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Maria Ivone Mendes da Silva de Correia Costa As - Repositório ...

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70 <strong>As</strong> (re)citações <strong>de</strong> Eurípi<strong>de</strong>s na Me<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> Mário Cláudio<br />

objectivo <strong>de</strong> vi<strong>da</strong>, a representação <strong>da</strong> Me<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> Eurípi<strong>de</strong>s, seja concretizado. Aquele texto<br />

é mais do que um texto insistentemente recitado por uma actriz já com dificul<strong>da</strong><strong>de</strong>s <strong>de</strong><br />

memorização; é a materialização, na voz <strong>da</strong> actriz, do objecto <strong>de</strong> uma obsessão que esteve<br />

presente ao longo <strong>de</strong> to<strong>da</strong> a sua vi<strong>da</strong>. A recitação do texto <strong>de</strong> Eurípi<strong>de</strong>s cria, ain<strong>da</strong> que<br />

metaforicamente, uma segun<strong>da</strong> personagem, que numa espécie <strong>de</strong> jogo <strong>de</strong> máscaras no<br />

qual o “eu” representa uma“outra” e a percepção <strong>da</strong> “outra” se confun<strong>de</strong> consigo si<br />

própria:<br />

Quando Me<strong>de</strong>ia se libertou do sonho, quebrou-se o exílio a que fora con<strong>de</strong>na<strong>da</strong>.<br />

<strong>As</strong>sassinados os filhos, fugiria num carro refulgente, puxado por dragões alados,<br />

oferecido pelo seu avô, o Sol. Con<strong>de</strong>nou-me a isto o meu Creonte engravatado.<br />

(p.37)<br />

O monólogo <strong>da</strong> actriz assume-se, <strong>de</strong> algum modo, como uma forma subverti<strong>da</strong> <strong>de</strong><br />

diálogo com esse texto primordial em que se revê, na sua condição <strong>de</strong> mulher, só e<br />

ressenti<strong>da</strong>. Através <strong>de</strong>ste recurso bastante comum, particularmente no teatro mo<strong>de</strong>rno, a<br />

personagem revela uma consciência dramática do seu papel e fala <strong>de</strong> teatro <strong>de</strong>ntro do<br />

teatro. Este é um procedimento tipicamente metateatral que o dramaturgo utiliza para criar<br />

distanciamento entre ficção e reali<strong>da</strong><strong>de</strong>, quebrando assim a ilusão dramática e revelando a<br />

sua consciência dramática. Cria-se, assim, um jeu <strong>da</strong>ns le jeu: a personagem representa o<br />

papel <strong>de</strong> uma actriz que representa uma personagem em “diálogo” com o texto/papel que<br />

<strong>de</strong>seja representar:<br />

Quando <strong>de</strong>parei com o meu rosto, e com os olhos on<strong>de</strong> se reflectiam as labare<strong>da</strong>s<br />

em que te abraçavas à tal, lembrei-me <strong>da</strong>quilo que mais <strong>de</strong>sejava e me po<strong>de</strong>ria<br />

comunicar um mensageiro que tivesse assistido à tragédia <strong>da</strong>quela a que te<br />

abraçavas na cama. «O dia<strong>de</strong>ma <strong>de</strong> oiro que lhe cingia a cabeça <strong>de</strong>scarregava uma<br />

torrente <strong>de</strong> um estranho fogo que a ia <strong>de</strong>vorando. E o tecido <strong>da</strong> belíssima túnica que<br />

os teus meninos lhe tinha oferecido, pobre rapariga!, consumia-lhe a carne<br />

<strong>de</strong>lica<strong>da</strong>. (p.19)<br />

O recurso à citação não se esgota na transcrição formal <strong>de</strong> fragmentos do texto<br />

originário que são copiados e incluídos no novo texto. A citação impele o espectador/leitor<br />

a uma releitura do arquitexto, a uma reflexão sobre ele e ao perspectivar <strong>de</strong> uma<br />

personagem que se (re)constrói, interdiscursivamente, no <strong>de</strong>curso <strong>da</strong> própria acção. <strong>As</strong>

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