1 PAULO E ESTEVÃO FRANCISCO CÂNDIDO ... - O Consolador
1 PAULO E ESTEVÃO FRANCISCO CÂNDIDO ... - O Consolador
1 PAULO E ESTEVÃO FRANCISCO CÂNDIDO ... - O Consolador
Create successful ePaper yourself
Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.
— Empreendi a viagem, mas tudo conspirou contra mim. Em breve os pés<br />
chagados não podiam caminhar. Arrastava -me como podia, cheio de cansaço e<br />
sede, quando um carroceiro humilde, apiedado, me colheu e trouxe a esta<br />
casa, onde a dor encontra um consolo fraternal.<br />
Gamaliel não sabia como externar sua surpresa, tal a emoção que lhe<br />
vibrava no íntimo. Pedro, igualmente, estava sensibilizado. Acostumando -se à<br />
prática do bem sem cogitar jamais dos antecedentes do socorrido, via no caso<br />
uma confortadora revelação do amoroso poder do Cris to.<br />
O grande rabino estava atônito diante do que ali via e ouvia. Com a<br />
sinceridade que lhe era peculiar, não podia dissimular sua amizade agradecida<br />
ao pobre enfermo; mas, sem recursos para retirá -lo daquele pobre albergue,<br />
via-se na contingência de esten der seu reconhecimento a Simão Pedro e<br />
demais companheiros do ex-pescador de Cafarnaum. Só agora reconhecia que<br />
o judaísmo não havia cogitado desses pousos de amor. Encontrando ali o<br />
amigo leproso, desejou sinceramente ampará -lo. Mas como? Pela primeira ve z<br />
pensou na dolorosa eventualidade de enviar um ente amado ao vale dos<br />
imundos. Ele que aconselhara esse recurso a tanta gente, ali estava<br />
considerando, agora, a situação de um amigo querido. O episódio abalava -o<br />
profundamente Procurando evitar raciocínios filosóficos, de modo a não cair em<br />
conclusões apressadas, falou com doçura:<br />
— Sim, tens razão para agradecer o esforço dos teus benfeitores.<br />
— E também a misericórdia do Cristo — acentuou o doente com uma<br />
lágrima. — Creio, agora, que o generoso profeta de Nazaré, com o testemunho<br />
de amor que nos trouxe, é o Messias prometido.<br />
O grande doutor compreendeu o êxito da nova dou trina. Aquele Jesus<br />
desconhecido, ignorado da sociedade mais culta de Jerusalém, triunfava no<br />
coração dos infelizes, pela contribuição de amor desinteressado que trou xera<br />
aos mais deserdados da sorte.<br />
Compreendeu, ao mesmo tempo, a discrição que se lhe impunha naquele<br />
meio humilde, atentas as suas responsabilidades na vida pública. Precisando<br />
prosseguir na conversa, por testemu nhar o seu altruísmo e piedade, advertiu<br />
com um sorriso:<br />
— Acredito que Jesus de Nazaré, de fato, foi um modelo de renúncia a prol<br />
de idéias que, até hoje, não pude perquirir ou compreender; mas daí a<br />
considerá-lo o próprio Messias..<br />
Essas palavras reticenciosas davam a compreender o escrúpulo do seu<br />
coração delicado, entre a Lei Antiga e as novas revelações do Evangelho.<br />
Simão Pedro assim o entendeu e, debalde, procurava um meio para desviar a<br />
palestra noutro rumo, O próprio Samônio, porém, como tutelado do Mes tre, foi<br />
em auxílio do Apóstolo, redar guindo a Gamaliel com observações ponderadas<br />
e justas:<br />
— Se eu estivesse com saúde, plenamente identifi cado com a família e no<br />
gozo dos bens que conquistei com esforço e trabalho, talvez duvidasse<br />
também dessa realidade confortando- a, Mas estou prostrado, esquecido de<br />
todos e sei quem me deu mão amiga. Como israelitas, amantes da Lei de<br />
Moisés, temos esperado um Salvador na pessoa mortal de um príncipe do<br />
mundo; contudo, essa crença há de prevalecer para uma situaçã o passageira.<br />
São ilusórios preconceitos, esses que nos levam a induzir uma dominação de<br />
forças perecíveis. A enfermidade, porém, é conselheira carinhosa e<br />
esclarecida. De que nos valeria um profeta que salvasse o mundo para depois<br />
77