Maria Ivone Mendes da Silva de Correia Costa As - Repositório ...
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60 <strong>As</strong> (re)citações <strong>de</strong> Eurípi<strong>de</strong>s na Me<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> Mário Cláudio<br />
Só Me<strong>de</strong>ia, implacável como é, mantém o mesmo rosto. (p. 39)<br />
Ela não mantém o mesmo rosto, envelheceu presa a recor<strong>da</strong>ções <strong>de</strong> que não se<br />
libertou e portanto, ao contrário <strong>de</strong> Me<strong>de</strong>ia, não conseguiu quebrar o exílio a que se<br />
con<strong>de</strong>nou: o teatro <strong>de</strong>struído e as recor<strong>da</strong>ções <strong>de</strong>struidoras.<br />
O Quadro termina com mais uma evocação <strong>da</strong>s férias em Corinto e <strong>da</strong> traição<br />
conjugal, evocação essa que a transporta para mais uma citação (p.41) do texto <strong>de</strong><br />
Eurípi<strong>de</strong>s, precisamente o excerto que já fora citado na p. 31:<br />
«É claro que entre to<strong>da</strong>s as criaturas dota<strong>da</strong>s <strong>de</strong> vi<strong>da</strong> e <strong>de</strong> vonta<strong>de</strong>, somos nós, as<br />
mulheres, as mais infelizes.»<br />
Escreve Mário Cláudio, traduzindo <strong>de</strong> Vellacott:<br />
Surely, of all creatures that have life and will, we women / Are the most wretched<br />
(vv. 242-243, p. 24)<br />
Penso que a razão pela qual neste Quadro se encontra apenas uma citação, e uma<br />
citação que já fora usa<strong>da</strong> anteriormente, se pren<strong>de</strong> com o facto <strong>de</strong> o autor preten<strong>de</strong>r iludir o<br />
espectador e levá-lo a crer que a personagem mudou <strong>de</strong> alguma forma, que ganhou<br />
distanciamento <strong>da</strong> sua obsessiva obstinação e <strong>da</strong>s recor<strong>da</strong>ções sempre presentes. Aliás, a<br />
referência ao nome <strong>de</strong> Creonte, a única <strong>da</strong> peça, não me parece ser inocente. A Me<strong>de</strong>ia<br />
euripidiana consegue obter <strong>de</strong> Creonte mais um dia, necessário à consecução do seu plano;<br />
a Me<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> Mário Claúdio consegue que o espectador lhe suponha a aquisição <strong>de</strong> uma<br />
tranquili<strong>da</strong><strong>de</strong> que tar<strong>da</strong>va em chegar e uma resignação que a impedia <strong>de</strong> partir noutra<br />
direcção, abstendo-se <strong>de</strong> usar mais um excerto do texto <strong>de</strong> Eurípi<strong>de</strong>s e apresentando como<br />
única citação uma repetição <strong>de</strong> palavras já anteriormente ditas.<br />
No Quadro seguinte se verá que a sereni<strong>da</strong><strong>de</strong> sugeri<strong>da</strong> pela personagem não passa<br />
<strong>de</strong> um engano.