Casa de penhores - Isis Baião - Cia. Atelie das Artes
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EDUARDO - Disse que processar a União é loucura. O processo vai rolar durante anos e, ainda que a gente ganhe, não leva... DORA - Mas não tem uma saída? Duda, eu estou com a roupa do corpo, nós estamos comendo batata... Não é justo. Eu investi o meu trabalho, a minha vida nessas coroas... Isso não pode ficar assim... EDUARDO - Ainda temos uma chance, remota... Vamos alegar que o teu produto é único, não existe similar na praça. Assim elimina o argumento da concorrência pública que a lei exige. DORA - É único mesmo. Coroas de tecido estampado é invenção minha! EDUARDO - E você ainda não registrou a patente. DORA - Não tive tempo. EDUARDO - Pois faça isso agora. DORA - É, vou agora. LEVANTA-SE MOVIDA POR UM NOVO ENTUSIASMO. MÃE - Eu falei com um dos meus amigos importantes... DORA - (CHEIA DE ESPERANÇAS) Falou? Que que ele disse? MÃE - Que fazer compra sem concorrência pública é corrupção. DORA - E daí? MÃE - Ele não se mete em corrupção. DORA - Safado, hipócrita! Você acredita nisso? MÃE - (SONHADORA) Um homem muito ilustre!... Olhou nos meus olhos, pegou nas minhas mãos... parece interessado... DORA - E você ainda fica se esfregando nesse ladrão! MÃE - E o filho! Como eu queria que você tivesse se casado com um rapaz igual aquele! Um rapaz bonito, bem vestido, fino! Igualzinho ao pai. Está sendo treinado pra substituir o pai! DORA - Na malandragem! Morre o pai, fica o filho. Isso não tem fim! (SAI) DADDY VOLTA A FALAR NO PREGO. DADDY - ... uma panela de ferro, da cozinha popular - em desuso -, excelente receptáculo para plantas na varanda. Uma Coruja de Ouro, o maior premio do cinema nacional, objeto extremamente decorativo para uma casa de campo. Esta coruja pertenceu a um grande cineasta, que pede para não ser citado... (SOME A VOZ DE DADDY) NA CASA DE DORA, ENTRA HELENA. A MÃE ABRE APENAS UM OLHO. 40
MÃE - Chiiiii! (FECHA RAPIDAMENTE O OLHO) HELENA - (IRÔNICA) É um prazer te encontrar! EDUARDO - (IDEM) O prazer é todo meu! HELENA - Neste edifício não tem interfone, não é? Na revista, eu chegava na portaria e ouvia o porteiro dizer pelo interfone: ela tá subindo... EDUARDO - Saí da revista... HELENA - Eu sei. EDUARDO - É! HELENA - Há três meses que você não paga a pensão dos teus filhos. EDUARDO - Eu sei. HELENA - E então? EDUARDO - Nada posso fazer. Estou desempregado. HELENA - E eu não posso pagar tudo sozinha. Sinto muito, mas vou ter que te meter na cadeia. EDUARDO - Tem toda razão. (GOZADOR) Faça-se de mim segundo a vossa vontade. HELENA - Farei. Você verá. VAI SAINDO DECIDIDA. EDUARDO - Helena, espera... a gente nem conversou... HELENA - Pra que? Você já me deu a decisão! EDUARDO - Espera, não é bem assim... Você tem razão de tá puta comigo... Tenho sido um péssimo pai... Mas não tenho culpa de estar desempregado... Estou procurando trabalho como um louco, mas, a cada dia que se passa, mais portas se fecham... HELENA - Não estou nem um pouco comovida. Olhaqui, se você teve filhos por acaso, azar seu. Eu sempre quis ter esses filhos. Eu amo os meus filhos e estou disposta a tudo pra garantir a eles uma vida menos fodida do que a tua. Estou disposta a tudo, a tudo, até a matar! EDUARDO AGARRA RAPIDAMENTE A TESOURA. HELENA RECUA ASSUSTADA. HELENA - Tá me ameaçando? EDUARDO - Não, tô me defendendo. É a segunda mulher que me ameaça de morte hoje. Vou desistir de mulher. Vou ser veado. HELENA - Talvez seja só o que você tem pra dar... EDUARDO - Ainda bem que você se convenceu que só me resta a bunda. HELENA - Isso não me comove... e não comoverá tampouco o juiz... EDUARDO - Olha, vamos acabar com essa frescura. Quer mandar me prender, manda. Não tenho nada a perder. Só não vai ser legal pros nossos filhos. Eles vão saber que a mãe botou o pai na cadeia... 41
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EDUARDO - Disse que processar a União é loucura. O processo vai rolar<br />
durante anos e, ainda que a gente ganhe, não leva...<br />
DORA - Mas não tem uma saída? Duda, eu estou com a roupa do<br />
corpo, nós estamos comendo batata... Não é justo. Eu investi o meu trabalho, a<br />
minha vida nessas coroas... Isso não po<strong>de</strong> ficar assim...<br />
EDUARDO - Ainda temos uma chance, remota... Vamos alegar que o teu<br />
produto é único, não existe similar na praça. Assim elimina o argumento da<br />
concorrência pública que a lei exige.<br />
DORA - É único mesmo. Coroas <strong>de</strong> tecido estampado é invenção<br />
minha!<br />
EDUARDO - E você ainda não registrou a patente.<br />
DORA - Não tive tempo.<br />
EDUARDO - Pois faça isso agora.<br />
DORA - É, vou agora.<br />
LEVANTA-SE MOVIDA POR UM NOVO ENTUSIASMO.<br />
MÃE - Eu falei com um dos meus amigos importantes...<br />
DORA - (CHEIA DE ESPERANÇAS) Falou? Que que ele disse?<br />
MÃE - Que fazer compra sem concorrência pública é corrupção.<br />
DORA - E daí?<br />
MÃE - Ele não se mete em corrupção.<br />
DORA - Safado, hipócrita! Você acredita nisso?<br />
MÃE - (SONHADORA) Um homem muito ilustre!... Olhou nos<br />
meus olhos, pegou nas minhas mãos... parece interessado...<br />
DORA - E você ainda fica se esfregando nesse ladrão!<br />
MÃE - E o filho! Como eu queria que você tivesse se casado com<br />
um rapaz igual aquele! Um rapaz bonito, bem vestido, fino! Igualzinho ao pai.<br />
Está sendo treinado pra substituir o pai!<br />
DORA - Na malandragem! Morre o pai, fica o filho. Isso não tem<br />
fim! (SAI)<br />
DADDY VOLTA A FALAR NO PREGO.<br />
DADDY - ... uma panela <strong>de</strong> ferro, da cozinha popular - em <strong>de</strong>suso -,<br />
excelente receptáculo para plantas na varanda. Uma Coruja <strong>de</strong> Ouro, o maior<br />
premio do cinema nacional, objeto extremamente <strong>de</strong>corativo para uma casa <strong>de</strong><br />
campo. Esta coruja pertenceu a um gran<strong>de</strong> cineasta, que pe<strong>de</strong> para não ser<br />
citado... (SOME A VOZ DE DADDY)<br />
NA CASA DE DORA, ENTRA HELENA. A MÃE ABRE APENAS UM<br />
OLHO.<br />
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