Mário Ferreira dos Santos - O problema social - iPhi
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70 MÁRIO FERREIRA DOS SANTOS<br />
visão proudhoniana, e aceitava a interactuação do objectivo<br />
e do subjectivo na formação do conhecimento. Mas<br />
o calor da sua paixão objectivadora, levou-o a esquecer<br />
estas teses e até o quadro da estructura (da infraestructura<br />
e da superestructura) foi finalmente modificado, permanecendo<br />
a infraestructura como meramente objectiva,<br />
e a subjectividade colocada exclusivamente na superestructura.<br />
Esta passou a ser apenas um epifenômeno daquela,<br />
assim como a trepidação de um motor é apenas<br />
um epifenômeno do seu funcionamento.<br />
Dessa maneira, o marxismo caiu no abismo nominalista,<br />
e consequentemente, teria que gestar to<strong>dos</strong> os erros<br />
que posteriormente vieram adicionar-se a este. (Um pequeno<br />
erro, no início, gesta grandes erros posteriores,<br />
diziam os escolásticos).<br />
Por isso, na Economia, o valor de uso, que é subjectivo,<br />
é reduzido ao valor de troca. Marx não vê mais o<br />
antinômico que se dá entre ambos, como vimos na análise<br />
da teoria do valor. Só se produz o que é útil; consequentemente,<br />
conclui que a utilidade já está contida no<br />
valor de troca, o que o leva a construir uma teoria<br />
abstracta do valor.<br />
O excesso do objectivismo marxista impele a falsificar<br />
o próprio conhecimento, no receio de cair nas teses<br />
idealistas. No entanto, como já vimos, em nossos trabalhos<br />
anteriores, o idealismo tinha sua positividade, tamtoém,<br />
ao afirmar que o mundo objectivo é modelado pelo<br />
sujeito.<br />
O mundo exterior, que não deve ser confundido com<br />
o objectivo, existe independentemente de nós. Mas o conhecimento,<br />
que dele temos, depende do sujeito. (Cognitío<br />
enim secundum quod cognitum est in cognoscente).<br />
O conhecimento se verifica do modo como o conhecido<br />
está no que o conhece, afirma São Tomás. E prossegue:<br />
O PROBLEMA SOCIAL 71<br />
O conhecido está no que o conhece, segundo seja seu<br />
modo natural de ser (o cão conhece caninamente, o homem<br />
humanamente., isto é, racionalmente também), pelo<br />
qual o conhecimento se adapta ao modo natural de ser<br />
do cognoscente. "Portanto, se o modo de ser de um<br />
objecto de conhecimento é de ordem superior ao modo<br />
natural de ser do que conhece, seu conhecimento está necessariamente<br />
acima da natureza de tal cognoscente"<br />
(Summa Theologica I, 12 a 4).<br />
Vemos aqui colocado, dialècticamente, o factor emergente<br />
do conhecimento ao lado do predisponente. O sujeito<br />
conhece segundo pode conhecer. Nossos esquemas<br />
permitem conheçamos segundo nossa assimilatio (assimilação)<br />
a eles. A criança conhece na proporção de seus<br />
esquemas. Mais esquemas, mais conhecimento. A tese<br />
idealista, aqui, é positiva. O conhecimento está condicionado<br />
ao cognoscente. Mas o cognoscente adquire esquemas<br />
pela experiência, que o torna apto a conhecer mais.<br />
Esta é a tese empirista.<br />
São Tomás é dialéctico, assim, quanto ao conhecimento.<br />
Marx só vê a acção da experiência, e esquece que<br />
sem a emergência não haveria conhecimento, sem o que<br />
é capaz de conhecer, e que realiza o acto de conhecer.<br />
O sujeito é constituído de modo a conhecer. E conhece,<br />
segundo o seu modo natural de ser. Dessa forma, a posição<br />
empirista e a racionalista apriorista são sintetizadas<br />
num empirismo racionalista, que é o de São Tomás.<br />
Marx, acentuando o aspecto objectivo, virtualiza a<br />
acção subjectiva. É verdade que êle termina por aceitar<br />
uma positividade também idealista, ao reconhecer o papel<br />
que a ideologia exerce no conhecimento, o papel que<br />
a subjectividade posteriormente impõe, como na cosmovisão<br />
das classes, etc, que êle, na verdade, compreendeu<br />
e tangeu em parte, o que já estava bem delineado, expli-