Mário Ferreira dos Santos - O problema social - iPhi
Mário Ferreira dos Santos - O problema social - iPhi
Mário Ferreira dos Santos - O problema social - iPhi
Create successful ePaper yourself
Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.
150<br />
MÁRIO FERREIRA DOS SANTOS<br />
-se também. A tendência é sempre para a centralização,<br />
formando-se os grandes grupos capitalistas, que só têm<br />
uma finalidade: o lucro até o infinito (lucrum in infinitum).<br />
O ser humano é esquecido em sua dignidade, a<br />
pessoa humana é reduzida a número, e os choques sociais<br />
atingem o seu clímax. A luta de classes agrava-se naturalmente,<br />
e surgem, as ideias revolucionárias do <strong>social</strong>ismo<br />
autoritário e, entre essas, o marxismo, que é uma filosofia<br />
do proletariado da paleotécnica. É natural, nessa<br />
época, que uma visão real <strong>dos</strong> acontecimentos levasse a<br />
Marx a acreditar que os factos se processariam na ordem<br />
que surgiram, isto é: máxima concentração do capital,<br />
enriquecimento crescente de uns, e empobrecimento crescente<br />
de quase to<strong>dos</strong> os outros. O marxismo, como producto<br />
dessa época, estava preso aos factos de então. As<br />
revoluções havidas inverteram as polarizações de poder.<br />
O poder político passa para a burguesia, e o poder económico<br />
é partilhado entre ela e os remanescentes feudais,<br />
mas, com o domínio quase total do primeiro.<br />
Mas, eis que surgem novos factos, novas descobertas,<br />
que vão alargar as possibilidades, e preparar o advento<br />
de novas formas. Surge a neotécnica, graças à possibilidade<br />
da transmissão da força, que permite uma industrialização<br />
maior, a colocação de fábricas nas fontes de<br />
matéria prima, e o desenvolvimento de uma série de novas<br />
descobertas químicas, que abrem um ciclo ainda não<br />
encerrado. Nesta fase, o capitalismo financeiro passa a<br />
predominar sobre o capitalismo industrial e mercantil. O<br />
proletariado, que na paleotécnica era apenas um instrumento<br />
de trabalho, é olhado agora como consumidor. É<br />
preciso melhorar-lhe as condições culturais e económicas,<br />
para que se dê a evasão da producção. Só na paleotécnica<br />
havia possibilidade de conservarem-se as formas<br />
de colonialismo <strong>dos</strong> povos mais atrasa<strong>dos</strong>, como se verificou,<br />
mas, nesta, o desejo de independência actualiza-se<br />
«ra lutas terríveis. A América independente penetra no<br />
O PROBLEMA SOCIAL 151<br />
caminho da própria autonomia, e o aspecto do mundo toma<br />
nova côr. O poder político desloca-se. O Estado<br />
que na eotécnica, era um servidor <strong>dos</strong> interesses <strong>dos</strong><br />
dominadores, passa a autonomizar-se, e torna-se um poder,<br />
não para os outros, mas para si.<br />
E filiando-se ao capitalismo financeiro, que aos poucos<br />
a êle se subordina, é senhor da situação, intervindo<br />
como detentor do capital, na producção. Nesta fase, por<br />
influência do espírito de centralização da paleotécnica, o<br />
poder económico é partilhado entre o Estado, sempre<br />
crescente, e os capitalistas; mas o poder político é quase<br />
totalmente assenhoreado pelo Estado, que o centraliza.<br />
Enquanto a paleotécnica é a fase do desperdício, a<br />
eotécnica é a do melhor aproveitamento <strong>dos</strong> bens. Dessa<br />
forma há possibilidades de melhorias extraordinárias <strong>dos</strong><br />
salários, e o proletariado passa a ser cliente, e principal,<br />
da burguesia.<br />
As condições sociais se modificam, e de tal forma,<br />
que o marxismo, que nos países paleotécnicos encontra<br />
campo de acção, perde, constantemente, sua força nos<br />
países neotecniza<strong>dos</strong>. E a razão é simples: é que a crítica<br />
marxista, que, na paleotécnica, fundava-se sobre factos,<br />
na neotécnica funda-se apenas sobre ideias, pois o proletariado<br />
da neotécnica tende a desproletarizar-se, a alcançar<br />
a autonomia individual e a familiar, a conquistar o<br />
ócio e meios mais hábeis de divertimentos e de culturalização.<br />
Enquanto foi longo o período eotécnico, e mais<br />
curto o paleotécnico, menor ainda é e será o neotécnico.<br />
É que a biotécnica, que aplica a incorporação do inorgânico<br />
ao orgânico, permite o desenvolvimento crescente da<br />
humanização do trabalho.<br />
Na fase de predomínio neotécnico, há ainda a presença<br />
de formas eotécnicas e paleotécnicas. No entanto,<br />
são essas vencidas pelas da neotécnica, que penetra vi-