para que a “actriz” <strong>de</strong> Mário Cláudio evolua aos olhos do<br />

espectador/leitor, como personagem portadora <strong>de</strong> um pathos que não se circunscreve à<br />

moldura <strong>da</strong> tragédia antiga mas que, neste complexo jogo encenado, rediz e reinterpreta<br />

emoções e sentimentos humanos que o espaço e o tempo não dissolveram.<br />

Mário Cláudio escreveu no programa (2007) <strong>da</strong> representação <strong>da</strong> peça que “A ca<strong>da</strong><br />

Me<strong>de</strong>ia, entendi<strong>da</strong> pelas variáveis <strong>da</strong> história, ou <strong>da</strong> geografia, sobra em <strong>de</strong>svario o que lhe<br />

falta em argúcia.”<br />

À Me<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> Eurípi<strong>de</strong>s não faltará, por certo, argúcia, pelo menos no sentido <strong>da</strong><br />

methis grega. É em virtu<strong>de</strong> <strong>de</strong>ssa quali<strong>da</strong><strong>de</strong> que ela persua<strong>de</strong> Creonte a <strong>de</strong>ixá-la<br />

permanecer em Corinto mais um dia, o dia necessário à consecução dos seus planos. A<br />

proprie<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong> linguagem leva-a, também a conseguir que Egeu prometa acolhê-la em<br />

Atenas e, também, torna-a vencedora dos agones com Jasão. 1<br />

Me<strong>de</strong>ia, a princesa <strong>da</strong> Cólqui<strong>da</strong>, repudia<strong>da</strong> pelo argonauta, que pela sua mão se<br />

tornara vencedor, encontra na sua palavra, na palavra grega que adquirira com esforço, o<br />

arrimo <strong>de</strong> que precisava para sair do oikos e dizer que <strong>de</strong> entre “to<strong>da</strong>s as criaturas vivas são<br />

as mulheres as mais miseráveis”. A Me<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> Eurípi<strong>de</strong>s é uma mulher estranha numa<br />

situação vulgar. A Me<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> Mário Cláudio é uma mulher vulgar numa situação estranha.<br />

Para se fazer ouvir, recita as palavras <strong>de</strong> outra mulher, palavras reconhecíveis, on<strong>de</strong> se<br />

revê, e nas quais encontra as marcas do mesmo abandono afectivo:<br />

1 M. F. Sousa e <strong>Silva</strong> (2007: 195) referiu a importância do conceito <strong>de</strong> orthoepeia na concepção <strong>da</strong><br />

figura <strong>de</strong> Me<strong>de</strong>ia em Desmesura. Exercício com Me<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> Hélia <strong>Correia</strong>.

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