ENTRE CHEGADAS E PARTIDAS: DINÂMICAS DAS ROMARIAS ...
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CORDEIRO, Maria Paula J. Entre chegadas e partidas: dinâmicas das romarias em Juazeiro do Norte 82<br />
Esses deslocamentos carregam em si um sentido de busca, na medida em<br />
que se constituem ritos de passagem do comum para o ideal, do cotidiano para o<br />
excepcional. Embora se revistam de um caráter individual – já que cada um refere-<br />
se a motivações de foro íntimo - não se trata de trajetória percorrida por cada um,<br />
mas do universo simbólico criado por todos e reflexo de processos sociais mais<br />
abrangentes, na medida em que determinam condutas e práticas sociais referentes<br />
a papéis e identificações reconstruídas por meio da participação do indivíduo no<br />
cenário social (BERGER, 1986).<br />
Ao mesmo tempo, a emergência de sociedades complexas propõe uma<br />
ruptura com a análise dicotômica de fenômenos como romarias em termos de<br />
sagrado e profano, compreendendo que “as ações acontecem numa escala<br />
contínua, entre os extremos temos a grande maioria das ações” (LEACH, 1996).<br />
Pensar em práticas diversificadas ocorrendo na peregrinação, que não são<br />
legíveis num modelo universal (turneriano), favorece a percepção de que há várias<br />
peregrinações ocorrendo dentro da peregrinação. Nesse contexto, as experiências<br />
de grupo tomam relevo, em detrimento da experiência de comunidade, entendendo-<br />
se experiência de grupo como aquelas que favorecem maior interação e intimidade,<br />
enquanto as experiências de comunidade seriam mais abrangentes e identitárias.<br />
De outro ponto de vista, as ligações entre a dimensão devocional do ser<br />
humano e a disponibilidade de tempo para o lazer se revestem de grande<br />
complexidade com o surgimento de práticas que associam de forma mais acentuada<br />
que no passado situações de férias, diversão ou lazer a deslocamentos religiosos.<br />
Isso favorece possibilidades de análise à luz das transformações na vivência do<br />
sagrado, ao passo que deambulações religiosas ligam-se também a um contexto de<br />
conquistas de direitos relacionadas ao tempo livre do trabalho no mundo ocidental.<br />
A vivência de tempo livre já não se constitui um privilégio de uma classe<br />
trabalhadora urbana; lazer e férias tornaram-se demandas características do<br />
cidadão contemporâneo, que os associa diretamente à saúde e ao bem-estar. Essa<br />
concepção de certa forma naturaliza modalidades de consumo de tempo fora do