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ENTRE CHEGADAS E PARTIDAS: DINÂMICAS DAS ROMARIAS ...

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CORDEIRO, Maria Paula J. Entre chegadas e partidas: dinâmicas das romarias em Juazeiro do Norte 53<br />

me sinto “embaixo da pele do outro” 28 , embora esta tenha sido uma condição a que<br />

recorri na busca de elementos como palavras, rituais e comportamentos acerca dos<br />

quais as lógicas das relações entre os envolvidos nas romarias são estabelecidas<br />

naturalmente. Perceber o outro, contudo, não é ser, nem é sentir como o outro, daí<br />

noto perfeitamente o lugar descrito por Geertz (1998, p. 89): “Em país de cegos,<br />

que, por sinal, são mais observadores que parecem, quem tem um olho não é rei, é<br />

um expectador”.<br />

Em segundo lugar, não perco de vista que qualquer condição que me coloque<br />

é um lugar de acesso que define e classifica lugares de fala limitantes, capaz de<br />

impor um muro invisível em relação ao resto, definindo e restringindo o que as<br />

coisas são. O muro inventado desconsidera conexões que não se rompem em sua<br />

construção. Essas relações é que irão tensionar os sistemas de nomeação e<br />

classificação criados pelo muro, ao retornarem escavando seus alicerces. Refletir<br />

sobre essas conexões permite perceber o que movimenta as tensões quando<br />

agentes interessados tentam fazer prioritário algum tipo de classificação dentre as<br />

muitas possibilidades de arranjo nas relações estabelecidas sob a romaria. Nesse<br />

sentido, o exercício de refletir sobre o envolvimento é também uma disposição para<br />

lidar com visões parciais que se atingem na interpretação.<br />

O grande exercício é, pois, de localização do olhar e de tensioná-lo ao limite<br />

na relação entre traços culturais particulares e teorizações válidas, sem perder de<br />

vista que não há pontos de vista definitivos e totais. Por mais que trabalhos como o<br />

de Malinowski tenham sinalizado a possibilidade de acesso abrangente a aspectos e<br />

pontos de vista da cultura nativa, em campos complexos, em permanente<br />

movimento e efervescentes interações como o das romarias, ter em conta todos os<br />

pontos de vista é praticamente impossível.<br />

Estar lá, contudo, junto a romeiros e demais agentes, acompanhar a romaria,<br />

nada disso aconteceu para mim com uma experiência de cartão postal do tipo “Fui a<br />

Juazeiro, vi a romaria... você conhece?”. Não foi uma viagem de trabalho, uma<br />

28 Termo usado por Geertz (1997) referindo-se ao contexto de experiência próxima.

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