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FREUD, Sigmund. Obras Completas (Cia. das Letras) – Vol. 14

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vez!’. Não hesitei nem um instante. Lá se foi uma panela, e, como eles não<br />

cessassem de gritar ‘Outra vez!’, todos os pratinhos, os pequenos vasos e as<br />

panelinhas se espatifaram um depois do outro na calçada. Meus vizinhos<br />

continuavam a manifestar-me a sua aprovação e eu estava radiante por lhes<br />

proporcionar esse prazer. Mas a provisão de louça esgotara-se e eles sempre<br />

a gritar: ‘Outra vez!’. Corri, pois, direto à cozinha e apanhei os pratos de<br />

barro, que naturalmente ofereceram, ao quebrar-se, um espetáculo ainda<br />

mais divertido. E assim comecei a ir e vir, trazendo um prato de cada vez,<br />

conforme podia alcançá-los na prateleira em que estavam guardados; e,<br />

como aqueles cavalheiros não se davam por satisfeitos, precipitei na mesma<br />

ruína toda a louça que pude arrastar até o vestíbulo. Foi então que apareceu<br />

alguém, mas demasiado tarde, para dar ponto final àquela e proibir-me a<br />

brincadeira. O mal estava feito, e em troca de tanta louça quebrada tivemos<br />

pelo menos uma história cômica, que foi, sobretudo para os maliciosos instigadores,<br />

e até o fim de sua existência, uma alegre recordação.”<br />

Em tempos pré-psicanalíticos, podia-se ler essa passagem sem achar motivo<br />

para nela se deter e sem admirar-se; mas depois a consciência analítica tornouse<br />

intensa. Havíamos formado, acerca de recordações da mais remota infância,<br />

determina<strong>das</strong> opiniões e expectativas, as quais pretendíamos que tivessem validade<br />

geral. Não devia ser indiferente ou insignificante qual detalhe da vida infantil<br />

escapara ao esquecimento geral da infância. Seria antes de supor que<br />

aquilo conservado na memória fosse também o mais significativo de todo<br />

aquele período de vida, seja porque tivesse tal importância já na época, seja<br />

por havê-la adquirido graças à influência de eventos posteriores.<br />

É certo que o alto valor de tais recordações infantis era óbvio apenas em<br />

um ou outro caso. Em geral não faziam diferença, pareciam mesmo sem nenhum<br />

valor, e não se entendia por que justamente elas conseguiam fazer frente à<br />

amnésia; também a pessoa que as conservara por muitos anos como bens de<br />

sua memória não podia apreciá-las, e tampouco uma outra a quem as havia<br />

contado. Para discernir a sua importância, era preciso um certo trabalho de<br />

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