Laranja-da-China - Unama
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Nharinha perdeu logo a vontade de chorar. Em dois tempos as malas de<br />
papel-couro e o baú cor-de-rosa com passarinhos voando de raminho no bico<br />
ficaram prontos.<br />
A família desceu. Silvana pagou a conta. A família já estava na porta <strong>da</strong> rua<br />
quando Seu Dagoberto largou o baú no chão e deu de procurar qualquer cousa<br />
apalpando-se todo. A família escancarou os olhos para ele interrogativamente. Seu<br />
Dagoberto ca<strong>da</strong> vez mais aflito acelerava as apalpadelas. De repente abriu a boca e<br />
disparou pela esca<strong>da</strong> acima. Voltou todo pimpão com um bolo de recortes de jornal<br />
e bilhetes de loteria na mão. Silvana compreendeu. Ficou verde de raiva. Ia se <strong>da</strong>r<br />
qualquer desgraça. Porém ficou quieta. Fungou só um instantinho. Depois intimou:<br />
— Vamos!<br />
Aí o proprietário do hotel perguntou limpando as unhas para onde seguia a<br />
família. Aí Silvana não se conteve desviou o nariz <strong>da</strong> mão do Juju e respondeu bem<br />
alto para to<strong>da</strong> a gente ouvir:<br />
— Pro inferno, Seu Roque!<br />
Aí Seu Roque fez que sim com a cabeça.<br />
O AVENTUREIRO ULISSES<br />
(Ulisses Serapião Rodrigues)<br />
Ain<strong>da</strong> tinha duzentos réis. E como eram sua única fortuna meteu a mão no<br />
bolso e segurou a moe<strong>da</strong>. Ficou com ela na mão fecha<strong>da</strong>.<br />
Nesse instante estava na Aveni<strong>da</strong> Celso Garcia. E sentia no peito todo o frio<br />
<strong>da</strong> manhã.<br />
Duzentão. Quer dizer: dois sorvetes de casquinha. Pouco.<br />
Ah! Muito sofre quem padece. Muito sofre quem padece? É uma canção de<br />
Sorocaba. Não. Não é. Então que é? Mui-to so-fre quem pa-de-ce. Alguém diz ia isto<br />
sempre. Etelvina? Seu Cosme? Com certeza Etelvina que vivia amando to<strong>da</strong> a<br />
gente. Até ele. Sujeitinha impossível. Só vendo o jeito de olhar dela.<br />
Bobagens. O melhor é ir an<strong>da</strong>ndo.<br />
Foi.<br />
Pé no chão é bom só na roça. Na ci<strong>da</strong>de é uma porcaria. To<strong>da</strong> a gente<br />
estranha. É ver<strong>da</strong>de. Agora é que ele reparava direito: ninguém an<strong>da</strong>va descalço.<br />
Sentiu um mal-estar horrível. As mãos a gente ain<strong>da</strong> escondia nos bolsos. Mas os<br />
pés? Cousa horrorosa. Desafogou a cintura. Puxou as calças para baixo. Encolheu<br />
os artelhos. Deu dez passos assim. Pipocas. Não <strong>da</strong>va jeito mesmo. Pipocas. A<br />
gente <strong>da</strong> ci<strong>da</strong>de que vá bugiar no inferno. Ajustou a cintura. Levantou as calças<br />
acima dos tornozelos. Acintosamente. E muito vermelho foi jogando os pés na<br />
calça<strong>da</strong>. An<strong>da</strong>ndo duro como se estivesse calçado.<br />
— Estado! Comércio! A Folha! Sem querer procurou o vendedor. Olhou de<br />
um lado. Olhou de outro.<br />
— Fanfulla! A Folha!<br />
Virou-se.<br />
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