ENTRE CHEGADAS E PARTIDAS: DINÂMICAS DAS ROMARIAS ...

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CORDEIRO, Maria Paula J. Entre chegadas e partidas: dinâmicas das romarias em Juazeiro do Norte 98 CAPÍTULO III– O PADRE CÍCERO, AS ROMARIAS, E A CIDADE Em todos os anos, setembro, novembro, vou ao Juazeiro Alegre e contente, cantando na frente, sou mais um romeiro Vou ver meu padim, de bucho cheio ou barriga vazia Ele é o meu pai, ele é o meu santo, é minha alegria. Luiz Gonzaga Este capítulo desenvolve-se no sentido de demonstrar como as relações entre o lugar, as romarias e as pessoas que ali circulam constituem-se elementos indissociáveis na compreensão do fenômeno das romarias e dos rumos que a cidade tomou desde sua fundação. A intenção é apresentar através do percurso social de Juazeiro do Norte, os acontecimentos geradores das representações veiculadas pelos romeiros. Um mundo em construção Seguindo moldes de povoamento colonial português e senhorial em contextos rurais, Juazeiro do Norte surgiu em torno de uma capela dedicada a Nossa Senhora das Dores, cuja pedra fundamental teria sido lançada em solenidade no dia 15 de setembro de 1827. Havia ali um sítio denominado Tabuleiro Grande de propriedade do Padre Pedro Ribeiro da Silva, onde funcionava um engenho de cana. Tratava-se a princípio de um ponto de paragem, onde à sombra de três frondosos juazeiros, viajantes e tropeiros realizavam negócios relacionados à troca de animais e produtos agrícolas produzidos na região, muitas vezes sob a forma de escambo. Era também um ponto de descanso para quem se dirigia ao município de Crato. Aponta Della Cava (1976) que em 1875 o lugarejo ainda conservava traços de uma fazenda de cana de açúcar, com população em torno de dois mil habitantes e cinco famílias importantes de fazendeiros estabelecidas juntamente com os trabalhadores

CORDEIRO, Maria Paula J. Entre chegadas e partidas: dinâmicas das romarias em Juazeiro do Norte 99 de suas fazendas de açúcar. Comercialmente a economia de mercado local era estagnada, funcionando a base de troca. Figura 1: Localização de Juazeiro do Norte na Região Nordeste 72 . Localizado ao sul do estado do Ceará, a 528 km de Fortaleza, o município de Juazeiro do Norte é geograficamente eqüidistante de todas as capitais nordestinas o equivalente a uma noite de viagem 73 terrestre (entre 8 e 12 horas). Situado no “centro geográfico” da região, é considerado por muitos romeiros como o coração do Nordeste. Mais especificamente, a cidade situa-se na microrregião do Cariri 74 cearense, cuja colonização se deu no início do século XVIII, com registros e 72 Fonte: Figura maior - Folheto turístico promocional “Padre Cícero, O Cearense do Século”. [Fortaleza]: Governo municipal / SETUR-CE / R. Furlani, [2001]. Figura menor – Mapa do Brasil, disponível em http://www.brasil-fotos.com/mapa-brasil.htm Acesso em: dez 2009. 73 A localização estratégica da cidade é um dos pontos enfatizados no discurso turístico. Ver Figura 1. 74 O nome vem dos índios Kariri ou Kiriri (resultantes do melting-pot de tupis e jês que ocupavam a grande parte do semi-árido nordestino no período da colonização). Cariri também está relacionado a principal família de línguas indígenas do sertão do Nordeste. Para Gonçalves (2006) além da compreensão geográfica e territorial do que seja Cariri, o termo remete também a situações históricas que definem uma pluralidade de “Cariris”. De fato, além do Cariri dos Índios, há o Cariri dos coronéis, o Cariri dos dinossauros e o Cariri da questão religiosa que envolveu o Padre Cícero. Atualmente a microrregião do Cariri é formada por oito municípios: Barbalha, Crato, Farias Brito, Jardim, Juazeiro

CORDEIRO, Maria Paula J. Entre chegadas e partidas: dinâmicas das romarias em Juazeiro do Norte 98<br />

CAPÍTULO III– O PADRE CÍCERO, AS <strong>ROMARIAS</strong>, E A CIDADE<br />

Em todos os anos, setembro, novembro, vou ao Juazeiro<br />

Alegre e contente, cantando na frente, sou mais um romeiro<br />

Vou ver meu padim, de bucho cheio ou barriga vazia<br />

Ele é o meu pai, ele é o meu santo, é minha alegria.<br />

Luiz Gonzaga<br />

Este capítulo desenvolve-se no sentido de demonstrar como as relações<br />

entre o lugar, as romarias e as pessoas que ali circulam constituem-se elementos<br />

indissociáveis na compreensão do fenômeno das romarias e dos rumos que a<br />

cidade tomou desde sua fundação. A intenção é apresentar através do percurso<br />

social de Juazeiro do Norte, os acontecimentos geradores das representações<br />

veiculadas pelos romeiros.<br />

Um mundo em construção<br />

Seguindo moldes de povoamento colonial português e senhorial em<br />

contextos rurais, Juazeiro do Norte surgiu em torno de uma capela dedicada a<br />

Nossa Senhora das Dores, cuja pedra fundamental teria sido lançada em solenidade<br />

no dia 15 de setembro de 1827. Havia ali um sítio denominado Tabuleiro Grande de<br />

propriedade do Padre Pedro Ribeiro da Silva, onde funcionava um engenho de cana.<br />

Tratava-se a princípio de um ponto de paragem, onde à sombra de três frondosos<br />

juazeiros, viajantes e tropeiros realizavam negócios relacionados à troca de animais<br />

e produtos agrícolas produzidos na região, muitas vezes sob a forma de escambo.<br />

Era também um ponto de descanso para quem se dirigia ao município de Crato.<br />

Aponta Della Cava (1976) que em 1875 o lugarejo ainda conservava traços de uma<br />

fazenda de cana de açúcar, com população em torno de dois mil habitantes e cinco<br />

famílias importantes de fazendeiros estabelecidas juntamente com os trabalhadores

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