Jornal da Academia Cristã de Letras - Outorga
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<strong>Aca<strong>de</strong>mia</strong> <strong>Cristã</strong> <strong>de</strong> <strong>Letras</strong> Agosto/Outubro 2011 - Pg. 17<br />
MEC não quer ensinar<br />
Carlos Alberto Di Franco*<br />
Recentemente, a imprensa noticiou que, para<br />
evitar discriminações, o MEC quer renunciar ao <strong>de</strong>ver<br />
<strong>de</strong> ensinar. Por exemplo, enten<strong>de</strong> que po<strong>de</strong> promover<br />
o preconceito a explicação em sala <strong>de</strong> aula <strong>de</strong> que a<br />
concordância entre artigo e substantivo é uma norma<br />
<strong>da</strong> língua portuguesa. Dessa forma, o MEC aconselha<br />
relativizar. Segundo o Ministério, a expressão “os<br />
carro” também<br />
seria correta. A socie<strong>da</strong><strong>de</strong>, quando se <strong>de</strong>u conta<br />
do que o MEC estava propondo, foi unânime na<br />
sua indignação. Afinal, a oportuni<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> apren<strong>de</strong>r<br />
bem a sua língua <strong>de</strong>ve ser um direito <strong>de</strong> todos.<br />
Nesse caso, no entanto, penso que está em jogo<br />
mais do que a norma culta <strong>da</strong> língua portuguesa.<br />
Implicitamente, o MEC nos diz: na busca por um<br />
“mundo mais justo” (sem preconceitos) po<strong>de</strong> ser<br />
aconselhável dizer algumas mentiras. Na lógica<br />
ministerial, o conhecimento é munição para a<br />
discriminação.<br />
Vislumbra-se aí uma visão <strong>de</strong> mundo, na qual o<br />
critério político prevaleceria sobre a reali<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong>s<br />
coisas, sobre a ver<strong>da</strong><strong>de</strong>. E aqui resi<strong>de</strong> o ponto central,<br />
cuja discussão é incômo<strong>da</strong> para uma socie<strong>da</strong><strong>de</strong> que<br />
não <strong>de</strong>seja utilizar o conceito “ver<strong>da</strong><strong>de</strong>”. Este seria<br />
apropriado apenas para uma agen<strong>da</strong> conservadora;<br />
os contemporâneos já não <strong>de</strong>veriam utilizá-lo mais.<br />
Outro influente motivo para evitar o uso do<br />
conceito “ver<strong>da</strong><strong>de</strong>” é a aspiração por liber<strong>da</strong><strong>de</strong>. As<br />
“ver<strong>da</strong><strong>de</strong>s” tolheriam a nossa autonomia, imporiam<br />
uns limites in<strong>de</strong>sejáveis; no mínimo acabariam<br />
diminuindo a nossa liber<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> pensamento. O MEC<br />
– <strong>de</strong> fato – enten<strong>de</strong> assim: numa socie<strong>da</strong><strong>de</strong> plural,<br />
não se po<strong>de</strong>ria ter apenas uma única norma culta para<br />
a língua portuguesa. Deixemos os nossos alunos<br />
“livres” para escolherem as diversas versões.<br />
Não será que ocorre exatamente o contrário?<br />
Quem conhece bem a língua portuguesa tem a<br />
liber<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> escolher qual forma – num texto<br />
literário, por exemplo – expressa melhor a sua idéia;<br />
e po<strong>de</strong> inclusive abrir mão <strong>da</strong> norma culta, num<br />
<strong>de</strong>terminado momento. Só terá a segurança <strong>de</strong>ssa<br />
escolha quem conheça a norma culta; caso contrário,<br />
serão tiros no escuro.<br />
Entre liber<strong>da</strong><strong>de</strong> e ver<strong>da</strong><strong>de</strong> não vige uma relação<br />
dialética. Elas an<strong>da</strong>m juntas. O que po<strong>de</strong> provocar<br />
um antagonismo com a liber<strong>da</strong><strong>de</strong> é uma versão<br />
absolutista <strong>de</strong> ver<strong>da</strong><strong>de</strong>, encarna<strong>da</strong> pelo sujeito que<br />
enten<strong>de</strong> ser o “dono <strong>da</strong> ver<strong>da</strong><strong>de</strong>”. Já não será hora <strong>de</strong><br />
superarmos a disjuntiva mo<strong>de</strong>rna, e estabelecermos<br />
uma relação amigável com a “ver<strong>da</strong><strong>de</strong>”? Não<br />
significa fazer um pacto “espiritual” com o universo<br />
LÍNGUA PÁTRIA<br />
ou assinar uma espécie <strong>de</strong> <strong>de</strong>claração <strong>de</strong> alienação,<br />
abdicando do uso <strong>da</strong> inteligência e <strong>da</strong> crítica. A proposta<br />
que aqui se faz na<strong>da</strong> mais é do que buscar uma relação<br />
<strong>de</strong> honesti<strong>da</strong><strong>de</strong> intelectual com a reali<strong>da</strong><strong>de</strong> e com os<br />
outros.<br />
Aquilo do qual mais nos orgulhamos não foi<br />
alcançado brigando com a “ver<strong>da</strong><strong>de</strong>”, dizendo que tudo<br />
era relativo, que <strong>da</strong>va na mesma A ou B. Nesta lógica<br />
aparentemente ampla – mas que no fundo é estreita<br />
(porque não está aberta à reali<strong>da</strong><strong>de</strong> e aos outros: impera<br />
o subjetivo) – quem ganha é o mais forte. Já não existe<br />
um referencial a<strong>de</strong>quado para o diálogo. Ficam as<br />
versões. Ficam os discursos. E ficamos à mercê dos<br />
Sarneys... e agora também dos Paloccis.<br />
Ministério <strong>da</strong> Educação: os alunos saberão fazer bom<br />
uso <strong>da</strong>s regras <strong>de</strong> português. Não lhes impeça o acesso<br />
ao conhecimento e, principalmente, não lhes negue um<br />
dos principais motores para o crescimento pessoal: a<br />
confiança.<br />
*Membro <strong>da</strong> <strong>Aca<strong>de</strong>mia</strong> <strong>Cristã</strong> <strong>de</strong> <strong>Letras</strong>, Diretor do<br />
Master em <strong>Jornal</strong>ismo do Instituto Internacional <strong>de</strong><br />
Ciências Sociais, e membro <strong>de</strong> outras enti<strong>da</strong><strong>de</strong>s <strong>da</strong> área<br />
<strong>da</strong>s Comunicações.<br />
BENEDICITE<br />
Débora Novaes <strong>de</strong> Castro*<br />
Bendito seja o mestre, o magnífico ja<strong>de</strong><br />
que reparte o tesouro: os saberes, flora<strong>da</strong>s;<br />
benditos: a floresta, o peixe, a cari<strong>da</strong><strong>de</strong>,<br />
as cachoeiras, o ninho, o azul e as passara<strong>da</strong>s.<br />
Benditos sejam: em brilho, o sol em majesta<strong>de</strong><br />
a pôr-se atrás do monte em régias alvora<strong>da</strong>s,<br />
as aves, a semente, o fio <strong>da</strong> água que inva<strong>de</strong><br />
o ver<strong>de</strong>jante vale e o recorta em agua<strong>da</strong>s.<br />
E benditos: a pedra, o monte que insepulto,<br />
o abismo, a rosa, o dia, a soluçante estrela,<br />
a concha do oceano, o fragor <strong>da</strong> batalha.<br />
Benditos: céus, a terra, os seres, nobre culto,<br />
trabalho, o vento, a lua, um gosto só <strong>de</strong> vê-la,<br />
e Deus que loura o trigo e as almas agasalha!<br />
*Membro <strong>da</strong> <strong>Aca<strong>de</strong>mia</strong> <strong>Cristã</strong> <strong>de</strong> <strong>Letras</strong>,<strong>Aca<strong>de</strong>mia</strong><br />
Paulista Evangélica <strong>de</strong> <strong>Letras</strong>, Ac. Brasileira <strong>de</strong> Lit.<br />
Infantil e Juvenil, União Brasileira <strong>de</strong> Escritores, entre<br />
outras. (In: MARES AFORA... 2010)