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ENTRE CHEGADAS E PARTIDAS: DINÂMICAS DAS ROMARIAS ...

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CORDEIRO, Maria Paula J. Entre chegadas e partidas: dinâmicas das romarias em Juazeiro do Norte 109<br />

condições de vida e de trabalho. Muitos desses indivíduos vinham originalmente em<br />

romaria. Para os romeiros de outrora que fixaram residência no município, é amplo o<br />

repertório de acontecimentos fantásticos, da ordem do milagroso e do sobrenatural<br />

que reconstituem os caminhos que os trouxeram para Joaseiro.<br />

Ramos (2000) aponta que as histórias são construídas de maneira própria<br />

por cada devoto e, embora possuam traços comuns, há muitas versões para um<br />

mesmo acontecimento; entre folhetos de cordel, benditos e relatos orais, a vitalidade<br />

das narrativas mantém-se no processo de seleção e reelaboração que criativamente<br />

diluem fronteiras e inventam o sagrado. Além disso, cada um tem a sua própria<br />

história para contar e histórias que narram sua ligação com a cidade e o Padre<br />

Cícero, como na fala do filho de migrantes abaixo:<br />

[...] Pai só falava mal do Padre Cícero. Já tinha chamado ele até de<br />

macaco. Mas vivia sendo perseguido nas Alagoas. O irmão dele foi morto<br />

quando disputava para vereador numa eleição. As terras dele foram<br />

tomadas por um coronel. Pai era dono de umas terras muito boas e também<br />

ia morrer se tivesse ficado lá. Então veio pro Juazeiro porque diziam que<br />

aqui era muito bom e mais fácil pra viver. Quando chegou foi ver o Padre<br />

Cícero. Todo mundo que chegava ia falar com Padre Cícero para ser<br />

encaminhado. Naquela época os romeiros traziam loucos para o Padre<br />

Cícero curar, expulsar a loucura pra fora. Quando pai chegou tinha uma<br />

roda de gente em torno do Padre Cícero que olhava pr’uma louca que os<br />

romeiros tinham trazido. Então ele [o padre] olhando pra louca começou a<br />

dizer se ela lembrava das palavras maldosas que ela tinha dito sobre ele. A<br />

família da louca dizia: “Não meu Padim, ela nunca disse essas coisas”. E<br />

ele tornava a repetir as coisas e ia dizendo tintim por tintim o que pai dizia<br />

dele olhando pra louca. Pai disse que suava e se arrupiava ouvindo aquilo.<br />

Padre Cícero tinha um mistério com ele, entendia dos mistérios. [...] Aí pai<br />

ficou com remorso e pediu perdão ao Padre Cícero e uma orientação pra<br />

sua vida. Padre Cícero disse que ele viesse morar no Juazeiro, que aqui ele<br />

criava a família em paz. (JOSÉ INÁCIO – 84, 2005)<br />

Os que no município foram se estabelecendo – a maioria trabalhadores<br />

rurais sem terra e romeiros - constituem as fronteiras internas de sua identificação<br />

como morador sob o domínio do líder aglutinador, que os mantinha sob sua<br />

autoridade moral e usando um preceito que delineia o fio condutor para toda ação<br />

social local: “em cada casa uma oficina, em cada oficina um altar”. Possivelmente,<br />

foi a institucionalização dos preceitos oração e trabalho, como marcas “identitárias”

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