Mário Ferreira dos Santos - O problema social - iPhi
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120 MÁRIO FERREIRA DOS SANTOS<br />
tico, como pretendem fazê-lo os <strong>social</strong>istas, em geral mal<br />
adverti<strong>dos</strong>. Bastaria analisar-se a diferença entre o capitalismo<br />
da fase paleotécnica com o da neotécnica e o<br />
da biotécnica, que ora se inaugura, para, desde logo, perceberem-se<br />
as diferenças nítidas que apresentam entre si.<br />
Os <strong>social</strong>istas vêem o capitalismo de modo pejorativo, e<br />
consideram-no fundamentalmente injusto. Actualizando<br />
apenas os aspectos vituperáveis que êle apresenta, virtualizando<br />
os aspectos louváveis que também oferece, é<br />
fácil apresentá-lo como um sistema monstruoso, que deve<br />
ser estirpado totalmente do mundo.<br />
No exame da História, que empreendemos, verificamos<br />
que o regime capitalista, no ocidente, corresponde<br />
ao domínio económico e político do estamento <strong>dos</strong> empresários<br />
utilitários. A perda do kratos, por parte <strong>dos</strong><br />
teocratas e <strong>dos</strong> aristocratas, que sofreram profunda diminuição<br />
na sua influência, permitiu o domínio quase total<br />
<strong>dos</strong> empresários utilitários, que impregnaram o mundo<br />
moderno da sua esquemática, favorecendo a eclosão<br />
de muitas condições desagradáveis e incongruentes para<br />
as populações menos protegidas economicamente.<br />
Para que se faça um exame justo do capitalismo, é<br />
mister estabelecer alguns da<strong>dos</strong>, sem os quais qualquer<br />
análise padecerá de defeitos. Vejamos o seguinte:<br />
A) Não é o capitalismo essencialmente necessário<br />
para a existência da sociedade humana. Este postulado<br />
nos revela desde logo que é o capitalismo algo que acontece<br />
na sociedade, e aqui o tomamos no sentido de sistema<br />
económico, jurídico e político. Se o empresário<br />
utilitário é um tipo indefectível na sociedade, também a<br />
sua presença é necessária. Mas esta necessidade não implica<br />
a do sistema económico, que corresponde a este estamento<br />
como dominador do kratos económico e do político.<br />
Em todo ciclo cultural elevado, sempre houve capitalistas,<br />
mas nem sempre houve capitalismo.<br />
O PROBLEMA SOCIAL 121<br />
B) Examinando os fundamentos do capitalismo,<br />
não tomado como sistemas político e económico, mas<br />
apenas como uma estratificação subestamental do empresário<br />
utilitário, vemos que êle se funda na propriedade<br />
privada, e que a sua actividade é ordenada ao lucro.<br />
Este é um ponto de máxima importância, porque o capitalista<br />
é o empresário utilitário, que visualiza, na sua actividade,<br />
um fim principal: o lucro. Ora, nós vimos que<br />
muitos empresários utilitários, como se observa entre os<br />
agrários no período aristocrático, não visam, primacialmente,<br />
ao lucro, mas à producção de bens necessários<br />
para satisfação das necessidades económicas da sociedade.<br />
O lucro, que é um estímulo, sobretudo de ordem<br />
psicológica, pode, realmente, como tem feito, viciar a<br />
actuação do capitalismo, a ponto de muitos, tendo os<br />
olhos posta<strong>dos</strong> exclusivamente no lucro, esquecerem as<br />
suas obrigações sociais e o respeito aos princípios éticos,<br />
ofendendo a justiça, que deve reinar entre os homens.<br />
É normal, psicologicamente considerando-se, que a exacerbação<br />
da concupiscência, da cupidez, leve a excessos<br />
vituperáveis. Não é, pois, de espantar que muitos esporea<strong>dos</strong><br />
pela cupidez do lucro esquecessem os direitos<br />
alheios e sem trepidação tomassem o rumo de obtê-lo em<br />
proporções ilimitadas. Estes factos, pela sua ocorrência<br />
continuada e numerosa, provocou uma série de ressentimentos<br />
e de descrença nas possibilidades deste sistema,<br />
fazendo erguerem-se vozes, que acusavam o capitalismo<br />
em geral <strong>dos</strong> vícios inerentes àqueles que usavam, e sobretudo<br />
abusavam, das possibilidades de ganho, que o regime<br />
lhes permitia.<br />
Outro elemento importante do capitalismo é a distinção<br />
funcional entre o prestador de serviço, que é remunerado<br />
apenas por um salário, e o prestador do capital,<br />
que é remunerado por um dividendo.<br />
Em princípio, um salário é justo, porque todo aquele<br />
que trabalha deve receber o seu salário, o que é uma má-