Mário Ferreira dos Santos - O problema social - iPhi
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162 MÁRIO FERREIRA DOS SANTOS<br />
a substituição <strong>dos</strong> capitalistas, que são liquida<strong>dos</strong>. Nesse<br />
caso, é claro e patente, que o bolchevismo é apenas<br />
a identidade inversa do capitalismo paleotécnico, é um<br />
ideal de reacção, que deseja fazer o contrário do que é<br />
feito, sem, no entanto, perder a similaridade com o contrariado.<br />
Enquanto o capitalista tem de ser, por índole,<br />
mais ou menos liberal, porque do contrário não poderia<br />
estabelecer-se a complexidade da troca e das relações correspondentes,<br />
a livre escolha da profissão, etc, o bolchevismo<br />
só pode tornar-se num regime de ascendente falta<br />
de liberdade. Basta ler-se a literatura bolchevista antes<br />
da revolução de outubro (por exemplo, as famosas teses<br />
de Abril, nas quais se condensaram as promessas totalmente<br />
incumpridas <strong>dos</strong> bolchevistas) para ver-se claramente<br />
o desmentido da prática a todas as afirmações<br />
feitas.<br />
O espírito paleotécnico, no entanto, vigora ainda, e<br />
alimenta com seus erros a propaganda bolchevista. Assistimos<br />
à prática quotidiana de um "rush" desesperado<br />
ao dinheiro transformado em fim, sem o menor respeito<br />
aos meios, com o espesinhamento de toda decência, no<br />
intuito de adquirir uma fortuna mal fundada e inconfessável.<br />
"Que importa é o dinheiro": essa frase é bem o<br />
reflexo dessa hora. Em face de tais atitudes e das injustiças,<br />
que elas geram, quem pode impedir o progresso<br />
do bolchevismo? Combater o espírito paleotécnico e<br />
suas bases reais é uma imprescindibilidade. A neotécnica,<br />
com seu espírito eugênico, saudável, nobre, precisa<br />
ingressar vitoriosamente em to<strong>dos</strong> os sectores. Mas é<br />
preciso mais! É preciso que o espírito biotécnico já se<br />
forme numa antevisão do que será a sociedade humanizada<br />
de amanhã.<br />
O que ora se observa no mundo, nos mostra patentemente,<br />
cada dia que passa, que a neotécnica firma suas<br />
bases ideais ao lado das bases reais. Por outro lado, o<br />
O PROBLEMA SOCIAL 163<br />
surgimento da biotécnica, que completa perfeitamente o<br />
ciclo da neotécnica, eleva-se de forma empolgante, avassalando<br />
amplos sectores.<br />
To<strong>dos</strong> os homens responsáveis se preocupam hoje<br />
em dar ao trabalho aquela alegria sempre reclamada,<br />
aquele prazer do artesão amante de seu mister, aquela<br />
eugenia anelada desde os gregos, aquela humanidade pregada<br />
pelo cristianismo, que é, sem dúvida, a viga mestra<br />
do que há de melhor em nossas almas, aquela humanização,<br />
em suma, do trabalho e da vida, aquela harmonização<br />
<strong>dos</strong> esforços e <strong>dos</strong> movimentos para um equilíbrio dinâmico<br />
criador.<br />
Hoje, em to<strong>dos</strong> os sectores, homens se erguem nessa<br />
obra imensa de cooperação, unindo suas fraquezas para<br />
torná-las força, vencendo os obstáculos <strong>dos</strong> céticos e<br />
<strong>dos</strong> indiferentes, fustigando com energia a concupiscência<br />
do paleotécnico desenfreado, apelando para o povo para<br />
organizar-se em função administrativa, fundando cooperativas,<br />
sociedades de compras, sociedades de trabalho<br />
e capital, de producção e consumo, etc, todas as formas<br />
que a cooperação apresenta como as bases fundamentais<br />
da transformação da neotécnica na fase mais<br />
progressista, que é a biotécnica. Capitalistas bem intenciona<strong>dos</strong><br />
já compreenderam a marcha imprescriptível do<br />
progresso, e também oferecem seus esforços a esse amplo<br />
movimento. E conosco estão professores, operários,<br />
pequenos comerciantes, agricultores, sacerdotes, médicos,<br />
advoga<strong>dos</strong>, engenheiros, donas de casa, homens e mulheres<br />
de to<strong>dos</strong> os matizes. Compreendem to<strong>dos</strong> que o momento<br />
exige uma acção imediata. O desejo de paz que<br />
anima os homens só se pode concretizar através de uma<br />
obra <strong>social</strong> benéfica. Por necessidade histórica, e por um<br />
grande querer humano, o momento exige a libertação total<br />
<strong>dos</strong> fantasmas do dilema: capitalismo paleotécnico e<br />
bolchevismo.