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Alguns elementos da história dos espumantes na Bairrada. O ...

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<strong>Alguns</strong> <strong>elementos</strong> <strong>da</strong> <strong>história</strong> <strong>dos</strong> <strong>espumantes</strong> <strong>na</strong> Bairra<strong>da</strong>. O segundo fôlego.<br />

1. Introdução<br />

A. Dias Car<strong>dos</strong>o<br />

São ain<strong>da</strong> muito mal conheci<strong>da</strong>s as iniciativas que deram seguimento à activi<strong>da</strong>de pioneira<br />

<strong>da</strong> Associação Vinícola <strong>da</strong> Bairra<strong>da</strong>, constituí<strong>da</strong> em 1893 e dissolvi<strong>da</strong> em 1905.<br />

Diniz Ramos (1990) diz que os mesmos sócios <strong>da</strong> extinta Associação constituíram de<br />

imediato outra socie<strong>da</strong>de, provavelmente desig<strong>na</strong><strong>da</strong> Real Companhia Central Vinícola de<br />

Portugal, que, após a implantação <strong>da</strong> República, terá <strong>da</strong>do lugar à Vinícola Nacio<strong>na</strong>l Limita<strong>da</strong>.<br />

Por outro lado, admite que Lucien Beyseker, que sucedeu a Tavares <strong>da</strong> Silva <strong>na</strong> direcção<br />

técnica <strong>da</strong> Associação Vinícola <strong>da</strong> Bairra<strong>da</strong>, terá fun<strong>da</strong>do as Caves Lucien Beisker no mesmo<br />

ano <strong>da</strong> dissolução <strong>da</strong> referi<strong>da</strong> Associação.<br />

O presente trabalho resulta de uma pesquisa ain<strong>da</strong> incompleta, que pretende lançar mais<br />

alguma luz sobre uma época em que germi<strong>na</strong>ram iniciativas e se assistiu a um segundo fôlego<br />

<strong>da</strong> região, que se traduziu no aparecimento de um número apreciável de empresas vinícolas<br />

especializa<strong>da</strong>s <strong>na</strong> produção de espumante.<br />

2. O período 1905-1920<br />

2.1 A Associação Vinícola <strong>da</strong> Bairra<strong>da</strong><br />

A Associação Vinícola <strong>da</strong> Bairra<strong>da</strong> <strong>na</strong>sce intimamente liga<strong>da</strong> à Escola de Viticultura e<br />

Pomologia <strong>da</strong> Bairra<strong>da</strong>, dirigi<strong>da</strong> pelo engenheiro agrónomo José Maria Tavares <strong>da</strong> Silva. A<br />

própria escritura de constituição <strong>da</strong> empresa, feita aos três de Novembro de 1893, em casa do<br />

Conselheiro José Luciano de Castro (Presidente do Conselho de Ministros em vários perío<strong>dos</strong><br />

<strong>da</strong> Mo<strong>na</strong>rquia Constitucio<strong>na</strong>l e líder do Partido Progressista) refere, expressamente, no ponto<br />

segundo: “A Associação vinícola <strong>da</strong> Bairra<strong>da</strong> tem a sua sede em A<strong>na</strong>dia e é composta por estes<br />

quatro outorgantes, que por sua conta iniciaram a preparação de vinhos <strong>espumantes</strong> sob a<br />

direcção <strong>da</strong> Escola de Viticultura Alexandre de Seabra para esse fim autoriza<strong>dos</strong> pelo governo.”<br />

Aliás, a Escola contava com o Padre António Alves de Mariz como professor auxiliar desde<br />

26 de Março de 1889 (Tavares <strong>da</strong> Silva tinha tomado posse de director em 25 de Fevereiro de<br />

1889), Padre Mariz que, desde o início assumiu a gerência <strong>da</strong> Associação.<br />

Quando, logo após a implantação <strong>da</strong> República, se instaurou uma sindicância à Escola de<br />

Fomento Agrícola <strong>da</strong> Bairra<strong>da</strong>, o Padre Mariz foi o alvo privilegiado <strong>da</strong> Comissão presidi<strong>da</strong> pelo<br />

sr. Albano Coutinho, líder republicano, gover<strong>na</strong>dor civil e deputado. O relatório acusa-o de “<br />

ganhar mensalmente 25$000 sem prestar o menor serviço ao Estado. É o que se chama uma<br />

inútil conezia”. (Bairra<strong>da</strong> Livre, de 20 de Abril de 1911). Poucos meses volvi<strong>dos</strong>, o Padre Mariz<br />

foi transferido para a Escola de Regentes Agrícolas de Santarém.<br />

À <strong>da</strong>ta <strong>da</strong> sua dissolução, a Associação Vinícola <strong>da</strong> Bairra<strong>da</strong> detinha activos significativos.<br />

Segundo o inventário <strong>da</strong>tado de 30 de Abril de 1905, o valor do activo era de 140.603$015,


nele se incluindo vinhos engarrafa<strong>dos</strong> e a granel, vasilhame, máqui<strong>na</strong>s, móveis e utensílios (96<br />

pupitres, por exemplo) e bens de raiz (Edifícios e Caves).<br />

João <strong>da</strong> Motta Prego visitou as instalações do Monte Crasto em 1901 e, <strong>na</strong> Revista<br />

Agrícola, dá conta do seu entusiasmo: “ Percorrendo os extensos subterrâneos profusamente<br />

ilumi<strong>na</strong><strong>dos</strong> a gás acetileno, por onde se alongavam infindáveis perspectivas de garrafas<br />

cui<strong>da</strong><strong>dos</strong>amente deita<strong>da</strong>s nos seus estojos de madeira, vendo trabalhar grupos de crianças <strong>na</strong><br />

lavagem de garrafas, operação de rolhar, etiquetar, etc, tudo por meio de aparelhos reluzentes<br />

e bonitos como brinque<strong>dos</strong> de formas desconheci<strong>da</strong>s, ouvindo o francês <strong>na</strong>sal de M. Lucien<br />

Beysecker (habilíssimo chefe de adega contratado pela companhia), explicando-nos os vários<br />

serviços, ain<strong>da</strong> mais se acentuou no nosso espírito de que saíramos de Portugal e nos<br />

encontrávamos transporta<strong>dos</strong> para a sede mesmo <strong>da</strong> fabricação do genuíno Champagne.”<br />

As ven<strong>da</strong>s <strong>da</strong> Associação, de 1898 a 1904 aparecem no quadro seguinte, que actualiza os<br />

<strong>da</strong><strong>dos</strong> publica<strong>dos</strong> por Dinis Ramos (1990).<br />

Ano<br />

Ven<strong>da</strong>s <strong>da</strong> Associação Vinícola <strong>da</strong> Bairra<strong>da</strong><br />

Garrafas de<br />

“Champagne”<br />

Meias garrafas<br />

de “Champagne” Valor<br />

1898 6491 1974 6:412$270<br />

1899 7603 4695 9:316$270<br />

1900 11181 3822 14:967$760<br />

1901 10508 7308 16:931$775<br />

1902 12330 7861 23:318$600<br />

1903 11118 7580 24:583$665<br />

1904 * 7776 5501 19:465$195<br />

*Da<strong>dos</strong> de Janeiro a Novembro. Não se encontrou o mapa de Dezembro<br />

O mercado de S. Paulo revelava-se promissor, apesar <strong>da</strong>s dificul<strong>da</strong>des invoca<strong>da</strong>s <strong>na</strong><br />

correspondência do responsável pela filial, Manuel Martins Galante. As ven<strong>da</strong>s aí efectua<strong>da</strong>s,<br />

de Janeiro a Junho de 1905, atingiram 25:861$900. A contabili<strong>da</strong>de <strong>da</strong> Associação regista uma<br />

despesa com papéis para um <strong>dos</strong> emprega<strong>dos</strong> <strong>da</strong> Associação, o regente agrícola Ferraz<br />

Mendonça, se deslocar ao Brasil, em 21 de Junho desse mesmo ano.<br />

O que falhava, então? Numa carta para D. Maria Emília Seabra de Castro –esposa do<br />

Conselheiro José Luciano de Castro - escreve o gerente, o Padre António Alves de Mariz, em


18 de Novembro de 1897: “… é por ora pouco desafoga<strong>da</strong> a vi<strong>da</strong> fi<strong>na</strong>nceira <strong>da</strong> Associação em<br />

consequência de parte do nosso débito estar garantido por letras, que temos de pagar a curtos<br />

prazos, por alguns <strong>dos</strong> nossos credores não aceitarem reforma <strong>da</strong>s mesmas.” E, mais adiante,<br />

acrescenta: “ Para o an<strong>da</strong>mento regular <strong>da</strong> associação falta-nos o que é imprescindível em<br />

qualquer empresa – o capital. E infelizmente, o que temos podido conseguir é, em grande<br />

parte, em más condições pelas razões já indica<strong>da</strong>s. Por este motivo, hão-se necessariamente<br />

retar<strong>da</strong>r-se os resulta<strong>dos</strong> duma indústria que está a viver quase exclusivamente do crédito, e<br />

para cujo desenvolvimento eram indispensáveis grandes capitais.”<br />

O referido inventário de 30 de Abril de 1905 está resumido no quadro seguinte:<br />

Rubricas Parcial Acumulado Total acumulado<br />

ACTIVO<br />

Fazen<strong>da</strong>s gerais 77.012$440<br />

Vasilhame 4.575$800<br />

Máqui<strong>na</strong>s, móveis e utensílios 6.057$370<br />

Materiais 25$000 87.670$610<br />

Caixa<br />

Bens de raiz<br />

297$495 87.968$105<br />

Edifício e Caves 24.012$565<br />

Casa de residência do chefe <strong>da</strong> cave 500$000<br />

Benfeitorias 99$000 24.612$465 112.580$570<br />

Letras a receber 700$000<br />

Contas correntes (sal<strong>dos</strong> devedores) 27.322$445 140.603$015<br />

TOTAL DO ACTIVO 140.603$015<br />

CAPITAL<br />

Fundo Social 14.000$000<br />

Sócios, c/ lucros 8.870$985 22.870$985<br />

PASSIVO<br />

Letras a pagar 8.100$000<br />

Contas correntes (sal<strong>dos</strong> credores) 106.632$030 140.603$015<br />

TOTAL DO CAPITAL E PASSIVO 140.603$015<br />

Comentou um amigo especialista nesta área:<br />

“Parece evidente que a empresa carecia de capitais próprios. Além disso, uma grande<br />

parte <strong>da</strong>s fazen<strong>da</strong>s gerais são vinhos, assim se agravando o imobilizado fi<strong>na</strong>nciado por capitais<br />

de curto prazo (letras e sal<strong>dos</strong> credores). Seria preciso uma grande injecção de capitais de<br />

médio e longo prazo. Mas, salvo se as ven<strong>da</strong>s estivessem em grande que<strong>da</strong> ou houvesse<br />

grandes prejuízos em perspectiva, não me parece que o balanço indicie uma situação<br />

desespera<strong>da</strong>”.


Esta análise confirma as reflexões do padre Mariz e sugere que o negócio tinha per<strong>na</strong>s<br />

para an<strong>da</strong>r. Tanto assim que seguiu o seu curso, como veremos.<br />

Uma carta do liqui<strong>da</strong>tário <strong>da</strong> Associação – Justino de Sampaio Alegre – dirigi<strong>da</strong> ao Director<br />

<strong>da</strong> Estação de Fomento Agrícola <strong>da</strong> Bairrra<strong>da</strong> (uma <strong>da</strong>s muitas novas desig<strong>na</strong>ções <strong>da</strong> primitiva<br />

Escola Prática de Viticultura e Pomologia <strong>da</strong> Bairra<strong>da</strong>), em 15 de agosto de 1906, informa que “<br />

brevemente serão entregues as máqui<strong>na</strong>s e utensílios de adega e outros artigos que,<br />

pertencentes ao Estado, foram em tempos cedi<strong>dos</strong> por empréstimo à Associação Vinícola <strong>da</strong><br />

Bairra<strong>da</strong>”.<br />

Ficamos a saber que, desde os primórdios <strong>da</strong> Associação agora liqui<strong>da</strong><strong>da</strong>, sempre a Escola<br />

Prática de Viticultura e Pomologia <strong>da</strong> Bairra<strong>da</strong> cedeu instalações e equipamento para as<br />

primeiras iniciativas industriais relacio<strong>na</strong><strong>da</strong>s com a produção de espumante <strong>na</strong> Bairra<strong>da</strong>.<br />

Forneceu também uvas, como se conclui do ofício de Tavares <strong>da</strong> Silva ao Director Geral de<br />

Agricultura, de 24 de Agosto de 1896:<br />

“Cumpre-me comunicar a V. Exª que a Associação Vinícola <strong>da</strong> Bairra<strong>da</strong> se oferece, como o<br />

fez já o ano passado, a ficar com o vinho <strong>da</strong>s uvas que forem apropria<strong>da</strong>s para o fabrico <strong>dos</strong><br />

seus <strong>espumantes</strong>, pelo maior preço que a Escola obtiver para o vinho que fabrique…” E conclui:<br />

“ É dever meu declarar a V. Exª que o Estado não fica prejudicado com a aceitação <strong>da</strong> oferta <strong>da</strong><br />

Associação Vinícola <strong>da</strong> Bairra<strong>da</strong> e além disso concorre para auxiliar uma empresa <strong>na</strong>scente e<br />

prometedora para os interesses vinícolas desta região.”<br />

2.2 A Real Companhia Vinícola do Centro<br />

A Real Companhia Vinícola do Centro, com sede em Coimbra, foi cria<strong>da</strong> por escritura<br />

realiza<strong>da</strong> em 29 de Janeiro de 1905. Segundo os Estatutos, reproduzi<strong>dos</strong> pela Vinha<br />

Portuguesa, de Janeiro de 1905, assumiu a forma de Socie<strong>da</strong>de Anónima de Responsabili<strong>da</strong>de<br />

Limita<strong>da</strong>, tendo como área de intervenção os distritos de Coimbra, Aveiro, Viseu, Guar<strong>da</strong>,<br />

Castelo Branco e Leiria. Como fun<strong>da</strong>dores teve nomes ilustres <strong>da</strong>s diversas regiões abrangi<strong>da</strong>s.<br />

No que respeita à Bairra<strong>da</strong>, salienta-se a participação de Justino Sampaio Alegre, Albano<br />

Coutinho e Marquês <strong>da</strong> Graciosa, tendo ficado os dois primeiros como membros <strong>da</strong> Direcção –<br />

o primeiro como efectivo e o segundo como suplente. A Associação Vinícola <strong>da</strong> Bairra<strong>da</strong>,<br />

conjuntamente com a Adega Regio<strong>na</strong>l de Coimbra e Sindicato de Nelas foram associa<strong>dos</strong> de<br />

relevo <strong>da</strong> Real Companhia.<br />

O objectivo desta Companhia terá sido obter “consideráveis massas de tipos regio<strong>na</strong>is bem<br />

constituí<strong>dos</strong> e equilibra<strong>dos</strong>”. (Vinha Portuguesa, Fevereiro de 1905).<br />

Tratou-se de uma experiência precursora <strong>dos</strong> vinhos regio<strong>na</strong>is, cuja produção viria a ser<br />

regulamenta<strong>da</strong> quase um século mais tarde (Portaria 159/93, de 11 de Fevereiro).<br />

O balanço de 31 de dezembro de 1905 confirma a participação <strong>da</strong>s três enti<strong>da</strong>des já<br />

referi<strong>da</strong>s e discrimi<strong>na</strong> como bens de raiz as instalações <strong>da</strong> sede em Coimbra e as de A<strong>na</strong>dia,<br />

não mencio<strong>na</strong>ndo as de Nelas. O capital realizado nessa <strong>da</strong>ta é assim distribuído:


Adega Regio<strong>na</strong>l de Coimbra 25:000$000<br />

Associação <strong>da</strong> Bairra<strong>da</strong> 50:000$000<br />

Mais accionistas 43:105$390<br />

Os bons auspícios iniciais, porém, deram lugar a um impasse de que se dá conta a Vinha<br />

Portuguesa de Novembro do mesmo ano. Em Abril de 1908, a Vinha Portuguesa informa que<br />

“a Associação Vinícola <strong>da</strong> Bairra<strong>da</strong> separou-se e lá vai continuando o seu negócio. Esta<br />

Associação, que trouxe à Companhia um certo âmbito de operações deve ter-lhe feito muita<br />

falta.” Lamentando a crise instala<strong>da</strong> <strong>na</strong> Real Companhia, prossegue: “ É uma pe<strong>na</strong>. Uma<br />

instalação de primeira ordem. Toneis enormes, cubas de alve<strong>na</strong>ria, subterrâneas, que<br />

conservam o vinho o melhor possível. Enotécnicos que preparam óptimos vinhos de mesa, que<br />

usam os vinhos ligeiros <strong>da</strong>s margens do Mondego e <strong>da</strong>s regiões limítrofes <strong>da</strong> Bairra<strong>da</strong>, em<br />

lotação com os famosos vinhos do Dão, e deste conjunto, cientemente elaborado, resultam<br />

produtos muito bons, muito bem aprecia<strong>dos</strong> e muito bem recebi<strong>dos</strong> no Brasil e noutros<br />

merca<strong>dos</strong>. As Caves <strong>da</strong> Companhia, ilumi<strong>na</strong><strong>da</strong>s a luz eléctrica, fazem o orgulho <strong>da</strong>s instalações<br />

vinárias do País.”<br />

Em Janeiro de 1909 volta a Vinha Portuguesa ao assunto: “A Companhia Vinícola Central…<br />

luta com muitas dificul<strong>da</strong>des económicas, mas está preparando as suas marcas de consumo<br />

com muito cui<strong>da</strong>do do enotécnico e grande aprazimento do público.”<br />

Em 24 de Novembro de 1916, os Serviços Agrícolas do Norte oficiam ao Posto Agrário <strong>da</strong><br />

Bairra<strong>da</strong>, a propósito de um bónus requerido pela Companhia Central Vinícola <strong>da</strong> Portugal.<br />

Assim, esta Companhia terá durado, pelo menos, de 1905 a 1916, com as muitas<br />

dificul<strong>da</strong>des de percurso já mencio<strong>na</strong><strong>da</strong>s.<br />

2.3 A Adega Social de A<strong>na</strong>dia<br />

Uma outra carta, com a mesma <strong>da</strong>ta de 15 de Agosto de 1906 e subscrita pelo mesmo<br />

Justino de Sampaio Alegre, <strong>na</strong> quali<strong>da</strong>de de gerente <strong>da</strong> Adega Social de A<strong>na</strong>dia, informa o<br />

Director <strong>da</strong> Estação de Fomento Agrário <strong>da</strong> Bairra<strong>da</strong> que “ fazendo actualmente parte <strong>da</strong> Real<br />

Companhia Central Vinícola de Portugal a antiga Adega Social d’A<strong>na</strong>dia, que tomou de<br />

arren<strong>da</strong>mento por três anos as adegas <strong>da</strong> Estação de Fomento Agricola desta região, está<br />

prevenindo aquela Companhia para, findo o prazo d’arren<strong>da</strong>mento, ter desocupa<strong>da</strong>s e fazer<br />

entrega <strong>da</strong>s mesmas adegas e utensílios vinários nos termos do contracto respectivo.”<br />

Numa correspondência para a Vinha Portuguesa, de Outubro de 1892, escreve o Padre<br />

João Coutinho: “ O estabelecimento <strong>da</strong>s adegas sociais, cria<strong>da</strong>s por decreto de 30 de Setembro<br />

último, pode aproveitar a esta região e desig<strong>na</strong><strong>da</strong>mente ao seu centro, onde já há forma<strong>da</strong><br />

uma associação agrícola em A<strong>na</strong>dia.”<br />

A Vinha Portuguesa de Junho de 1893 publica a seguinte notícia, intitula<strong>da</strong> A Adega Social<br />

de Via<strong>na</strong> do Alentejo: “ Apraz-nos muito consig<strong>na</strong>r aqui o assentamento <strong>da</strong> primeira pedra<br />

para o edifício <strong>da</strong> primeira adega social do país. Foi sua Majestade quem presidiu a esta<br />

cerimónia, <strong>na</strong> volta <strong>da</strong> sua visita a Beja”.


A Adega Social de A<strong>na</strong>dia não poderia, pois, ser muito anterior a 1900, provavelmente não<br />

tendo instalações próprias, <strong>da</strong>í a necessi<strong>da</strong>de de tomar de arren<strong>da</strong>mento uma parte <strong>da</strong> Adega<br />

<strong>da</strong> Escola de Viticultura e Pomologia <strong>da</strong> Bairra<strong>da</strong>. Se, em 15 de Agosto de 1906, Justino Alegre<br />

se lhe refere como a antiga Adega Social de A<strong>na</strong>dia, devemos concluir que ela não teve vi<strong>da</strong><br />

longa.<br />

É provável que esta adega social de A<strong>na</strong>dia <strong>na</strong><strong>da</strong> tivesse a ver com o espumante, mas sim<br />

com os outros tipos de vinho de que a Real Companhia Central Vinícola se viria a ocupar.<br />

Em 27 de Novembro de 1906, novamente o gerente <strong>da</strong> Adega Social <strong>da</strong> Bairra<strong>da</strong>, sr.<br />

Justino Sampaio Alegre, se dirige à Estação de Fomento Agrário <strong>da</strong> Bairra<strong>da</strong>: “ Não tendo a<br />

Adega Social de A<strong>na</strong>dia podido retirar ain<strong>da</strong> de uma <strong>da</strong>s adegas <strong>da</strong> Estação de Fomento<br />

Agrícola <strong>da</strong> Bairra<strong>da</strong> parte do vinho que ali havia depositado durante o arren<strong>da</strong>mento que fez<br />

<strong>da</strong>s mesmas adegas, vimos rogar a V. Exª se digne autorizar-nos a conservá-lo ain<strong>da</strong> por algum<br />

tempo <strong>na</strong> referi<strong>da</strong> adega…”<br />

Uma Ordem de Serviço emiti<strong>da</strong> pela Direcção Geral de Agricultura, em 12 de Maio de<br />

1908, “autorizou que a Adega Social <strong>da</strong> Bairra<strong>da</strong> possa queimar gratuitamente o vinho que<br />

tem actualmente…”. Portanto, <strong>na</strong>quela <strong>da</strong>ta ain<strong>da</strong> existia a referi<strong>da</strong> Adega Social. Mas não<br />

encontrámos referências posteriores.<br />

2.4 A Vinícola de A<strong>na</strong>dia Limita<strong>da</strong><br />

É fora de dúvi<strong>da</strong> que existiu a Vinícola de A<strong>na</strong>dia Limita<strong>da</strong>, com os mesmos sócios <strong>da</strong><br />

extinta Associação Vinícola <strong>da</strong> Bairra<strong>da</strong>, de que assumiu o passivo, e ocupando as instalações<br />

do Crasto, que pertenceram à primitiva socie<strong>da</strong>de.<br />

O Jor<strong>na</strong>l de A<strong>na</strong>dia, de 19 de Novembro de 1910 informa que no “Palácio Foz, hoje do<br />

Conde Suce<strong>na</strong>, se acha instala<strong>da</strong> a agência <strong>da</strong>s Águas <strong>da</strong> Curia e também <strong>dos</strong> vinhos <strong>da</strong><br />

Vinícola do Crasto.”<br />

Em 8 de Agosto de 1914, o mesmo Jor<strong>na</strong>l informa que partiu para França, para combater<br />

pelo seu país <strong>na</strong> 1ª Guerra Mundial, o sr. “Gustave Leon Pilon Demissy, chefe de cave <strong>da</strong><br />

Vinícola de A<strong>na</strong>dia, L<strong>da</strong>. “<br />

O Jor<strong>na</strong>l de A<strong>na</strong>dia, de 17 de Dezembro de 1910 publica um desmentido sobre um alegado<br />

adiantamento de 20:000$000 à Companhia <strong>da</strong> Bairra<strong>da</strong> para construção de grandes armazéns:<br />

“ Escreve-nos o dr. Paulo Cancela, presidente <strong>da</strong> Direcção <strong>da</strong> Vinícola de A<strong>na</strong>dia L<strong>da</strong>, para nos<br />

dizer que nem a antiga Socie<strong>da</strong>de Vinícola <strong>da</strong> Bairra<strong>da</strong> nem a actual Vinícola de A<strong>na</strong>dia, sua<br />

sucessora, receberam do governo adiantamento de quantia ou favor algum, e que <strong>na</strong> Bairra<strong>da</strong><br />

nunca existiu socie<strong>da</strong>de alguma que se denomi<strong>na</strong>sse simplesmente Companhia <strong>da</strong> Bairra<strong>da</strong>”.<br />

Nesta carta do dr. (José) Paulo Cancela refere-se a antiga Socie<strong>da</strong>de Vinícola <strong>da</strong> Bairra<strong>da</strong>,<br />

quando o mais certo é tratar-se <strong>da</strong> Associação Vinícola <strong>da</strong> Bairra<strong>da</strong>. Se for como pensamos,<br />

confirma-se, mais uma vez, que a Vinícola de A<strong>na</strong>dia sucedeu à Associação Vinícola <strong>da</strong><br />

Bairra<strong>da</strong>.<br />

Até quando se manteve a activi<strong>da</strong>de desta Vinícola de A<strong>na</strong>dia?


A Vinha Portuguesa, de Dezembro de 1917, publica um artigo, assi<strong>na</strong>do pelo seu Director e<br />

Fun<strong>da</strong>dor Almei<strong>da</strong> Brito, com o título Fabrica de Champagne em A<strong>na</strong>dia, referindo a <strong>da</strong><strong>da</strong><br />

altura, depois de historiar o papel inicial de Tavares <strong>da</strong> Silva no fabrico do Champagne:<br />

“Fundou-se uma parceria para explorar este fabrico; veio de França um técnico especial para<br />

trabalhar este vinho gasoso, e a parceria explorou, durante alguns anos, este ramo de negócio.<br />

Mas, haverá 6 anos, liquidou e ficou só, desenvolvendo a indústria, o sr. Justino de Sampaio<br />

Alegre, que é um viticultor muito ilustrado e um homem de rara activi<strong>da</strong>de e iniciativa.”<br />

Continua Almei<strong>da</strong> Brito: “A fábrica, situa<strong>da</strong> no monte do Crasto, foi alonga<strong>da</strong> e<br />

desenvolvi<strong>da</strong>, enriqueci<strong>da</strong> de maquinismos e aparelhos os mais modernos e recomen<strong>da</strong><strong>dos</strong>, e<br />

dota<strong>da</strong> de um director de grande competência, activi<strong>da</strong>de e honesti<strong>da</strong>de, o sr. João Raposo.<br />

Este cavalheiro trabalhou com o enotécnico francês, mas com tal proveito, que hoje é uma<br />

grande autori<strong>da</strong>de no fabrico de Champagne e prepara um tipo de vinho muito apreciável e<br />

muito bem recebido do público, porque é sempre igual e irrepreensivelmente apresentado.”<br />

De acordo com este relato, Justino Alegre terá ficado sozinho <strong>na</strong> empresa por volta de<br />

1911. Na reali<strong>da</strong>de tal terá acontecido um pouco mais tarde e de forma um pouco diferente.<br />

Segundo o Jor<strong>na</strong>l de A<strong>na</strong>dia de 4 de Maio de 1912 “Passou a ser proprie<strong>da</strong>de unicamente <strong>dos</strong><br />

srs. Justino de Sampaio Alegre e Padre António Alves de Mariz a Vinícola de A<strong>na</strong>dia Limita<strong>da</strong>,<br />

que nos disse vai entrar numa nova fase de activi<strong>da</strong>de extraordinária: Consta-nos mais que<br />

aqueles dois cavalheiros vão constituir nova socie<strong>da</strong>de com os grandes capitalistas srs. José<br />

Duarte de Figueiredo, do Luso, e Augusto Brandão, de Lisboa.”<br />

Esta nova composição <strong>da</strong> socie<strong>da</strong>de explica-se pelo falecimento recente do dr. José Paulo<br />

Monteiro Cancela, em Abril de 1912, e pelo periclitante estado de saúde do Conselheiro José<br />

Luciano de Castro, que morreria a 14 de Março de 1914.<br />

Em 10 de Janeiro de 1922, ain<strong>da</strong> Justino <strong>da</strong> Sampaio Alegre assi<strong>na</strong> <strong>na</strong> quali<strong>da</strong>de de<br />

representante <strong>da</strong> Socie<strong>da</strong>de Vinícola de A<strong>na</strong>dia, L<strong>da</strong>. em abono <strong>dos</strong> bons serviços presta<strong>dos</strong><br />

por João Simões Raposo e seu irmão Francisco Simões Raposo, que abando<strong>na</strong>ram a empresa<br />

em 9 desse mês de Janeiro.<br />

A fun<strong>da</strong>ção <strong>da</strong> empresa Justino de Sampaio Alegre& Filho virá a seguir, exclusivamente no<br />

âmbito familiar, associando o seu filho Augusto Brandão Alegre. Mais tarde, surgirá a firma<br />

Justino de Sampaio Alegre, Filho, de que Augusto Alegre ficará como único proprietário. Data<br />

provavelmente desse período a entra<strong>da</strong> do técnico francês Gaston Charlemagne. O sr. João<br />

Moura, felizmente ain<strong>da</strong> vivo, diz que entrou <strong>na</strong> empresa em 1943 e trabalhou 5 anos com M.<br />

Gaston e que este já lá trabalhava há alguns anos com o irmão Domingos Moura.<br />

Em 2 de Maio de 1956 Augusto Brandão Alegre, já viúvo e com alguns filhos ain<strong>da</strong><br />

menores, constitui a socie<strong>da</strong>de com a denomi<strong>na</strong>ção Caves do Monte Crasto. Nesta escritura<br />

intervêm Augusto Brandão Alegre, em representação <strong>dos</strong> seus filhos menores Justino Pereira<br />

Alegre e Augusto Maria Pereira Alegre e os filhos emancipa<strong>dos</strong> Manuel Pereira Alegre e Maria<br />

Joa<strong>na</strong> Pereira Alegre. Neste acto, ao filho Manuel são concedi<strong>dos</strong> poderes para outorgar <strong>na</strong><br />

escritura realiza<strong>da</strong> no mesmo dia, pela qual Augusto Brandão Alegre vende à nova socie<strong>da</strong>de<br />

os edifícios do Monte Crasto (Caves, residências e anexos) e as marcas regista<strong>da</strong>s em nome <strong>da</strong><br />

firma anterior.


A empresa ain<strong>da</strong> hoje existe, com outro proprietário, completando, em breve, 120 anos de<br />

activi<strong>da</strong>de.<br />

2.5 Caves Lucien Beysecker<br />

Outro importante actor deste período foi o francês Lucien Beysecker. Na contestação feita<br />

pela Associação Vinícola <strong>da</strong> Bairra<strong>da</strong> à acção contra ela movi<strong>da</strong> em 1900 pelo engenheiro<br />

Tavares <strong>da</strong> Silva, reclamando diversas quantias a que se julgava com direito, Lucien Beysecker<br />

é referido como sendo empregado <strong>da</strong> Associação ain<strong>da</strong> no tempo em que Tavares <strong>da</strong> Silva<br />

colaborava com a empresa, ou seja, até 1898. De facto, já m 1896 se refere o seu nome e o de<br />

Tavares <strong>da</strong> Silva no Balanço e Contas referentes a 31 de Outubro. Nos documentos de despesa<br />

de 1905 diz-se que aufere o orde<strong>na</strong>do de 70$000 e comissões pelas ven<strong>da</strong>s. Mas,<br />

surpreendentemente, Lucien Beysecker fun<strong>da</strong> as Caves com o seu nome, <strong>na</strong> rua do Cabecinho,<br />

em A<strong>na</strong>dia, e nos rótulos <strong>dos</strong> seus vinhos diz que a empresa <strong>da</strong>ta de 1894.<br />

O Jor<strong>na</strong>l de A<strong>na</strong>dia de 11 de Junho de 1910 noticia que “partiu desta vila para Vitel<br />

(França), onde foi fazer o tratamento d’água, o nosso estimado amigo Lucien Beysecker,<br />

distinto enologista aqui há anos estabelecido.” Parece, pois, confirmar-se que as Caves Lucien<br />

Beysecker existiam desde há alguns anos. Não existe, porém, escritura pública de constituição<br />

<strong>da</strong> socie<strong>da</strong>de em 1894. Sabemos que por escritura de 1 de Agosto de 1905 Lucien Beysecker<br />

comprou a Adriano Rodrigues Lapa as casas <strong>na</strong> rua do Cabecinho, conjuntamente com outros 6<br />

prédios rústicos. Sublinhe-se que Lucien Beysecker é identificado <strong>na</strong> escritura como “ci<strong>da</strong>dão<br />

francês, empregado <strong>na</strong> Associação Vinícola <strong>da</strong> Bairra<strong>da</strong>”. É provável, portanto, que as Caves<br />

tenham <strong>na</strong>scido depois de 1905, já que, no mínimo, seriam necessárias obras de a<strong>da</strong>ptação<br />

<strong>da</strong>s primitivas casas.<br />

Em 11 de Maio de 1918, o Jor<strong>na</strong>l de A<strong>na</strong>dia publica a escritura <strong>da</strong> Socie<strong>da</strong>de por quotas de<br />

responsabili<strong>da</strong>de limita<strong>da</strong> desig<strong>na</strong><strong>da</strong> Lucien Beysecker, Limita<strong>da</strong>, nela participando os sócios<br />

Lucien Beysecker, industrial, residente em A<strong>na</strong>dia, José Ferraz de Lemos Mendonça, regente<br />

agrícola, residente em A<strong>na</strong>dia, e Maximiano José Domingues, industrial, residente em Lisboa. A<br />

socie<strong>da</strong>de tinha como objecto essencial o fabrico e comércio de vinhos espumosos. A sede<br />

teve lugar em A<strong>na</strong>dia, admitindo-se que pudesse ser transferi<strong>da</strong> para Lisboa. Esta<br />

eventuali<strong>da</strong>de teria a ver com a posição domi<strong>na</strong>nte de Maximiano Domingues no capital <strong>da</strong><br />

socie<strong>da</strong>de. A escritura relacio<strong>na</strong> as proprie<strong>da</strong>des integra<strong>da</strong>s <strong>na</strong> socie<strong>da</strong>de, nomea<strong>da</strong>mente,<br />

edifício, caves e anexos (ain<strong>da</strong> hoje existentes e proprie<strong>da</strong>de <strong>da</strong>s Caves <strong>da</strong> Montanha),<br />

máqui<strong>na</strong>s, móveis, vinhas e terras de semeadura.<br />

Em 1923 ain<strong>da</strong> esta socie<strong>da</strong>de publicitava a compra de uvas. Admite-se que Lucien<br />

Beysecker se tenha retirado de A<strong>na</strong>dia poucos anos depois. Com efeito, em 30 de Outubro de<br />

1929 é constituí<strong>da</strong> a firma Champagnes Lucien Beysecker Limita<strong>da</strong>, tendo como sócios Joaquim<br />

Rodrigues Miran<strong>da</strong>, Maria Adelaide Neto Miran<strong>da</strong> e Horácio Neto Costa, sendo Joaquim<br />

Miran<strong>da</strong> o sócio maioritário, que assumiu a gerência. Em 1931, a desig<strong>na</strong>ção <strong>da</strong> socie<strong>da</strong>de<br />

regressa a Caves Lucien Beysecker, havendo registo de nova alteração estatutária em 19 de<br />

Setembro de 1934.<br />

Em 29 de Maio de 1941, a gerente <strong>da</strong>s Caves Lucien Beysecker, D. Maria Adelaide Neto<br />

Miran<strong>da</strong>, já viúva de Joaquim Miran<strong>da</strong>, vendeu às Caves <strong>da</strong> Curia, L<strong>da</strong>, representa<strong>da</strong>s por


Joaquim Seabra Ferreira e Noémio Moreira Capela, as suas marcas mais conheci<strong>da</strong>s e<br />

reconheci<strong>da</strong>s <strong>dos</strong> seus <strong>espumantes</strong> e licores. A marca de espumante Damery, por exemplo,<br />

estava regista<strong>da</strong> desde 1921.<br />

O desaparecimento <strong>da</strong>s Caves Lucien Beysecker, deu lugar, pouco depois, à socie<strong>da</strong>de<br />

SPEL, de que encontramos registos <strong>na</strong> Estação Vitivinícola desde 16 de Fevereiro de 1946 e,<br />

mais tarde às Caves <strong>dos</strong> Olivais. Hoje, as instalações pertencem às Caves <strong>da</strong> Montanha.

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