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Signos que embaralham a visão - Grupo de Estudos em Literatura ...

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138 Elizabete Sanches<br />

O escritor é a língua. Não se trata <strong>de</strong> manusear, apren<strong>de</strong>r e <strong>de</strong>sapren<strong>de</strong>r<br />

um idioma. Em Budapeste, fica nítida a certeza <strong>de</strong> <strong>que</strong> se é absorvido pela<br />

língua e, para um escritor, seja ele anônimo ou não, esta é uma lei. Talvez<br />

por essa razão Chico Buar<strong>que</strong> tenha abandonado a idéia <strong>de</strong> criar um<br />

protagonista arquiteto 2 ; na pele <strong>de</strong> um escritor, esta abordag<strong>em</strong> da palavra<br />

como essência mesma da i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong> po<strong>de</strong> ser mais claramente elaborada<br />

e a construção <strong>de</strong> diferentes espaços e cida<strong>de</strong>s é subordinada ao<br />

fazer lingüístico. É revelada uma relação visceral com as palavras, s<strong>em</strong> as<br />

quais não haveria a própria i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong> do escritor como hom<strong>em</strong>. Tanto<br />

quanto o hom<strong>em</strong>, as cida<strong>de</strong>s também se traduz<strong>em</strong> através da língua. Portanto,<br />

t<strong>em</strong>os <strong>em</strong> Budapeste o trinômio língua, cida<strong>de</strong>s, hom<strong>em</strong><br />

consubstanciando as várias viagens <strong>em</strong>preendidas pelo personag<strong>em</strong>, <strong>que</strong><br />

são simultaneamente para fora – países do exterior – e para <strong>de</strong>ntro –<br />

sonhos, <strong>de</strong>sejos e anseios <strong>de</strong> um José, carioca, brasileiro, latino-americano<br />

<strong>em</strong> busca <strong>de</strong> sua i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong> <strong>que</strong>, ironicamente, só po<strong>de</strong> se revelar por<br />

meio <strong>de</strong> uma expansão ao Outro, como ilustra esta passag<strong>em</strong>:<br />

Artistas, políticos e escro<strong>que</strong>s famosos batiam à minha porta, mas eu me dava ao luxo<br />

<strong>de</strong> aten<strong>de</strong>r somente personagens tão obscuros quanto eu mesmo. Clientes <strong>que</strong> me<br />

l<strong>em</strong>bravam a<strong>que</strong>les da sala três por quatro do centro da cida<strong>de</strong>, exceto por ser<strong>em</strong> ricos<br />

o suficiente para pagar o cachê extorsivo <strong>que</strong> o Álvaro estipulava, além <strong>de</strong> custear<strong>em</strong> a<br />

tirag<strong>em</strong> do livro para distribuição entre parentes e amigos (25).<br />

Vale salientar <strong>que</strong> José Costa passa a escrever autobiografias, com a<br />

aprovação <strong>de</strong> Álvaro – seu sócio na Cunha & Costa Agência Cultural,<br />

também ironicamente <strong>de</strong>nominada Cohna & Casta Agency –, <strong>de</strong>pois <strong>de</strong><br />

não reconhecer mais as marcas da diferença <strong>em</strong> sua escrita, <strong>que</strong> a tornavam<br />

apenas sua, i<strong>de</strong>ntificando o hom<strong>em</strong> e o escritor simultaneamente.<br />

Aqui o escritor e o hom<strong>em</strong> se amalgamam, formam um mesmo el<strong>em</strong>ento.<br />

Mas, ao buscar a autobiografia, José Costa revela personagens estranhos<br />

<strong>que</strong> inventa. Justamente pela imaginação, pelo sonho – “Descobri na<strong>que</strong>le<br />

instante <strong>que</strong> <strong>em</strong> meus sonhos eu falava húngaro” (31) – José Costa<br />

i<strong>de</strong>ntifica-se, é. E a imaginação só se po<strong>de</strong> apreen<strong>de</strong>r pela linguag<strong>em</strong>,<br />

especialmente pela língua:<br />

2 O Globo. “Essa Budapeste não está no mapa...”. Budapeste: fortuna crítica. Disponível <strong>em</strong> http:/<br />

/www.chicobuar<strong>que</strong>.uol.com.br/construção/in<strong>de</strong>x.html. Acesso <strong>em</strong> 1º. <strong>de</strong> março <strong>de</strong> 2006.

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