ENTRE CHEGADAS E PARTIDAS: DINÂMICAS DAS ROMARIAS ...

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CORDEIRO, Maria Paula J. Entre chegadas e partidas: dinâmicas das romarias em Juazeiro do Norte 24 Balneário do Caldas 13 que chega a receber 15 mil pessoas por dia em períodos de romarias. Isso pode repercutir em falseamento da estimativa, por duplicidade de registro de entrada em Juazeiro do Norte. O tempo das romarias corresponde a curto período de fluxo de visitantes de grande impacto na estrutura de funcionamento da cidade, intercalado por longos períodos de fluxo menor, mas constante, nos períodos intermediários às grandes romarias. Mais que isso, representa também um interstício na forma cotidiana das relações entre todos os envolvidos, semelhante ao que acontece na noção de tempo da política (PALMEIRA; HEREDIA, 1985). Embora os ritmos sejam alterados e os usos do espaço também, o interesse analítico neste estudo reside de forma mais pontual na visibilidade das dimensões de devoção, de diversão, e nas formas como os envolvidos nas romarias constroem e classificam suas diferenças. Na época de extraordinário número de visitantes, que numa noção econômica é caracterizado como “alta estação”, há uma concentração de festejos datados com certa proximidade uns dos outros e que, de fato, encerram um período contínuo e denso de presença de romeiros. Essa “alta estação” das romarias localiza-se entre os meses novembro a fevereiro, quando as celebrações de Finados são seguidas pelas festividades natalinas, com seu ápice nas tradições folclóricas da Festa de Reis em janeiro, encerrando no início de fevereiro com a festa de Nossa Senhora das Candeias. No tempo das romarias, a feira que se forma no entorno da Basílica de Nossa Senhora das Dores (Matriz) ocupa uma área mais extensa de barracas, que oferecem refeição e funcionam também como bares noturnos, assume um caráter semipermanente, acontecendo ininterruptamente por cerca de quatro meses. Através da multiplicidade de agências em torno das romarias que ali ocorrem, Juazeiro do Norte exemplifica e espelha a complexidade de grandes centros de romarias no Brasil, referente às interações promovidas pelos fluxos de romeiros. Diante de um cenário que se expande em ritmo acelerado e atrai interesses diversos para além da dimensão religiosa e que implica em arranjos envolvendo interesses 13 Localizado na Chapada do Araripe, município de Barbalha, o Caldas é um clube popular com piscinas, fontes naturais, ampla área verde e clima serrano.

CORDEIRO, Maria Paula J. Entre chegadas e partidas: dinâmicas das romarias em Juazeiro do Norte 25 econômicos e políticos, pensar nos significados veiculados a partir da influência de diversos agentes nunca será uma tarefa simples. As romarias em Juazeiro mobilizam apropriações distintas pelos participantes, pela Igreja e pelo Estado. Cada um desses agentes articula de forma própria aspectos simbólicos e sociais que têm por função ordenar o fenômeno e constituí-lo enquanto veículo que suporta valores e símbolos estruturantes de modos de ser e viver no mundo, naquela sociedade. O processo migratório, responsável pela constituição de Juazeiro do Norte como uma das maiores cidades do interior do Nordeste, também tem o seu lugar na construção de significados paras as romarias. A partir das diversas mobilizações e codificações acionadas pelos agentes ou mediadores na construção de significados do fenômeno, as romarias ao mesmo tempo em que atualizam aspectos importantes da cultura, sofrem ressignificações em suas práticas ao imbricarem-se com a noção de peregrinação, trazida pela Igreja, e com a noção de turismo, trazida pelo poder público e agentes interessados em fazer esse vínculo econômico. Na trama produzida pela agência de diversos mediadores, concomitantes sentidos de identidade são acionados, ora fortalecendo noções de comunidade e pertencimento, ora propiciando desvinculações, dispersões e, como conseqüência, o fortalecimento de sentimentos de individualização e isolamento. A concorrência desses aspectos ambivalentes é propiciada pela ação dos discursos classificatórios, veiculados pelos agentes relacionados a esse tipo de deslocamento e responsáveis pelo estabelecimento de um equilíbrio móvel de tensões. Enquanto prática vivenciada pelos participantes, as romarias ao longo do tempo agregam elementos que contemplam experiências de devoção, diversão e consumo, com o dimensionamento de cada um desses aspectos negociado internamente entre os participantes, mantendo, contudo, seu sentido geral relacionado à devoção como aquilo que direciona as práticas de romaria. Agentes interessados em um dos seus aspectos de forma isolada – diversão, devoção ou consumo - têm lançado mão de estratégias de apropriação da

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econômicos e políticos, pensar nos significados veiculados a partir da influência de<br />

diversos agentes nunca será uma tarefa simples.<br />

As romarias em Juazeiro mobilizam apropriações distintas pelos participantes,<br />

pela Igreja e pelo Estado. Cada um desses agentes articula de forma própria<br />

aspectos simbólicos e sociais que têm por função ordenar o fenômeno e constituí-lo<br />

enquanto veículo que suporta valores e símbolos estruturantes de modos de ser e<br />

viver no mundo, naquela sociedade. O processo migratório, responsável pela<br />

constituição de Juazeiro do Norte como uma das maiores cidades do interior do<br />

Nordeste, também tem o seu lugar na construção de significados paras as romarias.<br />

A partir das diversas mobilizações e codificações acionadas pelos agentes<br />

ou mediadores na construção de significados do fenômeno, as romarias ao mesmo<br />

tempo em que atualizam aspectos importantes da cultura, sofrem ressignificações<br />

em suas práticas ao imbricarem-se com a noção de peregrinação, trazida pela<br />

Igreja, e com a noção de turismo, trazida pelo poder público e agentes interessados<br />

em fazer esse vínculo econômico. Na trama produzida pela agência de diversos<br />

mediadores, concomitantes sentidos de identidade são acionados, ora fortalecendo<br />

noções de comunidade e pertencimento, ora propiciando desvinculações, dispersões<br />

e, como conseqüência, o fortalecimento de sentimentos de individualização e<br />

isolamento. A concorrência desses aspectos ambivalentes é propiciada pela ação<br />

dos discursos classificatórios, veiculados pelos agentes relacionados a esse tipo de<br />

deslocamento e responsáveis pelo estabelecimento de um equilíbrio móvel de<br />

tensões.<br />

Enquanto prática vivenciada pelos participantes, as romarias ao longo do<br />

tempo agregam elementos que contemplam experiências de devoção, diversão e<br />

consumo, com o dimensionamento de cada um desses aspectos negociado<br />

internamente entre os participantes, mantendo, contudo, seu sentido geral<br />

relacionado à devoção como aquilo que direciona as práticas de romaria.<br />

Agentes interessados em um dos seus aspectos de forma isolada –<br />

diversão, devoção ou consumo - têm lançado mão de estratégias de apropriação da

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