Maria Ivone Mendes da Silva de Correia Costa As - Repositório ...
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1. Uma recriação <strong>de</strong> Me<strong>de</strong>ia<br />
I<strong>de</strong>ntifica<strong>da</strong>s e analisa<strong>da</strong>s as citações do texto <strong>de</strong> Eurípi<strong>de</strong>s e o processo usado por<br />
Mário Cláudio para o seu transporte <strong>de</strong>s<strong>de</strong> o original grego até à peça, importa agora<br />
<strong>de</strong>strinçar <strong>de</strong> que modo como essas citações contribuem para a construção <strong>da</strong> sua<br />
personagem, mais ou menos <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>nte do referencial grego.<br />
Necessitava Mário Cláudio <strong>de</strong> citar o texto <strong>de</strong> Eurípi<strong>de</strong>s ou bastar-lhe-ia <strong>de</strong>senhar<br />
uma acção na qual a pela traição conjugal levasse a personagem a um estado <strong>de</strong>mencial e<br />
<strong>de</strong>strutivo para que o espectador/leitor reconhecesse <strong>de</strong> imediato o arquitexto ain<strong>da</strong> que a<br />
ele não fizesse qualquer alusão?<br />
Possui a Me<strong>de</strong>ia do autor português uma consistência que lhe advém, precisamente<br />
<strong>da</strong> recitação do texto euripidiano?<br />
Como já referi anteriormente, Mário Cláudio não tem qualquer intenção <strong>de</strong> per<strong>de</strong>r<br />
<strong>de</strong> vista o mo<strong>de</strong>lo grego. Para além do texto, também algumas di<strong>da</strong>scálias dão conta <strong>de</strong><br />
elementos cénicos que surgem como evocações persistentes do mito <strong>de</strong> Me<strong>de</strong>ia: a caveira<br />
<strong>de</strong> carneiro, como um troféu <strong>de</strong> caça, que lembra a conquista do velo <strong>de</strong> ouro; o trono em<br />
que a personagem se senta como reminiscência <strong>da</strong> sua condição <strong>de</strong> princesa <strong>da</strong> Cólqui<strong>da</strong>, o<br />
barulho do mar, audível em gravação, que recor<strong>da</strong> a viagem dos Argonautas. De sublinhar<br />
que o motivo do mar surge em diversas falas <strong>da</strong> personagem (11,13, 20, 33,39, 49),<br />
evocando precisamente o feito do herói que atravessa o mar para aportar às praias <strong>da</strong><br />
Cólqui<strong>da</strong>, mar através do qual ele levará Me<strong>de</strong>ia até Corinto. Corinto, na memória <strong>de</strong>sta<br />
personagem, liga-se ain<strong>da</strong> a uma infi<strong>de</strong>li<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> Jasão, o marido que tem olhos cor <strong>de</strong> oiro<br />
como o velo do carneiro sagrado.<br />
A personagem <strong>de</strong> Mário Cláudio não é, somente, a mulher que sofreu repeti<strong>da</strong>s<br />
infi<strong>de</strong>li<strong>da</strong><strong>de</strong>s conjugais geradoras <strong>de</strong> um ressentimento que o tempo não dilui, mas, em<br />
simultâneo, é uma actriz a viver a amargura <strong>de</strong> uma velhice que chega sem que o seu