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Maria Ivone Mendes da Silva de Correia Costa As - Repositório ...

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62 <strong>As</strong> (re)citações <strong>de</strong> Eurípi<strong>de</strong>s na Me<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> Mário Cláudio<br />

Esta citação, retira<strong>da</strong> do gran<strong>de</strong> monólogo <strong>da</strong> Me<strong>de</strong>ia euripidiana (vv. 1021-1080),<br />

arrasta, <strong>de</strong> novo, para as palavras <strong>da</strong> personagem to<strong>da</strong>s as más memórias <strong>da</strong> recusa à sua<br />

pretensão <strong>de</strong> representar Me<strong>de</strong>ia e <strong>de</strong> um tempo em que no Ministério <strong>da</strong> Cultura se<br />

esquivavam à sua passagem como quem foge <strong>de</strong> maléficos filtros lançados por uma<br />

feiticeira. Não a receavam, aborreciam-na pela insistência, mas a personagem tem <strong>de</strong> si<br />

uma consciência altera<strong>da</strong>, julga-se a princesa <strong>da</strong> Cólqui<strong>da</strong>, neta do Sol, quando é a actriz<br />

fracassa<strong>da</strong> que não <strong>de</strong>siste <strong>de</strong> um sonho impossível.<br />

Mário Cláudio usa um excerto <strong>de</strong> um momento <strong>da</strong> peça <strong>de</strong> Eurípi<strong>de</strong>s consi<strong>de</strong>rado<br />

por Pohenlz (1954: 256) o “cume <strong>da</strong> tragédia” e por Kovacs (1986: 352) “um dos passos<br />

mais importantes do drama europeu”, que isolado dos restantes versos <strong>da</strong> rhesis<br />

euripidiana, per<strong>de</strong> muito <strong>da</strong> sua força original e se afasta <strong>da</strong>s reflexões <strong>de</strong> uma Me<strong>de</strong>ia<br />

dividi<strong>da</strong> entre a paixão e a razão. É certo que o simples recitar <strong>de</strong>stes versos faz acor<strong>da</strong>r na<br />

personagem uma fúria que aparentemente tinha perdido, no entanto parece-me importante<br />

<strong>de</strong>stacar que o autor utiliza o texto <strong>de</strong> Eurípi<strong>de</strong>s, utiliza-o on<strong>de</strong> assim o enten<strong>de</strong>, não<br />

<strong>de</strong>pen<strong>de</strong> <strong>de</strong>le, não segue a sua or<strong>de</strong>m. Reconhece-lhe o po<strong>de</strong>r, a força capaz <strong>de</strong> acor<strong>da</strong>r na<br />

sua personagem sentimentos que pareciam extintos e memórias apaga<strong>da</strong>s, mas continua a<br />

ser o seu texto que usa o texto <strong>de</strong> Eurípi<strong>de</strong>s sem a ele estar subjugado.<br />

No final do quadro, a personagem assume um quinhão <strong>da</strong> culpa na infi<strong>de</strong>li<strong>da</strong><strong>de</strong> do<br />

marido, a “sua” Me<strong>de</strong>ia ocupou o espaço que <strong>de</strong>veria ter sido <strong>de</strong>ixado livre para um<br />

projecto comum:<br />

Foi assim que Jasão me abandonou. A mulher que se <strong>de</strong>ixa <strong>de</strong>vorar pelo sonho que<br />

espaço <strong>de</strong>ixa para o sonho do homem? Os conquistadores, já se sabe, não ganham<br />

sonhos, teimam em perdê-los à medi<strong>da</strong> que as conquistas se realizam. (p.46)<br />

Ao inverso <strong>da</strong> Me<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> Eurípi<strong>de</strong>s que cobra a Jasão a aju<strong>da</strong> que lhe <strong>de</strong>u na<br />

conquista do velo <strong>de</strong> ouro e <strong>da</strong> glória, aju<strong>da</strong> sem a qual ele nunca teria chegado a Corinto<br />

on<strong>de</strong> se dispõe a abandoná-la para contrair casamento mais vantajoso do que a união com<br />

uma princesa <strong>da</strong> Cólqui<strong>da</strong>, útil enquanto pretendia conquistar o velocino, mas dispensável<br />

quando o que preten<strong>de</strong> conquistar é o tálamo <strong>de</strong> uma princesa grega, a Me<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> Mário<br />

Cláudio reconhece que se <strong>de</strong>ixou habitar por uma obsessão que afastou Jasão.

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