Livro - O Recreador Mineiro - ICHS/UFOP

consciência da prática do pecado. Na citação que segue perceberemos como a situação
da personagem coloca em evidência os valores (familiares, religiosos, e jurídicos) que
se operam em sua consciência quando da reflexão sobre o crime que estava por cometer.
Sente-se supersticiosamente amedrontada pela culpa, acreditava ser aquela situação o
castigo para a pecadora que já era e a criminosa que estava preste a se tornar:
“-Deus me castiga, dizia ella fechando os olhos, para não vêr a dor de
seu marido, e as angustias de sua filha. Ainda não sou criminosa mas
o castigo precede a culpa. E entre tanto, quantas mulheres vivem
cercadas de linda e tenra família, que não têem hum crime só, mas
cem!
Tinha momentos de medo supersticioso; e cuidando que Deus a punia
em sua filha, queria desviar a morte da pequenina accusando se; a
cada momento resolvia levantar se, atirar se aos pés do Conde, e
salvar sua filha com huma confissão completa, e esperando o castigo.
Depois animava-se mais, e perguntava a si mesma se não daria todo o
amor, affeição e ternura de Theobaldo por hum sorriso de huma
filhinha única.
(...) Que fatalidade a tinha levado a esta intriga que tinha chamado
paixão? Huma rivalidade de mulher, e nada mais. Oh! meu Deus! E
porque não deixava ella a M. de Muley o seu amante? talvez que
então, em vez de chorar, se sorisse junto ao berço..” 170
E sentindo “ainda mais vivamente o perigo de sua posição. Tentou um esforço
para sahir d’elle.” Mais uma vez a condessa usa de dissimulação para tentar se livrar
daquela única testemunha de seu pecado e do crime que delataria com sua descoberta
por parte de qualquer uma das pessoas que ali entrassem. Propõe que a criança seja
transferida para o quarto do marido, mas não obteve êxito.
170 Envergonhei-me de mim mesm e tive medo.In: O Recreador Mineiro. Tomo I. nº 01, 01/01/1845.
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