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Quando ela era ele e se apaixonou por - Fonoteca Municipal de ...

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Sexta-feira<br />

26 Junho 2009<br />

www.ipsilon.pt<br />

As viagens <strong>de</strong> Jan Morris<br />

<strong>Quando</strong> <strong>ela</strong> <strong>era</strong> <strong>ele</strong> e <strong>se</strong> <strong>apaixonou</strong> <strong>por</strong> Veneza<br />

Javier MoroRodrigo LeãoVirgem SutaSmix Smox Smux St Vincent<br />

PAUL YEUNG / REUTERS ESTE SUPLEMENTO FAZ PARTE INTEGRANTE DA EDIÇÃO Nº 7024 DO PÚBLICO, E NÃO PODE SER VENDIDO SEPARADAMENTE


Flash<br />

Sumário<br />

Jan Morris 6<br />

Hoje é uma mulher, foi<br />

como homem que escreveu<br />

“Veneza”<br />

Sonia Gandhi 12<br />

Javier Moro escreve a<br />

história da italiana que<br />

recebeu a Índia como<br />

h<strong>era</strong>nça<br />

Rodrigo Leão 16<br />

Ao encontro do difícil<br />

equilíbrio<br />

Virgem Suta 18<br />

Pop(ular) <strong>de</strong> Beja<br />

Smix Smox Smux 20<br />

O humor ainda é uma arma<br />

rock<br />

St Vincent 22<br />

“Actor” é um disco<br />

monumental <strong>de</strong><br />

orquestrações alucinadas<br />

Ficha Técnica<br />

Director José Manuel Fernan<strong>de</strong>s<br />

Editores Vasco Câmara,<br />

Joana Gorjão Henriques (adjunta)<br />

Con<strong>se</strong>lho editorial Isabel Coutinho,<br />

Inês Nadais, Óscar Faria, Cristina<br />

Fernan<strong>de</strong>s, Vítor B<strong>ela</strong>nciano<br />

Design Mark Porter,<br />

Simon Esterson, Kuchar Swara<br />

Directora <strong>de</strong> arte Sónia Matos<br />

Designers Ana Carvalho,<br />

Carla Noronha, Mariana Soares<br />

E-mail: ipsilon@publico.pt<br />

Beck vai regravar<br />

os clássicos (e está a<br />

chamar os amigos)<br />

A coisa funciona assim: um dia <strong>por</strong><br />

<strong>se</strong>mana, <strong>ele</strong> chama os amigos,<br />

passam todos umas horas a brincar<br />

aos clássicos e no fim gravam um<br />

disco (isto soa-nos familiar). Já está<br />

a acontecer, no clube que Beck<br />

inventou para ocupar os tempos<br />

livres, o Record Club. Por palavras<br />

d<strong>ele</strong>: o Record Club é “um encontro<br />

informal <strong>de</strong> várias pessoas para<br />

gravar um álbum num dia”, a partir<br />

<strong>de</strong> um clássico que <strong>se</strong>rá<br />

“reinterpretado e usado como<br />

quadro <strong>de</strong> referência”. Não há<br />

ensaios, não há arranjos gravados<br />

com antecedência.<br />

No fim, quem lucra somos nós:<br />

todas as faixas do álbum vão <strong>se</strong>r<br />

disponibilizadas gratuitamente<br />

(mas não todas <strong>de</strong> uma vez: só há<br />

um brin<strong>de</strong> <strong>por</strong> <strong>se</strong>mana) no “site”<br />

do artista (www.beck.com) e dos<br />

amigos que brincarem com <strong>ele</strong>. Não<br />

é oficial, mas o “Guardian” diz que<br />

tanto os MGMT como Devendra<br />

Banhart e Jamie Li<strong>de</strong>ll já diss<strong>era</strong>m<br />

que sim, estão nessa. Não é assim<br />

tão surpreen<strong>de</strong>nte, tendo em conta<br />

que já têm antece<strong>de</strong>ntes: os MGMT,<br />

<strong>por</strong> exemplo, partilharam o palco<br />

com Beck no ano passado, em<br />

Chicago, para um concerto <strong>de</strong><br />

“covers” que inclui versões para<br />

coleccionador <strong>de</strong> músicas dos<br />

Beatles e <strong>de</strong> Jimi Hendrix.<br />

O primeiro clássico que Beck levou<br />

para o Record Club é mesmo um<br />

clássico: “The Velvet Un<strong>de</strong>rground<br />

& Nico” (1967), o álbum da banana<br />

(<strong>ele</strong> tinha em mente outro disco,<br />

“Sex Packets”, dos Digital<br />

Un<strong>de</strong>rground, mas os amigos<br />

d<strong>era</strong>m-lhe a volta). A versão que <strong>ele</strong><br />

e os convidados - Nigel Godrich,<br />

Joey Waronker, Brian Lebarton,<br />

Bram Inscore, Yo, Giovanni Ribisi,<br />

Chris Holmes e ainda a islan<strong>de</strong>sa<br />

Thorunn Magnusdottir - fiz<strong>era</strong>m já<br />

está a <strong>se</strong>r <strong>de</strong>scarregada. Primeiro<br />

brin<strong>de</strong>: “Sunday morning”, com<br />

ví<strong>de</strong>o e tudo, a preto e branco. Para<br />

a <strong>se</strong>mana há mais.<br />

Verone<strong>se</strong> revisitado<br />

<strong>por</strong> Peter Greenaway<br />

Uma extravagância digital <strong>de</strong> 50<br />

minutos concebida <strong>por</strong> Peter<br />

Greenaway a partir da t<strong>ela</strong> “As<br />

Bodas <strong>de</strong> Canaã”, <strong>de</strong> Paolo<br />

Verone<strong>se</strong>, está a dividir opiniões na<br />

53ª edição da Bienal <strong>de</strong> Veneza. Na<br />

pare<strong>de</strong> do refeitório do mosteiro<br />

beneditino da ilha veneziana <strong>de</strong> San<br />

Giorgio Maggiore, os visitantes<br />

po<strong>de</strong>m ver uma réplica digital da<br />

imensa t<strong>ela</strong> <strong>de</strong> Verone<strong>se</strong>,<br />

precisamente com as mesmas<br />

dimensões do original, que me<strong>de</strong><br />

qua<strong>se</strong> 67 metros quadrados, sobre<br />

a qual é projectado o filme <strong>de</strong><br />

Greenaway, que abarca<br />

Beck inventou o Record Club, “um<br />

encontro informal <strong>de</strong> várias pessoas<br />

para gravar um álbum num dia”<br />

Woody Allen volta a Nova<br />

Iorque (e aos <strong>se</strong>us ju<strong>de</strong>us-tipo)<br />

com a ajuda <strong>de</strong> Larry David<br />

Larry David garante que é<br />

um homem tão azedo<br />

quanto aquilo que mostra<br />

na série “Calma, Larry”. E<br />

também é frontal quanto às<br />

re<strong>se</strong>rvas que tinha em<br />

r<strong>ela</strong>ção a participar no<br />

novo filme <strong>de</strong> Woody Allen,<br />

que marca o regresso a<br />

Nova Iorque do<br />

argumentista/realizador.<br />

“Achei o argumento<br />

brilhante”, explica ao “Los<br />

Ang<strong>ele</strong>s Times” em<br />

vésp<strong>era</strong>s da estreia <strong>de</strong><br />

“Whatever Works” nos<br />

EUA. “Mas tinha as minhas<br />

dúvidas sobre <strong>se</strong> con<strong>se</strong>guia<br />

ou não fazê-lo. Porque não<br />

é o tipo <strong>de</strong> coisa que<br />

normalmente faço.<br />

G<strong>era</strong>lmente, faço <strong>de</strong> mim<br />

mesmo”, constata.<br />

Mas o protagonista <strong>de</strong><br />

“Whatever Works” parece<br />

<strong>se</strong>r uma sínte<strong>se</strong> <strong>de</strong> Allen e<br />

David: um cínico, um<br />

céptico, um auto-alienado.<br />

“Whatever Works” é a<br />

história <strong>de</strong> um cientista<br />

outrora candidato ao Nobel,<br />

Boris Yellnikoff, que<br />

vive alegremente<br />

só<br />

Internet<br />

em Nova Iorque após um<br />

divórcio e que <strong>de</strong>spreza<br />

qua<strong>se</strong> tudo e todos,<br />

convencido que só a sua<br />

mente iluminada conhece o<br />

<strong>se</strong>ntido da vida, da<br />

mecânica quântica e da<br />

im<strong>por</strong>tância <strong>de</strong> viver na sua<br />

bolha organizada,<br />

meticulosa e pouco<br />

sociável. Eis que entra em<br />

cena uma jovem,<br />

interpretada <strong>por</strong> Evan<br />

Rachel Wood, e tudo muda.<br />

A colaboração David/Allen é<br />

uma nova investida<br />

americana na Nova Iorque<br />

pelo periscópio do ju<strong>de</strong>u.<br />

Mas a cultura judaica<br />

americana mudou. Os<br />

ju<strong>de</strong>us agora dão cartas, são<br />

“insi<strong>de</strong>rs” e fazem a sua<br />

própria comédia. As<br />

personagens-tipo <strong>de</strong> Allen<br />

<strong>era</strong>m “outsi<strong>de</strong>rs”, frutos <strong>de</strong><br />

uma cultura focadíssima no<br />

pós-Holocausto, no <strong>se</strong>u<br />

iídiche e numa vida<br />

“kosher”. Agora há o Judd<br />

Apatow “boy” Seth Rogen,<br />

que está em qua<strong>se</strong> todos os<br />

filmes <strong>de</strong> comédia recentes,<br />

Ben Stiller<br />

ganhou há<br />

um par <strong>de</strong><br />

<strong>se</strong>manas o<br />

Estamos online. Entre em<br />

www.ipsilon.pt. É o mesmo<br />

suplemento, é outro <strong>de</strong>safi o.<br />

Venha construir este site<br />

connosco.<br />

Prémio G<strong>era</strong>ções da MTV e<br />

Sarah Silverman é a rainha<br />

da comédia viral “online”.<br />

O guião <strong>de</strong> “Whatever<br />

Works” tem 40 anos e hoje,<br />

com toda uma fornada <strong>de</strong><br />

comediantes <strong>de</strong> origem e<br />

“praxis” judaica na<br />

primeira linha do<br />

entretenimento ( Jon<br />

Stewart, Jerry Seinfeld,<br />

Larry David), o filme e as<br />

suas temáticas do ju<strong>de</strong>u<br />

neurótico arrisca-<strong>se</strong> a<br />

parecer... <strong>de</strong> época. Woody<br />

Allen “está a ficar velho.<br />

Está a ficar nostálgico. Está<br />

preso numa dada época”,<br />

comenta no “Guardian” Al<br />

Nigrin, professor <strong>de</strong> Cinema<br />

na Universida<strong>de</strong> Rutgers.<br />

“Em breve surgirá uma<br />

g<strong>era</strong>ção <strong>de</strong> ju<strong>de</strong>us cujas<br />

mães cresc<strong>era</strong>m a ver a<br />

MTV”, comenta Robert<br />

Thompson, director do<br />

Centro Bleier para a Cultura<br />

Popular, no “Guardian”.<br />

“Whatever Works” ainda<br />

não tem data <strong>de</strong> estreia em<br />

Portugal.<br />

O protagonista <strong>de</strong> “Whatever Works”, novo fi lme <strong>de</strong> Allen, parece <strong>se</strong>r uma sínte<strong>se</strong> do realizador e David:<br />

um cínico, um céptico, um auto-alienado<br />

Ípsilon • Sexta-feira 26 Junho 2009 • 3


Flash<br />

também o espaço ao redor da<br />

pintura.<br />

A obra <strong>de</strong> Greenaway tanto <strong>se</strong><br />

aproxima <strong>de</strong> uma lição sobre<br />

pintura <strong>se</strong>rvida <strong>por</strong> sofisticados<br />

meios tecnológicos, mostrando<br />

<strong>de</strong>talhes dos rostos ou <strong>se</strong>rvindo-<strong>se</strong><br />

<strong>de</strong> diagramas para atestar a<br />

centralida<strong>de</strong> da figura <strong>de</strong> Cristo,<br />

como <strong>de</strong>sliza para a ficção,<br />

assinalando com legendas os<br />

diálogos sussurrados entre as<br />

personagens da t<strong>ela</strong>. Como nas<br />

filact<strong>era</strong>s da banda <strong>de</strong><strong>se</strong>nhada,<br />

linhas vermelhas unem cada <strong>de</strong>ixa<br />

à respectiva personagem.<br />

A t<strong>ela</strong> <strong>de</strong> Verone<strong>se</strong>, concluída em<br />

1562, retrata o primeiro milagre <strong>de</strong><br />

Cristo - a transformação da água em<br />

vinho -, mas os diálogos que<br />

Greenaway escreveu (atribuídos<br />

a 126 figuras diferentes) tanto<br />

remetem para o tempo <strong>de</strong> Cristo<br />

como para a Veneza do século<br />

XVI. Muitas das falas são<br />

provocatoriamente banais e<br />

anacrónicas, como a <strong>de</strong> um<br />

conviva que, comentando o<br />

vinho milagrosamente<br />

produzido, diz: “Não há<br />

dúvida <strong>de</strong> que é<br />

encorpado; sabe a<br />

uvas plantadas<br />

numa encosta<br />

voltada a sul.”<br />

Antes <strong>de</strong>ste<br />

trabalho, o<br />

realizador, em cuja<br />

filmografia a pintura<br />

<strong>se</strong>mpre<br />

<strong>de</strong><strong>se</strong>mpenhou um<br />

papel fundamental,<br />

já tinha criado obras<br />

equivalentes para “A<br />

Ronda Nocturna”, <strong>de</strong><br />

Rembrandt, e para “A<br />

Última Ceia <strong>de</strong><br />

Leonardo”. E o <strong>se</strong>u<br />

intento é pros<strong>se</strong>guir a<br />

série. “As Meninas”,<br />

<strong>de</strong> Velásquez, e<br />

“Guernica”, <strong>de</strong><br />

Picasso, são algumas<br />

das obras que já<br />

anunciou que<br />

gostaria <strong>de</strong><br />

acrescentar ao <strong>se</strong>u<br />

projecto.<br />

A obra <strong>de</strong> Greenaway tanto <strong>se</strong><br />

aproxima <strong>de</strong> uma lição sobre<br />

pintura <strong>se</strong>rvida <strong>por</strong> sofi sticados<br />

meios tecnológicos como <strong>de</strong>sliza<br />

para a fi cção<br />

4 • Ípsilon • Sexta-feira 26 Junho 2009<br />

Uma obra <strong>de</strong> Anish Kapoor na Art Ba<strong>se</strong>l<br />

Na Art Ba<strong>se</strong>l<br />

não <strong>se</strong> <strong>se</strong>ntiu<br />

a cri<strong>se</strong><br />

O artigo é da insuspeita<br />

“Economist”: <strong>se</strong>gundo<br />

esta revista, a feira <strong>de</strong><br />

arte contem<strong>por</strong>ânea <strong>de</strong><br />

Ba<strong>se</strong>l atraiu um recor<strong>de</strong> <strong>de</strong><br />

61 mil coleccionadores e aqui a<br />

cri<strong>se</strong> não <strong>se</strong> fez <strong>se</strong>ntir, pelo menos<br />

para muitos. De 9 a 14 <strong>de</strong> Junho<br />

estiv<strong>era</strong>m na Arte Ba<strong>se</strong>l 300<br />

galerias <strong>de</strong> 29 paí<strong>se</strong>s, com obras <strong>de</strong><br />

2500 artistas e, tendo em conta<br />

aquilo a que a revista chama<br />

“barómetros nebulosos” (não<br />

há dados concretos), o<br />

negócio foi bom,<br />

“possivelmente até<br />

muito bom”. Muitos<br />

negociantes fiz<strong>era</strong>m<br />

transacções <strong>por</strong> volta<br />

do milhão <strong>de</strong> dólares<br />

com artistas como<br />

Anish Kapoor,<br />

Martin<br />

Kippenberger,<br />

Neo Rauch,<br />

Barbara Kruger,<br />

rev<strong>ela</strong> ainda a<br />

revista. A<br />

“Economist”<br />

interpreta a “leveza”<br />

que <strong>se</strong> <strong>se</strong>ntiu na feira com<br />

“o regresso <strong>de</strong><br />

coleccionadores<br />

fervorosos que preferem<br />

comprar quando o<br />

mercado está em baixa, a<br />

reacção <strong>de</strong> negociantes ao<br />

baixarem os preços para<br />

as<strong>se</strong>gurarem vendas, a<br />

percepção <strong>de</strong> que a arte é<br />

mais sólida do que outros<br />

activos e a ansieda<strong>de</strong> <strong>de</strong> muitos<br />

compradores <strong>de</strong>sviarem as suas<br />

poupanças das contas nos bancos<br />

suíços”. Outra das interpretações<br />

avançadas: falou-<strong>se</strong> muito do facto<br />

<strong>de</strong> os especuladores dos anos do<br />

“boom” do mercado da arte terem<br />

<strong>de</strong>saparecido. “Como comentava<br />

um consultor: ‘Todos os que<br />

comprarem qualida<strong>de</strong> nos<br />

próximos três ou quatro anos vão<strong>se</strong><br />

<strong>se</strong>ntir bem a longo prazo.’”<br />

Os humoristas na<br />

Cornucópia<br />

Bruno Nogueira e Luís Miguel<br />

Cintra? Parece uma junção<br />

improvável mas o humorista vai<br />

entrar num espectáculo encenado<br />

pelo director da Cornucópia, ao<br />

lado <strong>de</strong> outros Contem<strong>por</strong>âneos,<br />

Nuno Lopes e Dinarte Branco, e <strong>de</strong><br />

dois que entretanto saíram da série<br />

<strong>de</strong> humor da RTP, Maria Rueff e<br />

Gonçalo Waddington. É em “A<br />

Cida<strong>de</strong>”, uma colagem <strong>de</strong> textos <strong>de</strong><br />

Aristófanes feita <strong>por</strong> Cintra e faz<br />

parte da nova tem<strong>por</strong>ada do Teatro<br />

<strong>Municipal</strong> <strong>de</strong> São Luiz, em Lisboa –<br />

uma estreia só para 14 <strong>de</strong> Janeiro.<br />

Uns me<strong>se</strong>s antes, Gonçalo<br />

Waddington participa noutro<br />

projecto para o São Luiz, como<br />

autor e actor: “O Que <strong>se</strong> Leva Desta<br />

Vida”, texto assinado ainda com<br />

João Canijo, o cineasta que aqui <strong>se</strong><br />

transforma em encenador, e Tiago<br />

Rodrigues, que também<br />

interpreta (estreia a 5 <strong>de</strong><br />

Novembro). São dois <strong>de</strong>staques<br />

<strong>de</strong> teatro, ao qual <strong>se</strong> junta<br />

ainda a reposição <strong>de</strong> “Seis<br />

Personagens à Procura <strong>de</strong><br />

Autor”, <strong>de</strong> Piran<strong>de</strong>llo, uma<br />

encenação <strong>de</strong> Jorge Silva<br />

melo que, <strong>de</strong>sta vez, tem<br />

João Perry a interpretar.<br />

“Aqu<strong>ele</strong><br />

Querido Mês<br />

<strong>de</strong> Agosto”<br />

chegou a<br />

França<br />

Atenção, há um “objecto<br />

não i<strong>de</strong>ntificado, <strong>de</strong> teor<br />

altamente poético e<br />

popular” a circular nas<br />

salas <strong>de</strong> cinema <strong>de</strong> 11 cida<strong>de</strong>s<br />

francesas, avisou o “Le Mon<strong>de</strong>”. É<br />

um objecto que nos é familiar:<br />

“Aqu<strong>ele</strong> Querido Mês <strong>de</strong> Agosto”, o<br />

filme <strong>de</strong> Verão que Miguel Gomes<br />

fez numa “al<strong>de</strong>ia / perdida na<br />

Beira”, concelho <strong>de</strong> Arganil, teve<br />

estreia comercial num país on<strong>de</strong> já<br />

tinha dado sinais <strong>de</strong> po<strong>de</strong>r <strong>se</strong>r<br />

muito bem recebido <strong>de</strong>pois da<br />

passagem p<strong>ela</strong> Quinzena dos<br />

Realizadores <strong>de</strong> Cannes, em<br />

Maio do ano passado.<br />

Confirma-<strong>se</strong>: está a <strong>se</strong>r muito<br />

bem recebido. Os “Cahiers du<br />

Cinéma”<br />

Bruno Nogueira vai entrar em<br />

“A Cida<strong>de</strong>”, colagem <strong>de</strong> textos <strong>de</strong><br />

Aristófanes, encenação <strong>de</strong> Luís<br />

Miguel Cintra<br />

<strong>de</strong>dicaram-lhe um longo texto em<br />

que Cyril Neyrat inscreve o filme na<br />

tradição do “melhor do cinema<br />

<strong>por</strong>tuguês” que <strong>se</strong>mpre<br />

“negligenciou a velha divisão entre<br />

os géneros e amou <strong>de</strong>masiado a<br />

realida<strong>de</strong>”: como “Mudar <strong>de</strong> Vida”,<br />

<strong>de</strong> Paulo Rocha, “No Quarto <strong>de</strong><br />

Vanda”, <strong>de</strong> Pedro Costa, e “Trás-os-<br />

Montes”, <strong>de</strong> António Reis, a longa<br />

<strong>de</strong> Miguel Gomes cultiva “uma<br />

disposição popular para a fábula,<br />

para a poesia”, escreve Neyrat.<br />

Para o espectador, continua, “é o<br />

prazer raro <strong>de</strong> assistir à gestação da<br />

ficção, <strong>de</strong> uma narrativa que expõe<br />

o espectáculo da sua própria<br />

metamorfo<strong>se</strong>”.<br />

No “Le Mon<strong>de</strong>”, Jacques<br />

Man<strong>de</strong>lbaum chamou-lhe “um<br />

monstro <strong>de</strong>licado, que faz o<br />

espectador feliz” (“Há qualquer<br />

coisa <strong>de</strong> mágico na maneira como o<br />

cineasta convence o espectador a<br />

partir com <strong>ele</strong> à procura do <strong>se</strong>u<br />

tema”) e “faz soprar o vento louco<br />

da liberda<strong>de</strong> sobre a planície do<br />

cinema”: “A infiltração permanente<br />

dos registos, a combustão lenta dos<br />

gran<strong>de</strong>s motivos que atravessam o<br />

díptico, a mistura carnavalesca dos<br />

humores e dos <strong>se</strong>ntimentos, o<br />

<strong>de</strong><strong>se</strong>jo <strong>de</strong> reencontrar a crença na<br />

ressurreição estival <strong>de</strong> uma cultura<br />

popular perdida fazem <strong>de</strong> ‘Aqu<strong>ele</strong><br />

Querido Mês <strong>de</strong> Agosto’ um filme<br />

discretamente revolucionário, uma<br />

obra incan<strong>de</strong>scente e bucólica,<br />

mo<strong>de</strong>rna e romântica.” O<br />

“Libération” fez uma chamada <strong>de</strong><br />

capa e dis<strong>se</strong> que este filme não <strong>se</strong><br />

parece com nada, a não <strong>se</strong>r “com o<br />

caos doce <strong>de</strong> um baile <strong>de</strong> 15 <strong>de</strong><br />

Agosto”. Ainda há mais: “Les<br />

Inrockuptibles” notou que “Aqu<strong>ele</strong><br />

Querido Mês <strong>de</strong> Agosto” <strong>de</strong>monstra<br />

um “virtuosismo discreto”, o<br />

“L’Humanité” acrescentou que é<br />

um “filme raro”.<br />

Depois <strong>de</strong>stas 11 cida<strong>de</strong>s francesas<br />

- Paris, Caen, Grenoble, Lyon,<br />

Tours, Nantes, Angoulême,<br />

Bordéus, Mar<strong>se</strong>lha, Nancy e<br />

St. Ouen l’Aumône -, o<br />

filme terá outras<br />

estreias<br />

internacionais<br />

já confirmadas<br />

em Espanha,<br />

no Brasil, na<br />

Argentina, no<br />

Paraguai e no<br />

Chile.<br />

Os “Cahiers du Cinéma” <strong>de</strong>dicaram um longo texto ao fi lme, em que Cyril<br />

Neyrat inscreve o fi lme na tradição do “melhor do cinema <strong>por</strong>tuguês”


6 • Ípsilon • Sexta-feira 26 Junho 2009


COLIN MCPHERSON<br />

Jan Morris<br />

vive em<br />

Llanystumdwy,<br />

País <strong>de</strong><br />

Gales. No<br />

ano passado,<br />

<strong>de</strong>pois da<br />

mudança da<br />

lei na Grã-<br />

Bretanha,<br />

voltou a<br />

casar-<strong>se</strong> com<br />

Elizabeth,<br />

com quem<br />

fora casado<br />

enquanto<br />

James (em<br />

baixo) e <strong>de</strong><br />

quem <strong>se</strong><br />

tinha<br />

divorciado<br />

em 1972 <strong>por</strong><br />

razões<br />

legais.<br />

Juntas há 60<br />

anos, têm<br />

nove netos<br />

A Veneza<br />

<strong>de</strong> Jan no<br />

tempo<br />

em que<br />

ainda <strong>era</strong><br />

James<br />

Jan Morris é uma referência na lit<strong>era</strong>tura <strong>de</strong> viagens.<br />

Em meta<strong>de</strong> da sua vida foi um homem, na outra<br />

meta<strong>de</strong> uma mulher. Foi como James que escreveu<br />

“Veneza” – obra agora editada em Portugal. Essa<br />

viagem entre os <strong>se</strong>xos contara-a com <strong>de</strong>lica<strong>de</strong>za<br />

em “Conundrum”. Tem, mais do que a maioria das<br />

pessoas, uma consciência aguda do <strong>se</strong>xo <strong>de</strong> coisas,<br />

<strong>de</strong> acontecimentos, <strong>de</strong> cida<strong>de</strong>s.<br />

Alexandra Prado Coelho<br />

Para James Morris Veneza foi <strong>se</strong>mpre<br />

uma cida<strong>de</strong> feminina. Era assim - “talvez<br />

como uma espécie <strong>de</strong> ossificação<br />

do princípio da feminilida<strong>de</strong>” - que a<br />

via quando ali viveu com a mulher,<br />

Elizabeth, e os filhos. A cida<strong>de</strong> <strong>era</strong> “o<br />

equivalente em pedra, na sua graça,<br />

<strong>se</strong>renida<strong>de</strong> e cintilação” <strong>de</strong> tudo<br />

aquilo que James sonhava <strong>se</strong>r.<br />

Em 1960 James Morris escreveu<br />

“Veneza”, um livro, que a Tinta da<br />

China acaba <strong>de</strong> editar em Portugal,<br />

sobre aqu<strong>ela</strong> que é, com Oxford e<br />

Trieste, uma das cida<strong>de</strong>s que lhe<br />

“pertencem”. Uma década <strong>de</strong>pois<br />

James fez, em Marrocos, uma op<strong>era</strong>ção<br />

<strong>de</strong> mudança <strong>de</strong> <strong>se</strong>xo. Hoje chama<strong>se</strong><br />

Jan, é uma respeitável octogenária<br />

e vive na al<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> Llanystumdwy,<br />

País <strong>de</strong> Gales. No ano passado, <strong>de</strong>pois<br />

da mudança da lei na Grã-Bretanha,<br />

voltou a casar-<strong>se</strong>, em união civil, com<br />

Elizabeth.<br />

É para a casa on<strong>de</strong> vive há décadas,<br />

em Llanystumdwy, que t<strong>ele</strong>fonamos.<br />

A própria Jan aten<strong>de</strong> o t<strong>ele</strong>fone, uma<br />

voz não exactamente masculina mas<br />

não inteiramente feminina, calorosa,<br />

Capa<br />

tom britânico, vagamente afectado,<br />

mas ao mesmo tempo divertido.<br />

Conversa um pouco, mas diz que<br />

prefere respon<strong>de</strong>r às perguntas <strong>por</strong><br />

email.<br />

<strong>Quando</strong>, nessa mesma noite,<br />

envia as respostas pe<strong>de</strong> <strong>de</strong>sculpa<br />

<strong>por</strong> não falar do facto <strong>de</strong> ter sido<br />

homem e hoje <strong>se</strong>r mulher - “nada<br />

me aborrece mais do que falar sobre<br />

a mudança <strong>de</strong> <strong>se</strong>xo, razão p<strong>ela</strong> qual<br />

há cerca <strong>de</strong> 40 anos que recuso consistentemente<br />

fazê-lo”.<br />

Sobre “Veneza”, assume-o como<br />

um livro <strong>de</strong> um tempo, <strong>de</strong> uma<br />

outra vida. “Claro que me reconheço<br />

n<strong>ele</strong>, mas sou eu 50 anos<br />

mais nova. Se escreves<strong>se</strong> o livro<br />

hoje <strong>se</strong>ria o mesmo mas, infelizmente,<br />

não tão bom”.<br />

Houve, ao longo do tempo, outras<br />

edições, nas quais Morris tentou<br />

fazer actualizações, mas apercebeu<strong>se</strong><br />

<strong>de</strong> que isso não <strong>era</strong> possível.<br />

“Este livro em nada <strong>se</strong> as<strong>se</strong>melhava<br />

à re<strong>por</strong>tagem objectiva que eu imaginara<br />

inicialmente. Era um retrato<br />

subjectivo, romântico, impres-<br />

Ípsilon • Sexta-feira 26 Junho 2009 • 7


CARLO FABBRI/ REUTERS<br />

sionista, não tanto <strong>de</strong> uma cida<strong>de</strong><br />

mas <strong>de</strong> uma experiência”, escreve no<br />

preâmbulo.<br />

Regressou a Veneza, nas décadas<br />

<strong>de</strong> 70, <strong>de</strong> 80, <strong>de</strong> 90 e encontrou-a, a<br />

cada vez, diferente. Apaixonou-<strong>se</strong>, e<br />

<strong>de</strong>ixou <strong>de</strong> <strong>se</strong> <strong>se</strong>ntir apaixonada,<br />

lamentou o <strong>de</strong>saparecimento<br />

“daqu<strong>ela</strong> magia triste” e do “’pathos’<br />

do <strong>se</strong>u <strong>de</strong>clínio”, e nos anos 90 admitiu<br />

que pu<strong>de</strong>s<strong>se</strong> ter-<strong>se</strong> apaixonado <strong>de</strong><br />

novo, mas “<strong>de</strong> uma forma resignada,<br />

reconciliada”. Mas pouco alterou no<br />

livro. “Renovar a minha Veneza <strong>se</strong>ria<br />

falso, como <strong>se</strong>ria absurdo rejuvenescer-me”.<br />

Ela própria, nes<strong>se</strong> preâmbulo, <strong>de</strong>screve<br />

o livro mais <strong>por</strong> aquilo que <strong>ele</strong><br />

não é: “Não é um livro <strong>de</strong> história,<br />

mas contém necessariamente muitas<br />

passagens históricas” [...] Também<br />

não é um guia, mas no capítulo 21<br />

apre<strong>se</strong>nto uma lista dos monumentos<br />

que vale a pena visitar, <strong>por</strong> or<strong>de</strong>m<br />

topográfica, misturando-os ocasionalmente<br />

com breves passagens<br />

rebuscadas. [...] Este livro também<br />

não é exactamente uma re<strong>por</strong>tagem.<br />

<strong>Quando</strong> o escrevi, em 1960, pen<strong>se</strong>i<br />

que assim fos<strong>se</strong>. Nessa época eu <strong>era</strong><br />

correspon<strong>de</strong>nte no estrangeiro e planeei<br />

este livro como um trabalho<br />

sobre a Veneza contem<strong>por</strong>ânea”.<br />

No final do email para o Ípsilon, e<br />

ainda a propósito das perguntas r<strong>ela</strong>cionadas<br />

com a possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> ter<br />

um olhar mais masculino ou mais<br />

feminino sobre uma cida<strong>de</strong> (às quais<br />

não respon<strong>de</strong>), Jan diz: “Po<strong>de</strong>rá gostar<br />

<strong>de</strong> saber o <strong>se</strong>guinte: Elizabeth e<br />

eu divorciámo-nos em 1972, apenas<br />

<strong>por</strong> razões legais, mas <strong>de</strong>s<strong>de</strong> então<br />

vivemos <strong>se</strong>mpre juntas, e quando a<br />

lei mudou, há um ou dois anos, restab<strong>ele</strong>cemos<br />

a nossa r<strong>ela</strong>ção numa<br />

união civil formal. Vivemos juntas há<br />

60 anos e temos nove netos. O amor<br />

é tudo - e a generosida<strong>de</strong>!”.<br />

Numa entrevista à revista do “El<br />

País” confessara já que o assunto da<br />

mudança <strong>de</strong> <strong>se</strong>xo <strong>era</strong> para <strong>ela</strong> “algo<br />

já remoto, pré-diluviano”, e explicava<br />

que tudo o que tinha a dizer já tinha<br />

dito há 30 anos. O livro “Conundrum”<br />

- publicado em 1974 -, é o r<strong>ela</strong>to autobiográfico<br />

do “enigma” (é es<strong>se</strong> o <strong>se</strong>ntido<br />

<strong>de</strong> “conundrum”) que foi a sua<br />

vida. E aí, na forma <strong>de</strong> “comunicar o<br />

incomunicável”, Morris “é consistentemente<br />

brilhante”, escreveu o<br />

“Ob<strong>se</strong>rver”. O “Times” consi<strong>de</strong>rou<br />

“Conundrum” um dos “100 livros<br />

chave do nosso tempo”.<br />

Um momento,<br />

<strong>de</strong>baixo do piano<br />

James <strong>era</strong> pequeno, a mãe estava a<br />

tocar piano, e <strong>ele</strong>, como gostava <strong>de</strong><br />

fazer, estava <strong>se</strong>ntado <strong>de</strong>baixo do<br />

piano, com as notas a choverem sobre<br />

a cabeça. Foi nes<strong>se</strong> momento que<br />

soube: “Tinha três ou talvez quatro<br />

anos quando percebi que tinha nascido<br />

no corpo errado, e que <strong>de</strong>via <strong>se</strong>r<br />

uma rapariga. Lembro-me bem <strong>de</strong>s<strong>se</strong><br />

momento, e essa é a mais antiga<br />

memória da minha vida”. Era uma<br />

criança feliz, foi “criado com gentileza<br />

e <strong>se</strong>nsibilida<strong>de</strong>”, e não vale a<br />

pena procurar nessa infância sinal <strong>de</strong><br />

8 • Ípsilon • Sexta-feira 26 Junho 2009<br />

trauma ou <strong>de</strong>sajustamento que explique<br />

es<strong>se</strong> pensamento “tão bizarro”<br />

que <strong>se</strong> instalou n<strong>ele</strong>.<br />

Foi um longo, e muitas vezes doloroso,<br />

processo que o levou <strong>de</strong>s<strong>se</strong><br />

momento, <strong>de</strong>baixo do piano, ro<strong>de</strong>ado<br />

p<strong>ela</strong> música que a mãe tocava,<br />

até um estranho quarto numa clínica<br />

em Casablanca, on<strong>de</strong> um dia adormeceu<br />

homem e no outro acordou<br />

mulher. Ou melhor, acordou <strong>se</strong>m os<br />

órgãos genitais, o último passo que<br />

faltava para completar, até ao limite<br />

do possível, a sua mudança. A transformação<br />

começara muito antes da<br />

op<strong>era</strong>ção em 1972. “Cálculos rápidos<br />

indicam que entre 1954 e 1972<br />

engoli pelo menos 12 mil comprimidos<br />

e absorvi no meu sistema qualquer<br />

coisa como 50 000 miligramas<br />

<strong>de</strong> matéria feminina”, escreve em<br />

“Conundrum”.<br />

A mudança foi “infinitamente gradual”.<br />

Ao longo <strong>de</strong> “Conundrum”, as<br />

<strong>de</strong>scrições do processo são <strong>se</strong>mpre<br />

<strong>de</strong> uma imensa clareza, como <strong>se</strong> surgis<strong>se</strong>m<br />

<strong>se</strong>m esforço <strong>de</strong> uma extraordinária<br />

capacida<strong>de</strong> <strong>de</strong> auto-análi<strong>se</strong>.<br />

“O primeiro resultado não foi exactamente<br />

uma feminização do meu<br />

corpo, mas um <strong>de</strong>spir da capa<br />

Para James Morris<br />

Veneza foi <strong>se</strong>mpre<br />

uma cida<strong>de</strong> feminina.<br />

Era assim - “talvez<br />

como uma espécie<br />

<strong>de</strong> ossificação<br />

do princípio da<br />

feminilida<strong>de</strong>” - que a<br />

via quando ali viveu<br />

com a mulher,<br />

Elizabeth, e os filhos<br />

PAULO RICCA<br />

Depois <strong>de</strong> escever o livro, na década <strong>de</strong> 60, Jan Morris egressou a Veneza, nas décadas <strong>de</strong><br />

70, <strong>de</strong> 80, <strong>de</strong> 90 e encontrou-a, a cada vez, diferente. Apaixonou-<strong>se</strong> e <strong>de</strong>ixou <strong>de</strong> <strong>se</strong> <strong>se</strong>ntir<br />

apaixonada, lamentou o <strong>de</strong>saparecimento “daqu<strong>ela</strong> magia triste” e do “’pathos’ do <strong>se</strong>u<br />

<strong>de</strong>clínio”, e nos anos 90 admitiu que pu<strong>de</strong>s<strong>se</strong> ter-<strong>se</strong> apaixonado <strong>de</strong> novo,<br />

mas “<strong>de</strong> forma resignada, reconciliada”


“Limito-me a <strong>de</strong>ixar<br />

a cida<strong>de</strong> acontecer-me”<br />

MIKE SEGAR/ REUTERS<br />

Paul Theroux<br />

consid<strong>era</strong><br />

Morris “uma<br />

das gran<strong>de</strong>s<br />

escritoras<br />

<strong>de</strong>scritivas<br />

em língua<br />

inglesa”<br />

Jan Morris diz ao Ípsilon que os <strong>se</strong>us livros são “es<strong>se</strong>ncialmente autobiográficos”.<br />

“Veneza” é a cida<strong>de</strong> num tempo, os anos 60, quando Jan ainda <strong>era</strong> James.<br />

Não vale a pena pedir-lhe uma<br />

receita específi ca. Jan Morris não<br />

vai dizer <strong>se</strong>, quando <strong>se</strong> prepara<br />

para escrever sobre uma cida<strong>de</strong>,<br />

<strong>se</strong> fecha numa biblioteca a ler<br />

o que po<strong>de</strong>, <strong>se</strong> <strong>se</strong>nta num café a<br />

olhar em volta, <strong>se</strong> fala com quem<br />

quer que <strong>se</strong> lhe atraves<strong>se</strong> no<br />

caminho. “Nunca pen<strong>se</strong>i em mim<br />

como uma escritora <strong>de</strong> viagens”,<br />

respon<strong>de</strong>-nos <strong>por</strong> email. “E a<br />

minha técnica ba<strong>se</strong>ia-<strong>se</strong> em<br />

dois princípios preguiçosos. O<br />

primeiro tomei-o <strong>de</strong> E. M. Forster:<br />

‘Vaguear <strong>se</strong>m objectivo’. O<br />

<strong>se</strong>gundo dos Salmos: ‘Arreganha<br />

os <strong>de</strong>ntes como um cão e corre<br />

p<strong>ela</strong> cida<strong>de</strong>’. Tirando isso limitome<br />

a <strong>de</strong>ixar a cida<strong>de</strong> acontecerme”.<br />

É isto. Parece simples, mas<br />

é o que faz <strong>de</strong> Morris, nas<br />

palavras <strong>de</strong> outro escritor <strong>de</strong><br />

viagens, Paul Theroux (também<br />

em conversa com o Ípsilon<br />

<strong>por</strong> email), “uma das gran<strong>de</strong>s<br />

escritoras <strong>de</strong>scritivas em língua<br />

inglesa”. Morris “con<strong>se</strong>gue<br />

<strong>de</strong>screver um céu, um cheiro,<br />

um rosto, qualquer coisa, <strong>de</strong><br />

uma forma que faz com que a<br />

vejamos claramente”.<br />

Não <strong>se</strong> espere, em “Veneza”,<br />

um r<strong>ela</strong>to tradicional <strong>de</strong><br />

uma viagem, com a chegada,<br />

os pequenos (ou gran<strong>de</strong>s)<br />

“A minha técnica<br />

ba<strong>se</strong>ia-<strong>se</strong> em<br />

dois princípios<br />

preguiçosos.<br />

O primeiro tomei-o<br />

<strong>de</strong> E. M. Forster:<br />

‘Vaguear <strong>se</strong>m<br />

objectivo’. O <strong>se</strong>gundo<br />

dos Salmos:<br />

‘Arreganha os <strong>de</strong>ntes<br />

como um cão e corre<br />

p<strong>ela</strong> cida<strong>de</strong>’. Tirando<br />

isso limito-me a<br />

<strong>de</strong>ixar a cida<strong>de</strong><br />

acontecer-me”.<br />

acontecimentos dos dias que<br />

<strong>se</strong> <strong>se</strong>guem contados <strong>de</strong> forma<br />

cronológica até ao momento <strong>de</strong><br />

apanhar o avião <strong>de</strong> partida. “Não<br />

sou uma escritora <strong>de</strong> pequenas<br />

histórias”, respon<strong>de</strong> no email.<br />

Há, na escrita d<strong>ela</strong>, muitos<br />

dados históricos, mas que são<br />

<strong>se</strong>mpre entr<strong>ela</strong>çados com as<br />

histórias que conta. E estas<br />

resultam <strong>de</strong> uma apaixonada<br />

ob<strong>se</strong>rvação, misturada com<br />

um humor fi no: “Por vezes uma<br />

dona <strong>de</strong> casa veneziana anuncia<br />

conclusivamente que naqu<strong>ele</strong><br />

dia não <strong>se</strong> encontram couves na<br />

cida<strong>de</strong>: mas o que <strong>ela</strong> quer dizer<br />

é que, naqu<strong>ela</strong> manhã, as couves<br />

<strong>se</strong> esgotaram na mercearia<br />

a esquina do Campo <strong>de</strong> San<br />

Barnaba, on<strong>de</strong> a família d<strong>ela</strong><br />

faz compras <strong>de</strong>s<strong>de</strong> o tempo das<br />

primeiras Cruzadas”. Ou: “Os<br />

pais venezianos levam os bebés<br />

ao colo com um regalo assumido,<br />

e as mães venezianas dão sinais<br />

<strong>de</strong> imediata cri<strong>se</strong> cardíaca <strong>se</strong> o<br />

pequeno Giorgio estiver a dois<br />

metros da água. As crianças<br />

venezianas andam vestidas com<br />

requinte, ainda que <strong>por</strong> vezes<br />

pareçam um pouco ridículas”.<br />

Ambição ilimitada<br />

Uma das coisas que Carlos Vaz<br />

Marques, o coor<strong>de</strong>nador da<br />

colecção da Tinta da China sobre<br />

lit<strong>era</strong>tura <strong>de</strong> viagens, gosta em<br />

Jan Morris é o facto <strong>de</strong> “<strong>ela</strong> <strong>se</strong>r<br />

uma escritora-viajante com uma<br />

ambição ilimitada” que “não<br />

tem receio <strong>de</strong> querer abarcar<br />

a totalida<strong>de</strong> dos lugares a que<br />

<strong>de</strong>dica atenção”. É <strong>por</strong> isso que<br />

“ao contrário do que <strong>se</strong> tornou<br />

comum, <strong>ela</strong> não é uma escritora<br />

pós-mo<strong>de</strong>rna”. O <strong>se</strong>u r<strong>ela</strong>to “não<br />

é circunstancial”, não <strong>se</strong> ba<strong>se</strong>ia<br />

nas pequenas histórias que<br />

po<strong>de</strong>m ou não ter um signifi cado<br />

maior. Nunca chegamos a<br />

saber <strong>se</strong> aquilo que aconteceu a<br />

<strong>de</strong>terminado escritor é r<strong>ele</strong>vante<br />

para a visão do país ou da cida<strong>de</strong><br />

ou <strong>se</strong> foi apenas um episódio<br />

particular que lhe aconteceu<br />

<strong>por</strong> acaso - é a isto que Carlos<br />

Vaz Marques chama um r<strong>ela</strong>to<br />

“circunstancial”. “São escritores<br />

que contam a sua história com o<br />

pressusposto <strong>de</strong> que um ponto <strong>de</strong><br />

vista é apenas um ponto <strong>de</strong> vista<br />

e que não é possível ter um olhar<br />

total sobre a realida<strong>de</strong>”, o que,<br />

<strong>se</strong>ndo “um pressuposto fi losófi co<br />

e r<strong>ela</strong>tivista respeitável”, acaba<br />

<strong>por</strong> <strong>se</strong>r na maior parte dos<br />

casos “um estratagema para<br />

mascarar a falta <strong>de</strong> ‘génio’ ou a<br />

incapacida<strong>de</strong> do autor para ver<br />

para lá da sua circunstância”.<br />

Morris não o faz. “Muita da<br />

escrita <strong>de</strong> viagens publicada<br />

tem como tempo verbal o<br />

pretérito perfeito, ‘fui, estava,<br />

vi’, o d<strong>ela</strong> é o imperfeito,<br />

‘via, estava’, o que dá uma<br />

continuida<strong>de</strong> no tempo, e faz<br />

com que na maior parte dos<br />

casos <strong>ela</strong> <strong>de</strong>screva quadros que<br />

parecem intem<strong>por</strong>ais”.<br />

A própria Jan explica ao<br />

Ípsilon que embora “Dickens<br />

tenha escrito <strong>de</strong> forma muito<br />

b<strong>ela</strong> sobre Veneza ao fi m <strong>de</strong><br />

apenas um dia”, no <strong>se</strong>u caso<br />

escreveu livros sobre lugares<br />

aos quais <strong>se</strong> <strong>de</strong>dicou durante<br />

um ano - “e no do País <strong>de</strong> Gales,<br />

uma vida inteira!”. E confessa<br />

que é, como toda a gente,<br />

infl uenciada p<strong>ela</strong>s experiências<br />

que tem numa cida<strong>de</strong>. “Sou<br />

particularmente <strong>se</strong>nsível ao<br />

que acontece <strong>por</strong>que os meus<br />

livros são es<strong>se</strong>ncialmente<br />

autobiográfi cos - para não dizer<br />

que são egotistas. Descrevem o<br />

efeito dos lugares não em g<strong>era</strong>l,<br />

mas sobre uma <strong>se</strong>nsibilida<strong>de</strong><br />

particular - a minha própria.<br />

Nunca me tento colocar no lugar<br />

dos outros - escrevo sobre as<br />

minhas próprias reacções”.<br />

Veja-<strong>se</strong> o início <strong>de</strong> “Veneza”:<br />

“A 45º 14’N, 12º18’E, o navegador<br />

que vá subindo ao longo<br />

da costa adriática <strong>de</strong> Itália<br />

encontra uma abertura na<br />

extensa linha baixa da praia: e<br />

virando para oeste, com a ajuda<br />

da maré, entra numa laguna.<br />

De súbito,<strong>de</strong>saparece o vigor<br />

tempestuoso do mar. A água<br />

em volta é baixa mas opaca,<br />

a atmosf<strong>era</strong> curiosamente<br />

translúcida, as cores são<br />

pálidas, e sobre toda a extensão<br />

da bacia <strong>de</strong> lama e água pesa<br />

uma sugestão <strong>de</strong> m<strong>ela</strong>ncolia. É<br />

como que uma laguna albina”.<br />

Essas páginas iniciais, explica<br />

<strong>ela</strong> hoje, “corr<strong>era</strong>m bem”. “Toda<br />

a minha visão <strong>de</strong> Veneza é<br />

largamente infl uenciada pelo<br />

facto <strong>de</strong> ter acesso a barcos lá, e<br />

ainda hoje aquilo que mais gosto<br />

é aproximar-me d<strong>ela</strong> <strong>por</strong> mar”.<br />

Paul Theroux concorda que<br />

os livros <strong>de</strong> Morris [entre muitas<br />

<strong>de</strong>zenas <strong>de</strong> obras, retratos<br />

<strong>de</strong> Triestre, Oxford, Hong<br />

Kong, e r<strong>ela</strong>tos <strong>de</strong> viagens em<br />

inúmeros paí<strong>se</strong>s, para além <strong>de</strong><br />

ensaios] “estão cheios das suas<br />

opiniões, da sua história, da<br />

sua <strong>se</strong>nsibilida<strong>de</strong>”. E consid<strong>era</strong><br />

que não há n<strong>ela</strong> “um ‘estilo’<br />

<strong>de</strong>lib<strong>era</strong>do”. “Ela escreve como<br />

po<strong>de</strong>, como o faz, e é facilmente<br />

i<strong>de</strong>ntifi cável na sua escrita. E<br />

conhece o mundo como poucas<br />

pessoas”. Afi nal, conclui<br />

Theroux, “<strong>ela</strong> percorreu o<br />

mundo como homem, e também<br />

como mulher - quem mais po<strong>de</strong><br />

dizer isso?”. A.P.C.<br />

Ípsilon • Sexta-feira 26 Junho 2009 • 9


PAULO RICCA<br />

rugosa que cobre os indivíduos<br />

masculinos. Não estou a falar apenas<br />

dos pêlos ou da textura da p<strong>ele</strong>, nem<br />

da saliência dura dos músculos: tudo<br />

isto <strong>de</strong>sapareceu efectivamente nos<br />

anos que <strong>se</strong> <strong>se</strong>guiram, mas com <strong>ele</strong>s<br />

<strong>de</strong>sapareceu também algo menos<br />

tangível, que <strong>se</strong>i agora <strong>se</strong>r especificamente<br />

masculino: uma espécie <strong>de</strong><br />

camada invisível <strong>de</strong> resiliência acumulada,<br />

que oferece um escudo para<br />

o lado masculino das espécies, mas<br />

ao mesmo tempo diminui as <strong>se</strong>nsações<br />

do corpo”.<br />

É, explica Morris, como <strong>se</strong> os<br />

homens “tives<strong>se</strong>m um contacto<br />

menos imediato com o ar e o sol” e<br />

estives<strong>se</strong>m “mais po<strong>de</strong>rosamente<br />

compactados nos <strong>se</strong>us próprios<br />

recursos”. Com o tratamento hormonal<br />

a que <strong>se</strong> sujeitou, essa “armadura”<br />

foi <strong>de</strong>saparecendo e Morris<br />

<strong>se</strong>ntiu-<strong>se</strong> tão mais leve que sonhava<br />

frequentemente com levitação.<br />

Militar e jornalista<br />

Ser trans<strong>se</strong>xual, escreve, “não tem<br />

nada a ver com preferências <strong>se</strong>xuais”.<br />

Não é uma questão <strong>se</strong>xual. “É uma<br />

apaixonada, permanente e profunda<br />

convicção, que nunca ninguém con<strong>se</strong>guiu<br />

retirar a um verda<strong>de</strong>iro trans<strong>se</strong>xual”.<br />

É simplesmente uma evidência<br />

- mesmo que só para o próprio.<br />

“Para mim esta é uma questão que<br />

vai muito para além do <strong>se</strong>xo: não<br />

reconheço n<strong>ela</strong> qualquer carácter<br />

lascivo, e vejo-a, acima <strong>de</strong> tudo, como<br />

um dilema que não é do corpo nem<br />

da cabeça mas do espírito”.<br />

Na infância, quando não confessara<br />

a ninguém o que <strong>se</strong>ntia, atravessavam-lhe<br />

o espírito dúvidas tão <strong>de</strong>sconcertantes<br />

como esta: “Ocorr<strong>era</strong>me<br />

que talvez a minha condição fos<strong>se</strong><br />

perfeitamente normal, e que todos<br />

os rapazes gostariam <strong>de</strong> <strong>se</strong>r raparigas.<br />

Parecia-me uma aspiração suficientemente<br />

lógica [...]”.<br />

As primeiras experiências <strong>se</strong>xuais<br />

não contribuíram para clarificar o<br />

“enigma”. Não <strong>se</strong>ntia qualquer <strong>de</strong><strong>se</strong>jo<br />

<strong>de</strong> dormir com mulheres, e não partilhava<br />

“as ambições <strong>se</strong>xuais” que<br />

tanto pareciam interessar os outros<br />

homens - havia n<strong>ele</strong> uma ausência da<br />

“<strong>se</strong>xualida<strong>de</strong> masculina” que reconhecia<br />

nos amigos (aliás, confessa<br />

nunca ter percebido muito bem “a<br />

im<strong>por</strong>tância do <strong>se</strong>xo físico para os<br />

homens”). Os contactos <strong>se</strong>xuais com<br />

homens também não pareciam interessá-lo<br />

excessivamente, e <strong>se</strong>ntia<br />

“não exactamente repulsa mas embaraço”,<br />

ao mesmo tempo que “esteticamente”<br />

parecia-lhe “errado”, para<br />

10 • Ípsilon • Sexta-feira 26 Junho 2009<br />

MIKE SEGAR/ REUTERS<br />

PAULO RICCA<br />

Jan diz-nos: “nada me aborrece mais do que falar sobre a mudança <strong>de</strong> <strong>se</strong>xo,<br />

razão p<strong>ela</strong> qual há cerca <strong>de</strong> 40 anos que recuso consistentemente fazê-lo”<br />

“Toda a minha visão <strong>de</strong> Veneza é largamente infl uenciada pelo facto <strong>de</strong> ter acesso a barcos lá, e ainda hoje aquilo qu<br />

ALBERTO PIZZOLI/ AFP<br />

PAULO RICCA


PAULO RICCA<br />

além <strong>de</strong> achar que “esta intimida<strong>de</strong><br />

do corpo com simples conhecidos <strong>era</strong><br />

<strong>de</strong>s<strong>ele</strong>gante”.<br />

James/Jan é es<strong>se</strong>ncialmente uma<br />

pessoa feliz. Apesar da angústia que<br />

<strong>se</strong>ntiu durante anos <strong>por</strong> achar que<br />

tinha nascido no corpo errado, aproveitou<br />

<strong>se</strong>mpre o melhor possível o<br />

muito que a vida lhe <strong>de</strong>u - e mesmo<br />

o que um corpo <strong>de</strong> homem lhe ofereceu.<br />

Aos 17 anos ingressou como<br />

voluntário no Exército inglês, foi oficial<br />

do 9º Regimento <strong>de</strong> Lanceiros da<br />

Rainha - “paradoxalmente a vida militar<br />

<strong>se</strong>mpre me atraiu”, escreve num<br />

capítulo <strong>de</strong> “Conundrum” em que<br />

confessa a sua admiração p<strong>ela</strong>s “virtu<strong>de</strong>s<br />

militares, a coragem, a força, a<br />

lealda<strong>de</strong>, a auto-disciplina” além <strong>de</strong><br />

um fascínio especial <strong>por</strong> tanques.<br />

Mais tar<strong>de</strong> tornou-<strong>se</strong> jornalista e<br />

percorreu o mundo em re<strong>por</strong>tagem<br />

ao <strong>se</strong>rviço da “Arab News Agency”<br />

do Cairo, do “The Times” e do “Manchester<br />

Guardian”. E <strong>se</strong> <strong>se</strong> <strong>se</strong>ntia <strong>de</strong>sconfortável<br />

no “Manchester Guardian”<br />

<strong>por</strong>que “<strong>era</strong> como trabalhar<br />

para uma mulher e não para um<br />

homem”, o “Times” agradava-lhe<br />

precisamente <strong>por</strong> <strong>se</strong>r “muito britânico<br />

e muito masculino”.<br />

“O facto <strong>de</strong> ter nascido no Império<br />

Britânico moldou a minha visão do<br />

mundo”, reconhece ao Ípsilon.<br />

“Senti-me <strong>de</strong>s<strong>de</strong> o início privilegiada<br />

e <strong>de</strong> certa forma invulnerável. Além<br />

disso, embora tenha vindo a abominar<br />

o princípio do imperialismo, a<br />

i<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> que uma pessoa po<strong>de</strong> im<strong>por</strong><br />

o <strong>se</strong>u domínio a outra (<strong>por</strong> exemplo<br />

os ingle<strong>se</strong>s sobre nós, no País <strong>de</strong><br />

Gales!), <strong>se</strong>ntia-me <strong>se</strong>duzida p<strong>ela</strong> estética<br />

<strong>de</strong> tudo isso, e é <strong>por</strong> isso que o<br />

meu trabalho mais im<strong>por</strong>tante é a<br />

minha triologia ‘Pax Britannica’ - uma<br />

franca mistura <strong>de</strong> admiração e<br />

repulsa, que repre<strong>se</strong>nta, julgo eu, a<br />

atitu<strong>de</strong> nacional melhor do que qualquer<br />

análi<strong>se</strong> académica”.<br />

Jan Morris parece ter, mais do que<br />

a maioria das pessoas, uma consciência<br />

aguda do <strong>se</strong>xo <strong>de</strong> coisas, <strong>de</strong><br />

acontecimentos, <strong>de</strong> cida<strong>de</strong>s. É através<br />

<strong>de</strong>ssa perspectiva que lê momentos<br />

<strong>de</strong>terminantes da sua vida como<br />

a expedição do topo do Everest, que<br />

acompanhou como jornalista em<br />

1953. “O corpo masculino po<strong>de</strong> <strong>se</strong>r<br />

pouco generoso e pouco criativo <strong>de</strong><br />

uma forma mais profunda, mas<br />

quando está a funcionar bem é uma<br />

coisa maravilhosa <strong>de</strong> habitar”,<br />

escreve a propósito <strong>de</strong>s<strong>se</strong> momento<br />

em que <strong>se</strong>ntiu que nada a podia <strong>de</strong>rrotar.<br />

E, no entanto, aqu<strong>ele</strong> feito<br />

extraordinário <strong>de</strong>ixava-a “insatisfeita,<br />

como provavelmente à maioria das<br />

mulheres”, <strong>por</strong>que <strong>era</strong> uma vitória<br />

no vazio - “nada fora <strong>de</strong>scoberto,<br />

nada feito, nada melhorado”.<br />

O casamento,<br />

os fi lhos, a op<strong>era</strong>ção<br />

Encontrar Elizabeth Tuckiness<br />

mudou-lhe a vida. Foi um “encontro<br />

<strong>de</strong> iguais”. A <strong>de</strong>scrição que faz é a <strong>de</strong><br />

um gran<strong>de</strong> amor e da <strong>de</strong>scoberta <strong>de</strong><br />

uma alma gémea. Casaram em 1949<br />

e tiv<strong>era</strong>m cinco filhos, três rapazes e<br />

duas raparigas. “Ouve-<strong>se</strong> agora falar<br />

no conceito <strong>de</strong> ‘casamento aberto’<br />

[...] O nosso foi <strong>se</strong>mpre um acordo<br />

<strong>de</strong>s<strong>se</strong> tipo”, e “p<strong>ela</strong> natureza das coisas,<br />

o <strong>se</strong>xo <strong>era</strong> subsidiário”.<br />

Jan sabia que queria ter filhos e,<br />

não po<strong>de</strong>ndo <strong>se</strong>r mãe, assumiu com<br />

prazer o papel <strong>de</strong> pai, mesmo reconhecendo<br />

que nunca foi a típica<br />

figura paternal. Elizabeth soube <strong>se</strong>mpre<br />

o “enigma” da vida do marido, e<br />

os filhos soub<strong>era</strong>m, <strong>de</strong> forma gradual,<br />

mais tar<strong>de</strong>. “Espero ter-lhes dado, <strong>se</strong><br />

nada mais, pelo menos uma compreensão<br />

do amor”, escreve.<br />

Mas <strong>se</strong> os filhos e Elizabeth acompanharam<br />

essa mudança gradual e<br />

tiv<strong>era</strong>m tempo para <strong>se</strong> habituar a <strong>ela</strong>,<br />

o resto do mundo estava menos preparado<br />

para a transformação <strong>de</strong><br />

James em Jan. Num dos capítulos<br />

mais marcados pelo <strong>se</strong>u <strong>ele</strong>gantíssimo<br />

<strong>se</strong>ntido <strong>de</strong> humor, <strong>de</strong>screve o<br />

que foram es<strong>se</strong>s anos em que a sua<br />

“Sou particularmente<br />

<strong>se</strong>nsível ao que<br />

acontece <strong>por</strong>que<br />

os meus livros são<br />

es<strong>se</strong>ncialmente<br />

autobiográficos -<br />

para não dizer que<br />

são egotistas.<br />

Descrevem o efeito<br />

dos lugares não em<br />

g<strong>era</strong>l, mas sobre uma<br />

<strong>se</strong>nsibilida<strong>de</strong><br />

particular - a minha<br />

própria. Nunca me<br />

tento colocar no lugar<br />

dos outros - escrevo<br />

sobre as minhas<br />

próprias reacções”<br />

o que mais gosto é aproximar-me d<strong>ela</strong> <strong>por</strong> mar”.<br />

“condição andrógina” <strong>se</strong> podia rev<strong>ela</strong>r<br />

tanto um “pesa<strong>de</strong>lo” como uma<br />

“aventura”. O momento, <strong>por</strong> exemplo,<br />

em que, tendo que passar p<strong>ela</strong><br />

alfân<strong>de</strong>ga no aero<strong>por</strong>to Kennedy, em<br />

Nova Iorque, “não fazia i<strong>de</strong>ia a que<br />

<strong>se</strong>xo é que o polícia iria achar que eu<br />

pertencia, e tinha que preparar as<br />

minhas respostas para qualquer uma<br />

das <strong>de</strong>cisões” e tentar perceber <strong>se</strong><br />

ouvia um “o <strong>se</strong>nhor aí” ou em vez<br />

disso “a <strong>se</strong>nhora, <strong>por</strong> favor”, para<br />

po<strong>de</strong>r <strong>de</strong>cidir que atitu<strong>de</strong> tomar.<br />

As reacções mudavam conforme o<br />

lugar do mundo em que <strong>se</strong> encontrava.<br />

“Os gregos pareciam muito<br />

divertidos. Os árabes convidavam-me<br />

para pas<strong>se</strong>ar. Os escoce<strong>se</strong>s pareciam<br />

chocados. Os alemães preocupados.<br />

Os japone<strong>se</strong>s não reparavam”.<br />

Com o tempo, e as do<strong>se</strong>s <strong>de</strong> hormonas,<br />

a ambiguida<strong>de</strong> foi-<strong>se</strong> reduzindo<br />

e Jan foi parecendo cada vez<br />

mais uma mulher. Inicialmente a op<strong>era</strong>ção<br />

estava prevista para a Grã-Bretanha,<br />

mas a informação <strong>de</strong> que teria<br />

que <strong>se</strong> divorciar <strong>de</strong> Elizabeth primeiro<br />

(o que acabaria <strong>por</strong> acontecer<br />

mas só mais tar<strong>de</strong>) levou-a a uma<br />

opção mais arriscada: o Dr. B e a sua<br />

clínica em Casablanca. Foi aí que, nas<br />

duas <strong>se</strong>manas que levou a recup<strong>era</strong>r<br />

da op<strong>era</strong>ção, viu p<strong>ela</strong> primeira vez<br />

outros como <strong>ela</strong>. “Encontrávamo-nos<br />

vagueando pelos corredores. [...] Éramos<br />

como prisioneiros, momentaneamente<br />

libertos das nossas c<strong>ela</strong>s para<br />

interrogatórios, encontrando <strong>por</strong> fim<br />

colegas que só conhecíamos <strong>por</strong> códigos<br />

ou lendas. Olhávamos uns para<br />

os outros como estranhos e aliados,<br />

com curiosida<strong>de</strong> e inocência”.<br />

E assim James <strong>de</strong>u lugar a Jan. Só<br />

então, <strong>se</strong>ntindo-<strong>se</strong> completa, percebeu<br />

o “quão profundamente tinha<br />

ansiado pelos braços e o amor <strong>de</strong> um<br />

homem”. Mas <strong>era</strong> “<strong>de</strong>masiado tar<strong>de</strong>”<br />

<strong>por</strong>que os homens que amara estavam<br />

“já casados, ou mortos, ou longe,<br />

ou indiferentes”.<br />

Às vezes o nome suscitava confusões,<br />

como quando um australiano<br />

lhe dis<strong>se</strong>, em tom <strong>de</strong>scontraído: “Pen<strong>se</strong>i<br />

que Jan Morris <strong>era</strong> um homem. O<br />

que é que aconteceu, mudou <strong>de</strong> <strong>se</strong>xo<br />

ou alguma coisa assim?”. E Jan respon<strong>de</strong>u<br />

a evidência: “Sim, foi isso<br />

mesmo”. Mas no g<strong>era</strong>l o mundo integrou<br />

bem a nova i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong>.<br />

Aliás, tudo correu surpreen<strong>de</strong>ntemente<br />

bem. Jan acredita que foi assim<br />

<strong>por</strong>que faz parte da categoria dos<br />

“trans<strong>se</strong>xuais do tipo clássico”, aqu<strong>ele</strong>s<br />

para quem o que está em causa<br />

não é uma questão <strong>se</strong>xual, aqu<strong>ele</strong>s<br />

que “não oferecem nenhum objectivo<br />

racional às suas compulsões”, mas<br />

limitam-<strong>se</strong> a <strong>se</strong>r “guiados, cegamente,<br />

e <strong>se</strong>m alternativa, até à mesa <strong>de</strong> op<strong>era</strong>ções”.<br />

Nunca <strong>se</strong> arrepen<strong>de</strong>u da <strong>de</strong>cisão<br />

que tomou. Aliás, escreve, “<strong>se</strong> me<br />

vis<strong>se</strong> presa nessa gaiola outra vez,<br />

nada me afastaria do meu objectivo,<br />

<strong>por</strong> muito assustadoras que fos<strong>se</strong>m<br />

as perspectivas, <strong>por</strong> muito pouca que<br />

fos<strong>se</strong> a esp<strong>era</strong>nça, correria a terra em<br />

busca <strong>de</strong> cirurgiões, subornaria barbeiros<br />

ou aborta<strong>de</strong>iras , pegaria numa<br />

faca e fá-lo-ia eu própria, <strong>se</strong>m medo,<br />

<strong>se</strong>m dúvidas, <strong>se</strong>m pensar duas<br />

vezes”.<br />

E aos que a invejam acreditando<br />

que tomou em mãos o <strong>se</strong>u <strong>de</strong>stino, e<br />

lhe citam W. E. Heney - “I am the master<br />

of my fate,/I am the captain of my<br />

soul”, respon<strong>de</strong> que isso é uma ilusão<br />

e que <strong>se</strong> avançou <strong>por</strong> aí foi <strong>por</strong>que<br />

es<strong>se</strong> <strong>era</strong> o único caminho que lhe <strong>era</strong><br />

possível percorrer.<br />

E cita-lhes Cecil Day Lewis - “Tell<br />

them in England, if they ask/What<br />

brought us to the<strong>se</strong> wars/To this plateau<br />

beneath the night’s/Grave manifold<br />

of stars/<br />

It was not fraud or foolishness,/<br />

Glory, revenge or pay:/We came<br />

becau<strong>se</strong> our open eyes/Could <strong>se</strong>e no<br />

other way.”<br />

Ver crítica <strong>de</strong> livros págs. 38 e <strong>se</strong>gs.<br />

SÃO LUIZ / JUN ~O9<br />

7ª FESTA<br />

DO JAZZ DO<br />

SÃO LUIZ<br />

A FESTA<br />

DO JAZZ<br />

PORTUGUÊS<br />

26, 27 E 28 JUN<br />

<strong>se</strong>xta, sábado e domingo<br />

sala principal, jardim <strong>de</strong> inverno,<br />

teatro-estúdio mário viegas<br />

e spot são luiz<br />

SEXTA DAS 21H00 ÀS 02H00<br />

SÁBADO DAS 14H00 ÀS 02H00<br />

DOMINGO DAS 12H00 ÀS 02H00<br />

M/3<br />

um novo palco,<br />

uma gran<strong>de</strong><br />

festa!<br />

CO-ORGANIZAÇÃO: SLTM /<br />

APOIO:<br />

SÃO LUIZ TEATRO MUNICIPAL<br />

RUA ANTÓNIO MARIA CARDOSO, 38; 1200-027 LISBOA<br />

GERAL@TEATROSAOLUIZ.PT; T: 213 257 640<br />

DIRECÇÃO<br />

ARTÍSTICA:<br />

CARLOS MARTINS<br />

PRODUÇÃO<br />

EXECUTIVA:<br />

LUÍS HILÁRIO<br />

São Luiz 2009<br />

APOIO À DIVULGAÇÃO:<br />

Ípsilon • Sexta-feira 26 Junho 2009 • 11<br />

silva!<strong>de</strong>signers<br />

WWW.TEATROSAOLUIZ.PT


MANPREET ROMANA/ AFP<br />

<strong>de</strong>u<strong>se</strong><br />

Na Índia só os<br />

Sonia <strong>era</strong> mulher <strong>de</strong> Rajiv, que <strong>era</strong> fi lho <strong>de</strong> Indira, que <strong>era</strong> fi lha <strong>de</strong> Nehru. Só n<br />

Javier Moro escreveu a história <strong>de</strong>sta italiana que ao tornar-<strong>se</strong> Gandhi <strong>por</strong> amor recebe a Índia d<br />

12 • Ípsilon • Sexta-feira 26 Junho 2009<br />

Livros<br />

Uma vida com traços <strong>de</strong> tragédia<br />

grega e peça shakespeariana. Senão<br />

vejamos: o primeiro primeiro-ministro<br />

da Índia, Jawaharlal Nehru,<br />

enquanto está na prisão, tece um sari<br />

que a filha Indira acaba <strong>por</strong> vestir no<br />

dia do <strong>se</strong>u casamento. Es<strong>se</strong> mesmo<br />

pano <strong>se</strong>rá usado <strong>por</strong> uma jovem italiana<br />

quando toma Rajiv, filho <strong>de</strong><br />

Indira, <strong>por</strong> marido. Hoje, Sonia é “a<br />

pessoa mais po<strong>de</strong>rosa do país”. Não<br />

há nada a fazer. Há um <strong>de</strong>stino preso<br />

ao apelido Gandhi e a história recente<br />

indiana não <strong>se</strong> conta <strong>se</strong>m <strong>ele</strong>. O espanhol<br />

Javier Moro não con<strong>se</strong>guiu <strong>de</strong>ixar<br />

<strong>de</strong> ver a vida <strong>de</strong> Sonia como um<br />

fantástico romance, e foi <strong>por</strong> isso que<br />

escreveu “O Sari Vermelho” (Planeta).<br />

No mês passado, e p<strong>ela</strong> <strong>se</strong>gunda<br />

vez, a antiga dona <strong>de</strong> casa que gostava<br />

Sonia Gandhi,<br />

italiana, a pessoa<br />

mais po<strong>de</strong>rosa da<br />

Índia, <strong>se</strong>gundo o livro<br />

<strong>de</strong> Javier Moro<br />

<strong>de</strong> cozinhar massas para a família<br />

levou o Congresso à vitória.<br />

Aceitou a tarefa <strong>de</strong> o lid<strong>era</strong>r,<br />

mas não a <strong>de</strong> chefiar o Governo.<br />

O <strong>se</strong>u papel não é es<strong>se</strong>. A missão<br />

“messiânica” <strong>de</strong> Sonia é a <strong>de</strong><br />

trans<strong>por</strong>tar a tocha para um dia a<br />

po<strong>de</strong>r passar aos filhos.<br />

Como é que con<strong>se</strong>guiu tantos<br />

<strong>de</strong>talhes sobre Sonia Gandhi e<br />

a família, Indira, Raji?<br />

Porque tomei isto como uma op<strong>era</strong>ção<br />

militar. Ao princípio <strong>ela</strong> não<br />

quis colaborar. “Não, não, não”, a<br />

cada entrevista que pedi. <strong>Quando</strong><br />

con<strong>se</strong>gui falar com um amigo <strong>se</strong>u,<br />

<strong>ele</strong> dis<strong>se</strong>-me que não iria contar<br />

nada sobre Sonia Gandhi, <strong>por</strong>que<br />

não queria prejudicar a sua r<strong>ela</strong>ção<br />

com a pessoa mais po<strong>de</strong>rosa do<br />

país.<br />

Não tem dúvidas <strong>de</strong> que é a<br />

pessoa mais po<strong>de</strong>rosa da Índia?<br />

Nenhumas. É a mais po<strong>de</strong>rosa, mas<br />

não usa o <strong>se</strong>u po<strong>de</strong>r como o po<strong>de</strong>ria<br />

fazer. Tem muito po<strong>de</strong>r e <strong>por</strong> isso ninguém<br />

fala. O que teria <strong>ela</strong> a ganhar?<br />

Notorieda<strong>de</strong>? Não precisa. Alguém me<br />

dis<strong>se</strong>: “Repara, <strong>ela</strong> está on<strong>de</strong> está não<br />

<strong>por</strong>que tenha <strong>de</strong><strong>se</strong>jado, mas apesar<br />

disso.” Não lhe interessa que <strong>se</strong><br />

escreva sobre <strong>ela</strong> <strong>por</strong>que não teve um<br />

percurso, uma luta, para contar. Pen<strong>se</strong>i<br />

abandonar o projecto: que <strong>se</strong>ntido<br />

faz contar a história da família através<br />

<strong>de</strong> Sonia, <strong>se</strong> Sonia não colabora? Mas<br />

também pen<strong>se</strong>i outra coisa: conheço<br />

a Índia e <strong>se</strong>i que no fim toda a gente<br />

fala. Se <strong>ela</strong> não quer falar, nem o <strong>se</strong>u<br />

círculo mais íntimo <strong>de</strong> amiza<strong>de</strong>s,


es abandonam o po<strong>de</strong>r<br />

ó não foi primeira-ministra da Índia <strong>por</strong>que não quis. E isso fez d<strong>ela</strong> uma <strong>de</strong>usa.<br />

a <strong>de</strong> h<strong>era</strong>nça. Esta é a história <strong>de</strong> pessoas prisioneiras do <strong>se</strong>u apelido. Francisca Gorjão Henriques<br />

então vou para o <strong>se</strong>gundo, terceiro,<br />

quarto círculo. Elaborei um plano.<br />

Aluguei um apartamento em Nova<br />

Deli, contratei dois investigadores e<br />

um tradutor, que foram aos arquivos<br />

<strong>de</strong> todos os jornais <strong>de</strong> Deli: “Hindustan<br />

Times”, “Asian Age”, “Times of<br />

India”, todos, metodicamente, para<br />

retirar tudo o que <strong>se</strong> publicou sobre<br />

Sonia Gandhi.<br />

E o que revelou isso?<br />

Ao fim <strong>de</strong> 20 anos na Índia, havia muitos<br />

<strong>de</strong>talhes. Uma <strong>de</strong>claração um dia,<br />

algo que dis<strong>se</strong> noutro, num encontro<br />

com uma amiga, ou que saiu numa<br />

revista. Coisas interessantes.<br />

Pessoais?<br />

Sim, pessoais. Era o que eu procurava.<br />

Eu estava à procura da brecha<br />

nesta fortaleza que <strong>era</strong> Sonia Gandhi.<br />

Por on<strong>de</strong> ataco? E encontrei-a graças<br />

a Usha Bhagat, uma <strong>se</strong>nhora muito<br />

velha que foi <strong>se</strong>cretária da Indira Gandhi.<br />

Foi fundamental. Sentia-<strong>se</strong> um<br />

pouco ferida <strong>por</strong> não <strong>se</strong>r tida em<br />

conta p<strong>ela</strong> família, queixa-<strong>se</strong> <strong>de</strong> ter<br />

sido esquecida. Mas comigo quis<br />

falar. É fantástico ter as confidências<br />

da <strong>se</strong>cretária <strong>de</strong> Indira Gandhi, <strong>por</strong>que<br />

tive alguém que viveu <strong>de</strong>ntro<br />

daqu<strong>ela</strong> casa. Procurava o íntimo,<br />

queria saber o que comiam, como<br />

c<strong>ele</strong>bravam os aniversários, como <strong>se</strong><br />

davam Indira e Soni, Sonia e a sua<br />

cunhada [Maneka].<br />

E espantou-o a proximida<strong>de</strong><br />

e cumplicida<strong>de</strong> entre Indira e<br />

Sonia?<br />

Fiquei surpreendido p<strong>ela</strong> personalida<strong>de</strong><br />

<strong>de</strong> Indira. Era fantástica. Um<br />

sonho para um escritor! Parece uma<br />

<strong>de</strong>usa <strong>de</strong> uma tragédia grega, pre-<br />

Não me diga que isto não é um romance? É<br />

skakespeariano! Uma tragédia grega, a força do<br />

<strong>de</strong>stino, que é mais po<strong>de</strong>rosa que a vonta<strong>de</strong><br />

pessoal das personagens Javier Moro<br />

Um “graffi ti” em Calcutá com o rosto da antiga<br />

primeira-ministra Indira Gandhi, que manteve uma r<strong>ela</strong>ção<br />

<strong>de</strong> cumplicida<strong>de</strong> com Sonia<br />

JAYANTA SHAW/ REUTERS<br />

vendo a sua morte, sabia que a iam<br />

matar e vivia obcecada com isso.<br />

Fica-<strong>se</strong> com a <strong>se</strong>nsação <strong>de</strong> que a<br />

certa altura muda <strong>de</strong> foco: larga<br />

Sonia para agarrar Indira.<br />

A personagem <strong>de</strong> Indira é mais dramática.<br />

Do ponto <strong>de</strong> vista do escritor<br />

é mais interessante, <strong>por</strong>que <strong>era</strong> contraditória:<br />

<strong>era</strong> capaz <strong>de</strong> estar “em<br />

guerra” com Nixon ou com o Parlamento,<br />

e voltava a casa, <strong>se</strong>ntava-<strong>se</strong><br />

com Usha Bagat, e dizia-lhe: “Usha,<br />

no dia 9 são os anos <strong>de</strong> Sonia, faz uma<br />

lista <strong>de</strong> pre<strong>se</strong>ntes que lhe possamos<br />

dar.” Era capaz <strong>de</strong> falar a um milhão<br />

<strong>de</strong> pessoas e passadas duas horas<br />

estava no chão a brincar com os netos.<br />

Era assim, fabulosa. Era a mulher forte<br />

<strong>de</strong>sta família.<br />

Fica-<strong>se</strong> com a <strong>se</strong>nsação <strong>de</strong> que<br />

a <strong>de</strong>sculpa muito, que passa as<br />

fazer um estudo histórico e totalmente<br />

objectivo.<br />

Há partes r<strong>ela</strong>tivamente<br />

ficcionadas? Como sabe o<br />

que Sonia <strong>se</strong>ntia em tantos<br />

momentos?<br />

Ficcionadas não, dramatizadas sim.<br />

Chama-<strong>se</strong> não ficção dramatizada.<br />

Não há uma personagem, uma cena,<br />

uma data inventadas, <strong>por</strong>que isso não<br />

faria <strong>se</strong>ntido. Escrevi como um<br />

romance. Com a documentação que<br />

temos, dramatizamos, como numa<br />

peça <strong>de</strong> teatro. Dou um exemplo:<br />

entrevistei um alto funcionário do<br />

Governo indiano do Partido do Congresso<br />

que testemunhou uma cena no<br />

último andar do hospital no dia do<br />

assassinato <strong>de</strong> Indira. Os médicos estavam<br />

a co<strong>se</strong>r o <strong>se</strong>u cadáver, Sonia esp<strong>era</strong>va<br />

a chegada <strong>de</strong> Rajiv e perto havia<br />

“O <strong>de</strong>terminante<br />

[para Sonia assumir<br />

a h<strong>era</strong>nça política]<br />

foi chamar-<strong>se</strong> Gandhi<br />

e o risco <strong>de</strong> <strong>de</strong>ixar<br />

<strong>de</strong> fazer <strong>se</strong>ntido o<br />

sacrifício que tinham<br />

feito Nehru, Indira,<br />

Rajiv [também<br />

assassinado]”<br />

responsabilida<strong>de</strong>s d<strong>ela</strong> para o<br />

filho Sanjay.<br />

Percebo o que está a dizer, mas não é<br />

exactamente isso. É claro que <strong>ela</strong> foi<br />

muito dura e a história julga-a duramente.<br />

O estado <strong>de</strong> emergência [entre<br />

Junho <strong>de</strong> 1975 e Março <strong>de</strong> 1977] não<br />

foi nada simpático, suspen<strong>de</strong>u os<br />

direitos <strong>de</strong>mocráticos do país. Mas eu<br />

sabia uma coisa: não queria fazer um<br />

livro histórico. Aí, obviamente tratála-ia<br />

<strong>de</strong> outra maneira. Para mim,<br />

Indira <strong>era</strong> a sogra <strong>de</strong> Sonia, a mamã<br />

<strong>de</strong> Rajiv. Eu tinha que a ver <strong>de</strong>s<strong>se</strong><br />

ponto <strong>de</strong> vista. Olhar para <strong>ela</strong> como<br />

fazia Sonia, <strong>por</strong>que é es<strong>se</strong> o ponto <strong>de</strong><br />

vista que estou a <strong>se</strong>guir.<br />

E <strong>por</strong>que escolheu Sonia como<br />

personagem principal?<br />

<strong>Quando</strong> morreu Rajiv, eu estava a ver<br />

p<strong>ela</strong> TV e pen<strong>se</strong>i: “Que bonito <strong>se</strong>ria<br />

um pequeno<br />

grupo que viu a cena:<br />

Rajiv chega e diz a Sonia:<br />

“O partido quer que eu assuma o<br />

posto <strong>de</strong> primeiro-ministro hoje<br />

mesmo.” Sonia respon<strong>de</strong>-lhe: “Não<br />

faças isso, não foi o que combinámos.<br />

Combinámos que nunca te meterias<br />

na política, num cargo no Governo.<br />

Vão-te matar.” Ele respon<strong>de</strong>u: “Tem<br />

que <strong>se</strong>r, estão a pedir-mo e eu não<br />

posso dizer que não. São 40 milhões<br />

<strong>de</strong> pessoas do Congresso a pedir.” Ela<br />

começa a chorar e diz: “Vão-te matar,<br />

não o faças.” Chega um membro do<br />

partido e comunica-lhe que está tudo<br />

pronto para <strong>ele</strong> tomar pos<strong>se</strong>, têm <strong>de</strong><br />

partir. Ele vai, <strong>ela</strong> fica sozinha.<br />

Contam-me isto, e o que faço? Vou<br />

ao hospital para <strong>de</strong>screver o que <strong>se</strong> vê<br />

das jan<strong>ela</strong>s, que manchas há na<br />

pare<strong>de</strong>, o cheiro, tudo. É verda<strong>de</strong> que<br />

invento os diálogos, mas com ba<strong>se</strong> no<br />

que me dis<strong>se</strong> aqu<strong>ele</strong> homem. Talvez<br />

não <strong>se</strong>ja 100 <strong>por</strong> cento o que <strong>ele</strong>s diss<strong>era</strong>m,<br />

que <strong>se</strong>ria impossível, mas <strong>se</strong>rá<br />

uns 85 <strong>por</strong> cento.<br />

O que o surpreen<strong>de</strong>u mais em<br />

Sonia Gandhi?<br />

Ela tem muitas coisas surpreen<strong>de</strong>ntes.<br />

A história em si é surpreen<strong>de</strong>nte.<br />

Des<strong>de</strong> o momento em que tive a i<strong>de</strong>ia<br />

<strong>de</strong> escrever este livro p<strong>ela</strong> primeira<br />

vez, no dia da cremação <strong>de</strong> Rajiv Gandhi,<br />

quando <strong>ela</strong> estava <strong>de</strong>sfeita, sozinha,<br />

quando a sua vida já não fazia<br />

<strong>se</strong>ntido, pen<strong>se</strong>i que <strong>se</strong>ria bom escrever.<br />

Mas não tinha final. Aqu<strong>ele</strong> <strong>se</strong>ria<br />

tão triste que não valeria a pena, <strong>se</strong>ria<br />

terrível!<br />

Por isso, [mais tar<strong>de</strong>] comecei o<br />

contar a história <strong>de</strong>sta família através<br />

<strong>de</strong> Sonia. Porque Sonia é os nossos<br />

olhos, o nosso ponto <strong>de</strong> vista. Ela<br />

é a italiana, a oci<strong>de</strong>ntal que po<strong>de</strong>ria<br />

<strong>se</strong>r <strong>por</strong>tuguesa ou espanhola. É<br />

alguém com quem nos po<strong>de</strong>mos<br />

i<strong>de</strong>ntificar. Por isso, tudo está contado<br />

do <strong>se</strong>u ponto <strong>de</strong> vista, e, para<br />

<strong>ela</strong>, Indira não <strong>era</strong> a política capaz<br />

<strong>de</strong> mandar para a prisão antigos amigos,<br />

carradas <strong>de</strong> gente. Era a sogra<br />

boa, avó dos <strong>se</strong>us filhos, que tinha<br />

que carregar com um país às costas.<br />

E que país! Foi uma escolha <strong>de</strong>lib<strong>era</strong>da<br />

que fiz, sabendo que na Índia<br />

me iriam criticar <strong>por</strong> isso.<br />

E criticaram?<br />

O livro ainda não saiu lá. Mas vão<br />

criticar. Eu quis contar um drama<br />

familiar, mas através d<strong>ele</strong> vêem-<strong>se</strong><br />

os últimos anos da Índia. Nunca quis<br />

livro <strong>por</strong><br />

aí, <strong>por</strong> <strong>se</strong>r<br />

um momento chave na sua vida, em<br />

que os <strong>se</strong>us 26 anos na Índia não têm<br />

<strong>se</strong>ntido, <strong>por</strong> que a sua razão <strong>de</strong> <strong>se</strong>r,<br />

que <strong>era</strong> o marido que adorava, está<br />

a <strong>de</strong>sfazer-<strong>se</strong> em cinzas. Equaciona<br />

tudo: “Volto a Itália, que faço? Fico?<br />

Matam-me os filhos.” <strong>Quando</strong><br />

ganhou as <strong>ele</strong>ições em 2004, pen<strong>se</strong>i:<br />

agora sim, há um final. Esta transformação<br />

prodigiosa <strong>de</strong> dona <strong>de</strong><br />

casa, viúva, <strong>de</strong><strong>se</strong>sp<strong>era</strong>da e <strong>de</strong>samparada<br />

em lí<strong>de</strong>r da oposição, primeiro,<br />

e a vencedora das <strong>ele</strong>ições,<br />

caramba! Este é um bom final.<br />

É épico.<br />

É! De repente a vida <strong>de</strong> Sonia Gandhi<br />

toma <strong>se</strong>ntido. Assume a h<strong>era</strong>nça da<br />

família política.<br />

E como é que <strong>ela</strong> <strong>de</strong>u a volta?<br />

Fê-lo em homenagem ao<br />

marido, como foi para <strong>ela</strong>?<br />

Depois da morte <strong>de</strong> Rajiv o partido<br />

<strong>de</strong>sagregava-<strong>se</strong>. É um partido que<br />

não tem muito <strong>se</strong>ntido <strong>se</strong>m um Gandhi<br />

à cabeça. Esta é a história <strong>de</strong> pessoas<br />

prisioneiras do <strong>se</strong>u apelido.<br />

Chamaram-na. Em 1998 o partido<br />

estava na ruína. Foi quando [a filha]<br />

Priyanka e <strong>ela</strong> têm uma reunião, e<br />

Priyanka diz: “Mãe, vamos <strong>de</strong>ixar<br />

que tudo o que os meus avós construíram<br />

vá para o lixo?”<br />

Havia outro argumento: <strong>se</strong> o partido<br />

vai para o lixo, quem paga a<br />

<strong>se</strong>gurança <strong>de</strong> que precisa Sonia para<br />

viver na Índia?<br />

Também foi uma questão<br />

prática, então?<br />

Sim, foram as duas coisas. Não<br />

Ípsilon • Sexta-feira 26 Junho 2009 • 13<br />

ANA BANHA


Jawaharlal Nehru<br />

1889-1964<br />

Nenhum primeiro-ministro<br />

governou durante tanto tempo<br />

como o primeiro-primeiroministro<br />

da Índia: <strong>de</strong> 1947 a<br />

1964. Membro do Partido do<br />

Congresso <strong>de</strong>s<strong>de</strong> jovem, ajudou<br />

a levar o país à in<strong>de</strong>pendência<br />

da coroa britânica, em 1947,<br />

juntamente com Mahatma<br />

Gandhi, o <strong>se</strong>u mentor. Foi um<br />

dos fundadores do Movimento<br />

dos Não Alinhados.<br />

acredito que a questão prática<br />

tenha sido <strong>de</strong>terminante. O <strong>de</strong>terminante<br />

foi chamar-<strong>se</strong> Gandhi e o<br />

risco <strong>de</strong> <strong>de</strong>ixar <strong>de</strong> fazer <strong>se</strong>ntido o<br />

sacrifício que tinham feito Nehru,<br />

Indira, Rajiv [também assassinado].<br />

Havia que fazer alguma coisa, e é aí<br />

que <strong>ela</strong> <strong>de</strong>ci<strong>de</strong> dar um salto que vai<br />

contra a sua natureza. Ela não quer,<br />

não é ambiciosa, nunca quis saber<br />

da política, não sabe mover-<strong>se</strong> n<strong>ela</strong><br />

e o risco é enorme. Conhece os <strong>se</strong>us<br />

limites em economia, política internacional,<br />

tudo. Transforma-<strong>se</strong> e leva<br />

o partido qua<strong>se</strong> à maioria absoluta.<br />

Estas <strong>ele</strong>ições foram<br />

surpreen<strong>de</strong>ntes, não <strong>se</strong><br />

esp<strong>era</strong>va esta vitória do<br />

Congresso.<br />

Sim, e o BJP não dá um passo em<br />

falso. Ela está a sair-<strong>se</strong> muito bem, é<br />

fabulosa para uma pessoa que nunca<br />

quis saber <strong>de</strong> política.<br />

Será <strong>por</strong>que também não <strong>se</strong><br />

expõe <strong>de</strong>masiado?<br />

Não <strong>se</strong> expõe, protege-<strong>se</strong> muito.<br />

Como é que alguém <strong>se</strong>m<br />

passado político con<strong>se</strong>gue<br />

tornar-<strong>se</strong> tão competente no<br />

jogo <strong>de</strong> bastidores?<br />

Entrevistei as freiras, professoras do<br />

colégio on<strong>de</strong> andou, que me diziam<br />

que <strong>ela</strong> <strong>era</strong> conciliadora, tentava<br />

<strong>se</strong>mpre mediar as disputas entre<br />

amigas. E isso agora foi fundamental<br />

para fazer a política <strong>de</strong> coligações.<br />

Imagine Indira Gandhi numa coligação<br />

- <strong>era</strong> impossível. Sonia é muito<br />

hábil nos bastidores e é a isso que <strong>se</strong><br />

<strong>de</strong>dica. Con<strong>se</strong>guiu manter a coliga-<br />

14 • Ípsilon • Sexta-feira 26 Junho 2009<br />

STF<br />

Dinastia Os prisioneiros <strong>de</strong> u<br />

Indira Gandhi<br />

1917-1984<br />

A fi lha <strong>de</strong> Nehru foi a primeira<br />

mulher a ocupar o cargo <strong>de</strong><br />

primeira-ministra da Índia.<br />

Casou-<strong>se</strong> com Feroze Gandhi,<br />

dando assim o nome do<br />

Mahatma Gandhi (com quem<br />

não tinha parentesco, mas uma<br />

forte r<strong>ela</strong>ção <strong>de</strong> amiza<strong>de</strong>) à<br />

gran<strong>de</strong> dinastia política do país.<br />

Teve dois fi lhos, Rajiv e Sanjay.<br />

Em 1984 a chefe do Governo foi<br />

assassinada <strong>por</strong> um extremista<br />

sikh.<br />

ção [formada em 2004 com partidos<br />

<strong>de</strong> esquerda], o que foi muito difícil<br />

com o tratado nuclear [com os EUA,<br />

que levou à saída dos comunistas].<br />

Sonia foi fundamental nes<strong>se</strong><br />

momento?<br />

Foi fundamental, como foi para aplicar<br />

o programa <strong>de</strong> um mês <strong>de</strong> emprego<br />

<strong>por</strong> ano [para quem não tem rendimentos,<br />

sobretudo nas zonas rurais].<br />

São 44 milhões <strong>de</strong> famílias. Lutou contra<br />

[Palaniappan] Chidambaram, que<br />

<strong>era</strong> ministro das Finanças do <strong>se</strong>u próprio<br />

Governo para que o aplicas<strong>se</strong>m,<br />

<strong>por</strong>que <strong>ela</strong> promet<strong>era</strong>-o. Uma parte<br />

da vitória [nas últimas <strong>ele</strong>ições <strong>de</strong><br />

Abril e Maio] foi <strong>por</strong> isso. Ela não <strong>se</strong><br />

esqueceu dos pobres e essa é a marca<br />

Gandhi.<br />

Isso e outra coisa. A <strong>de</strong>claração <strong>de</strong><br />

bens <strong>de</strong> Sonia é uma casa em Itália -<br />

uma casa <strong>de</strong> pedra, simples - e uma<br />

conta no banco, um carro em <strong>se</strong>u<br />

nome e nada mais. Rahul não tem<br />

nada, tem 20 mil rupias na conta bancária,<br />

não tem um carro, uma mota,<br />

um apartamento em <strong>se</strong>u nome. Já a<br />

<strong>de</strong> Maneka [cunhada <strong>de</strong> Sonia, viúva<br />

<strong>de</strong> Sanjay] e Varun [o filho] é outra<br />

coisa.<br />

Curioso como nesta família os que<br />

ambicionam o po<strong>de</strong>r acabam <strong>se</strong>m <strong>ele</strong>,<br />

e os que não o <strong>de</strong><strong>se</strong>jam tornam-<strong>se</strong><br />

governantes. Não me diga que isto não<br />

é um romance? É skakespeariano!<br />

Uma tragédia grega, a força do <strong>de</strong>stino,<br />

que é mais po<strong>de</strong>rosa que a vonta<strong>de</strong><br />

pessoal das personagens.<br />

É mesmo verda<strong>de</strong> que o<br />

Congresso não <strong>se</strong> aguentará <strong>se</strong>m<br />

um Gandhi?<br />

STF<br />

Rajiv Gandhi<br />

1944-1991<br />

Filho mais velho <strong>de</strong> Indira e<br />

Feroze Gandhi, foi primeiroministro<br />

entre 1984 e 1989,<br />

<strong>de</strong>pois da morte da mãe. Era<br />

piloto da Air India, e foi para a<br />

política <strong>por</strong> obrigação. Morreu<br />

em campanha <strong>ele</strong>itoral em 1991,<br />

assassinado <strong>por</strong> um extremista<br />

tamil.<br />

“Sonia é os nossos<br />

olhos, o nosso ponto<br />

<strong>de</strong> vista. Ela é a<br />

italiana, a oci<strong>de</strong>ntal<br />

que po<strong>de</strong>ria <strong>se</strong>r<br />

<strong>por</strong>tuguesa ou<br />

espanhola. É alguém<br />

com quem nos<br />

po<strong>de</strong>mos i<strong>de</strong>ntificar.<br />

Por isso, tudo está<br />

contado do <strong>se</strong>u<br />

ponto <strong>de</strong> vista”<br />

JOHN MACDOUGALL/ AFP<br />

Sonia Gandhi<br />

1946<br />

Casou com Rajiv Gandhi, que<br />

conheceu em Cambridge, em<br />

1968. Tiv<strong>era</strong>m dois fi lhos.<br />

Aceitou lid<strong>era</strong>r o histórico<br />

Partido do Congresso, mas não<br />

tornar-<strong>se</strong> primeira-ministra. A<br />

Forbes consi<strong>de</strong>rou-a em 2004 a<br />

terceira mulher mais po<strong>de</strong>rosa<br />

do mundo. Este ano, p<strong>ela</strong><br />

<strong>se</strong>gunda vez, levou o Partido ao<br />

po<strong>de</strong>r em Nova Deli.<br />

Sonia e o fi lho Rahul: muitos querem vê-lo como primeiro-ministro;<br />

<strong>ele</strong> diz que precisa <strong>de</strong> “experiência” primeiro<br />

JOHN MACDOUGALL/ AFP<br />

Sanjay Gandhi<br />

1946-1980<br />

Seria o sucessor da mãe, Indira.<br />

O fi lho mais novo, <strong>era</strong> o que mais<br />

<strong>se</strong> interessava <strong>por</strong> política. Apesar<br />

<strong>de</strong> não ter cargo ofi cial, foi o<br />

con<strong>se</strong>lheiro <strong>de</strong> Indira no período<br />

mais negro da sua governação, o<br />

estado <strong>de</strong> emergência (1975-<br />

1977). Casou com Maneka, com<br />

quem teve um fi lho, Varun<br />

(também <strong>se</strong> <strong>de</strong>dicam à política,<br />

mas pelo BJP, nacionalista<br />

hindu). Morreu num <strong>de</strong>sastre <strong>de</strong><br />

avião a 23 <strong>de</strong> Junho <strong>de</strong> 1980.<br />

RAVEENDRAN/ AFP


e um apelido<br />

Rahul Gandhi<br />

1970<br />

O fi lho mais velho <strong>de</strong> Sonia e<br />

Rajiv é <strong>de</strong>putado no Parlamento.<br />

Membro do Congresso, <strong>de</strong>cidiu<br />

<strong>se</strong>guir as pisadas dos<br />

antepassados, e a sua<br />

participação na campanha para<br />

as legislativas <strong>de</strong> Abril-Maio<br />

<strong>de</strong>ste ano terá sido im<strong>por</strong>tante<br />

para a vitória. Muitos no partido<br />

querem vê-lo como primeiroministro.<br />

Ele só diz que precisa<br />

<strong>de</strong> “experiência” primeiro.<br />

Para já, haverá Rahul e Priyanka <strong>por</strong><br />

alguns anos. Dentro <strong>de</strong> pouco tempo<br />

Rahul <strong>se</strong>rá primeiro-ministro; o <strong>se</strong>u<br />

pai já o <strong>era</strong> quando tinha a sua ida<strong>de</strong>.<br />

Agora não quer, está cauteloso, mas<br />

acredito que <strong>se</strong>rá o próximo primeiroministro.<br />

Seria a quarta g<strong>era</strong>ção. Dirme-á<br />

que não é saudável, quatro Gandhis.<br />

Mas uma dinastia política não é<br />

uma dinastia como no passado, que<br />

<strong>se</strong>rvia para perpetuar a or<strong>de</strong>m social.<br />

Hoje as dinastias políticas são <strong>ele</strong>itas.<br />

J. F. Kennedy não teria sido Presi<strong>de</strong>nte<br />

[dos EUA], <strong>se</strong> não tives<strong>se</strong> ganho<br />

as <strong>ele</strong>ições. O mesmo <strong>se</strong> passou com<br />

Indira Gandhi e com Sonia. Não é<br />

uma dinastia no <strong>se</strong>ntido <strong>de</strong> ter o<br />

po<strong>de</strong>r absoluto, que reproduz a<br />

pobreza. O povo chama-os.<br />

Mas o povo só chama os que<br />

conhece, e o Congresso<br />

parece manobrar bem<br />

para apre<strong>se</strong>ntar <strong>se</strong>mpre<br />

um Gandhi.<br />

Sim, claro. As pessoas sabem<br />

que um Gandhi não vai <strong>de</strong>itar<br />

a mão aos cofres do Estado. Não roubam.<br />

Nem Sanjay <strong>era</strong> um ladrão. Tinha<br />

outros problemas - <strong>era</strong> um louco que<br />

<strong>se</strong> achava visionário -, mas não <strong>era</strong><br />

corrupto. A corrupção não está na<br />

cúpula do po<strong>de</strong>r, nos Gandhi ou [no<br />

primeiro-ministro, Manmohan] Singh.<br />

Está daí para baixo. Singh, quando vai<br />

aos domingos a um jogo <strong>de</strong> pólo,<br />

insiste em pagar a entrada. Saca das<br />

suas 40 rupias e paga o bilhete!<br />

O Congresso escolheu Sonia <strong>por</strong><br />

pensar que po<strong>de</strong>ria fazer com<br />

<strong>ela</strong> o mesmo que, erradamente,<br />

achava que iria fazer com<br />

FAYAZ KABLI/ REUTERS<br />

Priyanka Vadra<br />

1972<br />

Diz que não tem interes<strong>se</strong> <strong>por</strong><br />

uma carreira política, mas<br />

esteve ao lado da mãe, Sonia, e<br />

do irmão, Rahul, durante a<br />

última campanha. É-lhe<br />

reconhecido um instinto<br />

político e há quem acredite que<br />

<strong>se</strong>guirá o <strong>de</strong>stino da família. É<br />

casada com Robert Vadra, <strong>de</strong><br />

quem tem dois fi lhos, Raihan e<br />

Miraya.<br />

Indira, usá-la e manipulá-la?<br />

Sim, mas as situações são diferentes.<br />

Com Indira o Congresso <strong>era</strong><br />

forte, Nehru acabava <strong>de</strong> morrer e<br />

<strong>ele</strong> <strong>era</strong> a força do país. Não <strong>se</strong> discutia<br />

o po<strong>de</strong>r do Congresso. Mas<br />

com Sonia o partido estava moribundo.<br />

Veja o quão <strong>de</strong><strong>se</strong>sp<strong>era</strong>dos<br />

os barões do Congresso tiv<strong>era</strong>m<br />

que estar para pedir a Sonia, uma<br />

italiana, que assumis<strong>se</strong> a lid<strong>era</strong>nça.<br />

Muitos foram contra, boicotaram-na<br />

até à última. Havia<br />

quem lhe chamas<strong>se</strong> “a puta italiana”.<br />

A campanha contra as suas<br />

origens foi sangrenta: o Vaticano<br />

vai dirigir os <strong>de</strong>stinos da Índia,<br />

diziam.<br />

A política indiana é uma coisa<br />

horrível, mas <strong>ela</strong> soube levar a<br />

coisa. E, ao abandonar o po<strong>de</strong>r,<br />

ficou ainda mais po<strong>de</strong>rosa. Só os<br />

<strong>de</strong>u<strong>se</strong>s abandonam o po<strong>de</strong>r. O normal<br />

é agarrar-<strong>se</strong> a <strong>ele</strong> e roubar tudo<br />

o que <strong>se</strong> con<strong>se</strong>gue, que é o que<br />

fazem <strong>de</strong>s<strong>de</strong> <strong>se</strong>mpre os políticos<br />

indianos. Sonia tornou-<strong>se</strong> ainda<br />

mais ven<strong>era</strong>da pelo povo. A filha <strong>de</strong><br />

um pastor <strong>de</strong> vacas acabou <strong>por</strong> ter<br />

às costas o <strong>de</strong>stino <strong>de</strong> 1200 milhões<br />

<strong>de</strong> pessoas.<br />

Supondo que teria <strong>de</strong> escrever<br />

mais um capítulo do livro, o<br />

que prevê que vá acontecer a<br />

Sonia Gandhi?<br />

Ela vai querer passar a tocha aos<br />

filhos e cumprir o <strong>se</strong>u objectivo:<br />

manter a chama dos Gandhi acesa e<br />

passar para <strong>se</strong>gundo plano. Tem um<br />

<strong>se</strong>ntido muito messiânico do <strong>se</strong>u<br />

papel.<br />

KAMAL KISHORE/ REUTERS<br />

Ípsilon • Sexta-feira 26 Junho 2009 • 15


São canções nostálgicas mas embaladas<br />

<strong>por</strong> um <strong>se</strong>ntido <strong>de</strong> renascença,<br />

aqu<strong>ela</strong>s que Rodrigo Leão apre<strong>se</strong>nta<br />

em “A Mãe”, coadjuvado pelo Cinema<br />

En<strong>se</strong>mble, p<strong>ela</strong> Sinfonietta <strong>de</strong> Lisboa<br />

e <strong>por</strong> Stuart A. Staples dos Tin<strong>de</strong>rsticks,<br />

Neil Hannon dos Divine Comedy<br />

e Daniel Melingo, o argentino, nome<br />

im<strong>por</strong>tante do tango.<br />

Percorrendo várias linguagens<br />

(música contem<strong>por</strong>ânea, clássica,<br />

minimalismo, ambientalismo, tango,<br />

fado) é talvez o disco on<strong>de</strong> rev<strong>ela</strong> uma<br />

<strong>se</strong>nsibilida<strong>de</strong> mais pop, apostando na<br />

maior parte dos casos em estruturas<br />

<strong>de</strong> canção, <strong>se</strong>m per<strong>de</strong>r <strong>de</strong> vista a criação<br />

<strong>de</strong> atmosf<strong>era</strong>s sonhadoras. É es<strong>se</strong><br />

romantismo, essa vonta<strong>de</strong> <strong>de</strong> ir <strong>se</strong>mpre<br />

mais além que, diz <strong>ele</strong>, lhe foi<br />

transmitida p<strong>ela</strong> mãe, que morreu<br />

durante o processo <strong>de</strong> composição.<br />

Todos os <strong>se</strong>us discos contêm<br />

<strong>ele</strong>mentos unificadores,<br />

facilmente reconhecíveis,<br />

mas existem <strong>se</strong>mpre algumas<br />

novida<strong>de</strong>s. Como é que<br />

enquadra “A Mãe” no <strong>se</strong>u<br />

percurso?<br />

É um disco <strong>de</strong> continuida<strong>de</strong>, mas on<strong>de</strong><br />

há vonta<strong>de</strong> <strong>de</strong> explorar coisas que<br />

ainda não tinha feito. Nunca tinha trabalhado,<br />

<strong>por</strong> exemplo, com vozes masculinas,<br />

nem com orquestra, como<br />

aconteceu com a Sinfonietta <strong>de</strong> Lisboa.<br />

Ao nível das harmonias, do trabalho<br />

<strong>de</strong> composição, também existem <strong>por</strong>-<br />

16 • Ípsilon • Sexta-feira 26 Junho 2009<br />

menores que nunca havia explorado.<br />

Mas é um disco, es<strong>se</strong>ncialmente, <strong>de</strong><br />

prolongamento em r<strong>ela</strong>ção ao passado.<br />

Que significado atribui às vozes<br />

masculinas?<br />

A minha música nasce <strong>se</strong>mpre no formato<br />

<strong>de</strong> temas instrumentais. Depois,<br />

em <strong>de</strong>terminada altura, quando já<br />

estou a trabalhar com o Tiago Lopes e<br />

o Pedro Oliveira [co-produtores], é que<br />

começamos a vislumbrar que existem<br />

alguns temas que po<strong>de</strong>riam <strong>se</strong>r cantados.<br />

As vozes masculinas não <strong>era</strong>m<br />

uma obrigação, mas já tinha pensado<br />

nisso. Desta feita aconteceu <strong>de</strong> forma<br />

natural. <strong>Quando</strong> estávamos a ouvir o<br />

tema que o Stuart A. Staples canta,<br />

pensámos todos n<strong>ele</strong>, qua<strong>se</strong> em simultâneo.<br />

O tema do Neil Hannon <strong>era</strong> instrumental,<br />

mas às tantas começamos<br />

a pensar que po<strong>de</strong>ríamos experimentar<br />

uma voz e lembrámo-nos d<strong>ele</strong>. Talvez<br />

inconscientemente o lado pop<br />

esteja mais pre<strong>se</strong>nte neste disco, filtrado<br />

<strong>por</strong> algumas <strong>de</strong>ssas vozes.<br />

Como é que <strong>se</strong> <strong>de</strong>u o<br />

envolvimento dos convidados?<br />

Dei-lhes a ouvir o tema que gostava<br />

que <strong>ele</strong>s cantas<strong>se</strong>m e <strong>ele</strong>s aceitaram.<br />

Foi simples. Hoje em dia estas coisas<br />

po<strong>de</strong>m funcionar <strong>de</strong> forma muito<br />

rápida. Foi o que aconteceu com o Stuart<br />

A. Staples que nos enviou <strong>por</strong> email<br />

a i<strong>de</strong>ia para a letra e <strong>de</strong>pois veio gravar<br />

cá. Com o Neil Hannon falei <strong>por</strong> t<strong>ele</strong>-<br />

O novo<br />

sonho<br />

<strong>de</strong> Rodrigo Leão<br />

No <strong>se</strong>u novo álbum Rodrigo Leão evoca a memória da mãe e das mães. É<br />

ajudado <strong>por</strong> Neil Hannon, Stuart A. Staples ou Melingo. Vítor B<strong>ela</strong>nciano<br />

fone e propus-lhe que <strong>ele</strong> escreves<strong>se</strong><br />

sobre o que lhe apeteces<strong>se</strong>, a partir da<br />

audição da música. Ao Melingo, mais<br />

latino, mais parecido connosco, qua<strong>se</strong><br />

não foi preciso explicar nada. Trocámos<br />

uns emails e, quando chegou,<br />

estava à esp<strong>era</strong> que <strong>ele</strong> cantas<strong>se</strong>, mas<br />

<strong>ele</strong> optou <strong>por</strong> um registo mais falado.<br />

À primeira, não fiquei muito satisfeito,<br />

mas <strong>de</strong>pois arranjámos umas vozes<br />

para o refrão e fez-<strong>se</strong>. <strong>Quando</strong> isso<br />

aconteceu já <strong>ele</strong> estava em Paris. Foi a<br />

partir <strong>de</strong> um estúdio lá que gravou o<br />

que faltava.<br />

Há pouco dizia que este <strong>era</strong><br />

o <strong>se</strong>u disco mais pop, mas é<br />

também mais clássico, como <strong>se</strong><br />

os extremos coabitas<strong>se</strong>m.<br />

Sim, é, simultaneamente, o mais pop<br />

e o mais clássico. O mais clássico <strong>por</strong>que,<br />

p<strong>ela</strong> primeira vez, tive o<strong>por</strong>tunida<strong>de</strong><br />

<strong>de</strong> ter uma orquestra. Es<strong>se</strong> lado<br />

mais clássico já estava pre<strong>se</strong>nte em<br />

temas meus, mas agora está mais evi<strong>de</strong>nciado<br />

através dos arranjos e dos<br />

instrumentos. Ter 30 músicos a tocar<br />

é diferente do que ter um trio. É também<br />

mais pop, p<strong>ela</strong>s vozes e p<strong>ela</strong>s<br />

estruturas. E existe também uma vertente<br />

mais popular, como a música do<br />

Melingo ou aqu<strong>ela</strong> que a<br />

Ana Vi<strong>era</strong> canta<br />

em russo.<br />

“Ter 30 músicos<br />

a tocar<br />

é diferente do<br />

que ter um trio.<br />

É também<br />

mais pop,<br />

p<strong>ela</strong>s vozes e p<strong>ela</strong>s<br />

estruturas”<br />

Música


Ao nível dos ambientes é o <strong>se</strong>u<br />

disco mais grave, solene.<br />

Sim, ao nível das composições e das<br />

harmonias. Mas não transmite tristeza.<br />

Comunica esp<strong>era</strong>nça. Existem inclusive<br />

algumas vozes <strong>de</strong> crianças que, só<br />

<strong>de</strong>pois <strong>de</strong> as ter gravado, comecei a<br />

reflectir sobre o <strong>por</strong>quê. Talvez tenha<br />

a ver com a infância. Nes<strong>se</strong> <strong>se</strong>ntido, é<br />

um disco que nos trans<strong>por</strong>ta para o<br />

passado, o pre<strong>se</strong>nte, o futuro. A vida<br />

e a morte, obviamente, estão pre<strong>se</strong>ntes.<br />

É um disco mais filosófico, no <strong>se</strong>ntido<br />

<strong>de</strong> traduzir essa reflexão sobre o<br />

que andamos aqui a fazer. A minha<br />

mãe ensinou-nos, a mim e aos meus<br />

irmãos, a lidar com o facto <strong>de</strong> todos<br />

nós morrermos um dia. É inevitável,<br />

in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ntemente do menor ou<br />

maior preparo para o aceitar.<br />

Não existe nenhuma r<strong>ela</strong>ção<br />

entre a pre<strong>se</strong>nça das vozes<br />

masculinas e o facto <strong>de</strong> o disco<br />

<strong>se</strong>r centrado na i<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> “mãe”?<br />

Não. O disco é <strong>de</strong>dicado à minha mãe,<br />

mas não é sobre <strong>ela</strong>. É a “mãe” como<br />

alusão universal, no <strong>se</strong>ntido mais poético,<br />

embora existam temas que foram<br />

feitos na altura em que <strong>ela</strong> já estava<br />

muito doente. Ou <strong>se</strong>ja, a influência<br />

d<strong>ela</strong> esteve pre<strong>se</strong>nte.<br />

Que im<strong>por</strong>tância teve a sua mãe<br />

no percurso criativo?<br />

Foi muito im<strong>por</strong>tante. <strong>Quando</strong> tinha<br />

11 ou 12 anos foi <strong>ela</strong> que me chamou<br />

para o mundo da música ou da poesia.<br />

Recordo-me <strong>de</strong> ouvirmos o [João]<br />

Villaret, em casa, a recitar José Régio.<br />

Ou <strong>de</strong> ouvirmos Beethoven. No início<br />

aquilo até podia não me dizer nada,<br />

mas <strong>de</strong>pois começava a entrar. Íamos<br />

também muito ao cinema ou a concertos<br />

na Gulbenkian. Tudo isto <strong>era</strong> incor<strong>por</strong>ado<br />

<strong>de</strong> forma natural. Ou <strong>se</strong>ja,<br />

também brincava na rua e fazia aqu<strong>ela</strong>s<br />

coisas que é suposto fazer-<strong>se</strong> nessas<br />

ida<strong>de</strong>s. Mas mesmo mais tar<strong>de</strong>, no início<br />

da Sétima Legião, <strong>ela</strong> esteve pre<strong>se</strong>nte,<br />

ajudando-nos no título das canções,<br />

<strong>por</strong> exemplo. Foi <strong>se</strong>mpre muito<br />

atenta, ouvindo todas as coisas que ia<br />

fazendo.<br />

Já <strong>de</strong>dicou temas aos filhos.<br />

Agora à mãe. Podia <strong>se</strong>ntir-<strong>se</strong><br />

sugestionado pelo que lhe é<br />

distante, que apenas po<strong>de</strong><br />

imaginar. É aquilo que lhe está<br />

próximo que o inspira?<br />

Há um grupo restrito <strong>de</strong> pessoas com<br />

quem partilho a minha música antes<br />

<strong>de</strong> <strong>ela</strong> <strong>se</strong>r editada. Entre <strong>ela</strong>s, estão os<br />

meus amigos mais próximos, e a família.<br />

Ajudam-me imenso e são, em<br />

simultâneo, uma inspiração. Viajo com<br />

<strong>ele</strong>s, conheço sítios com <strong>ele</strong>s, <strong>por</strong> isso<br />

é muito natural que <strong>ele</strong>s estejam pre<strong>se</strong>ntes.<br />

Em alguns temas são<br />

introduzidos sons concretos que<br />

parecem ter sido registados,<br />

precisamente, em viagens.<br />

Sim, <strong>por</strong>que este disco foi <strong>se</strong>ndo composto<br />

em sítios diferentes. Há dois<br />

anos que ando com um pequeno<br />

teclado que levo para todo o lado. Há<br />

músicas que foram feitas em hotéis,<br />

outras em Goa quando lá fui <strong>de</strong> férias,<br />

no ano passado. Dá uma certa i<strong>de</strong>ia <strong>de</strong><br />

movimento e <strong>de</strong>pois há uma série <strong>de</strong><br />

gravações - algumas registadas com<br />

t<strong>ele</strong>móvel - <strong>de</strong> chuva, <strong>de</strong> pássaros, <strong>de</strong><br />

crianças a brincar, etc. Tudo isso foi<br />

<strong>se</strong>ndo gravado, <strong>de</strong> há um ano a esta<br />

parte, já com essa i<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> os utilizar<br />

no disco.<br />

Dos músicos da g<strong>era</strong>ção <strong>de</strong> 80<br />

que começaram na pop e <strong>se</strong><br />

mantém no activo parece <strong>se</strong>r, na<br />

fa<strong>se</strong> actual, aqu<strong>ele</strong> que tem um<br />

percurso mais consolidado. Tem<br />

alguma explicação?<br />

Des<strong>de</strong> que comecei a fazer discos sozinho,<br />

em 1993, até hoje passaram 16<br />

anos. Nos primeiros 8 anos não <strong>era</strong><br />

muito conhecido. Foram anos em que<br />

me <strong>de</strong>diquei mais à composição, talvez<br />

como reacção ao facto <strong>de</strong> vir da Sétima<br />

Legião e dos Madre<strong>de</strong>us, com quem<br />

<strong>de</strong>i muitos concertos. Só a partir <strong>de</strong><br />

2001, com o “Alma Mater”, as coisas<br />

<strong>se</strong> alt<strong>era</strong>ram e a minha música come-<br />

“Existem algumas<br />

vozes <strong>de</strong> crianças que,<br />

só <strong>de</strong>pois <strong>de</strong> as ter<br />

gravado, comecei<br />

a reflectir sobre o<br />

<strong>por</strong>quê. Talvez tenha<br />

a ver com a infância.<br />

Nes<strong>se</strong> <strong>se</strong>ntido,<br />

é um disco que nos<br />

trans<strong>por</strong>ta para<br />

o passado, o pre<strong>se</strong>nte,<br />

o futuro. A vida e a<br />

morte, obviamente,<br />

estão pre<strong>se</strong>ntes”<br />

çou a chegar a mais pessoas, em parte,<br />

p<strong>ela</strong> aceitação <strong>de</strong> canções como o<br />

“Pasion”. No “Cinema” isso voltou a<br />

acontecer.<br />

Neste, há um ano atrás, pensava<br />

apenas em três músicas cantadas e o<br />

resto <strong>se</strong>ria instrumental, mas as coisas<br />

alt<strong>era</strong>ram-<strong>se</strong>. Como não me imponho<br />

barreiras - inclusive ao nível da língua<br />

- as coisas vão surgindo naturalmente.<br />

Em <strong>de</strong>terminados momentos entro em<br />

pânico ao aperceber-me <strong>de</strong> tantos <strong>ele</strong>mentos<br />

diferentes que <strong>se</strong> têm que ajustar,<br />

mas no fim tudo ganha <strong>se</strong>ntido. E<br />

aí tenho a sorte <strong>de</strong> estar ro<strong>de</strong>ado <strong>de</strong><br />

uma equipa, <strong>de</strong> amigos <strong>de</strong> infância que<br />

me ajudam como o Pedro Oliveira, o<br />

Tiago Lopes ou o Paulo Abelho.<br />

Em termos <strong>de</strong> mercado, dá i<strong>de</strong>ia<br />

que po<strong>de</strong>rá estar a ocupar um<br />

espaço <strong>de</strong>ixado em aberto pelo<br />

menor impacto comercial dos<br />

Madre<strong>de</strong>us nos últimos anos.<br />

Sente isso?<br />

Não <strong>se</strong>i. O facto <strong>de</strong> a Ana Vieira cantar<br />

em <strong>por</strong>tuguês neste momento foi algo<br />

que aconteceu <strong>de</strong>pois <strong>de</strong> uma experiência<br />

há três anos. A partir daí procurámos<br />

uma maneira d<strong>ela</strong> cantar que<br />

parece antiga. Neste disco existe um<br />

tema, “Segredos”, que po<strong>de</strong> lembrar<br />

Madre<strong>de</strong>us. Uma espécie <strong>de</strong> Madre<strong>de</strong>us<br />

nos anos 50. Talvez agora não<br />

tenha problemas em ocupar coisas que<br />

os Madre<strong>de</strong>us faziam. A partir do<br />

momento em que a Ana canta em <strong>por</strong>tuguês,<br />

há uma r<strong>ela</strong>ção mais directa.<br />

Nos espectáculos ao vivo<br />

<strong>se</strong>nte-<strong>se</strong> cumplicida<strong>de</strong> entre<br />

si e os músicos do Cinema<br />

En<strong>se</strong>mble. Todos parecem<br />

verda<strong>de</strong>iramente integrados,<br />

são mesmo um colectivo.<br />

Sim. Por exemplo, a Ana Vieira já<br />

esteve numa posição ingrata, <strong>por</strong>que<br />

cantava apenas canções feitas para<br />

outras pessoas. Agora não. Está muito<br />

mais integrada no En<strong>se</strong>mble e as músicas<br />

que <strong>ela</strong> canta foram compostas<br />

para a sua voz. Se mudas<strong>se</strong>, <strong>de</strong> hoje<br />

para amanhã, a maior parte dos músicos,<br />

evi<strong>de</strong>ntemente, <strong>se</strong>ria outra coisa.<br />

Existe uma filosofia saudável neste<br />

grupo. Não é uma ditadura. Cada um<br />

tem espaço para contribuir com as<br />

suas i<strong>de</strong>ias. Isso é im<strong>por</strong>tante.<br />

Qua<strong>se</strong> todas as pessoas que<br />

já trabalharam consigo<br />

<strong>de</strong>stacam o <strong>se</strong>u lado humano,<br />

a autenticida<strong>de</strong>. Sente que essa<br />

autenticida<strong>de</strong> também a <strong>de</strong>ve,<br />

<strong>de</strong> alguma forma, à sua mãe?<br />

Sem dúvida. Havia um certo romantismo<br />

na forma como <strong>ela</strong> olhava para<br />

o mundo. Tenho isso também. Nem<br />

<strong>se</strong>mpre <strong>se</strong> con<strong>se</strong>gue concretizar todos<br />

os sonhos, mas só aqu<strong>ele</strong>s que <strong>se</strong> permitem<br />

sonhar po<strong>de</strong>m chegar a algum<br />

lado. Ela <strong>de</strong>u-me isso.<br />

Ver crítica <strong>de</strong> discos pág. 26 e <strong>se</strong>gs.<br />

Ípsilon • Sexta-feira 26 Junho 2009 • 17


Subimos p<strong>ela</strong> cida<strong>de</strong>. O típico casario<br />

branco à direita, as muralhas do castelo<br />

à esquerda. Encontramos Nuno<br />

Figueiredo, que nos guia mais acima.<br />

Os carros <strong>se</strong>rpenteiam p<strong>ela</strong>s ruas,<br />

neste final <strong>de</strong> tar<strong>de</strong> quente que guarda<br />

as pessoas em casa. Subindo, lá chegamos.<br />

Terreirinho das Peças. Árvores<br />

alinhadas junto ao miradouro, um lar<br />

<strong>de</strong> apoio à terceira ida<strong>de</strong> e um par <strong>de</strong><br />

velhotes a aventurar-<strong>se</strong> sob o sol. Ao<br />

centro, o bem-vindo quiosque. É na<br />

sua esplanada que nos recebe Jorge<br />

Benvinda. Recepção clássica. Uma<br />

mini e uns caracóis. Perfeito. E muito<br />

conveniente, como veremos mais<br />

tar<strong>de</strong> quando ouvirmos Jorge dizer<br />

algo como “<strong>de</strong>pois <strong>de</strong> uma exposição,<br />

toda a gente gosta da cultura do caracol<br />

e do mini” - falávamos da Galeria<br />

do Desassos<strong>se</strong>go, espaço <strong>de</strong> “petiscos,<br />

espectáculos e exposições” que <strong>ele</strong><br />

dinamiza Jorge Benvinda e que é tasca<br />

e galeria (<strong>se</strong>m hi<strong>era</strong>rquização). Mas já<br />

nos estamos a adiantar.<br />

Jorge e Nuno são os Virgem Suta,<br />

banda que <strong>se</strong> formou em Beja e que<br />

começou a tornar-<strong>se</strong> naquilo que é<br />

hoje, agora que edita o álbum <strong>de</strong><br />

estreia, bem mais a norte. A história<br />

conta-<strong>se</strong> rapidamente. Em 2001, Jorge<br />

Benvinda e Nuno Figueiredo rumaram<br />

até Vila Nova <strong>de</strong> Gaia para participarem<br />

num concurso <strong>de</strong> bandas. Como<br />

Nuno nasceu no Porto e tem <strong>por</strong> lá<br />

família, nunca per<strong>de</strong>riam muito - apenas<br />

tempo e gasolina. Não ganharam.<br />

Mas é certo que não perd<strong>era</strong>m. Portanto,<br />

Jorge e Nuno, duas vozes e duas<br />

guitarras acústicas, em 2001. Acabaram<br />

em <strong>se</strong>gundo e levaram para Beja<br />

o prémio rev<strong>ela</strong>ção. Levaram também,<br />

mais im<strong>por</strong>tante, os contactos <strong>de</strong> dois<br />

membros do júri, Hél<strong>de</strong>r Gonçalves e<br />

Manu<strong>ela</strong> Azevedo, <strong>ele</strong>s dos Clã, <strong>ele</strong>s<br />

que viram naqu<strong>ela</strong>s canções que os<br />

Virgem Suta tocaram com nervosismo<br />

um talento em bruto à esp<strong>era</strong> <strong>de</strong> <strong>de</strong>sabrochar.<br />

Nos anos <strong>se</strong>guintes, autores Virgem<br />

Suta e mentor Hél<strong>de</strong>r Gonçalves trocaram<br />

i<strong>de</strong>ias, eliminaram canções,<br />

aperfeiçoaram <strong>de</strong>talhes e <strong>de</strong>finiram<br />

rumo. Em 2009, eis que o trabalho<br />

frutifica. Oito anos <strong>de</strong>pois da subida<br />

até ao Porto, os Virgem Suta editam<br />

um álbum - e antes que perguntem,<br />

não, <strong>ele</strong>s não acham que tenha sido<br />

tempo <strong>de</strong>mais. “Não tínhamos a presunção<br />

<strong>de</strong> <strong>se</strong>rmos completamente<br />

diferentes. Sabíamos o que não queríamos,<br />

fazer pop <strong>de</strong>scarada com os<br />

arranjos normais. Não sabíamos é<br />

como fugir a isso”, conta Jorge Benvinda.<br />

O processo inicial foi, <strong>por</strong>tanto,<br />

<strong>de</strong> recusa. Juntavam umas quantas<br />

canções, reuniam-<strong>se</strong> com alguns músicos,<br />

ensaiavam, montavam um concerto.<br />

No dia <strong>se</strong>guinte, encontravam-<strong>se</strong><br />

e o comentário <strong>era</strong> invariavelmente o<br />

mesmo: “não <strong>era</strong> aquilo”.<br />

Assim andaram, entre o “não <strong>era</strong><br />

aquilo” e o “como <strong>se</strong> faz aquilo”, até<br />

<strong>de</strong>cidirem pôr <strong>de</strong> parte tudo o resto,<br />

concentrarem-<strong>se</strong> nas suas duas guitarras,<br />

nas suas letras e na voz <strong>de</strong> Benvinda.<br />

Ou <strong>se</strong>ja, <strong>de</strong>cidiram procurar<br />

sozinhos. Entretanto, entrou em cena<br />

Hél<strong>de</strong>r Gonçalves, que <strong>se</strong> assumiu<br />

como produtor. Acumularam canções<br />

e frustrações, gravaram e regravaram,<br />

compus<strong>era</strong>m e recompus<strong>era</strong>m. Avançaram<br />

<strong>por</strong> tentativa e erro, estimulados<br />

<strong>por</strong> um produtor perfeccionista,<br />

em busca daquilo que não sabiam bem<br />

o que <strong>era</strong> - mas que sabiam exacta-<br />

A longa viagem dos Virg<br />

18 • Ípsilon • Sexta-feira 26 Junho 2009<br />

Música<br />

Em 2001, Nuno Figueiredo e Jorge Benvinda sabiam o que não queriam, faltava-lhes <strong>de</strong>scobrir o q<br />

ajuda <strong>de</strong> Hél<strong>de</strong>r Gonçalves, dos Clã. Música pop(ular), canções que resgatadas às vidas da <strong>de</strong> B<br />

encontro. Mário Lopes<br />

CARLOS MANUEL MARTINS


CARLOS MANUEL MARTINS<br />

mente o que não queriam que fos<strong>se</strong>.<br />

Não é <strong>de</strong>cididamente, um percurso<br />

normal.<br />

Eles resguardados em Beja, recusando-<strong>se</strong><br />

a editar maquetes ou dar<br />

concertos enquanto não estives<strong>se</strong> tudo<br />

como queriam. No Porto, Hél<strong>de</strong>r Gonçalves,<br />

entre álbuns <strong>de</strong> Clã e o álbum<br />

<strong>de</strong> Humanos e o “Irmão do Meio” <strong>de</strong><br />

Sérgio Godinho, ia recebendo e encaminhando,<br />

acon<strong>se</strong>lhando. Nada <strong>de</strong><br />

pressas - em contradição com a voragem<br />

da pop, com a sua habitual sofreguidão,<br />

os Virgem Suta lá iam continuando,<br />

lenta mas persistentemente,<br />

<strong>se</strong>m pressas. E agora, oito anos <strong>de</strong>pois<br />

do início <strong>de</strong> todo este processo, Nuno<br />

Figueiredo está <strong>se</strong>ntado numa esplanada<br />

do Terreirinho das Peças a dizernos<br />

que “parece muito tempo, mas foi<br />

o necessário”. Continua: “Fazíamos<br />

música há muito, mas precisávamos<br />

<strong>de</strong> uma linha condutora, <strong>de</strong> um rumo<br />

para algumas canções”. Sentencia:<br />

“Tudo o que vies<strong>se</strong> antes <strong>se</strong>ria precipitado”.<br />

As tascas <strong>de</strong> Beja<br />

Abandonamos o Terreirinho das Peças<br />

em busca <strong>de</strong> cenário a<strong>de</strong>quado à <strong>se</strong>ssão<br />

fotográfica. Nuno <strong>de</strong> guitarra em<br />

punho, Jorge soltando a voz. O primeiro<br />

toca os acor<strong>de</strong>s <strong>de</strong> “Tomo conta<br />

<strong>de</strong>sta tua casa”, single <strong>de</strong> apre<strong>se</strong>ntação<br />

do álbum, o <strong>se</strong>gundo canta-lhe os versos.<br />

Um mini concerto improvisado,<br />

pontuado pelos “pá-ra ra-rai” que surgem<br />

ali <strong>de</strong>pois do refrão, pelo som dos<br />

disparos da máquina fotográfica e pelo<br />

automóvel ocasional, cuja passagem<br />

obriga à interrupção momentânea da<br />

canção.<br />

O fotógrafo escolhe a <strong>por</strong>ta e a<br />

pare<strong>de</strong> em que os enquadrar na rua<br />

<strong>de</strong><strong>se</strong>rta. Enquanto mantêm a po<strong>se</strong><br />

para a foto, uma mulher começa a<br />

subir a rua. Não vem sozinha. O <strong>se</strong>u<br />

rafeiro apressa-<strong>se</strong> mais que <strong>ela</strong>. Avança<br />

resoluto. Os Virgem Suta escolh<strong>era</strong>m<br />

a <strong>por</strong>ta errada para <strong>se</strong>ssões fotográficas<br />

- a d<strong>ele</strong>, naturalmente (os latidos<br />

insistentes não enganam). A mulher<br />

que chega não conhece o bejen<strong>se</strong><br />

Jorge, muito menos Nuno, que abalou<br />

do Porto na adolescência para estudar<br />

na universida<strong>de</strong> <strong>de</strong> Beja. Mas conhece<br />

os Benvinda - e isso é suficiente para<br />

trocar dois <strong>de</strong>dos <strong>de</strong> conversa. Este<br />

tipo <strong>de</strong> coincidências faz parte da<br />

música dos Virgem Suta. Ou melhor,<br />

Como escreveu<br />

Hél<strong>de</strong>r Gonçalves<br />

num texto<br />

<strong>de</strong> apre<strong>se</strong>ntação,<br />

<strong>de</strong> um lado estão os<br />

“textos introspectivos<br />

do Nuno [Figueiredo],<br />

do outro<br />

“as <strong>de</strong>liciosas sátiras<br />

realistas do Jorge<br />

[Benvinda]”<br />

<strong>se</strong>rem <strong>de</strong> uma cida<strong>de</strong> como Beja<br />

enforma aquilo que é a sua música.<br />

“Numa cida<strong>de</strong> gran<strong>de</strong>, cruzas-te com<br />

as pessoas no metro e per<strong>de</strong>s-lhes o<br />

rumo”, afirma Nuno Figueiredo. “Em<br />

Beja, e não <strong>por</strong> uma questão <strong>de</strong> coscuvilhice,<br />

tens a possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> te cruzar<br />

com gente que irás acompanhar <strong>se</strong>mpre<br />

no dia-a-dia - o que te permite facilmente<br />

criar histórias”. A história das<br />

virtu<strong>de</strong>s da “Vovó Joaquina”, que é a <strong>de</strong><br />

Jorge Benvinda, “tramada” na juventu<strong>de</strong><br />

pelo avô que <strong>ele</strong> não conhece, do<br />

“belo vinho” da “Dança <strong>de</strong> balcão”, do<br />

“Homem do mundo” que “não tem<br />

dono, ninguém para o <strong>se</strong>rvir”.<br />

Portanto, Beja é a sua cida<strong>de</strong>, é<br />

daqui que extraem canções - está-lhes<br />

até no nome: suta é um termo local,<br />

“da malta mais nova”, que “<strong>de</strong>signa<br />

um estado caótico, <strong>de</strong> euforia, <strong>de</strong><br />

excesso <strong>se</strong>m controlo”. Os Virgem Suta<br />

adoram Tom Waits e gostam do italiano<br />

Paolo Conte. Admiram a musicalida<strong>de</strong><br />

<strong>de</strong> José Afonso e as letras <strong>de</strong><br />

Sérgio Godinho. Tudo isso há-<strong>de</strong> manifestar-<strong>se</strong><br />

na música, mas o que procuraram<br />

durante os oito anos que <strong>se</strong><br />

<strong>de</strong>moraram a criar “Virgem Suta” <strong>era</strong><br />

outra coisa. Era aquilo que, conta Jorge<br />

Benvinda, vêem na Galeria do Desassos<strong>se</strong>go:<br />

“Pessoas que <strong>se</strong> juntam ao<br />

final da noite e apanham ‘tosgas’ incríveis,<br />

uma coisa fantástica. Conversam<br />

umas com as outras, umas mais tristes,<br />

outras mais eufóricas e, no dia<br />

<strong>se</strong>guinte, cumprimentam-<strong>se</strong> como <strong>se</strong><br />

nada <strong>se</strong> tives<strong>se</strong> passado. Ninguém fala<br />

<strong>de</strong> nada: dos vidros partidos, das contas<br />

<strong>por</strong> pagar, dos amores da mulher”.<br />

O que <strong>ele</strong>s procuravam, pragmaticamente,<br />

<strong>era</strong> pegar em instrumentos da<br />

música popular e, como explica Nuno<br />

Figueiredo, “oferecer-lhes nuances<br />

pop e rock que, ainda assim, <strong>de</strong>nuncias<strong>se</strong>m<br />

um <strong>por</strong>menor <strong>de</strong> bairro”. Era,<br />

es<strong>se</strong>ncialmente, fazer com que as diferentes<br />

personalida<strong>de</strong>s criativas dos<br />

dois Virgem Suta <strong>se</strong> complementas<strong>se</strong>m<br />

harmoniosamente.<br />

Nuno Figueiredo e Jorge Benvinda<br />

conhecem-<strong>se</strong> há muito. São amigos<br />

in<strong>se</strong>paráveis, mas dizem-nos, e nós<br />

vemos, que têm temp<strong>era</strong>mentos diferentes.<br />

Como escreveu Hél<strong>de</strong>r Gonçalves<br />

num texto <strong>de</strong> apre<strong>se</strong>ntação da<br />

banda, <strong>de</strong> um lado estão os “textos<br />

introspectivos do Nuno”, do outro “as<br />

<strong>de</strong>liciosas sátiras realistas do Jorge”.<br />

Este manda vir mais uma mini e um<br />

prato <strong>de</strong> caracóis e rev<strong>ela</strong>-nos que, no<br />

século XVIII, Beja tinha uma tasca <strong>por</strong><br />

cada cinco habitantes (agora tem duas<br />

para vinte mil). Aqu<strong>ele</strong> interrompe-<strong>se</strong><br />

a meio <strong>de</strong> uma resposta e lança o olhar<br />

sobre a planície em frente. Aponta:<br />

“Ser feliz é isto. Entrar na estrada e<br />

cortar <strong>por</strong> aqui fora. Abrir as jan<strong>ela</strong>s e<br />

ver esta vida lá fora”. Duas personalida<strong>de</strong>s,<br />

duas formas <strong>de</strong> olhar que, no<br />

disco, <strong>se</strong> complementam.<br />

Os Virgem Suta já sabiam tudo isto<br />

antes, já viviam tudo isto antes. Faltava-lhes<br />

<strong>de</strong>scobrir como transformálo<br />

em canções. Um acaso levou-os até<br />

Hél<strong>de</strong>r Gonçalves, que viu o po<strong>de</strong>ria<br />

d<strong>ele</strong>s nascer. Eles, não <strong>se</strong> im<strong>por</strong>taram<br />

<strong>de</strong> esp<strong>era</strong>r, que a vida não iria <strong>de</strong>saparecer.<br />

As canções continuariam ali, à<br />

esp<strong>era</strong> que <strong>ele</strong>s lhes <strong>de</strong>s<strong>se</strong>m forma. Eilas<br />

então, exactamente como os Virgem<br />

Suta queriam que <strong>ela</strong>s fos<strong>se</strong>m.<br />

Nuno Figueiredo suspira e sorri:<br />

“Não foi tempo perdido”<br />

Ver crítica <strong>de</strong> discos págs. 26 e <strong>se</strong>gs<br />

gem Suta<br />

o que queriam. Descobriram-no com a<br />

e Beja, a sua cida<strong>de</strong>. O Ípsilon foi ao <strong>se</strong>u<br />

PATROCÍNIO VERÃO NA CASA<br />

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Fundado em 2000<br />

pelos membros da<br />

banda Pedro Luís e A<br />

Pare<strong>de</strong>, o Monobloco<br />

transformou-<strong>se</strong> num<br />

fenómeno da música<br />

brasileira. Tão<br />

original quanto<br />

tradicional, o <strong>se</strong>u<br />

repertório passa<br />

p<strong>ela</strong>s marchinhas<br />

tradicionais,<br />

samba, xote,<br />

forró ou funk,<br />

para além das<br />

canções <strong>de</strong> gran<strong>de</strong>s<br />

nomes da MPB.<br />

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Ípsilon • Sexta-feira 26 Junho 2009 • 19


SUSANA JESUS<br />

Os Smix Smox Smux fazem rock<br />

a ver o Portugal no Coração<br />

O concerto está no “encore” e Palas,<br />

o vocalista e guitarrista que aguenta<br />

estoicamente a terceira guitarra da<br />

noite (na primeira meta<strong>de</strong> da actuação<br />

foram-<strong>se</strong> as cordas <strong>de</strong> duas),<br />

manda toda a gente subir para palco.<br />

Toda a gente sobe. Toda? Não. Um<br />

par <strong>de</strong> incautos mantém-<strong>se</strong> na plateia<br />

e Palas exorta: “O que é que estão aí<br />

a fazer?! Vamos tocar uma música<br />

com tudo cá em cima, ninguém em<br />

baixo”. O par <strong>de</strong> incautos ace<strong>de</strong>.<br />

Toca-<strong>se</strong> a canção, o pessoal salta, a<br />

banda toca, o pessoal ro<strong>de</strong>ia Palas,<br />

abraça Palas e a terceira guitarra da<br />

noite, <strong>por</strong> momentos, <strong>de</strong>ixa <strong>de</strong> <strong>se</strong><br />

ouvir. Rock’n’roll, pois claro.<br />

É certo que o espaço, o Santiago<br />

Alquimista, em Lisboa, esteve longe<br />

<strong>de</strong> esgotar - fos<strong>se</strong> em Braga e a história<br />

<strong>se</strong>ria outra -, mas o cenário tinha o <strong>se</strong>u<br />

quê <strong>de</strong> bizarro. E emblemático. Festa<br />

em palco, plateia vazia. Todos do<br />

mesmo lado. Faz <strong>se</strong>ntido: os Smix<br />

Smox Smux têm essa coisa punk <strong>de</strong><br />

falarem das coisas <strong>de</strong> forma directa e<br />

inteligível, têm es<strong>se</strong> lado mui rock’n’roll<br />

<strong>de</strong> fazer música que pe<strong>de</strong> dança acel<strong>era</strong>da<br />

(e individual, que isto não dá<br />

para pares enrolados).<br />

Este trio que edita agora o <strong>se</strong>u primeiro<br />

álbum, “Eles São os Smix Smox<br />

Smux”, cria música eléctrica que<br />

entusiasma e põe lá <strong>de</strong>ntro histórias<br />

e personagens contadas e tratadas<br />

20 • Ípsilon • Sexta-feira 26 Junho 2009<br />

com humor <strong>de</strong>sconcertante - nunca<br />

nos tínhamos lembrado disto assim,<br />

mas todos reconhecemos o que passa:<br />

<strong>de</strong> t<strong>ele</strong>móveis mo<strong>de</strong>rnaços ao aquecimento<br />

global, das Famel Zundapp<br />

dos subúrbios ao revivalismo urbano<br />

dos anos 1980. E então, no Santiago<br />

Alquimista, dia 19 <strong>de</strong> Junho, lá estava<br />

a banda a cantar “<strong>ele</strong>s são os Smix<br />

Smox Smux” e o pessoal a repetir<br />

“<strong>ele</strong>s são os Smix Smox Smux”. Tudo<br />

no palco. Ninguém na plateia. A<br />

música é d<strong>ele</strong>s, mas estamos todos<br />

juntos nisto. Uma festa.<br />

Na casa <strong>de</strong> banho com...<br />

Horas antes, entrávamos nos bastidores<br />

da sala para entrevistar o trio.<br />

Espaço <strong>de</strong>vidamente caótico, ou não<br />

fos<strong>se</strong> partilhado <strong>por</strong> três bandas - os<br />

Smix Smox Smux e também os De<strong>se</strong>rto<br />

Branco e a Armada, que as<strong>se</strong>guraram<br />

a primeira parte do concerto. A entrevista,<br />

numa <strong>de</strong>cisão <strong>se</strong>nsata, <strong>de</strong>correu<br />

então no único espaço on<strong>de</strong> imp<strong>era</strong>va<br />

algum silêncio. Es<strong>se</strong>: a casa <strong>de</strong> banho.<br />

E é ali, entre a aparição <strong>de</strong> um amigo<br />

da banda, armado com um “bongo”<br />

imponente, e <strong>de</strong> um dos Dirty Two, a<br />

dupla <strong>de</strong> DJs bracaren<strong>se</strong> que, naqu<strong>ela</strong><br />

noite, <strong>se</strong> ocupou dos pratos, que ouviremos<br />

o baixista José Figueiredo (o<br />

Smix) <strong>de</strong>finir a música <strong>de</strong> “Eles São os<br />

Smix Smox Smux”. Coisa séria: “um<br />

grito sarcástico em r<strong>ela</strong>ção à socieda<strong>de</strong><br />

<strong>de</strong> consumo”. “Mas feita <strong>por</strong> alguém<br />

que está <strong>por</strong> <strong>de</strong>ntro. Também a aproveitamos,<br />

também somos vítimas<br />

d<strong>ela</strong>”, apressa-<strong>se</strong> a acrescentar Filipe<br />

Palas (o Smox). Certamente. Ouça-<strong>se</strong><br />

“Animal vegetal”. Vozes em fal<strong>se</strong>te póspunk<br />

e bateria em modo dançante:<br />

“Não faço nada / Às quatro da madrugada<br />

/ Não faço nenhum / Ao meio dia<br />

e cinquenta e um / Fico no sofá / A ver<br />

t<strong>ele</strong>visão / Crio raízes / Enquanto vejo<br />

o Portugal no Coração”. A classificação<br />

<strong>de</strong> José Figueiredo é, claro, uma análi<strong>se</strong><br />

a posteriori. Como nos diz o baterista<br />

Miguel Macieira (o Smux), “isto é<br />

música para fugir ao aborrecimento<br />

do nosso dia-a-dia”. São, dizemos nós,<br />

canções que fogem ao politicamente<br />

correcto, que exploram o non<strong>se</strong>n<strong>se</strong>,<br />

que louvam o “Uísqui” (“quanto mais<br />

velho melhor, quanto mais cedo<br />

melhor”) e o aquecimento global <strong>por</strong>que,<br />

com <strong>ele</strong>, “finalmente há praia em<br />

Braga”: canções que abordam “temas<br />

estúpidos que estão à nossa frente e<br />

<strong>de</strong> que ninguém fala” - a eloquência é<br />

<strong>de</strong> Filipe Palas, <strong>ele</strong> que recusará qualquer<br />

referência específica para aquilo<br />

que cantam. Resume-o assim: “tradição<br />

oral e o sotaque <strong>de</strong> Braga”.<br />

A tentação é concentrarmo-nos no<br />

humor, no sarcasmo e nas referências<br />

das letras, e esquecermo-nos do resto.<br />

Esquecermo-nos que, como testemunhámos<br />

no concerto no Santiago<br />

“Não faço nada / Às<br />

quatro da<br />

madrugada / Não<br />

faço nenhum / Ao<br />

meio dia e cinquenta<br />

e um / Fico no sofá / A<br />

ver t<strong>ele</strong>visão / Crio<br />

raízes / Enquanto<br />

vejo o Portugal no<br />

Coração”<br />

Alquimista, os Smix Smox Smux são<br />

um <strong>por</strong>tento rock’n’roll <strong>de</strong> riffs empolgantes<br />

e <strong>se</strong>cção rítmica certeira. O<br />

som é cru, mas cabem ali os crescendos<br />

sónicos dos Pavement ou o gingar<br />

do funk (via pós-punk, entenda-<strong>se</strong>),<br />

numa dinâmica <strong>de</strong> power-trio que, ao<br />

vivo, <strong>se</strong> torna irresistível - os longos<br />

discursos <strong>de</strong> Palas, extensão improvisada<br />

daquilo que canta no álbum, são<br />

um extra.<br />

“As pessoas têm na cabeça o mito<br />

que, tocando apenas com um baixo,<br />

uma bateria e uma guitarra, é simples<br />

fazer canções. Completamente mentira”,<br />

acentua José Figueiredo. “Quanto<br />

Música<br />

O álbum <strong>de</strong> estreia dos bracaren<strong>se</strong>s tem canções que fogem ao politicamente correcto,<br />

que exploram o non<strong>se</strong>n<strong>se</strong>, que louvam o “Uísqui” e o aquecimento global <strong>por</strong>que, com <strong>ele</strong>,<br />

“fi nalmente há praia em Braga”. Humor <strong>de</strong>sconcertante, rock empolgante. Mário Lopes<br />

menos dispositivos estão disponíveis,<br />

mais temos que fazer com cada um<br />

para que <strong>se</strong> integrem e funcionem uns<br />

com os outros”. O baixista saberá do<br />

que fala. Toca também nos Peixe:<br />

Avião, banda <strong>de</strong> uma <strong>se</strong>nsibilida<strong>de</strong><br />

absolutamente diferente - tem órgãos<br />

e sintetizadores, tem vários <strong>ele</strong>mentos<br />

contribuindo para uma massa sonora<br />

cuidadosamente texturada. Aliás, os<br />

Smix Smox Smux tocam muito há<br />

muito tempo, ponto. Estiv<strong>era</strong>m no<br />

passado em várias bandas e até <strong>se</strong><br />

encontravam como membros <strong>de</strong> algumas<br />

d<strong>ela</strong>s. Há alguns anos, reuniram<strong>se</strong><br />

em trio. Clan<strong>de</strong>stinamente, o que<br />

soa a<strong>de</strong>quado: “O Zé tinha as chaves<br />

<strong>de</strong> uma escola <strong>de</strong> música e íamos para<br />

lá tocar às duas da manhã”, conta<br />

Miguel Macieira. Nessa altura, <strong>era</strong>m<br />

uma banda substancialmente diferente.<br />

A abordagem <strong>era</strong> a mesma, mas<br />

tocavam com guitarra acústica, bateria<br />

com vassouras e contrabaixo. Deixaram-<strong>se</strong><br />

disso. Electrificaram-<strong>se</strong> e <strong>de</strong>ixaram<br />

a clan<strong>de</strong>stinida<strong>de</strong>.<br />

Ob<strong>se</strong>rvam a rua, ob<strong>se</strong>rvam os<br />

outros e a si próprios e cantam-nos<br />

tudo o que isso lhes diz - <strong>de</strong> forma<br />

inesp<strong>era</strong>da, que nunca nos lembrámos<br />

<strong>de</strong> dizê-lo assim. Naturalmente.<br />

Afinal, nós somos nós. Eles são os<br />

Smix Smox Smux.<br />

Ver crítica <strong>de</strong> discos págs. 26 e <strong>se</strong>gs


Música<br />

St Vincent fez um disco<br />

<strong>de</strong> gente crescida<br />

“Actor” é um disco monumental <strong>de</strong> orquestrações alucinadas, que <strong>se</strong> ouve como quem<br />

cai num pesa<strong>de</strong>lo. De <strong>se</strong>u verda<strong>de</strong>iro nome Annie Clark, St Vincent quis agora fazer um disco<br />

com “um lado mais perturbador e repugnante”. João Bonifácio<br />

22 • Ípsilon • Sexta-feira 26 Junho 2009<br />

Olhem bem para a cara d<strong>ela</strong> na capa<br />

<strong>de</strong> “Actor”: os olhos gran<strong>de</strong>s, esbugalhados,<br />

ver<strong>de</strong>s, as sobrancelhas tratadas,<br />

o nariz fino, os cabelos entre o<br />

ondulado e o encaracolado, o rosto<br />

alvo, o pescoço estreito, o queixo <strong>de</strong>finido,<br />

o qua<strong>se</strong> sorriso a <strong>de</strong>spontar.<br />

Aqu<strong>ele</strong> rosto faz-nos imaginar<br />

pequenas neuro<strong>se</strong>s a encaracolarem<br />

as pontas dos cabelos, cri<strong>se</strong>s amorosas,<br />

turbilhões internos. Imaginamos<br />

cenários tenebrosos: que <strong>ela</strong> podia <strong>se</strong>r<br />

uma irmã mais nova da insu<strong>por</strong>tável<br />

Regina Spektor, uma PJ Harvey mais<br />

mansinha.<br />

Quem ouviu “Marry Me”, o primeiro<br />

disco, lançado há dois anos, encontrou<br />

um álbum centrado nas inevitáveis<br />

questões hormonais. Havia boas melodias<br />

não convencionais, algo que a<br />

distanciava do universo da Spektor. As<br />

letras, pe<strong>se</strong> a temática, tinham “wit”.<br />

E, além da guitarra, o disco estava<br />

cheio <strong>de</strong> Moogs, piano e outros instrumentos<br />

que <strong>ela</strong> própria tocou.<br />

Tudo pontos a favor.<br />

Ainda assim parecia uma<br />

mulherzinha.<br />

Mas <strong>de</strong>pois <strong>ela</strong> diz: “Não é que<br />

neste disco eu qui<strong>se</strong>s<strong>se</strong> tirar a<br />

parte caprichosa da minha<br />

música. Mas queria juntar um lado<br />

mais perturbador e repugnante.”<br />

Isto é St Vincent a referir-<strong>se</strong> ao processo<br />

que a levou ao <strong>se</strong>gundo disco, o<br />

mencionado “Actor”, e, ao mesmo<br />

tempo, é St Vincent a admitir<br />

que havia um lado<br />

“queridinho” na sua<br />

música com o qual<br />

não quer ficar<br />

exclusivamente<br />

conotada.<br />

Ela diz:<br />

“Acho que <strong>era</strong><br />

muito nova<br />

quando<br />

escrevi o<br />

primeiro<br />

disco.<br />

Era um<br />

daqu<strong>ele</strong>s discos sobre ‘como a vida é’,<br />

ainda <strong>por</strong> cima <strong>de</strong> um ponto <strong>de</strong> vista<br />

romântico. Era um disco <strong>de</strong> rapariguinha.”<br />

Não per<strong>de</strong> tempo e atira, com<br />

resolução: “Se há coisa que queria <strong>era</strong><br />

fazer este disco do ponto <strong>de</strong> vista <strong>de</strong><br />

um adulto.”<br />

Sabemos como po<strong>de</strong> <strong>se</strong>r assustador<br />

misturar as palavras “pop” e “adulto”<br />

numa só fra<strong>se</strong>, mas St Vincent está<br />

longe <strong>de</strong> querer brincar no mesmo<br />

campeonato dos U2. Por “adulto” <strong>ela</strong><br />

quer apenas dizer que “queria fazer<br />

um disco <strong>de</strong> gente crescida, com as<br />

emoções e as perturbações e neuro<strong>se</strong>s<br />

das gentes crescidas”.<br />

O disco adulto <strong>de</strong> St Vincent é<br />

“Actor”: 11 canções<br />

Roubou o nome<br />

ao hospital on<strong>de</strong><br />

Dylan Thomas<br />

morreu. Ela gosta<br />

<strong>de</strong> <strong>por</strong>menores<br />

<strong>de</strong>stes, “com um certo<br />

negrume”, e diz que<br />

a sua “b<strong>ele</strong>za frágil”<br />

e a sua “intensida<strong>de</strong>”<br />

“não são<br />

mutuamente<br />

exclusivas”<br />

disfuncionais, que parecem caixinhas<br />

<strong>de</strong> música estragadas,<br />

trespassadas <strong>por</strong> uma imensa<br />

paleta <strong>de</strong> instrumentos: cordas<br />

ora sumptuosas, ora assustadoras,<br />

sopros, metais, cordofones<br />

e a sua amada guitarra<br />

eléctrica, o <strong>se</strong>u primeiro instrumento.<br />

A <strong>de</strong>scrição que <strong>ela</strong> oferece<br />

para o disco é exacta: cada canção<br />

soa à banda-sonora <strong>de</strong> um<br />

processo <strong>de</strong> <strong>de</strong>sintegração<br />

mental (e ainda assim<br />

tudo é melodicamente<br />

irrepreensível).<br />

Rocker a sério<br />

É o disco que faz<br />

d<strong>ela</strong> um caso<br />

sério, o disco<br />

que acaba com<br />

a imagem <strong>de</strong> menininha.<br />

Imagem<br />

errada, diga-<strong>se</strong>, <strong>por</strong>que<br />

há n<strong>ela</strong> uma<br />

rocker a sério. De <strong>se</strong>u<br />

verda<strong>de</strong>iro nome<br />

Annie Clark, esta<br />

rapariga <strong>de</strong> quem<br />

Andrew Bird e Bon<br />

Iver são fãs nasceu no<br />

Texas, “nos subúrbios<br />

<strong>de</strong> Dallas”,<br />

numa “família católica<br />

com mais <strong>se</strong>te<br />

irmãos” e “aos 13<br />

anos” já tocava<br />

guitarra. Passou<br />

uma parte da adolescência<br />

enfiada<br />

no quarto “a<br />

ouvir o que passas<strong>se</strong><br />

na rádio” e<br />

a apren<strong>de</strong>r a<br />

tocar.<br />

A outra parte<br />

da adolescência,<br />

contou ao<br />

“New York Times”, passou-a como<br />

“tour manager” <strong>de</strong> um tio chamado<br />

Tuck Andress. Isto não é a típica vida<br />

<strong>de</strong> “menininha”.<br />

Fez parte da 100 Guitar Orchestra<br />

<strong>de</strong> Glenn Branca e aos 23 anos juntou<strong>se</strong><br />

aos Polyphonic Spree. Mais tar<strong>de</strong>,<br />

fez parte da banda <strong>de</strong> Sufjan Stevens.<br />

Depois abriu concertos para os Arca<strong>de</strong><br />

Fire e para os National, já como St Vincent.<br />

Roubou o nome ao hospital on<strong>de</strong><br />

Dylan Thomas morreu. Ela gosta <strong>de</strong><br />

<strong>por</strong>menores <strong>de</strong>stes, “com um certo<br />

negrume”, e diz que a sua “b<strong>ele</strong>za frágil”<br />

e a sua “intensida<strong>de</strong>” “não são<br />

mutuamente exclusivas”.<br />

Ouvindo “Actor”, conclui-<strong>se</strong> que<br />

não, não são. “Actor” po<strong>de</strong> parecer o<br />

disco <strong>de</strong> alguém que não está a bater<br />

bem da cabeça, mas acima <strong>de</strong> tudo é<br />

o disco <strong>de</strong> quem não teve nada na<br />

cabeça durante <strong>de</strong>masiado tempo.<br />

“An<strong>de</strong>i em digressão um ano e meio,<br />

e quando cheguei ao fim parecia que<br />

não tinha cérebro. É um meio <strong>de</strong> op<strong>era</strong>r<br />

tão específico que quando cheguei<br />

ao fim <strong>se</strong>nti que tinha vivido muito,<br />

mas não con<strong>se</strong>guia <strong>se</strong>quer acercar-me<br />

do que tinha vivido. Parecia que não<br />

tinha retido nada.”<br />

(Clark diz <strong>se</strong>r uma mulher “ob<strong>se</strong>ssiva”:<br />

“Com os discos, <strong>por</strong> exemplo.<br />

Tendo a ficar ob<strong>se</strong>ssiva com um e<br />

ouço-os exclusivamente durante<br />

me<strong>se</strong>s. Neste momento são os Dirty<br />

Projectors”.)<br />

Sozinha em casa, em Brooklyn,<br />

<strong>de</strong>pois da digressão, só havia uma<br />

ob<strong>se</strong>ssão: um “bloqueio <strong>de</strong> escrita,<br />

que é uma coisa pavorosa”. Ela não<br />

con<strong>se</strong>guia escrever, <strong>por</strong> mais que tentas<strong>se</strong>.<br />

“Por isso comecei a ver muitos<br />

filmes. E acabei <strong>por</strong> inventar as minhas<br />

bandas-sonoras para os meus filmes<br />

favoritos”. Daí o nome “Actor”.<br />

Clark escreveu “a maior parte do<br />

disco no PC”, no <strong>se</strong>u “apartamento,<br />

para não fazer barulho para os vizinhos”.<br />

Diz gravar em computadores<br />

“<strong>de</strong>s<strong>de</strong> os 13 anos”. Não usou instrumentos<br />

reais. Samplou-os, <strong>de</strong>pois<br />

introduziu “as notas pelo MIDI” e<br />

modificou “o som até ficar contente”.<br />

Daí também alguma da estranheza do<br />

disco. Não havia regras, apenas<br />

manias: “Gosto imenso <strong>de</strong> dissonâncias,<br />

u<strong>se</strong>i-as imenso <strong>por</strong>que criam um<br />

ambiente ligeiramente assustador”.<br />

“As canções não correspon<strong>de</strong>m<br />

obrigatoriamente a nenhum filme”,<br />

esclarece Clark, que também é uma<br />

mulher <strong>de</strong> livros e gosta <strong>de</strong> ler Susan<br />

Sontag. “Apenas os u<strong>se</strong>i como inspiração”,<br />

acrescenta. A título <strong>de</strong> curiosida<strong>de</strong>,<br />

fique-<strong>se</strong> a saber que a colecção<br />

<strong>de</strong> cinema visto ia “<strong>de</strong> ‘Badlands’ [<strong>de</strong><br />

Terrence Malick] ao ‘Feiticeiro <strong>de</strong> Oz’,<br />

passando <strong>por</strong> Stardust Memories [<strong>de</strong><br />

Woody Allen]”. (Clark é fã <strong>de</strong> Woody<br />

Allen e acha que “toda a gente <strong>de</strong>via<br />

ver ‘Stardust Memories’”.)<br />

<strong>Quando</strong> lhe perguntámos <strong>por</strong>que<br />

razão resolveu ver cinema para vencer<br />

o <strong>se</strong>u bloqueio <strong>de</strong> escrita, Clark respon<strong>de</strong>u:<br />

“Basicamente, sou uma pessoa<br />

muito cerebral”. Talvez. Mas só <strong>se</strong><br />

partirmos do princípio que o cérebro<br />

está cheio <strong>de</strong> carne.<br />

Ver crítica <strong>de</strong> discos pág. 26<br />

e <strong>se</strong>gs.


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Música<br />

24 • Ípsilon • Sexta-feira 26 Junho 2009<br />

Talvez <strong>se</strong> lembrem <strong>de</strong> “Broken Flowers”.<br />

Era uma fita <strong>de</strong> Jim Jarmusch,<br />

em que um Bill Murray enfadado ia à<br />

procura da mãe do filho que <strong>de</strong>sconhecia<br />

ter. Era um pequeno filme <strong>de</strong><br />

silêncios e gestos mínimos, com uma<br />

b<strong>ela</strong> banda-sonora, que fez muito p<strong>ela</strong><br />

carreira <strong>de</strong> Holy Golightly. Mas também<br />

<strong>de</strong> Mulatu Astatké. Havia três<br />

faixas do etíope na BSO <strong>de</strong> “Broken<br />

Flowers”: “Yegelle Tezeta”, “Yekermo<br />

Sew” e “Gubelye”. Entravam no filme<br />

como parte <strong>de</strong> uma suposta mixtape<br />

que <strong>era</strong> oferecida a Bill Murray para a<br />

sua viagem. Mas “Yegelle Tezeta” em<br />

particular tornou-<strong>se</strong> um culto: tinha<br />

uma figura <strong>de</strong> órgão marado plena <strong>de</strong><br />

groove, uma linha <strong>de</strong> baixo redonda<br />

em fundo, um saxofone estranhíssimo.<br />

Era irresistível, uma nova visão<br />

do funk ou, talvez, uma velha visão<br />

do funk.<br />

“Eu já tinha o público do jazz,<br />

<strong>de</strong>pois pas<strong>se</strong>i a ter o público do<br />

cinema”, diz Mulatu Astatké, ao t<strong>ele</strong>fone<br />

<strong>de</strong> Londres. É um tipo que diz o<br />

que tem a dizer e nem uma palavra a<br />

mais. Seco mas não mal educado, e<br />

nitidamente <strong>se</strong>guro do <strong>se</strong>u valor e<br />

orgulhoso dos <strong>se</strong>us feitos.<br />

“Broken Flowers” po<strong>de</strong> ter exposto<br />

Astatké a uma nova g<strong>era</strong>ção, mas a<br />

reavaliação da sua música tinha começado<br />

anos antes: em 1998 a série <strong>de</strong><br />

CDs “Ethiopiques” (uma gran<strong>de</strong> Bíblia<br />

da música etíope) tinha <strong>de</strong>dicado todo<br />

o <strong>se</strong>u “vol IV” a Mulatu. O que lá <strong>se</strong><br />

encontra é um espanto: uma nova<br />

(velha) música negra que fazia a ponte<br />

entre a Etiópia e a soul, o jazz, o funk.<br />

Para toda uma g<strong>era</strong>ção que só chegava<br />

a Astatké com “Broken Flowers” o<br />

veredicto <strong>era</strong> simples: tínhamos <strong>de</strong>scoberto<br />

um novo génio.<br />

“Criei a Ethio-jazz music [música<br />

etíope com influências <strong>de</strong> jazz] há 40<br />

anos. Ao início na Etiópia, não gostavam.<br />

Ficaram zangados comigo. Mas<br />

agora todos tocam, etíopes e até<br />

mesmo alemães e americanos”, diz<br />

Mulatu, finalmente rindo um pouco.<br />

Do passado ao futuro<br />

Tem razões para rir. O novo disco é um<br />

assombro, um torpedo que vem do<br />

passado a mil à hora e já ultrapassou<br />

o futuro. “Inspiration Information” é<br />

um disco a meias com os Heliocentrics,<br />

a banda que durante anos tocou com<br />

DJ Shadow. É um disco que atravessa<br />

toda a música negra americana usando<br />

as lições <strong>de</strong> música etíope que Astatké<br />

<strong>de</strong>u ao longo dos anos. Funk, soul,<br />

R&B, jazz, tudo coexiste aqui, atravessado<br />

<strong>por</strong> uma espécie <strong>de</strong> psica<strong>de</strong>lismo<br />

cósmico e um puro po<strong>de</strong>r <strong>de</strong> dança.<br />

“Os Heliocentrics contactaram-me<br />

para fazer um concerto em Londres”,<br />

recorda Astatké. “Não os conhecia <strong>de</strong><br />

lado algum. Eles tocam música mais<br />

<strong>ele</strong>ctrónica mas têm amor p<strong>ela</strong> minha<br />

música, <strong>por</strong> isso aceitei o convite.”<br />

Astatké é parco em encómios e <strong>de</strong>scrições<br />

excessivas: para <strong>ele</strong> o milagre<br />

que acontece no disco é simples:<br />

“Tocámos a minha música e também<br />

alguma música d<strong>ele</strong>s e a mistura ficou<br />

muito boa”.<br />

É mais que isso, claro: é um disco<br />

<strong>de</strong> uma profusão sonora impressionante,<br />

que recorre a um imenso naipe<br />

<strong>de</strong> metais, sopros, cordas, pianos,<br />

órgãos, percussões digitais e orgânicas,<br />

guitarras, vibrafones, e até a harpa<br />

etíope eléctrica inventada <strong>por</strong> Astatké,<br />

o krar. A “Dusted Magazine”, a BBC, a<br />

PopMatters, a revista “Impo<strong>se</strong>” atiraram-<strong>se</strong><br />

ao ar quando botaram ouvidos<br />

“Já não ouço música<br />

<strong>de</strong> ninguém. Só<br />

a minha. <strong>Quando</strong> <strong>se</strong><br />

ouve muito a música<br />

dos outros tem-<strong>se</strong><br />

tendência a imitar e<br />

eu quero <strong>se</strong>r original”<br />

na rod<strong>ela</strong>: aos 66 anos o velho Astatké<br />

tinha acertado em cheio outra vez.<br />

Mas tudo isto podia nunca ter acontecido.<br />

A música foi, simplesmente,<br />

um acaso tremendamente feliz.<br />

“<strong>Quando</strong> eu <strong>era</strong> miúdo na Etiópia<br />

ouvia <strong>de</strong> tudo o que passava na rádio”,<br />

lembra o vibrafonista, “mas na Etiópia<br />

nunca toquei música. Em África não<br />

ouvia muito jazz. Foi em Londres que<br />

comecei a ouvir mais”.<br />

Foi para Londres - imagine-<strong>se</strong> - estudar<br />

engenharia. “Comecei a ir a concertos<br />

<strong>de</strong> jazz”, conta, e <strong>de</strong>pois começou<br />

a “experimentar tocar um pouco”:<br />

aqu<strong>ela</strong> música não lhe saía da cabeça.<br />

“Estu<strong>de</strong>i no Trinity College Music of<br />

London e comecei a tocar com músicos<br />

<strong>de</strong> jazz. Foram <strong>ele</strong>s que me d<strong>era</strong>m<br />

o contacto <strong>de</strong> Berk<strong>ele</strong>y”. Mulatu foi o<br />

primeiro africano a estudar na Universida<strong>de</strong><br />

<strong>de</strong> Berklee, em Boston. Tornou<strong>se</strong><br />

um vibrafonista e um pianista <strong>de</strong><br />

excepção, mas a sua marca d’água são<br />

os arranjos, estranha concepção <strong>de</strong><br />

harmonia que faz parecer com que a<br />

música esteja a pairar no ar antes <strong>de</strong><br />

explodir <strong>de</strong> ritmo.<br />

A sua carreira é impressionante,<br />

mas é a invenção do Ethio-jazz que o<br />

enche <strong>de</strong> orgulho. Isso e ter tocado<br />

com Duke Ellington nos anos 70.<br />

“Tocar com o Duke foi extraordinário.<br />

Falávamos muito sobre música africana.<br />

Ele tinha vonta<strong>de</strong> <strong>de</strong> conhecer<br />

essa cultura - <strong>era</strong> es<strong>se</strong>ncial para po<strong>de</strong>r<br />

criar música”.<br />

As suas obras a solo são <strong>de</strong> uma<br />

heterogeneida<strong>de</strong> rara, indo à música<br />

afro-latina, aproximando-<strong>se</strong> mais do<br />

jazz, mais do funk, mais da música<br />

etíope. Nos últimos anos tem-<strong>se</strong> entretido<br />

“a escrever óp<strong>era</strong>, continuar a<br />

fazer música <strong>de</strong> fusão e ensinar miúdos<br />

a <strong>se</strong>rem criativos”. É um advogado<br />

do trabalho duro, que afiança que “<strong>se</strong><br />

<strong>se</strong> trabalha muito as pessoas convidam-nos<br />

a voltar e querem ouvir-nos<br />

outra vez”. Para confirmar a sua te<strong>se</strong>,<br />

dá o <strong>se</strong>u exemplo: “Olhe para mim:<br />

agora tenho fãs pelo mundo todo”. É<br />

um tipo que não tem medo <strong>de</strong> correr<br />

riscos e que aceita colaborar com<br />

músicos <strong>de</strong>sconhecidos. Recentemente<br />

gravou com o <strong>por</strong>tuguês DJ<br />

Ri<strong>de</strong>, que diz <strong>se</strong>r “bom rapaz”. (Dis<strong>se</strong><br />

o mesmo <strong>de</strong> Jarmusch.) “Nem <strong>se</strong>mpre<br />

aceito os convites: preciso <strong>de</strong> ter a certeza<br />

que estou a trabalhar com boas<br />

pessoas. Isso é es<strong>se</strong>ncial”.<br />

Aos 66 anos e com um novo disco<br />

<strong>de</strong> génio <strong>de</strong>baixo do braço, Astatké<br />

po<strong>de</strong> dar-<strong>se</strong> ao luxo <strong>de</strong> não <strong>se</strong>r humil<strong>de</strong><br />

e acabar uma entrevista a dizer: “Já<br />

não ouço música <strong>de</strong> ninguém. Só a<br />

minha. <strong>Quando</strong> <strong>se</strong> ouve muito a música<br />

dos outros tem-<strong>se</strong> tendência a imitar<br />

e eu quero <strong>se</strong>r original”.<br />

Ver crítica <strong>de</strong> discos págs. 26 e <strong>se</strong>gs<br />

Mulatu Astatké,<br />

o génio esquecido<br />

Aos 66 anos o etíope assina um disco <strong>de</strong> génio, “Iinspiration Information”. Ao <strong>se</strong>u lado estão<br />

os Heliocentrics, a banda que tocava com DJ Shadow. Funk, soul, jazz, R&B e música etíope<br />

unem-<strong>se</strong> para criar música que vem do passado e já ultrapassou o futuro. João Bonifácio


DOM 28 JUN<br />

SALA SUGGIA 22:00<br />

BRAD MEHLDAU piano<br />

CHICO PINHEIRO voz e guitarra<br />

FLEURINE E LUCIANA ALVES voz<br />

DOUG WEISS baixo<br />

EDU RIBEIRO bateria<br />

PATROCÍNIO VERÃO NA CASA<br />

Um momento único que c<strong>ele</strong>bra<br />

o encontro entre Brasil e<br />

EUA com a Música Popular<br />

Brasileira e o Jazz.<br />

APOIO INSTITUCIONAL<br />

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Discos<br />

26 • Ípsilon • Sexta-feira 19 Junho 2009<br />

Pop<br />

Deve <strong>se</strong>r isto<br />

a memória<br />

do futuro<br />

O pre<strong>se</strong>nte e o futuro<br />

das músicas negras num<br />

admirável álbum <strong>de</strong> canções<br />

intergalácticas.<br />

Vítor B<strong>ela</strong>nciano<br />

The Sa-Ra Creative Partners<br />

Nuclear Evolution: The Age Of Love<br />

Ubiquity, distri. Symbio<strong>se</strong><br />

mmmmm<br />

Não <strong>se</strong>rá<br />

lembrado da<br />

mesma forma que<br />

“3 Feet High and<br />

Rising” (1989) dos<br />

De La Soul ou<br />

“The Love Below/<br />

Speakerboxxx” (2003) dos OutKast,<br />

para darmos dois exemplos,<br />

largamente <strong>se</strong>parados no tempo, <strong>de</strong><br />

discos que influenciaram os<br />

caminhos da música popular, em<br />

particular os das chamadas músicas<br />

negras. Hoje o contexto é diferente.<br />

São tempos <strong>de</strong>sor<strong>de</strong>nados e<br />

Espaço<br />

Público<br />

fraccionados aqu<strong>ele</strong>s que <strong>se</strong><br />

apre<strong>se</strong>ntam, on<strong>de</strong> os efeitos <strong>de</strong><br />

con<strong>se</strong>nso são bem mais difíceis <strong>de</strong><br />

alcançar.<br />

Mas é disso que <strong>se</strong> trata. O<br />

primeiro álbum - na verda<strong>de</strong>, um<br />

duplo CD - do trio <strong>de</strong> L.A., <strong>de</strong>pois <strong>de</strong><br />

atrasos <strong>por</strong> causa <strong>de</strong> várias peripécias<br />

com editoras como a Good Music do<br />

admirador Kanye West, é um<br />

daqu<strong>ele</strong>s registos com potencial para<br />

<strong>se</strong> projectar no tempo. Antes já<br />

tinham lançado EPs, uma compilação<br />

<strong>de</strong> material já conhecido (“The<br />

Hollywood Recordings”, 2007),<br />

remisturas e inúm<strong>era</strong>s colaborações<br />

(Erykah Badu, Kanye West, Spacek,<br />

Common, Jill Scott, Talib Kweli) mas<br />

po<strong>de</strong> dizer-<strong>se</strong> que este é<br />

verda<strong>de</strong>iramente o <strong>se</strong>u primeiro<br />

álbum <strong>de</strong> originais.<br />

É daqu<strong>ele</strong> tipo <strong>de</strong> discos on<strong>de</strong><br />

todas as classificações clássicas têm<br />

que <strong>se</strong>r r<strong>ela</strong>tivizadas (soul, hip-hop,<br />

jazz, funk, <strong>ele</strong>ctro, pop) <strong>de</strong> tal forma<br />

aquilo que o trio apre<strong>se</strong>nta <strong>se</strong><br />

mostra renovado e excitante. A<br />

maior parte dos temas parte <strong>de</strong><br />

impulsos rítmicos voluptuosos <strong>de</strong><br />

hip-hop, ro<strong>de</strong>ados <strong>por</strong> vozes soul,<br />

estranhas configurações funk,<br />

atmosf<strong>era</strong>s cósmicas e improvisos<br />

jazzísticos, como <strong>se</strong> dissolves<strong>se</strong>m e,<br />

ao mesmo tempo, remontas<strong>se</strong>m<br />

uma série <strong>de</strong> idiomas, afirmando, no<br />

fim <strong>de</strong> contas, a sua voz. Em cada<br />

canção po<strong>de</strong>m <strong>se</strong>r invocadas<br />

referências (Prince, Funka<strong>de</strong>lic, Sun<br />

Ra, Spacek, OutKast) mas em<br />

nenhum momento<br />

es<strong>se</strong> facto<br />

É daqu<strong>ele</strong> tipo <strong>de</strong> discos on<strong>de</strong> todas as classifi cações clássicas têm que <strong>se</strong>r r<strong>ela</strong>tivizadas<br />

<strong>de</strong> tal forma aquilo que os Sa-Ra apre<strong>se</strong>ntam <strong>se</strong> mostra renovado e excitante<br />

Em primeiro lugar,<br />

agra<strong>de</strong>ço: obrigado valter<br />

hugo mãe (o “escritor das<br />

minúsculas”) o facto <strong>de</strong>,<br />

recentemente, numa<br />

daqu<strong>ela</strong>s entrevistas “a la<br />

minute” num <strong>se</strong>manário<br />

da nossa praça, teres feito<br />

referência a este artista.<br />

Em <strong>se</strong>gundo lugar,<br />

<strong>de</strong>claro: afi nal, o melhor<br />

disco <strong>de</strong> 2008, que só me<br />

chegou aos ouvidos e às<br />

mãos há duas <strong>se</strong>manas, é<br />

<strong>de</strong> um jovem norte-<br />

contribui para fragilizar uma música<br />

nada ortodoxa, funk espacial<br />

ancorado em matrizes rítmicas <strong>de</strong><br />

poeira sintética.<br />

Acompanhados <strong>por</strong> alguns vultos<br />

das músicas negras (da cantora<br />

Erykah Badu ao saxofonista jazz<br />

Gary Bartz) os Sa-Ra afirmam uma<br />

sonorida<strong>de</strong> aventureira e familiar,<br />

em do<strong>se</strong>s similares, em canções <strong>de</strong><br />

movimentação minimalista, vozes e<br />

melodias lascivas e partículas<br />

digitais flutuando pelo espaço. Os<br />

fragmentos da memória colectiva<br />

são organizados <strong>de</strong> forma notável<br />

expondo, afinal, um enorme <strong>de</strong><strong>se</strong>jo<br />

<strong>de</strong> futuro como há muito as músicas<br />

negras não conheciam.<br />

O velho<br />

etíope e os<br />

aventureiros<br />

Travessia p<strong>ela</strong> música<br />

egípcia, jazz, funk, soul, hiphop<br />

instrumental e R&B.<br />

Obra-prima. João Bonifácio<br />

Mulatu Astatké & The<br />

Heliocentrics<br />

Inspiration Information<br />

Strut; distri. Symbio<strong>se</strong><br />

mmmmm<br />

americano, <strong>de</strong> <strong>se</strong>u nome<br />

Ryan Lott, que respon<strong>de</strong><br />

pelo alter-ego Son Lux. Em<br />

terceiro lugar, pergunto:<br />

como foi possível este<br />

disco ter passado ao lado<br />

<strong>de</strong> praticamente toda a<br />

crítica <strong>de</strong> música em<br />

Portugal, blogs incluídos?<br />

Em quarto lugar, <strong>de</strong>screvo<br />

(tento...): ao mesmo tempo,<br />

soa a Massive Attack,<br />

Portishead, Perry Blake,<br />

Sufjan Stevens, Nico<br />

Muhly, Radiohead... e,<br />

Se dis<strong>se</strong>rmos que<br />

“Inspiration<br />

Information” é<br />

uma travessia p<strong>ela</strong><br />

música egípcia,<br />

jazz, funk, soul,<br />

hip-hop<br />

instrumental e R&B, o mais<br />

provável é - caso não fujam a <strong>se</strong>te<br />

pés - pensarem que <strong>se</strong> trata <strong>de</strong> um<br />

daqu<strong>ele</strong>s exercícios <strong>de</strong> fusão que<br />

ajudam a combater a insónia ou<br />

então <strong>de</strong> um disco espertalhão, <strong>de</strong><br />

produção lambida, a<strong>de</strong>quado a<br />

um daqu<strong>ele</strong>s bares com pare<strong>de</strong>s<br />

laranja e bebidas exóticas,<br />

repletos <strong>de</strong> gente bonita. Mas<br />

isto, na sua radical inventivida<strong>de</strong>,<br />

na sua extraordinária<br />

acessibilida<strong>de</strong>, é tudo o que a<br />

música po<strong>de</strong> <strong>se</strong>r quando não lhe<br />

enfiam um espartilho, quando<br />

não a domam para suposto<br />

benefício das massas.<br />

Mulatu Astatké é inventor do jazz<br />

etíope, noção propícia a piadas <strong>de</strong><br />

mau gosto. Os Heliocentrics foram a<br />

banda ao vivo <strong>de</strong> DJ Shadow, mas<br />

quem ouviu “Out There” sabe que<br />

são dos melhores <strong>se</strong>gredos da<br />

música urbana do século XXI. A<br />

união do velho etíope com esta<br />

trupe <strong>de</strong> aventureiros resulta num<br />

dos mais extraordinários discos que<br />

2009 trouxe até ao momento: pega<strong>se</strong><br />

em temas antigos <strong>de</strong> Astatké (um<br />

vibrafonista e percussionista <strong>de</strong><br />

<strong>ele</strong>ição), escrevem-<strong>se</strong> novos<br />

arranjos, junta-<strong>se</strong> alguns temas<br />

novos criados em conjunto e amplia<strong>se</strong><br />

a paleta sonora até ao infinito,<br />

também, a nada disso;<br />

música <strong>ele</strong>ctrónica<br />

fragmentária, <strong>de</strong>nsa,<br />

estranha,misteriosa,<br />

indolente, <strong>se</strong>dutora,<br />

hipnótica... Em quinto<br />

lugar, remato: “At war with<br />

walls and mazes” é um<br />

disco <strong>de</strong>ste mundo e do<br />

outro! Cumprimentos<br />

audiófi los<br />

José Couto, professor,<br />

41 anos<br />

com a ajuda <strong>de</strong> metais (trombones e<br />

trompetes), cordas, vibrafones, um<br />

krar (harpa etíope eléctrica, que<br />

Astatké inventou), sopros, pianos,<br />

theremins, guitarras wah-wah. Toda<br />

esta música é inclassificável.<br />

O disco abre com “Ma<strong>se</strong>ngo”, que<br />

começa com piano jazzy. Percussão<br />

e a sujeira <strong>de</strong> uma guitarra eléctrica<br />

anunciam uma quebra e <strong>se</strong>gue-<strong>se</strong><br />

uma melodia etíope tradicional para<br />

voz e violino. A <strong>se</strong>guir a guitarra suja<br />

retorna, dobrada <strong>por</strong> oleadíssima<br />

<strong>se</strong>cção rítmica, com <strong>de</strong>staque para o<br />

balanço do contra-baixo. O piano<br />

atira-<strong>se</strong> a um solo muito bluesy, mas<br />

nunca nada fica no mesmo sítio: voz<br />

e violino regressam, a guitarra<br />

eléctrica traz nova sujeira, e o baixo<br />

retorna ainda mais po<strong>de</strong>roso, antes<br />

<strong>de</strong> uma nova figura <strong>de</strong> violino surgir<br />

em fundo. Há um conjunto <strong>de</strong><br />

harmonias traçado <strong>por</strong> theremin,<br />

piano e harpa que trazem um<br />

ambiente cinemático à peça, antes<br />

do piano voltar a um lugar bluesy<br />

para <strong>de</strong>pois as figuras etíopes<br />

tomarem <strong>de</strong> novo a dianteira.<br />

“Cha Cha” abre com guitarra wahwah<br />

e é <strong>se</strong>rvido <strong>por</strong> uma linha <strong>de</strong><br />

baixo irresistível. O arranjo <strong>de</strong><br />

metais - saído <strong>de</strong> uma banda-sonora<br />

da blaxpoitation - é extraordinário e<br />

em fundo o vibrafone <strong>de</strong> Astatké,<br />

etéreo e misterioso, enceta diálogos<br />

jazzy com o piano. Este<br />

posteriormente sai <strong>de</strong> cena<br />

<strong>de</strong>ixando uma guitarra assombrada<br />

tomar o <strong>se</strong>u lugar, enquanto figuras<br />

esvoaçantes <strong>de</strong> flautas entram e<br />

saem <strong>de</strong> cena.<br />

“Addis black widow” abre com<br />

breaks <strong>de</strong> bateria <strong>se</strong>cos,<br />

trespassados <strong>por</strong> flautas. Depois a<br />

força dos metais é posta lado a lado<br />

com os breaks <strong>de</strong> bateria, antes <strong>de</strong><br />

uma guitarra danificada aumentar a<br />

percentagem <strong>de</strong> freakalhice da faixa.<br />

Três temas, três pérolas - e <strong>se</strong>rá<br />

assim até ao fim. (Não vale a pena<br />

dis<strong>se</strong>carmos cada tema, mas<br />

assinale-<strong>se</strong> que todos, mesmo todos,<br />

são extraordinários, do cool <strong>de</strong><br />

“Esketa dance” à fabulosa<br />

conjugação do beat com os metais<br />

danados em “Fire in the zoo”,<br />

passando p<strong>ela</strong> pura loucura <strong>de</strong><br />

“Anglo Ethio Suite”, talvez o melhor<br />

pedaço <strong>de</strong> música <strong>de</strong>ste século.)<br />

A força rítmica é a primeira coisa<br />

que <strong>se</strong> nota, mas audição após<br />

audição vai-<strong>se</strong> ganhando amor à<br />

versatilida<strong>de</strong> dos arranjos para<br />

metais e sopros. Depois repara-<strong>se</strong> a<br />

facilida<strong>de</strong> com que <strong>se</strong> salta <strong>de</strong> um<br />

quadro musical para outro. Mais<br />

tar<strong>de</strong> admira-<strong>se</strong> a extraordinária<br />

capacida<strong>de</strong> <strong>de</strong>stes músicos <strong>de</strong><br />

convocarem diferentes tradições<br />

musicais <strong>se</strong>m <strong>se</strong> quedarem <strong>por</strong><br />

exercícios <strong>de</strong> género. E <strong>por</strong> fim<br />

ficamos maravilhados com a exímia<br />

arquitectura harmónica <strong>de</strong>ste colosso<br />

que a cada <strong>se</strong>gundo ameaça ruir,<br />

para instantes <strong>de</strong>pois nos <strong>de</strong>ixar <strong>de</strong><br />

boca aberta com nova surpresa. Isto<br />

é música que não preten<strong>de</strong> <strong>se</strong>r a<br />

inovação da estação. É a música que<br />

Charles Mingues faria <strong>se</strong> tives<strong>se</strong> Sun<br />

Ra e David Axeldo a <strong>se</strong>u lado. É<br />

música que existe <strong>de</strong> uma forma que<br />

nunca existiu antes nem é passível <strong>de</strong><br />

<strong>se</strong>r imitada. Obra-prima.


AGENDA CULTURAL FNAC<br />

Especial Festa da Música<br />

entrada livre<br />

AO VIVO<br />

TÓ TRIPS<br />

Guitarra 66<br />

O primeiro álbum em nome próprio é um conjunto <strong>de</strong> temas em guitarra acústica, concentrando<br />

memórias <strong>de</strong> uma vida inteira.<br />

26.06. 18H00 FNAC STA. CATARINA<br />

26.06. 22H00 FNAC MAR SHOPPING<br />

27.06. 17H00 FNAC BRAGA<br />

AO VIVO<br />

TIGUANA BIBLES<br />

Child Of The Moon<br />

A receita para criar uma banda como os Tiguana Bibles foi juntar três amigos <strong>de</strong> longa data, provenientes dos<br />

Bunnyranch, Tédio Boys e Parkinsons, com a voz açucarada <strong>de</strong> Tracy Vandal (Giant Paw).<br />

27.06. 17H00 FNAC NORTESHOPPING<br />

AO VIVO<br />

OS GOLPES<br />

Cruz Vermelha Sobre Fundo Branco<br />

O fervilhar do “Roque Português” <strong>de</strong> tempos idos está lá todo, mas <strong>de</strong><strong>se</strong>nganem-<strong>se</strong>... os Golpes não são do passado.<br />

27.06. 22H00 FNAC COIMBRA<br />

28.06. 18H30 FNAC CHIADO<br />

AO VIVO<br />

NORBERTO LOBO<br />

Pata Lenta<br />

Pata Lenta c<strong>ele</strong>bra o amor, a paz e a luz que encontra na liberda<strong>de</strong>.<br />

30.06. 21H30 FNAC COLOMBO<br />

05.07. 22H00 FNAC NORTESHOPPING<br />

11.07. 22H00 FNAC COIMBRA<br />

AO VIVO<br />

TAXI<br />

Amanhã<br />

A banda <strong>por</strong>tuen<strong>se</strong> que marcou os saudosos anos 80 com temas tão emblemáticos como Chiclete ou Cairo<br />

está agora <strong>de</strong> volta e com a sua formação inicial.<br />

30.06. 22H00 FNAC NORTESHOPPING<br />

Consulte a agenda cultural Fnac em http://cultura.fnac.pt/Agenda<br />

Apoio:<br />

27.06. 22H00 FNAC NORTESHOPPING<br />

28.06. 17H00 FNAC COIMBRA<br />

28.06. 21H00 FNAC VISEU<br />

APRESENTAÇÃO AO VIVO LANÇAMENTO EXPOSIÇÃO


Discos<br />

Angola<br />

Remix<br />

Clássicos da pop angolana,<br />

produtores brasileiros<br />

actuais, uma ponte que <strong>se</strong><br />

dança entre dois continentes<br />

e duas g<strong>era</strong>ções da lusofonia.<br />

Luís Maio<br />

Vários<br />

Comfusões 1: From Angola to Brasil<br />

Out/Here Rec., distri. Megamúsica<br />

mmmnn<br />

Espaço<br />

Público<br />

Maurício Pacheco<br />

foi uma das<br />

figuras chave da<br />

cena <strong>ele</strong>ctrónica<br />

brasileira,<br />

emergente nos<br />

inícios dos anos 90. Fundou a banda<br />

<strong>de</strong> capoeira-hip hop Stereo<br />

Maracanã e produziu artistas como<br />

Fernanda Abreu e Jussara Silveira.<br />

28 • Ípsilon • Sexta-feira 26 Junho 2009<br />

De entre os discos <strong>de</strong> 2009<br />

que apre<strong>se</strong>ntaram uma<br />

<strong>ele</strong>vada taxa <strong>de</strong><br />

m<strong>ela</strong>ncolia, “The Sleeper”,<br />

dos ingle<strong>se</strong>s The Leisure<br />

Society, tem sido um dos<br />

mais tocados nos meus<br />

headphones. Uma<br />

colecção <strong>de</strong> pequenas<br />

pérolas on<strong>de</strong> imp<strong>era</strong>m<br />

arranjos <strong>de</strong> <strong>ele</strong>ição, numa<br />

banda que certamente<br />

terá <strong>de</strong>dicado muitas<br />

Des<strong>de</strong> o início <strong>de</strong>sta década, ou<br />

melhor, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> o fim da guerra em<br />

Angola, em 2002, passou também a<br />

voar regularmente para Luanda,<br />

on<strong>de</strong> veio a produzir vários artistas,<br />

<strong>de</strong>s<strong>de</strong> Elias Dia Kimuezo, velha<br />

glória do <strong>se</strong>mba, até novas ve<strong>de</strong>tas<br />

do kuduro como Dog Murras,<br />

passando pelo mais eclético Paulo<br />

Flores. De caminho o brasileiro teve<br />

acesso aos arquivos da Radio<br />

Nacional <strong>de</strong> Angola e ao <strong>se</strong>u já<br />

lendário espólio das décadas 60 e<br />

70. Foram os anos <strong>de</strong> explosão da<br />

música mo<strong>de</strong>rna angolana, quando<br />

toda uma nova g<strong>era</strong>ção <strong>de</strong> artistas e<br />

bandas pegou em guitarras<br />

eléctricas para recriar a música das<br />

suas raízes, entre uma certa euforia<br />

juvenil e a amargura da repressão<br />

colonial.<br />

Parte significativa <strong>de</strong>ssa h<strong>era</strong>nça<br />

foi transposta para formato digital<br />

em antologias, entretanto lançadas<br />

com os <strong>se</strong>los Buda e Difference. O<br />

que Pacheco vem pro<strong>por</strong> com<br />

“Comfusões” é, no entanto,<br />

completamente diferente: uma série<br />

<strong>de</strong> compilações on<strong>de</strong> êxitos da<br />

música mo<strong>de</strong>rna angolana são<br />

confiados a compinchas <strong>se</strong>us,<br />

horas a escutar o sublime<br />

“69 Love Songs”. Numa<br />

época on<strong>de</strong> assistimos à<br />

vertigem do tempo e a<br />

artistas, djs e produtores da cena<br />

<strong>ele</strong>ctrónica brasileira. As ligações<br />

entre as músicas <strong>de</strong> Angola e do<br />

Brasil são tão antigas quanto o<br />

intercâmbio entre as duas colónias<br />

<strong>por</strong>tuguesas e, <strong>por</strong>tanto, o que aqui<br />

<strong>se</strong> propõe é todo um programa <strong>de</strong><br />

renovação <strong>de</strong>ssa velha história <strong>de</strong><br />

(com)fusão.<br />

O próprio Maurício Pacheco<br />

assina a maior parte das remisturas,<br />

incluindo originais <strong>de</strong> Teta Lando,<br />

Avozinho e Carlos Lamartine.<br />

Estab<strong>ele</strong>cendo um guião, o<br />

produtor retém as vozes,<br />

em registos dolentes que<br />

não andam longe da<br />

soul, e junta-lhes<br />

batidas <strong>de</strong> hip hop,<br />

que repercutem a<br />

própria rítmica do<br />

<strong>se</strong>mba. Mário<br />

Caldato Jr. transpõe um original <strong>de</strong><br />

Artur Nunes para o território <strong>de</strong><br />

Curtis Mayfield, DJ Dolores escava<br />

até ao osso o merengue rebita <strong>de</strong><br />

Paulinho Pinheiro, enquanto<br />

Moreno Veloso <strong>de</strong>scarrega uma<br />

avalanche <strong>de</strong> samba sobre a voz <strong>de</strong><br />

Paulo Flores. A ponte entre os<br />

clássicos pop angolanos e a actual<br />

vaga <strong>de</strong> kuduro tem uma expressão<br />

privilegiada do discorrer febril <strong>de</strong><br />

Dog Murras sobre o popular<br />

“Chofer <strong>de</strong> praça”, mas a melhor<br />

r<strong>ele</strong>itura brasileira dos êxitos<br />

angolanos é, <strong>se</strong>m dúvida, a do<br />

“Kapakiao” que transposta a voz<br />

granulada <strong>de</strong> Bonga para um<br />

oceano <strong>de</strong> efeitos especiais e ruídos<br />

sónicos. Pelo meio, claro, há um par<br />

<strong>de</strong> produções <strong>ele</strong>ctrónicas mais<br />

frouxas, mas genericamente<br />

“Comfusões” é o género <strong>de</strong><br />

colecção que honra o passado ao<br />

mesmo tempo que lhe confere uma<br />

nova dinâmica - que é o melhor<br />

<strong>se</strong>rviço que as remisturas brasileiras<br />

po<strong>de</strong>riam oferecer às glórias<br />

passadas da pop angolana.<br />

Rodrigo Leão,<br />

particular e<br />

universal<br />

Rodrigo Leão & Cinema<br />

En<strong>se</strong>mble<br />

A Mãe<br />

Edi. E distri. Sony Music<br />

mmmmn<br />

<strong>Quando</strong> <strong>se</strong> parte<br />

para a audição <strong>de</strong><br />

um novo disco <strong>de</strong><br />

Rodrigo Leão não<br />

<strong>se</strong> vai à esp<strong>era</strong> <strong>de</strong><br />

gran<strong>de</strong>s surpresas<br />

sónicas. Mas a<br />

expectativa também não é o simples<br />

mimetismo <strong>de</strong> algo anteriormente<br />

experimentado. A expectativa é<br />

<strong>de</strong>scobrir temas instrumentais e<br />

canções <strong>de</strong> tonalida<strong>de</strong> nostálgica,<br />

marcadas <strong>por</strong> subtis reencontros<br />

com vários géneros (pop, tango,<br />

fado, ambientalismo, música<br />

concreta, música clássica ou<br />

contem<strong>por</strong>ânea) que acrescentem<br />

algo mais ao que já <strong>se</strong> conhecia.<br />

Dito assim, parece fácil. Não é.<br />

visitas recorrentes do<br />

fantasma do stress, nada<br />

melhor do que nos<br />

juntarmos à socieda<strong>de</strong> do<br />

lazer para esp<strong>era</strong>r<br />

tranquilamente p<strong>ela</strong><br />

chegada do Verão. 8<br />

g<strong>ela</strong>dos numa arca<br />

frigorífi ca com lugar para<br />

10.<br />

Pedro Miguel Silva,<br />

técnico <strong>de</strong> comunicação,<br />

35 anos<br />

Apesar <strong>de</strong> <strong>se</strong>r o <strong>se</strong>u disco on<strong>de</strong> expõe facetas mais contrastantes,<br />

é o álbum mais homogéneo <strong>de</strong> Rodrigo Leão<br />

Porque a pequena<br />

diferença é muitas vezes<br />

a mais difícil <strong>de</strong> afirmar.<br />

Muitas carreiras já<br />

falharam na procura <strong>de</strong>s<strong>se</strong><br />

difícil equilíbrio. Rodrigo<br />

Leão encontrou-o. E isso<br />

<strong>se</strong>nte-<strong>se</strong> em “A Mãe”, disco<br />

que mostra qualida<strong>de</strong>s<br />

enunciadas em<br />

anteriores<br />

registos,<br />

mas<br />

não <strong>se</strong> fica<br />

<strong>por</strong> aí, expondo<br />

aquilo que, na teoria, parecem<br />

contradições, mas que, na<br />

prática, <strong>se</strong> rev<strong>ela</strong>m afinida<strong>de</strong>s<br />

<strong>ele</strong>ctivas.<br />

“A Mãe” é o disco on<strong>de</strong> as canções<br />

pop mais estão pre<strong>se</strong>ntes, contando<br />

para isso com um naipe certeiro <strong>de</strong><br />

vozes (Stuart Staples dos<br />

Tin<strong>de</strong>rsticks, Neil Hannon dos<br />

Divine Comedy, o argentino Daniel<br />

Melingo e a habitual Ana Vieira), mas<br />

também aqu<strong>ele</strong> on<strong>de</strong> os ambientes<br />

são mais graves e solenes. É também<br />

o <strong>se</strong>u disco mais pessoal (<strong>de</strong>dicado à<br />

mãe, falecida este ano), ao mesmo<br />

tempo que é aqu<strong>ele</strong> on<strong>de</strong> <strong>se</strong> <strong>se</strong>nte<br />

mais a pre<strong>se</strong>nça do grupo que o<br />

acompanha - o Cinema En<strong>se</strong>mble -<br />

para além <strong>de</strong> uma orquestra, a<br />

Sinfonietta <strong>de</strong> Lisboa, que contribui<br />

para arranjos mais exub<strong>era</strong>ntes.<br />

Não custa projectar que é um<br />

disco com uma mão cheia <strong>de</strong><br />

canções que prometem marcar os<br />

próximos me<strong>se</strong>s do mercado em<br />

Portugal, como “No sè nada”, com a<br />

voz vivida, mais falada que cantada,<br />

<strong>de</strong> Melingo, em contraponto com a<br />

<strong>de</strong> Ana Vieira. O <strong>se</strong>ntido dramático<br />

<strong>de</strong> “This light holds so many<br />

colours”, com Stuart Staples; o<br />

enlevo pop <strong>de</strong> “Cathy” com Neil<br />

Hannon; o movimento tranquilo <strong>de</strong><br />

“Sleepless heart”, com Ana Vieira a<br />

situar-<strong>se</strong> algures entre Beth Gibbons<br />

e Goldfrapp, ou “Ya skaju tebe”,<br />

alusão à música dos Balcãs.<br />

Apesar <strong>de</strong> <strong>se</strong>r o <strong>se</strong>u disco on<strong>de</strong><br />

expõe facetas mais contrastantes, “A<br />

Mãe” é o álbum mais homogéneo do<br />

percurso <strong>de</strong> Rodrigo Leão. Uma<br />

contradição? Sim, claro. Mas a<br />

música está cheia d<strong>ela</strong>s. V. B.<br />

Caixinha <strong>de</strong> música<br />

disfuncional<br />

St Vincent<br />

Actor<br />

4AD; distri. Popstock<br />

mmmm<br />

Tanto <strong>se</strong> repetiu<br />

que já tudo foi<br />

inventado que o<br />

mundo acreditou.<br />

Mas <strong>por</strong> mais que<br />

queiramos<br />

instituir a<br />

mediocrida<strong>de</strong> como modo <strong>de</strong> vida,<br />

há <strong>se</strong>mpre alguém suficientemente<br />

autista para <strong>se</strong> enfiar num quarto e<br />

St Vincent,<br />

aliás Annie Clark<br />

unir pontas que nunca<br />

ninguém uniu, colar o que<br />

nunca ninguém colou,<br />

imaginar o que nunca ninguém<br />

imaginou. “Actor”, o <strong>se</strong>gundo<br />

disco Annie Clark (conhecida<br />

<strong>por</strong> St Vincent), é um <strong>de</strong>s<strong>se</strong>s<br />

casos: é impossível traçar-lhe<br />

filiações, não vem <strong>de</strong> lado<br />

algum, vai para todo o sítio.<br />

“Actor” po<strong>de</strong> ter um refrão aqui,<br />

uma ponte ali, uma coda acolá,<br />

mas não <strong>se</strong> atém com as regras<br />

convencionais. É uma<br />

caixinha <strong>de</strong> música<br />

disfuncional, uma jukebox<br />

mentalmente instável que salta a<br />

agulha <strong>de</strong> disco em disco a cada 30<br />

<strong>se</strong>gundos ou então toca vários ao<br />

mesmo tempo. O <strong>se</strong>u primeiro<br />

gran<strong>de</strong> mérito é trabalhar cada som<br />

digitalmente, ao ponto <strong>de</strong> muitas<br />

vezes não reconhecermos os<br />

instrumentos ba<strong>se</strong>. A sua <strong>se</strong>gunda<br />

qualida<strong>de</strong> é a tremenda paleta<br />

sonora: temos sopros pastorais<br />

(flautas, oboés, etc), metais<br />

dissonantes, cordas plangentes ou<br />

prenhas <strong>de</strong> angústia, guitarras<br />

eléctricas sujas e acústicas plácidas,<br />

piano e outros cordofones, beats<br />

digitais. Mas a sua mais<br />

impressionante qualida<strong>de</strong> - para<br />

além <strong>de</strong> uma tremenda<br />

inventivida<strong>de</strong> melódica - é a<br />

justaposição <strong>de</strong> <strong>ele</strong>mentos que<br />

aparentemente não encaixam na<br />

perfeição.<br />

Exemplifiquemos com “The<br />

strangers”: começa com um bombo<br />

bem marcado em 4/4, há uma figura<br />

pastoral <strong>de</strong> glockenspiel, coros<br />

angélicos tratados digitalmente. E<br />

<strong>de</strong>pois explo<strong>de</strong> com guitarra suja e o<br />

que parece <strong>se</strong>r uma figura <strong>de</strong> flauta a<br />

repetir-<strong>se</strong> e torvelinhos <strong>de</strong> coros em<br />

fundo. Em “Actor out of work”,<br />

talvez a canção mais convencional<br />

do disco, guitarras sujas em formato<br />

power-pop são dobradas <strong>por</strong> uma<br />

uma fra<strong>se</strong> <strong>de</strong> sintetizador<br />

ligeiramente psicótica. A voz é qua<strong>se</strong><br />

pop-twee e o glockenspiel regressa,<br />

com coros saídos <strong>de</strong> um filme dos<br />

anos 40 em fundo. Isto antes da<br />

canção <strong>se</strong>r sabotada <strong>por</strong> uma<br />

tremenda rui<strong>de</strong>ira.<br />

Em “Black rainbow” doces figuras<br />

<strong>de</strong> sopros tomam a dianteira, para<br />

muto mais tar<strong>de</strong> a melodia virar e<br />

cordas saídas <strong>de</strong> um Hitchcock<br />

encherem <strong>de</strong> angústia a canção.<br />

Em “The Party”, o que começa<br />

<strong>por</strong> <strong>se</strong>r canção <strong>de</strong> fim <strong>de</strong> noite<br />

(piano, melodia m<strong>ela</strong>ncólica) acaba<br />

em épico, com coros tremendos,<br />

percussões excessivas e cordas<br />

grandiosas. Estas canções não são<br />

apenas construídas <strong>por</strong> camadas,<br />

empilhando diferentes arranjos -<br />

isso só surge em <strong>se</strong>gunda instância,<br />

como complemento às constantes<br />

guinadas melódicas que Annie Clark<br />

provoca.<br />

“Actor” é uma espécie <strong>de</strong> BSO<br />

para um “Feiticeiro <strong>de</strong> Oz” que fos<strong>se</strong><br />

ao mesmo tempo fábula infantil,<br />

filme gore, <strong>de</strong> suspen<strong>se</strong>, <strong>por</strong>nografia<br />

e também retrato <strong>de</strong> distúrbio<br />

mental. É um pequeno musical para<br />

pesa<strong>de</strong>los rocambolescos, uma<br />

espécie <strong>de</strong> barroco digital para o<br />

século XXI. É extraordinário. J. B.<br />

ANNABEL MEHRAN


ANNABEL MEHRAN<br />

Virgem Suta<br />

Virgem Suta<br />

Universal Music<br />

mmmnn<br />

Os Virgem<br />

Suta são <strong>de</strong><br />

Beja e isso<br />

está-lhes<br />

inscrito<br />

na<br />

música.<br />

Está nas tascas e nas<br />

ressacas, está num olhar<br />

optimista que nasce do<br />

espaço livre que vêem em volta:<br />

uma <strong>se</strong>nsação <strong>de</strong> tranquilida<strong>de</strong> que<br />

é atravessada <strong>por</strong> episódios <strong>de</strong><br />

burlesco “patusco” ou <strong>de</strong><br />

comentário (nunca <strong>de</strong>claradamente)<br />

social. Mas a música dos Virgem<br />

Suta, neste que é o <strong>se</strong>u álbum <strong>de</strong><br />

estreia, é também outras coisas.<br />

Fanfarra e melodia mediterrânica na<br />

dança <strong>de</strong> “Tomo conta <strong>de</strong>sta casa” e<br />

um pedaço do Nor<strong>de</strong>ste brasileiro<br />

atirado para um coreto no centro do<br />

parque (“Vovó Joaquina”, uma das<br />

melhores do álbum). Porém, entre o<br />

tom introspectivo das letras <strong>de</strong> Nuno<br />

Figueiredo e as personagens<br />

cantadas <strong>por</strong> Jorge Benvinda, algo<br />

sobressai. A produção foi as<strong>se</strong>gurada<br />

<strong>por</strong> Hél<strong>de</strong>r Gonçalves e o toque do<br />

guitarrista e compositor dos Clã<br />

atravessa o disco: os teclados<br />

“brincalhões” <strong>de</strong> “Não sou <strong>de</strong>ste<br />

lugar”, a pop como fantasia blues<br />

em “Anjo em <strong>de</strong>scensão”, o ritmo<br />

preciso <strong>de</strong> “Linhas cruzadas”, com<br />

voz levemente distorcida e mil<br />

teclados recheando a canção, ou<br />

essa “Homem no mundo” que nos<br />

recorda algo do Sérgio Godinho mais<br />

<strong>de</strong>claradamente pop <strong>de</strong> “Lupa” -<br />

álbum produzido, precisamente, <strong>por</strong><br />

Hél<strong>de</strong>r Gonçalves e Nuno Rafael.<br />

Isso é uma virtu<strong>de</strong>: é inatacável o<br />

bom gosto do que aqui ouvimos.<br />

Contudo, ficamos a espaços com a<br />

<strong>se</strong>nsação que, apesar da<br />

característica voz <strong>de</strong> Jorge Benvinda,<br />

apesar <strong>de</strong>ste universo personalizado<br />

<strong>de</strong> “Danças <strong>de</strong> balcão” e “Mulas da<br />

agonia”, há muito do universo<br />

sónico dos Clã do Porto nestes<br />

Virgem Suta <strong>de</strong> Beja - o que, <strong>se</strong>ndo<br />

um óptimo ponto <strong>de</strong> partida, não<br />

<strong>de</strong>verá transformar-<strong>se</strong> em ponto <strong>de</strong><br />

chegada. Resumindo: boa estreia,<br />

futuro ainda melhor em aberto.<br />

Mário Lopes<br />

Smix Smox Smux<br />

Eles São Os Smix Smox Smux<br />

Amor Fúria; distri. Mbari<br />

mmmnn<br />

Isto começa<br />

com a<br />

banda a<br />

afinar o<br />

<strong>se</strong>u<br />

nome,<br />

vozes no<br />

CARLOS MANUEL MARTINS<br />

alto e guitarrinha <strong>de</strong><br />

escuteiros. Isto começa com<br />

um riff <strong>de</strong> levantar um gajo do<br />

sofá e uma <strong>se</strong>cção rítmica, lá mais<br />

para a frente, a entregar-<strong>se</strong> ao<br />

balanço “pernicioso” do funk-punk.<br />

Dançamos, claro, que isto é<br />

rock’n’roll a sério e grita-<strong>se</strong> “Uísqui!”<br />

com indisfarçável euforia. Isto são os<br />

Smix Smox Smux, trio <strong>de</strong> Braga que<br />

faz do <strong>se</strong>u disco <strong>de</strong> estreia um<br />

conjunto <strong>de</strong> piadas privadas,<br />

habilmente transformadas em<br />

retrato <strong>de</strong> cultura pop e cultura<br />

“tout court”, ano 2009. Cabem aqui<br />

toques polifónicos, o Portugal no<br />

Coração, uma Famel Zundapp e o<br />

aquecimento global - <strong>ele</strong>s são a favor<br />

e exultam: “Finalmente há praia em<br />

Braga”. É bonito ver como os Smix<br />

Smox Smux têm a atitu<strong>de</strong><br />

politicamente incorrecta <strong>de</strong> um<br />

Frank Zappa que, embuído do mais<br />

genuíno espírito punk, <strong>se</strong> <strong>de</strong>dicas<strong>se</strong><br />

alegremente ao álcool, às drogas e<br />

ao rock <strong>de</strong> garagem. É bonito ver<br />

que os Smix Smox Smux, <strong>ele</strong>s dos<br />

coros em fal<strong>se</strong>te, das guitarras em<br />

crescendo e do baixo com um pé no<br />

“groove”, não são apenas o humor<br />

tresloucado das letras - linguagem<br />

directa, extraída <strong>de</strong> conversas do<br />

dia-a-dia directamente para música<br />

rock. Nesta estreia, ouve-<strong>se</strong> uma<br />

banda que faz tangentes aos<br />

Pavement - versão <strong>de</strong>scarnada, “in<br />

your face”, como em “Cara <strong>de</strong> pau”<br />

ou na supracitada “Aquecimento<br />

global” -, uma banda que anda <strong>por</strong><br />

ali, em “Malinha”, a revolver o blues<br />

para cantar sobre cocaína - só para<br />

envergonhar Eric Clapton - ,e que,<br />

tudo resumido, faz rock’n’roll com o<br />

fervor e a ausência <strong>de</strong> tentações<br />

perfeccionistas <strong>de</strong> que o bom<br />

rock’n’roll é feito. Claro que isso<br />

resulta num álbum imperfeito:<br />

digamos que <strong>se</strong> nota a diferença<br />

entre o crescendo<br />

final<br />

empolgante<br />

<strong>de</strong> “Maçã”<br />

e uma<br />

“Roqueiro<br />

<strong>de</strong> aviário”<br />

que soa a i<strong>de</strong>ia<br />

à esp<strong>era</strong><br />

<strong>de</strong><br />

concretização. Ao vivo, os Smix<br />

Smox Smux são banda imparável e<br />

impagável. No álbum <strong>de</strong> estreia,<br />

reuniram um bom conjunto <strong>de</strong><br />

canções - dois exemplos entre<br />

vários: “Uísqui” é festa<br />

<strong>de</strong>sbragada, “Aquecimento<br />

global” um clássico para<br />

memória futura. Ainda é no<br />

palco, <strong>por</strong>ém, que <strong>se</strong> rev<strong>ela</strong>m<br />

totalmente. M.L.<br />

Jazz<br />

Angelica Sanchez<br />

Life Between<br />

Clean Feed<br />

mmmmn<br />

Smix Smox Smux: isto é rock’n’roll a sério<br />

Virgem Suta: boa estreia,<br />

futuro ainda melhor em aberto<br />

Os convidados são<br />

<strong>de</strong> luxo: no<br />

saxofone está<br />

Tony Malaby,<br />

saxofonista<br />

excepcional, e<br />

juntam-<strong>se</strong> ainda Marc Ducret (na<br />

guitarra), Drew Gress (no<br />

contrabaixo) e Tom Rainey (na<br />

bateria) - habituais parceiros do<br />

galáctico saxofonista Tim Berne. A<br />

lí<strong>de</strong>r do quinteto é a pianista/teclista/<br />

compositora Angelica Sanchez, que<br />

impõe a sua personalida<strong>de</strong> neste<br />

<strong>se</strong>gundo disco em nome próprio,<br />

<strong>de</strong>pois <strong>de</strong> “Mirror Me” (Omnitone,<br />

2003). Entre o piano acústico e o<br />

piano eléctrico, Sanchez <strong>de</strong><strong>se</strong>nha<br />

melodias abertas que abrem espaço<br />

para os parceiros <strong>de</strong> quinteto<br />

brilharem. O tenor <strong>de</strong> Malaby está<br />

radioso, inventando magia quando<br />

encontra espaço. O guitarrista Ducret<br />

opta p<strong>ela</strong> discrição mas também <strong>se</strong><br />

expõe com à vonta<strong>de</strong> e quando tem<br />

o<strong>por</strong>tunida<strong>de</strong> entra numa linguagem<br />

qua<strong>se</strong> rock. E a empatia entre Gress e<br />

Rainey é notável, numa dinâmica<br />

rítmica assinalável. Com o contributo<br />

<strong>de</strong> músicos <strong>de</strong>ste nível, Sanchez<br />

<strong>de</strong><strong>se</strong>nvolve um jazz articulado, <strong>se</strong>m<br />

limites bem <strong>de</strong>finidos e com muitas<br />

pontas soltas. Angelica mostra-<strong>se</strong><br />

uma intérprete <strong>de</strong> bom nível,<br />

especialmente a solar ao piano -<br />

ouça-<strong>se</strong> a <strong>se</strong>gunda faixa, “Fe<strong>de</strong>rico”.<br />

Mais do que uma soma <strong>de</strong><br />

individualida<strong>de</strong>s, este disco vale pelo<br />

colectivo, que transforma os temas<br />

com um magnifício envolvimento.<br />

Nuno Catarino<br />

Ípsilon • Sexta-feira 26 Junho 2009 • 29


Concertos<br />

<br />

30 • Ípsilon • Sexta-feira 26 Junho 2009<br />

Jazz<br />

Estoril Hot<br />

Apostando forte na<br />

pre<strong>se</strong>nça, a solo, do lendário<br />

pianista Chick Corea, o<br />

Estoril Jazz cumpre 28 anos.<br />

Rodrigo Amado<br />

XXVIII Estoril Jazz - Jazz Num<br />

Dia <strong>de</strong> Verão 2009<br />

Estoril. Centro <strong>de</strong> Congressos do Estoril. Av. Amaral.<br />

Tel.: 214647575. 26 <strong>de</strong> Junho a 05 <strong>de</strong> Julho30€.<br />

Informações: 214827862.<br />

Dia 26/06 às 21h30 - James Carter Quinteto<br />

Dia 27/06 às 15h00 - Jazz em Miúdos<br />

16h30 - Jon Mayer Trio<br />

21h30 - Ro<strong>se</strong>anna Vitro com Kenny Werner Trio<br />

Dia 28/06 às 19h00 / 21h30 - Chick Corea Piano Solo<br />

Dia 03/07 às 21h30 - David Murray “Black Saint<br />

Quartet”<br />

Dia 04/07 às 21h30 - Mingus Dynasty Septeto<br />

Dia 05/07 às 19h00 - Christian McBri<strong>de</strong> and Insi<strong>de</strong><br />

Straight<br />

Numa altura em que a conjuntura<br />

económica põe em evidência a<br />

fragilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> gran<strong>de</strong> parte dos<br />

eventos culturais, saú<strong>de</strong>-<strong>se</strong> a<br />

consistência e longevida<strong>de</strong> <strong>de</strong> um dos<br />

mais im<strong>por</strong>tantes e antigos festivais<br />

<strong>de</strong> jazz <strong>por</strong>tugue<strong>se</strong>s. Des<strong>de</strong> <strong>se</strong>mpre<br />

<strong>de</strong>dicado às correntes mais<br />

con<strong>se</strong>rvadoras do jazz norteamericano,<br />

o Estoril Jazz apre<strong>se</strong>nta<br />

este ano um cartaz fortíssimo que<br />

integra duas formações<br />

históricas mais próximas<br />

<strong>de</strong> um jazz <strong>de</strong> cariz<br />

mo<strong>de</strong>rno; o quarteto<br />

“Black Saint” <strong>de</strong><br />

David Murray e o<br />

<strong>se</strong>pteto Mingus<br />

Dynasty.<br />

As primeiras<br />

notas do<br />

festival <strong>se</strong>rão<br />

dadas pelo<br />

quinteto do<br />

exc<strong>ele</strong>nte<br />

saxofonista<br />

James Carter,<br />

tendo a <strong>se</strong>u lado<br />

o trompete <strong>de</strong><br />

Corey Wilkes.<br />

O gran<strong>de</strong> momento do festival está re<strong>se</strong>rvado Tendo perdido<br />

para domingo, com duas <strong>se</strong>ssões con<strong>se</strong>cutivas alguma da visibilida<strong>de</strong><br />

pelo mestre Chick Corea<br />

que marcou os primeiros<br />

anos da sua carreira, Carter<br />

A Orquestra <strong>de</strong> Câmara Portuguesa dará a ouvir a obra completa <strong>de</strong> “Sonho<br />

<strong>de</strong> uma Noite <strong>de</strong> Verão”, <strong>de</strong> Men<strong>de</strong>lssohn, com a colaboração do Coro Voces Ca<strong>ele</strong>stes<br />

mantém uma activida<strong>de</strong> intensa que o<br />

afirma como um dos gran<strong>de</strong>s solistas<br />

do jazz actual. Enérgico e criativo,<br />

particularmente forte no saxofone<br />

barítono, Carter editou no ano<br />

passado “Pre<strong>se</strong>nt Ten<strong>se</strong>”, uma<br />

referência na sua obra recente.<br />

No <strong>se</strong>gundo dia do festival as<br />

activida<strong>de</strong>s têm início às 15h00 com o<br />

projecto Jazz em Miúdos, um projecto<br />

<strong>de</strong> jovens músicos nacionais que<br />

adaptaram à língua <strong>por</strong>tuguesa uma<br />

série <strong>de</strong> conhecidos standards <strong>de</strong> jazz.<br />

A meio da tar<strong>de</strong> apre<strong>se</strong>nta-<strong>se</strong> o trio <strong>de</strong><br />

Jon Mayer, pianista pouco conhecido<br />

cujo percurso assinala, no entanto,<br />

algumas colaborações <strong>de</strong> peso.<br />

Concerto evocativo <strong>de</strong> uma visita <strong>de</strong><br />

Mayer, em 1960, ao mítico Clube<br />

Universitário <strong>de</strong> Jazz. A noite <strong>de</strong><br />

sábado é <strong>de</strong>dicada à arte das canções,<br />

neste caso interpretadas p<strong>ela</strong> voz <strong>de</strong><br />

Ro<strong>se</strong>anna Vitro, acompanhada pelo<br />

trio <strong>de</strong> Kenny Werner, talentoso<br />

pianista bem conhecido pelos <strong>se</strong>us<br />

extraordinários dotes <strong>de</strong><br />

acompanhador.<br />

O gran<strong>de</strong> momento do festival está<br />

re<strong>se</strong>rvado para domingo, com duas<br />

<strong>se</strong>ssões con<strong>se</strong>cutivas pelo mestre<br />

Chick Corea em solo absoluto <strong>de</strong><br />

piano, formato que evi<strong>de</strong>ncia as suas<br />

capacida<strong>de</strong>s únicas como intérprete e<br />

como improvisador. Corea, que<br />

embarcou recentemente numa série<br />

<strong>de</strong> aventuras fusionistas <strong>de</strong> gosto<br />

duvidoso, é um dos gran<strong>de</strong>s estetas<br />

do piano jazz, e estes dois recitais a<br />

solo po<strong>de</strong>m rev<strong>ela</strong>r-<strong>se</strong> momentos <strong>de</strong><br />

im<strong>por</strong>tância histórica.<br />

O <strong>se</strong>gundo fim <strong>de</strong> <strong>se</strong>mana tem um<br />

início agitado com o “Black Saint<br />

Quartet” do saxofonista David<br />

Murray, improvisador <strong>se</strong>mpre<br />

pre<strong>se</strong>nte, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> os anos 70, nas<br />

fileiras revolucionárias do jazz.<br />

Murray é um solista po<strong>de</strong>roso e<br />

saberá tirar o melhor partido da<br />

exc<strong>ele</strong>nte <strong>se</strong>cção rítmica que o<br />

acompanha; Lafayette Gilchrist,<br />

Jaribu Shahid e Hamid Drake.<br />

No dia <strong>se</strong>guinte, é a vez <strong>de</strong> uma das<br />

instituições do jazz criativo norteamericano,<br />

a Mingus Dynasty,<br />

formação totalmente <strong>de</strong>dicada ao<br />

repertório do genial Charles Mingus.<br />

Orrin Evans (piano), Craig Handy<br />

(saxofone) e Frank Lacy (trombone)<br />

partilham a difícil tarefa <strong>de</strong> evocar a<br />

irreverência e extrema criativida<strong>de</strong> <strong>de</strong><br />

um dos maiores compositores do jazz<br />

mo<strong>de</strong>rno.<br />

Finalmente, a encerrar o festival,<br />

apre<strong>se</strong>nta-<strong>se</strong> o quinteto do<br />

contrabaixista Christian McBri<strong>de</strong>,<br />

formação que integra o saxofone ágil<br />

<strong>de</strong> Steve Wilson, prometendo um<br />

hard-bop dinâmico, bem coeso,<br />

repleto <strong>de</strong> vibrantes improvisações.<br />

Clássica<br />

Verão<br />

onírico<br />

A música <strong>de</strong> cena <strong>de</strong><br />

Men<strong>de</strong>lssohn para “Sonho<br />

<strong>de</strong> Uma Noite <strong>de</strong> Verão” na<br />

íntegra. Cristina Fernan<strong>de</strong>s<br />

Orquestra <strong>de</strong> Câmara Portuguesa<br />

Direcção Musical: Pedro Carneiro.<br />

Com Ana Quintans (soprano), Joana<br />

Seara (soprano). Com Beatriz<br />

Batarda (narrador), Coro Voces<br />

Ca<strong>ele</strong>stes. Com Orquestra <strong>de</strong><br />

Câmara Portuguesa.<br />

Lisboa. Centro Cultural <strong>de</strong> Belém. Praça do Império.<br />

Sáb. às 21h00. Tel.: 213612400. 5€ a 20€.<br />

A Abertura e a Marcha Nupcial<br />

extraídas da música <strong>de</strong> cena da peça<br />

“Sonho <strong>de</strong> Uma Noite <strong>de</strong> Verão” estão<br />

entre as páginas mais famosas <strong>de</strong><br />

Felix Men<strong>de</strong>lssohn (1809-1847). A<br />

maior parte das restantes <strong>se</strong>cções que<br />

o compositor <strong>de</strong>dicou à célebre obra<br />

<strong>de</strong> Shakespeare são actualmente<br />

menos conhecidas e mais raramente<br />

interpretadas em concerto.<br />

Colmatando esta lacuna, a<br />

Orquestra <strong>de</strong> Câmara Portuguesa<br />

dará a ouvir a obra completa no <strong>se</strong>u<br />

último programa <strong>de</strong>sta tem<strong>por</strong>ada no<br />

Centro Cultural <strong>de</strong> Belém, com a<br />

colaboração do Coro Voces Ca<strong>ele</strong>stes,<br />

das sopranos Ana Quintans e Joana<br />

Seara e da actriz Beatriz Batarda, que<br />

irá <strong>de</strong>clamar alguns excertos do texto<br />

<strong>de</strong> Shakespeare. A direcção musical é<br />

<strong>de</strong> Pedro Carneiro.<br />

Nascido em Hamburgo, numa<br />

ilustre família judia, Men<strong>de</strong>lssohn<br />

teve uma educação refinada que lhe<br />

permitiu <strong>de</strong><strong>se</strong>nvolver uma cultura<br />

enciclopédica e talentos artísticos<br />

como a pintura e a música. O <strong>se</strong>u avô<br />

foi o filósofo Mo<strong>se</strong>s Men<strong>de</strong>lssohn, o<br />

<strong>se</strong>u pai <strong>era</strong> um banqueiro apaixonado<br />

p<strong>ela</strong>s artes, a mãe lia Homero em<br />

grego e a irmã Fanny Men<strong>de</strong>lssohn<br />

<strong>era</strong> também uma talentosa<br />

compositora e pianista. A casa dos<br />

Men<strong>de</strong>lssohn <strong>era</strong> ponto <strong>de</strong> encontro<br />

da elite int<strong>ele</strong>ctual germânica e nos<br />

O vet<strong>era</strong>no Fou Tsong propõe um recital<br />

com Sonatas e Variações <strong>de</strong> Haydn<br />

<strong>se</strong>us jardins realizavam-<strong>se</strong> concertos<br />

<strong>por</strong> uma pequena orquestra. O<br />

“Sonho <strong>de</strong> uma Noite <strong>de</strong> Verão”, <strong>de</strong><br />

Shakespeare, <strong>era</strong> uma das peças<br />

preferidas dos irmãos Men<strong>de</strong>lssohn<br />

que a repre<strong>se</strong>ntavam e liam em na<br />

tradução alemã <strong>de</strong> Schlegel e Tieck.<br />

As fantásticas personagens (Oberon,<br />

Titania, Bottom ou Puck) e os<br />

ambientes feéricos foram ilustrados<br />

musicalmente pelo compositor na<br />

Abertura op. 21 que escreveu em<br />

1826, quando tinha apenas 17 anos. A<br />

composição da restante música <strong>de</strong><br />

cena (op. 61) só ocorreu anos <strong>de</strong>pois,<br />

em 1843, quando Friedrich Wilhelm<br />

IV, rei da Prússia, lhe encomendou<br />

um acompanhamento musical para<br />

uma produção da peça.<br />

Com uma extraordinária<br />

jovialida<strong>de</strong> e criativida<strong>de</strong>, é uma<br />

obra bem apropriada para um<br />

concerto que preten<strong>de</strong> c<strong>ele</strong>brar o<br />

Verão em todo o <strong>se</strong>u esplendor e que<br />

aposta em jovens intérpretes <strong>de</strong><br />

qualida<strong>de</strong>.<br />

44º Festival <strong>de</strong> Sintra<br />

Jue Wang<br />

Com Jue Wang (piano).<br />

Sintra. Quinta da Regaleira. Rua Barbosa du<br />

Bocage. Sáb. às 17h00. Tel.: 219106650. 20€.<br />

Obras <strong>de</strong> Ravel, Chopin e Liszt.<br />

Fou Tsong<br />

Com Fou Tsong (piano).<br />

Sintra. Quinta da Pieda<strong>de</strong>. Estr. Velha <strong>de</strong> Colares.<br />

Dom. às 17h00. Tel.: 219290026. 20€.<br />

Festival <strong>de</strong> Sintra 2009. Obras <strong>de</strong><br />

Haydn.<br />

O programa do Festival <strong>de</strong> Sintra dá<br />

especial <strong>de</strong>staque às escolas<br />

pianísticas chinesa e coreana,<br />

apre<strong>se</strong>ntando intérpretes <strong>de</strong> várias<br />

g<strong>era</strong>ções. Neste fim <strong>de</strong> <strong>se</strong>mana<br />

chegam dois intérpretes nascidos em<br />

Xangai com meio século <strong>de</strong> diferença:<br />

o jovem Jue Wang (n. 1984), que irá<br />

interpretar obras <strong>de</strong> Ravel (Sonatina e<br />

“Mirroirs”) e Brahms ( três<br />

“Intermezzi” op. 117 e <strong>de</strong>z Danças<br />

Húngaras), e o vet<strong>era</strong>no Fou Tsong (n.<br />

1934), que propõe um recital com<br />

Sonatas e Variações <strong>de</strong> Haydn.<br />

Nos últimos oito anos, Jue Wang<br />

tem sido galardoado com numerosos<br />

prémios em diferentes paí<strong>se</strong>s, entre<br />

os quais <strong>se</strong> <strong>de</strong>staca a medalha <strong>de</strong><br />

ouro no XVI Concurso Internacional<br />

<strong>de</strong> Piano <strong>de</strong> Santan<strong>de</strong>r “Paloma<br />

O’Shea” (2008). Fou Tsong,<br />

consid<strong>era</strong>do um dos mais ilustres<br />

músicos chine<strong>se</strong>s vivos, recebeu em<br />

1953 o Prémio Mazurca no


Concertos<br />

<br />

30 • Ípsilon • Sexta-feira 26 Junho 2009<br />

Jazz<br />

Estoril Hot<br />

Apostando forte na<br />

pre<strong>se</strong>nça, a solo, do lendário<br />

pianista Chick Corea, o<br />

Estoril Jazz cumpre 28 anos.<br />

Rodrigo Amado<br />

XXVIII Estoril Jazz - Jazz Num<br />

Dia <strong>de</strong> Verão 2009<br />

Estoril. Centro <strong>de</strong> Congressos do Estoril. Av. Amaral.<br />

Tel.: 214647575. 26 <strong>de</strong> Junho a 05 <strong>de</strong> Julho30€.<br />

Informações: 214827862.<br />

Dia 26/06 às 21h30 - James Carter Quinteto<br />

Dia 27/06 às 15h00 - Jazz em Miúdos<br />

16h30 - Jon Mayer Trio<br />

21h30 - Ro<strong>se</strong>anna Vitro com Kenny Werner Trio<br />

Dia 28/06 às 19h00 / 21h30 - Chick Corea Piano Solo<br />

Dia 03/07 às 21h30 - David Murray “Black Saint<br />

Quartet”<br />

Dia 04/07 às 21h30 - Mingus Dynasty Septeto<br />

Dia 05/07 às 19h00 - Christian McBri<strong>de</strong> and Insi<strong>de</strong><br />

Straight<br />

Numa altura em que a conjuntura<br />

económica põe em evidência a<br />

fragilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> gran<strong>de</strong> parte dos<br />

eventos culturais, saú<strong>de</strong>-<strong>se</strong> a<br />

consistência e longevida<strong>de</strong> <strong>de</strong> um dos<br />

mais im<strong>por</strong>tantes e antigos festivais<br />

<strong>de</strong> jazz <strong>por</strong>tugue<strong>se</strong>s. Des<strong>de</strong> <strong>se</strong>mpre<br />

<strong>de</strong>dicado às correntes mais<br />

con<strong>se</strong>rvadoras do jazz norteamericano,<br />

o Estoril Jazz apre<strong>se</strong>nta<br />

este ano um cartaz fortíssimo que<br />

integra duas formações<br />

históricas mais próximas<br />

<strong>de</strong> um jazz <strong>de</strong> cariz<br />

mo<strong>de</strong>rno; o quarteto<br />

“Black Saint” <strong>de</strong><br />

David Murray e o<br />

<strong>se</strong>pteto Mingus<br />

Dynasty.<br />

As primeiras<br />

notas do<br />

festival <strong>se</strong>rão<br />

dadas pelo<br />

quinteto do<br />

exc<strong>ele</strong>nte<br />

saxofonista<br />

James Carter,<br />

tendo a <strong>se</strong>u lado<br />

o trompete <strong>de</strong><br />

Corey Wilkes.<br />

O gran<strong>de</strong> momento do festival está re<strong>se</strong>rvado Tendo perdido<br />

para domingo, com duas <strong>se</strong>ssões con<strong>se</strong>cutivas alguma da visibilida<strong>de</strong><br />

pelo mestre Chick Corea<br />

que marcou os primeiros<br />

anos da sua carreira, Carter<br />

A Orquestra <strong>de</strong> Câmara Portuguesa dará a ouvir a obra completa <strong>de</strong> “Sonho<br />

<strong>de</strong> uma Noite <strong>de</strong> Verão”, <strong>de</strong> Men<strong>de</strong>lssohn, com a colaboração do Coro Voces Ca<strong>ele</strong>stes<br />

mantém uma activida<strong>de</strong> intensa que o<br />

afirma como um dos gran<strong>de</strong>s solistas<br />

do jazz actual. Enérgico e criativo,<br />

particularmente forte no saxofone<br />

barítono, Carter editou no ano<br />

passado “Pre<strong>se</strong>nt Ten<strong>se</strong>”, uma<br />

referência na sua obra recente.<br />

No <strong>se</strong>gundo dia do festival as<br />

activida<strong>de</strong>s têm início às 15h00 com o<br />

projecto Jazz em Miúdos, um projecto<br />

<strong>de</strong> jovens músicos nacionais que<br />

adaptaram à língua <strong>por</strong>tuguesa uma<br />

série <strong>de</strong> conhecidos standards <strong>de</strong> jazz.<br />

A meio da tar<strong>de</strong> apre<strong>se</strong>nta-<strong>se</strong> o trio <strong>de</strong><br />

Jon Mayer, pianista pouco conhecido<br />

cujo percurso assinala, no entanto,<br />

algumas colaborações <strong>de</strong> peso.<br />

Concerto evocativo <strong>de</strong> uma visita <strong>de</strong><br />

Mayer, em 1960, ao mítico Clube<br />

Universitário <strong>de</strong> Jazz. A noite <strong>de</strong><br />

sábado é <strong>de</strong>dicada à arte das canções,<br />

neste caso interpretadas p<strong>ela</strong> voz <strong>de</strong><br />

Ro<strong>se</strong>anna Vitro, acompanhada pelo<br />

trio <strong>de</strong> Kenny Werner, talentoso<br />

pianista bem conhecido pelos <strong>se</strong>us<br />

extraordinários dotes <strong>de</strong><br />

acompanhador.<br />

O gran<strong>de</strong> momento do festival está<br />

re<strong>se</strong>rvado para domingo, com duas<br />

<strong>se</strong>ssões con<strong>se</strong>cutivas pelo mestre<br />

Chick Corea em solo absoluto <strong>de</strong><br />

piano, formato que evi<strong>de</strong>ncia as suas<br />

capacida<strong>de</strong>s únicas como intérprete e<br />

como improvisador. Corea, que<br />

embarcou recentemente numa série<br />

<strong>de</strong> aventuras fusionistas <strong>de</strong> gosto<br />

duvidoso, é um dos gran<strong>de</strong>s estetas<br />

do piano jazz, e estes dois recitais a<br />

solo po<strong>de</strong>m rev<strong>ela</strong>r-<strong>se</strong> momentos <strong>de</strong><br />

im<strong>por</strong>tância histórica.<br />

O <strong>se</strong>gundo fim <strong>de</strong> <strong>se</strong>mana tem um<br />

início agitado com o “Black Saint<br />

Quartet” do saxofonista David<br />

Murray, improvisador <strong>se</strong>mpre<br />

pre<strong>se</strong>nte, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> os anos 70, nas<br />

fileiras revolucionárias do jazz.<br />

Murray é um solista po<strong>de</strong>roso e<br />

saberá tirar o melhor partido da<br />

exc<strong>ele</strong>nte <strong>se</strong>cção rítmica que o<br />

acompanha; Lafayette Gilchrist,<br />

Jaribu Shahid e Hamid Drake.<br />

No dia <strong>se</strong>guinte, é a vez <strong>de</strong> uma das<br />

instituições do jazz criativo norteamericano,<br />

a Mingus Dynasty,<br />

formação totalmente <strong>de</strong>dicada ao<br />

repertório do genial Charles Mingus.<br />

Orrin Evans (piano), Craig Handy<br />

(saxofone) e Frank Lacy (trombone)<br />

partilham a difícil tarefa <strong>de</strong> evocar a<br />

irreverência e extrema criativida<strong>de</strong> <strong>de</strong><br />

um dos maiores compositores do jazz<br />

mo<strong>de</strong>rno.<br />

Finalmente, a encerrar o festival,<br />

apre<strong>se</strong>nta-<strong>se</strong> o quinteto do<br />

contrabaixista Christian McBri<strong>de</strong>,<br />

formação que integra o saxofone ágil<br />

<strong>de</strong> Steve Wilson, prometendo um<br />

hard-bop dinâmico, bem coeso,<br />

repleto <strong>de</strong> vibrantes improvisações.<br />

Clássica<br />

Verão<br />

onírico<br />

A música <strong>de</strong> cena <strong>de</strong><br />

Men<strong>de</strong>lssohn para “Sonho<br />

<strong>de</strong> Uma Noite <strong>de</strong> Verão” na<br />

íntegra. Cristina Fernan<strong>de</strong>s<br />

Orquestra <strong>de</strong> Câmara Portuguesa<br />

Direcção Musical: Pedro Carneiro.<br />

Com Ana Quintans (soprano), Joana<br />

Seara (soprano). Com Beatriz<br />

Batarda (narrador), Coro Voces<br />

Ca<strong>ele</strong>stes. Com Orquestra <strong>de</strong><br />

Câmara Portuguesa.<br />

Lisboa. Centro Cultural <strong>de</strong> Belém. Praça do Império.<br />

Sáb. às 21h00. Tel.: 213612400. 5€ a 20€.<br />

A Abertura e a Marcha Nupcial<br />

extraídas da música <strong>de</strong> cena da peça<br />

“Sonho <strong>de</strong> Uma Noite <strong>de</strong> Verão” estão<br />

entre as páginas mais famosas <strong>de</strong><br />

Felix Men<strong>de</strong>lssohn (1809-1847). A<br />

maior parte das restantes <strong>se</strong>cções que<br />

o compositor <strong>de</strong>dicou à célebre obra<br />

<strong>de</strong> Shakespeare são actualmente<br />

menos conhecidas e mais raramente<br />

interpretadas em concerto.<br />

Colmatando esta lacuna, a<br />

Orquestra <strong>de</strong> Câmara Portuguesa<br />

dará a ouvir a obra completa no <strong>se</strong>u<br />

último programa <strong>de</strong>sta tem<strong>por</strong>ada no<br />

Centro Cultural <strong>de</strong> Belém, com a<br />

colaboração do Coro Voces Ca<strong>ele</strong>stes,<br />

das sopranos Ana Quintans e Joana<br />

Seara e da actriz Beatriz Batarda, que<br />

irá <strong>de</strong>clamar alguns excertos do texto<br />

<strong>de</strong> Shakespeare. A direcção musical é<br />

<strong>de</strong> Pedro Carneiro.<br />

Nascido em Hamburgo, numa<br />

ilustre família judia, Men<strong>de</strong>lssohn<br />

teve uma educação refinada que lhe<br />

permitiu <strong>de</strong><strong>se</strong>nvolver uma cultura<br />

enciclopédica e talentos artísticos<br />

como a pintura e a música. O <strong>se</strong>u avô<br />

foi o filósofo Mo<strong>se</strong>s Men<strong>de</strong>lssohn, o<br />

<strong>se</strong>u pai <strong>era</strong> um banqueiro apaixonado<br />

p<strong>ela</strong>s artes, a mãe lia Homero em<br />

grego e a irmã Fanny Men<strong>de</strong>lssohn<br />

<strong>era</strong> também uma talentosa<br />

compositora e pianista. A casa dos<br />

Men<strong>de</strong>lssohn <strong>era</strong> ponto <strong>de</strong> encontro<br />

da elite int<strong>ele</strong>ctual germânica e nos<br />

O vet<strong>era</strong>no Fou Tsong propõe um recital<br />

com Sonatas e Variações <strong>de</strong> Haydn<br />

<strong>se</strong>us jardins realizavam-<strong>se</strong> concertos<br />

<strong>por</strong> uma pequena orquestra. O<br />

“Sonho <strong>de</strong> uma Noite <strong>de</strong> Verão”, <strong>de</strong><br />

Shakespeare, <strong>era</strong> uma das peças<br />

preferidas dos irmãos Men<strong>de</strong>lssohn<br />

que a repre<strong>se</strong>ntavam e liam em na<br />

tradução alemã <strong>de</strong> Schlegel e Tieck.<br />

As fantásticas personagens (Oberon,<br />

Titania, Bottom ou Puck) e os<br />

ambientes feéricos foram ilustrados<br />

musicalmente pelo compositor na<br />

Abertura op. 21 que escreveu em<br />

1826, quando tinha apenas 17 anos. A<br />

composição da restante música <strong>de</strong><br />

cena (op. 61) só ocorreu anos <strong>de</strong>pois,<br />

em 1843, quando Friedrich Wilhelm<br />

IV, rei da Prússia, lhe encomendou<br />

um acompanhamento musical para<br />

uma produção da peça.<br />

Com uma extraordinária<br />

jovialida<strong>de</strong> e criativida<strong>de</strong>, é uma<br />

obra bem apropriada para um<br />

concerto que preten<strong>de</strong> c<strong>ele</strong>brar o<br />

Verão em todo o <strong>se</strong>u esplendor e que<br />

aposta em jovens intérpretes <strong>de</strong><br />

qualida<strong>de</strong>.<br />

44º Festival <strong>de</strong> Sintra<br />

Jue Wang<br />

Com Jue Wang (piano).<br />

Sintra. Quinta da Regaleira. Rua Barbosa du<br />

Bocage. Sáb. às 17h00. Tel.: 219106650. 20€.<br />

Obras <strong>de</strong> Ravel, Chopin e Liszt.<br />

Fou Tsong<br />

Com Fou Tsong (piano).<br />

Sintra. Quinta da Pieda<strong>de</strong>. Estr. Velha <strong>de</strong> Colares.<br />

Dom. às 17h00. Tel.: 219290026. 20€.<br />

Festival <strong>de</strong> Sintra 2009. Obras <strong>de</strong><br />

Haydn.<br />

O programa do Festival <strong>de</strong> Sintra dá<br />

especial <strong>de</strong>staque às escolas<br />

pianísticas chinesa e coreana,<br />

apre<strong>se</strong>ntando intérpretes <strong>de</strong> várias<br />

g<strong>era</strong>ções. Neste fim <strong>de</strong> <strong>se</strong>mana<br />

chegam dois intérpretes nascidos em<br />

Xangai com meio século <strong>de</strong> diferença:<br />

o jovem Jue Wang (n. 1984), que irá<br />

interpretar obras <strong>de</strong> Ravel (Sonatina e<br />

“Mirroirs”) e Brahms ( três<br />

“Intermezzi” op. 117 e <strong>de</strong>z Danças<br />

Húngaras), e o vet<strong>era</strong>no Fou Tsong (n.<br />

1934), que propõe um recital com<br />

Sonatas e Variações <strong>de</strong> Haydn.<br />

Nos últimos oito anos, Jue Wang<br />

tem sido galardoado com numerosos<br />

prémios em diferentes paí<strong>se</strong>s, entre<br />

os quais <strong>se</strong> <strong>de</strong>staca a medalha <strong>de</strong><br />

ouro no XVI Concurso Internacional<br />

<strong>de</strong> Piano <strong>de</strong> Santan<strong>de</strong>r “Paloma<br />

O’Shea” (2008). Fou Tsong,<br />

consid<strong>era</strong>do um dos mais ilustres<br />

músicos chine<strong>se</strong>s vivos, recebeu em<br />

1953 o Prémio Mazurca no


Concertos<br />

Concurso Chopin <strong>de</strong> Varsóvia,<br />

tendo iniciado aí uma im<strong>por</strong>tante<br />

carreira internacional, que o levou a<br />

actuar poucos anos <strong>de</strong>pois com o<br />

gran<strong>de</strong> maestro Carl Maria Giulini.<br />

Recentemente tem integrado o júri<br />

<strong>de</strong> alguns dos mais prestigiados<br />

concursos internacionais <strong>de</strong> piano e<br />

conta com uma diversificada<br />

discografia na etiqueta Meridian que<br />

inclui obras <strong>de</strong> Scarlatti, Bach,<br />

Han<strong>de</strong>l, Mozart, Beethoven, Chopin,<br />

Schubert, Schumann e Debussy,<br />

entre outros. C.F.<br />

apre<strong>se</strong>nta<br />

ANTÓNIO BUIKA<br />

ZAMBUJO<br />

Convida IVAN LINS<br />

16JUL<br />

15JUL<br />

MAFALDA<br />

VEIGA<br />

21JUL<br />

Convida MARIZA<br />

www.cooljazzfest.com<br />

CASCAIS CIDADELA 9JUL<br />

JOSHUA REDMAN 10JUL<br />

JAZZANOVA LIVE BAND! FEAT PAUL<br />

RANDOLPHPARQUE MARECHAL<br />

CARMONA 14JUL ELIANE<br />

ELIAS 1ªParte BOSSA NOSSA 23JUL<br />

LISA EKDHAL HIPÓDROMO<br />

22JUL KATIE MELUA 29JUL<br />

JAMES TAYLOR 31JUL SEAL<br />

MAFRA JARDIM DO CERCO<br />

16JUL VAYA CON DIOS<br />

17JUL VADIOS CAMANÉ,<br />

MÁRIO LAGINHA, BERNARDO<br />

SASSETTI Convidado CARLOS BICA<br />

PARQUE<br />

MARECHAL<br />

CARMONA<br />

Bilhetes à venda na Ticketline (www.ticketline.pt), Lojas Fnac, Posto <strong>de</strong> Turismo <strong>de</strong> Mafra e locais habituais.<br />

Patrocinadores Principais: Patrocinadores Oficiais: Media Partners: Hotel Oficial: Organização:<br />

32 • Ípsilon • Sexta-feira 26 Junho 2009<br />

Pop<br />

As canções do bom<br />

velho Elton<br />

Elton John<br />

Lisboa. Pavilhão Atlântico. Parque das Nações.<br />

Dom. às 22h00. Tel.: 218918409. 40€ a 125€.<br />

1969 foi um ano normal para Reginald<br />

Kenneth Dwight. O pianista compôs<br />

as habituais canções para outros<br />

Elton John gosta <strong>de</strong> fazer as coisas em<br />

gran<strong>de</strong> - e, nesta “Rocket Man Tour” as<br />

coisas têm mesmo que <strong>se</strong>r em gran<strong>de</strong><br />

cantarem, andou a tocar em pubs e<br />

cabarets, enfim, fez aquilo que vinha<br />

fazendo <strong>de</strong>s<strong>de</strong> o início da década <strong>de</strong><br />

1960. Ah, mas entre isso houve algo<br />

<strong>de</strong> diferente.<br />

Reginald, que <strong>por</strong> esta altura já<br />

assinava como Elton John, também<br />

editou um disco - chamava-<strong>se</strong><br />

“Empty Sky” mas ninguém ligou.<br />

Um ano <strong>de</strong>pois, tudo havia mudado.<br />

Em 1970, um álbum homónimo,<br />

on<strong>de</strong> encontrávamos “Bor<strong>de</strong>r song”<br />

ou “Your song”, nada teve <strong>de</strong><br />

discreto e Reginald, o músico <strong>de</strong><br />

Os Black Bombaim são indicados para a<br />

noite e são dados a divagações<br />

<strong>se</strong>ssão,<br />

transformava-<strong>se</strong> em<br />

Elton John, a estr<strong>ela</strong><br />

pop. O resto, como<br />

sabemos, é história. E é<br />

essa história que o autor <strong>de</strong><br />

“Candle in the wind” anda a<br />

c<strong>ele</strong>brar mundo fora na “Rocket Man<br />

Tour”, que passa pelo Pavilhão<br />

Atlântico dia 28 <strong>de</strong> Junho.<br />

Inicialmente marcado para dia 27,<br />

no Estádio do Restelo, o concerto<br />

teve data e localização alt<strong>era</strong>das<br />

<strong>de</strong>vido à estrutura do palco <strong>de</strong> Sir<br />

Elton,<br />

criador<br />

que, como<br />

sabemos<br />

<strong>de</strong>s<strong>de</strong> es<strong>se</strong>s<br />

anos 1970 que<br />

passou enfiado em fatos<br />

<strong>de</strong> Donald ou <strong>de</strong> nobre da corte <strong>de</strong><br />

Versalhes, gosta <strong>de</strong> fazer as coisas<br />

em gran<strong>de</strong> - e, nesta “Rocket Man<br />

Tour” as coisas têm mesmo que <strong>se</strong>r<br />

em gran<strong>de</strong>.<br />

Afinal, c<strong>ele</strong>bra-<strong>se</strong> uma das maiores<br />

estr<strong>ela</strong>s da pop dos anos 1970, o<br />

homem que atravessou os 80 como<br />

c<strong>ele</strong>brida<strong>de</strong> intocada (quem não <strong>se</strong><br />

lembra da “Nikita”?), o músico que é<br />

padrinho <strong>de</strong> Sean Ono Lennon e que<br />

sabia da bulimia <strong>de</strong> Lady Di muito<br />

antes do resto do mundo (<strong>por</strong>que<br />

<strong>era</strong>m os melhores amigos, <strong>por</strong>que<br />

também <strong>ele</strong> <strong>era</strong> bulímico).<br />

Desta vez, esp<strong>era</strong>-<strong>se</strong>, não haverá<br />

fumo no Pavilhão que o <strong>de</strong>mova (em<br />

2000, a sua justificação para o<br />

canc<strong>ela</strong>mento do concerto no<br />

Casino Estoril foi o excesso <strong>de</strong> fumo<br />

no Salão Preto e Prata). Melómano<br />

insaciável, diz que o <strong>se</strong>u próximo<br />

álbum terá como principal<br />

influência o hip hop e o r&b <strong>de</strong><br />

Timbaland, Snoop Dogg, Kanye West<br />

ou Pharrell Williams. No Pavilhão<br />

Atlântico, contudo, não haverá<br />

tempo para olhar em frente. Para<br />

trás, <strong>por</strong>tanto: “Daniel”, “Candle in<br />

the wind”, “Rocket man”,<br />

“Sacrifice”, “Can you feel the love<br />

tonight”. As velhas canções do bom<br />

velho Elton. Mário Lopes<br />

Alto! + Black Bombaim + Sun<br />

Flare & Garcia da Selva<br />

Lisboa. Galeria Zé dos Bois. Rua da Barroca, 59 -<br />

Bairro Alto. Sáb. às 23h00. Tel.: 213430205. 6€.<br />

Black Bombaim é um nome<br />

<strong>por</strong>reiro, principalmente para quem<br />

nunca esteve em Bombaim. Nunca<br />

tendo estado na maior cida<strong>de</strong><br />

indiana, retém-<strong>se</strong> apenas a imagem<br />

romantizada da cida<strong>de</strong>, um lado<br />

exótico a que a banda fez questão <strong>de</strong><br />

a<strong>por</strong> o substantivo negro para não<br />

haver confusões.<br />

Porque os Black Bombaim são<br />

indicados para a noite e são dados a<br />

divagações - nunca tendo estado em<br />

Bombaim, o nome invoca algo <strong>de</strong><br />

misterioso e isso <strong>se</strong>rve bem a uma<br />

banda que é, neste momento, a mais<br />

<strong>de</strong>stacada <strong>de</strong> algo que, visto à<br />

distância, apelidaríamos <strong>de</strong> cena.<br />

De<strong>se</strong>nvolve-<strong>se</strong> em Barcelos e temnos<br />

rev<strong>ela</strong>do nos últimos tempos<br />

uma série <strong>de</strong> nomes a <strong>se</strong>guir com<br />

atenção - os Green Machine,<br />

primeiro, e agora estes Black<br />

Bombaim, ALTO!, Glockenspiel ou<br />

uns Aspen que <strong>se</strong> chamavam Cosmic<br />

Vishnu antes <strong>de</strong> <strong>de</strong>cidirem mudar <strong>de</strong><br />

nome e <strong>de</strong> sonorida<strong>de</strong>.<br />

Tudo pessoal a mexer-<strong>se</strong> e a fazer<br />

mexer - <strong>por</strong> exemplo, no fim-<strong>de</strong><strong>se</strong>mana<br />

passado, o Auditório da<br />

Biblioteca <strong>Municipal</strong> recebeu o<br />

<strong>se</strong>gundo “Barcelos É Demais”, míni<br />

festival que reúne a pandilha toda.<br />

Amanhã, parte d<strong>ela</strong> aterra na Galeria<br />

Zé dos Bois. Black Bombaim e<br />

ALTO!, acompanhados <strong>por</strong> uns<br />

misteriosos Sunflare & Garcia da<br />

Selva <strong>de</strong> quem pouco <strong>se</strong> sabe. Anda


Nestes concertos, há “um pouquinho <strong>de</strong><br />

cada coisa”, diz Virgínia Rodrigues Katy Perry<br />

<strong>por</strong> lá Guilherme Canhão, guitarrista<br />

dos Lobster, e alguém dos The<br />

Sound Of Typewriters - o resto é<br />

para <strong>se</strong>r <strong>de</strong>svendado sábado à noite.<br />

Falemos então do que sabemos.<br />

Dos Black Bombaim, mestres <strong>de</strong>s<strong>se</strong><br />

psica<strong>de</strong>lismo excessivo a que<br />

<strong>de</strong>cidiram chamar stoner-rock, e dos<br />

Alto!, pessoal do garage berrado <strong>se</strong>m<br />

parcimónia. Os primeiros editaram<br />

recentemente o homónimo e muito<br />

recomendável álbum <strong>de</strong> estreia:<br />

dispensam vocalista e concentram<br />

tudo numa <strong>de</strong>scarga eléctrica<br />

mastodôntica. São os Black Sabbath<br />

em jam enquanto o Ozzy rói um<br />

morcego no bar, os Comets On Fire<br />

com ré<strong>de</strong>a solta no estúdio on<strong>de</strong> os<br />

Blue Cheer gravaram “Outsi<strong>de</strong><br />

Insi<strong>de</strong>”, são uma felicida<strong>de</strong> opiácea<br />

em volume acima do recomendável (e<br />

é assim que <strong>de</strong>ve <strong>se</strong>r).<br />

Já os ALTO! op<strong>era</strong>m <strong>de</strong> outra forma.<br />

Formados <strong>por</strong> membros dos Green<br />

Machine e com um Black Bombaim<br />

na bateria, editaram há alguns me<strong>se</strong>s<br />

a primeira maqueta e são um<br />

frenesim garage-rock <strong>de</strong> riff certeiro e<br />

grito a<strong>de</strong>quado para inflamar as<br />

massas (dançantes, esp<strong>era</strong>-<strong>se</strong>).<br />

Um dia <strong>de</strong>pois do concerto na<br />

ZDB, Black Bombaim e Alto! actuam,<br />

domingo, no Mercado Negro, em<br />

Aveiro. M.L.<br />

Festival Mestiço 2009<br />

Naná Vasconcelos + Virgínia<br />

Rodrigues + JP Simões<br />

Com Naná Vasconcelos (voz e<br />

percussão), Virgínia Rodrigues (voz),<br />

Lui Coimbra (voz violoncelo e<br />

guitarra), Alex Mesquita (guitarra<br />

acústica).<br />

Porto. Casa da Música. Pç. Mouzinho <strong>de</strong><br />

Albuquerque. 5ª às 22h00. Tel.: 220120220. 15€.<br />

Pas<strong>se</strong> Mestiço: 30€.<br />

A atentar no cartaz <strong>de</strong>sta quintafeira,<br />

não <strong>se</strong> po<strong>de</strong> dizer que o<br />

Festival Mestiço (Casa da Música,<br />

Porto) leve às últimas con<strong>se</strong>quências<br />

a i<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> surpresa (es<strong>se</strong>ncial a uma<br />

boa mestiçagem): Naná<br />

Vasconcelos, Virgínia Rodrigues e JP<br />

Simões são nomes conhecidos. Naná<br />

é um dos gran<strong>de</strong>s percussionistas<br />

brasileiros (e um conhecedor das<br />

origens africanas <strong>de</strong>ssas percussões)<br />

e conheceu Virgínia há uns anos, na<br />

feitura do documentário “Diário <strong>de</strong><br />

Naná”. Des<strong>de</strong> então têm colaborado<br />

juntos.<br />

Por norma, nestes concertos, há<br />

“um pouquinho <strong>de</strong> cada coisa”,<br />

como dis<strong>se</strong> há uns dias Virgínia.<br />

Tocam canções que <strong>ela</strong> gravou em<br />

“Mares Profundos”, há afro-sambas<br />

(Ba<strong>de</strong>n e Vinicius), canções <strong>de</strong> Villa-<br />

Lobos, cantos religiosos, coisas que<br />

Naná gravou. Há 15 dias Naná dizia<br />

que “a cada vez a coisa vai<br />

crescendo”, pelo que no Porto já<br />

<strong>de</strong>ve estar tudo afinado.<br />

JP Simões, entretanto, anda a rodar<br />

“Boato”, o <strong>se</strong>u último disco, que une<br />

canções dos <strong>se</strong>us dois primeiros com<br />

os Belle Cha<strong>se</strong> Hotel a canções do<br />

Quinteto Tati e a canções <strong>de</strong> “1970”, o<br />

<strong>se</strong>u primeiro disco a solo, a canções<br />

da “Óp<strong>era</strong> do Falhado” e a originais<br />

nunca antes publicados. É, dis<strong>se</strong> JP,<br />

uma espécie <strong>de</strong> balanço da primeira<br />

fa<strong>se</strong> <strong>de</strong> uma carreira. João Bonifácio<br />

Agenda<br />

<strong>se</strong>xta, 26<br />

Shout Out Louds<br />

Vila Nova <strong>de</strong> Famalicão. Casa das Artes <strong>de</strong> Vila Nova<br />

<strong>de</strong> Famalicão. Pq. <strong>de</strong> Sinçães. 6ª às 22h00. Tel.:<br />

252371297.25€.<br />

Maria da Fé & Convidados<br />

Com Maria da Fé, Camané, Aldina<br />

Duarte, Ana <strong>de</strong> Castro, António<br />

Zambujo.<br />

Porto. Coli<strong>se</strong>u. R. Passos Manuel, 137. 6ª às 22h00.<br />

Tel.: 223394947. 25€ a 50€.<br />

Tiguana Bibles<br />

Lisboa. Galeria Zé dos Bois. R. da Barroca, 59 -<br />

Bairro Alto. 6ª às 23h00. Tel.: 213430205. 6€.<br />

Rodrigo Leão & Cinema En<strong>se</strong>mble<br />

Fafe. Teatro Cinema <strong>de</strong> Fafe. R. Mon<strong>se</strong>nhor Vieira <strong>de</strong><br />

Castro. 6ª às 21h30. 10€ a 15€. Informações:<br />

918028108.<br />

Festival Med 2009 - Dia 26<br />

Loulé. 6ª às 19h30. 12€. Pas<strong>se</strong>: 40€.<br />

No Centro Histórico. Palco Matriz:<br />

Orquestra Buena Vista Social Club e<br />

DJ Click. Palco Cerca: Donna Maria e<br />

Pitingo. Palco Castelo: Hristov e<br />

Philarmonic Weed. Palco Bica:<br />

Nanook e os Vagabungos e Duon<strong>de</strong>.<br />

Palco Arco: Trio João Orn<strong>ela</strong>s e Yin &<br />

Yang. Palco Classic: Orquestra do<br />

Algarve.<br />

Festa do Jazz do São Luiz<br />

Lisboa. Teatro <strong>Municipal</strong> <strong>de</strong> S. Luiz. R. Antº Maria<br />

Cardoso, 38-58. 6ª às 21h00. Tel.: 213257650. Pas<strong>se</strong> 1<br />

dia: 15€. Pas<strong>se</strong> 2 dias: 25€. Pas<strong>se</strong> 3 dias: 30€.<br />

Sala Principal: António Pinho Vargas,<br />

En<strong>se</strong>mble Festa do Jazz do São Luiz.<br />

Jardim <strong>de</strong> Inverno: Big Band da Escola<br />

<strong>de</strong> Jazz do Barreiro, Jam Sessions.<br />

sábado, 27<br />

António Chainho<br />

Com António Chainho (guitarra).<br />

Guarda. Teatro <strong>Municipal</strong>. R. Batalha Reis, 12. Sáb.<br />

às 21h30. Tel.: 271205241.10€.<br />

Sumol Summer Fest - Dia 27<br />

Ericeira. Praia Ribeira d’Ilhas. . Sáb. às 17h00. 25€.<br />

Pas<strong>se</strong>: 40€.<br />

Sumol Summer Fest. Palco Sumol:<br />

Tiken Jah Fakoly, Mishka, Justin<br />

Nozuka, Culcha Cand<strong>ela</strong>, Police in<br />

Dub e Ana Free. Tenda Good Vibes:<br />

DJ Patife, Miguel Ren<strong>de</strong>iro e Mary B.<br />

Arraial Pri<strong>de</strong> 2009<br />

Com Bad Lovers & Hysteria Iberika.<br />

Com Rainha Malvada, Lorenz Factor,<br />

Natasha Semmynova, Bruna<br />

Meneghel, H<strong>ele</strong>na Martins, Kassandra,<br />

Miss T & Hush Hush, Rui Murka,<br />

Plastic Poney, Deborah Kristall &<br />

Companhia, Les Baton Rouge, La<br />

Terremoto <strong>de</strong> Alcorcon.<br />

Lisboa. Jardim da Torre <strong>de</strong> Belém. Sáb. às 16h.<br />

Entrada livre.<br />

A. J. Holmes<br />

Lisboa. Fundação e Mu<strong>se</strong>u Calouste Gulbenkian. Av.<br />

<strong>de</strong> Berna, 45A. Sáb. às 21h30. Tel.: 217823700. 10€.<br />

Festa do Jazz do São Luiz - Dia 27<br />

Lisboa. Teatro <strong>Municipal</strong> <strong>de</strong> S. Luiz. R. Antº Maria<br />

Cardoso, 38-58. Sáb. às 14h00. Tel.: 213257650. Pas<strong>se</strong><br />

1 dia: 15€. Pas<strong>se</strong> 2 dias: 25€. Pas<strong>se</strong> 3 dias: 30€.<br />

Sala Principal: Vozes 3, Zé Eduardo<br />

Unit, André Matos Trio e George<br />

Garzone. Teatro-Estúdio Mário<br />

Viegas: Desidério Lázaro Quarteto,<br />

Rui Caetano Trio, Tim Tim Por Tim<br />

Tum. Spot São Luiz: Triospiro.<br />

Jardim <strong>de</strong> Inverno: Quinteto <strong>de</strong> Jazz<br />

da ESMAE, Jam Sessions, Aca<strong>de</strong>mia<br />

<strong>de</strong> Amadores <strong>de</strong> Música, Combo <strong>de</strong><br />

Jazz do Con<strong>se</strong>rvatório Nacional,<br />

Escola <strong>de</strong> Jazz do Barreiro, Escola <strong>de</strong><br />

Música Valentim <strong>de</strong> Carvalho,<br />

Con<strong>se</strong>rvatório da Escola Profissional<br />

das Artes da Ma<strong>de</strong>ira, Escola <strong>de</strong> Jazz<br />

do Porto, Escola <strong>de</strong> Jazz Luiz Villas-<br />

Boas.<br />

Gui Boratto + Expan<strong>de</strong>r +<br />

Freshkitos + Manu<br />

Porto. Teatro Sá da Ban<strong>de</strong>ira. R. Sá da Ban<strong>de</strong>ira, 108.<br />

Sáb. às 00h00. Tel.: 222003595.20€. Pré-venda: 15€.<br />

domingo, 28<br />

Katy Perry<br />

Lisboa. Pç. <strong>de</strong> Touros do Campo Pequeno. Dom. às<br />

20h00 (<strong>por</strong>tas abrem às 19h). Tel.: 217820575. 23€ a<br />

29€.<br />

Brad Mehldau + Chico Pinheiro +<br />

Fleurine + Luciana Alves<br />

Com Brad Mehldau (piano), Chico<br />

Pinheiro (guitarra e violão), Fleurine<br />

(voz), Lucinda Alves (voz), Doug<br />

Weiss (baixo), Edu Ribeiro (bateria).<br />

Porto. Casa da Música. Pç. Mouzinho <strong>de</strong><br />

Albuquerque. Dom. às 22h00. Tel.: 220120220.<br />

25€.<br />

Lisboa. Aula Magna. Alam. Universida<strong>de</strong>. 2ª às<br />

21h30. Tel.: 217967624.35€ a 40€.<br />

Faro. Teatro <strong>Municipal</strong>. Horta das Figuras - EN125.<br />

3ª às 22h00. Tel.: 289888100. 15€ a 20€.<br />

Chick Corea<br />

Com Chick Corea (piano).<br />

Estoril. Centro <strong>de</strong> Congressos. Av. Amaral. Dom. às<br />

19h00 e 21h30. Tel.: 214647575. 30€.<br />

Dema y su Orquestra Petit<strong>era</strong><br />

Lisboa. Fundação e Mu<strong>se</strong>u Calouste Gulbenkian. Av.<br />

<strong>de</strong> Berna, 45A. Dom. às 19h00. Tel.: 217823700. 10€.<br />

No Anfiteatro ao Ar Livre<br />

Próximo Futuro/Next Future.<br />

Festa do Jazz do São Luiz - Dia 28<br />

Lisboa. Teatro <strong>Municipal</strong> <strong>de</strong> S. Luiz. R. Antº Maria<br />

Cardoso, 38-58. Dom. às 12h00. Tel.: 213257650.<br />

Pas<strong>se</strong> 1 dia: 15€. Pas<strong>se</strong> 2 dias: 25€. Pas<strong>se</strong> 3 dias: 30€.<br />

Sala Principal: Orquestra <strong>de</strong> Jazz <strong>de</strong><br />

Matosinhos, José Peixoto, Ricardo<br />

Pinheiro Quinteto e Chris Cheek.<br />

Teatro-Estúdio Mário Viegas: Pedro<br />

Madaleno, Laurent Filipe, Acácio<br />

Saleiro. Spot São Luiz: Zeca Neves e<br />

Nuno Ferreira. Jardim <strong>de</strong> Inverno:<br />

A<strong>de</strong>lino Mota e Quarteto Maravilha,<br />

Lúcia Martínez Quarteto, Jam<br />

Sessions, Escola <strong>de</strong> Artes <strong>de</strong> Sines,<br />

Jazz Class Dámsom, Escola <strong>de</strong><br />

Música <strong>de</strong> Aveiro, Escola JBJazz,<br />

Universida<strong>de</strong> <strong>de</strong> Évora, Escola<br />

Superior <strong>de</strong> Música <strong>de</strong> Lisboa,<br />

Escola Superior <strong>de</strong> Música e das<br />

Artes do Espectáculo.<br />

quarta, 1<br />

Pedro Burmester<br />

Com Pedro Burmester (piano).<br />

Sintra. CC Olga Cadaval. Pç. Dr. Francisco Sá<br />

Carneiro. 4ª às 21h30. Tel.: 219107110. 15€ a 20€.<br />

Orquestra G<strong>era</strong>ção<br />

Lisboa. Fundação e Mu<strong>se</strong>u Calouste Gulbenkian. Av.<br />

<strong>de</strong> Berna, 45A. 4ª às 18h00. Tel.: 217823700. Entrada<br />

livre.<br />

quinta 2<br />

Brad Mehldau<br />

Gaiteiros <strong>de</strong> Lisboa<br />

Lisboa. Cinema São Jorge. Av.<br />

Liberda<strong>de</strong>, 175. 5ª às 21h00. Tel.:<br />

213103400. 10€.<br />

Ípsilon • Sexta-feira 26 Junho 2009 • 33


Expos<br />

34 • Ípsilon • Sexta-feira 26 Junho 2009<br />

1979 - 2009<br />

Corrente<br />

<strong>de</strong> ar<br />

Uma instalação luminosa <strong>de</strong><br />

Pedro Morais no CAM, em<br />

Lisboa. Óscar Faria<br />

Mu. Lua em Chão <strong>de</strong> Terra Batida<br />

De Pedro Morais.<br />

Lisboa. Centro <strong>de</strong> Arte Mo<strong>de</strong>rna - José <strong>de</strong> Azeredo<br />

Perdigão. Rua Dr. Nicolau Bettencourt. Tel.:<br />

217823474. Até 30/08. 3ª a Dom. das 10h às 18h..<br />

Instalação.<br />

mmmmm<br />

Em 1234, <strong>se</strong>te anos após ter<br />

regressado da China, Dogen Zenji, o<br />

fundador da escola Soto, uma das<br />

variantes do budismo Zen no Japão,<br />

escreveu para os <strong>se</strong>us discípulos o<br />

texto “Gakudo Yojin-shu”, uma<br />

espécie <strong>de</strong> manual <strong>de</strong> instruções<br />

para aqu<strong>ele</strong>s que <strong>se</strong>guiam uma<br />

prática ba<strong>se</strong>ada sobretudo no zazen,<br />

o “apenas <strong>se</strong>ntar” como postura<br />

para a iluminação. Nes<strong>se</strong> guia,<br />

Dogen conta este episódio (a<br />

tradução é <strong>de</strong> João Rodrigues): “Um<br />

monge perguntou a Joshu, ‘Um cão<br />

tem a natureza <strong>de</strong> Buda?’ Joshu<br />

respon<strong>de</strong>u, ‘Mu!’ Esta palavra mu<br />

não po<strong>de</strong> <strong>se</strong>r medida ou agarrada,<br />

pois nada existe <strong>por</strong> on<strong>de</strong> lhe pegar.<br />

Sugiro que tentes <strong>de</strong>ixar ir!” E<br />

acrescenta: “Então faz a ti mesmo<br />

estas perguntas: O que são o corpo e<br />

a mente? O que é a conduta Zen? O<br />

que é o nascimento-e-morte? O que<br />

é o Buda-Dharma? O que são os<br />

assuntos mundanos? E em última<br />

análi<strong>se</strong>, o que são montanhas, rios e<br />

terra, ou pessoas, animais e casas?”<br />

Comentado ao longo dos séculos<br />

¬Mau ☆Medíocre ☆☆Razoável ☆☆☆Bom ☆☆☆☆Muito Bom ☆☆☆☆☆Exc<strong>ele</strong>nte<br />

Obra <strong>de</strong> Julian Ro<strong>se</strong>feldt em Marzlive<br />

“Mu - Lua em chão <strong>de</strong> terra batida” é uma obra<br />

formada <strong>por</strong> um corredor e uma sala obscurecida<br />

não só <strong>por</strong> monges da escola soto,<br />

mas também <strong>por</strong> autores ligados à<br />

escola Rinzai, este “koan” - “’Um cão<br />

tem a natureza <strong>de</strong> Buda?’ Joshu<br />

respon<strong>de</strong>u, ‘Mu!’”-, tem como fim a<br />

iluminação do discípulo, ou, como<br />

sublinha ainda Dogen Zenji, a<br />

sup<strong>era</strong>ção da dicotomia movimento/<br />

imobilida<strong>de</strong>. Numa das<br />

interpretações <strong>de</strong>ste diálogo, Tendo<br />

Nyojo escreve que a palavra “Mu” é<br />

uma “vassoura <strong>de</strong> ferro”, para<br />

formular o <strong>se</strong>guinte raciocínio: “no<br />

local on<strong>de</strong> <strong>se</strong> varre fica muita coisa<br />

no ar e on<strong>de</strong> há muita coisa no ar,<br />

volta a varrer-<strong>se</strong>; quanto mais <strong>se</strong><br />

varre, mais há para varrer, neste<br />

ponto torna-<strong>se</strong> impossível limpar,<br />

pois <strong>de</strong>sperdiça-<strong>se</strong> toda a vida na<br />

limpeza.” O mestre chinês (1163-1228)<br />

pros<strong>se</strong>gue: “Mantém a tua espinha<br />

direita dia e noite, e não <strong>de</strong>ixes a tua<br />

coragem fugir. De repente, varreste a<br />

totalida<strong>de</strong> do espaço, e todas as<br />

diferenças são sup<strong>era</strong>das com<br />

clareza, assim a origem e os <strong>se</strong>us<br />

significados tornam-<strong>se</strong> evi<strong>de</strong>ntes.”<br />

Na sala <strong>de</strong> exposições tem<strong>por</strong>árias<br />

do Centro <strong>de</strong> Arte Mo<strong>de</strong>rna da<br />

Fundação Gulbenkian, Pedro Morais<br />

(Lisboa, 1944) propõe “Mu - Lua em<br />

chão <strong>de</strong> terra batida” (2006-2009),<br />

uma obra formada <strong>por</strong> um corredor<br />

e uma sala obscurecida on<strong>de</strong> <strong>se</strong><br />

encontra um “pequeno habitat com<br />

uma jan<strong>ela</strong> e uma entrada que<br />

<strong>de</strong>fine uma zona recolhida.”<br />

É im<strong>por</strong>tante sublinhar o percurso<br />

proposto pelo artista, que <strong>de</strong>fine,<br />

<strong>de</strong>s<strong>de</strong> logo, uma <strong>se</strong>paração<br />

r<strong>ela</strong>tivamente ao exterior, ao mundo<br />

que <strong>se</strong> <strong>de</strong>ixa para trás, preparando o<br />

espectador para o confronto com<br />

um espaço para <strong>se</strong> experimentar um<br />

possível acordar. Como nota o<br />

próprio no catálogo que<br />

complementa o projecto: “’Mu’<br />

significa lit<strong>era</strong>lmente ‘nada’ - isto,<br />

não <strong>se</strong>paração.”<br />

A intervenção do artista - uma<br />

variação <strong>de</strong>s<strong>se</strong> lugar solitário, o sítio<br />

on<strong>de</strong> nos coloca <strong>se</strong>mpre, a <strong>se</strong>u lado -<br />

rev<strong>ela</strong> uma arquitectura <strong>ele</strong>vada do<br />

solo <strong>de</strong> modo a que “o olhar do<br />

ob<strong>se</strong>rvador coincida com o olhar <strong>de</strong><br />

alguém <strong>se</strong>ntado no chão.” Zazen,<br />

<strong>por</strong>tanto. Um rectângulo <strong>de</strong> luz,<br />

chamado pelo artista <strong>de</strong> lua, é o<br />

espaço da iluminação: “...as mãos<br />

repousam uma na outra e os<br />

polegares tocam-<strong>se</strong>.” E quando o<br />

olhar <strong>se</strong> habitua à escuridão, à<br />

luminosida<strong>de</strong>, do outro lado da<br />

jan<strong>ela</strong>, vê-<strong>se</strong> uma “paisagem<br />

emprestada”, um <strong>de</strong><strong>se</strong>nho a carvão<br />

sobre papel colado (“marouflé”)<br />

sobre t<strong>ela</strong>, <strong>de</strong> 1988 - este trabalho<br />

remete para “Locus Solus I”, um<br />

antigo projecto <strong>de</strong> Pedro Morais,<br />

nunca concretizado, formado <strong>por</strong><br />

células (“quartos <strong>de</strong> hóspe<strong>de</strong>s”)<br />

construídas ao longo <strong>de</strong> um corredor.<br />

Espreitamos, tentamos ver mais,<br />

contudo, é-nos negado o acesso ao<br />

âmago da habitação, que permanece<br />

<strong>se</strong>creto: este modo <strong>de</strong> aproximação<br />

po<strong>de</strong> ter pontos <strong>de</strong> contacto com a<br />

forma <strong>de</strong> Marcel Duchamp dar a ver<br />

“Étant Donnés” (1946-1966) -<br />

também ali, no Phila<strong>de</strong>lphia<br />

Mu<strong>se</strong>um of Art, há uma iluminação<br />

(“Le gaz d’éclairage”).<br />

“Mu - Lua em chão <strong>de</strong> terra<br />

batida”, exposição <strong>de</strong>dicada a<br />

António Dacosta e Lour<strong>de</strong>s Castro, é<br />

feita também <strong>de</strong> “fortes espirros”:<br />

uma corrente <strong>de</strong> ar que atravessa<br />

toda a obra <strong>de</strong> Pedro Morais. Essas<br />

manifestações orgânicas<br />

“sobressaltam e rev<strong>ela</strong>m uma<br />

pre<strong>se</strong>nça”. Os sucessivos e aleatórios<br />

“atchim” são uma outra forma <strong>de</strong><br />

potenciar uma iluminação, po<strong>de</strong>ndo<br />

mesmo <strong>se</strong>r uma das traduções<br />

possíveis <strong>de</strong> “Mu”, es<strong>se</strong> modo <strong>de</strong><br />

estar atento, aqui e agora, o atingir<br />

<strong>de</strong>ssa completa liberda<strong>de</strong>, “<strong>se</strong>m<br />

residir no corpo ou na mente,<br />

<strong>de</strong>sapegado, <strong>se</strong>m limites” (Dogen<br />

Zenji).<br />

Agenda<br />

Inauguram<br />

MARZLIVE<br />

De Julian Ro<strong>se</strong>feldt, Johanna<br />

Billing, Matt Stokes, Jens Wagner,<br />

Micha<strong>ela</strong> Eichwald, Kai Althoff,<br />

Ralf Schauff, Iain Forsyth, Jane<br />

Pollard.<br />

Lisboa. MARZ - Galeria. R. Reinaldo Ferreira,<br />

20A. Tel.: 915769723. De 26/06 a 30/07. 3ª a<br />

Sáb. das 12h às 20h. De 26/6 a 2/7: Julian<br />

Ro<strong>se</strong>feldt. De 3/7 a 9/7: Johanna Billing. De 10/7<br />

a 16/7: Matt Stokes. De 17/7 a 23/7: Jens Wagner,<br />

Micha<strong>ela</strong> Eichwald, Kai Althoff e Ralf Schauff.<br />

De 24/7 a 30/7: Iain Forsyth e Jane Pollard.<br />

Inaugura 26/6 às 22h.<br />

Ví<strong>de</strong>o.<br />

Depois do Dilúvio<br />

De Gao Xingjian.<br />

Sintra. Sintra Mu<strong>se</strong>u <strong>de</strong> Arte Mo<strong>de</strong>rna Colecção<br />

B<strong>era</strong>rdo. Av. Heliodoro Salgado. Tel.: 219248170.<br />

Até 27/09. 3ª a Dom. das 10h às 18h. Inaugura<br />

26/6 às 19h.<br />

Pintura, Ví<strong>de</strong>o.<br />

Factory Manufactory<br />

De Luísa Co<strong>de</strong>r, José Rus<strong>se</strong>l.<br />

Vila Franca <strong>de</strong> Xira. Mu<strong>se</strong>u do Neo-Realismo.<br />

Rua Alves Redol, 45. Tel.: 263285626. De 27/06 a<br />

25/10. 3ª a 6ª das 10h às 19h. Sáb. das 15h às<br />

22h. Dom. das 11h às 18h.<br />

Design.<br />

Quantos Artistas<br />

um Artista po<strong>de</strong> <strong>se</strong>r<br />

De João Paulo Feliciano.<br />

Castelo Branco. 102-100 Galeria <strong>de</strong> Arte. R. <strong>de</strong><br />

Santa Maria, 100. Tel.: 933180211. Até 01/08. 3ª<br />

a 6ª das 15h às 19h. Sáb. das 10h30 às 19h.<br />

Inaugura 27/6 às 22h com concerto <strong>de</strong> Márcia.<br />

Fotografia, Outros.<br />

Notas Sobre um Problema<br />

<strong>de</strong> Método<br />

De Pedro Calapez.<br />

Coimbra. Centro <strong>de</strong> Artes Visuais - CAV. Pátio da<br />

Inquisição, 10. Tel.: 239826178. Até 06/09. 3ª a<br />

Dom. das 14h às 19h. Inaugura 27/6 às 22h.<br />

Pintura.<br />

The Night Walker<br />

e Outras Obras<br />

De Ra di Martino.<br />

Coimbra. Centro <strong>de</strong> Artes Visuais - CAV. Pátio da<br />

Inquisição, 10. Tel.: 239826178. Até 06/09. 3ªa<br />

Dom. das 14h às 19h. Inaugura 27/6 às 22h.<br />

Ví<strong>de</strong>o, Instalação.<br />

Paisagem<br />

Com Edgar Martins. De João Luís<br />

Carrilho da Graça, Augusto<br />

Brázio, Frédéric Bellay.<br />

Coimbra. Centro <strong>de</strong> Artes Visuais - CAV. Pátio da<br />

Inquisição, 10. Tel.: 239826178. Até 06/09. 3ª a<br />

Dom. das 14h às 19h. Inaugura 27/6 às 22h.<br />

Arquitectura, Fotografia.<br />

Não-Lugares<br />

na Cida<strong>de</strong> do Porto<br />

De Vítor Tavares.<br />

Porto. Centro Português <strong>de</strong> Fotografia - Ca<strong>de</strong>ia<br />

da R<strong>ela</strong>ção do Porto. Campo Mártires da Pátria.<br />

Tel.: 222076310. Até 02/08. 3ª a 6ª das 10h às<br />

18h. Sáb., Dom. e Feriados das 15h às 19h.<br />

Inaugura 27/6 às 16h.<br />

Fotografia.<br />

Coleccionar III<br />

De Ana Telhado, António José<br />

Duarte, Duarte Amaral Netto,<br />

José Pedro Cortes, Rodrigo<br />

Amado.<br />

Lisboa. Módulo - Centro Difusor <strong>de</strong> Arte. Calçada<br />

dos Mestres, 34A/B. Tel.: 213885570. Até 31/07. 3ª<br />

a Sáb. das 15h às 20h. Inaugura 27/6 às 18h.<br />

Fotografia.<br />

The Rebirth of Lazarus<br />

De David Rosado.<br />

Lisboa. Galeria Pedro Serrenho. Rua Almeida e<br />

Sousa, 21A. Tel.: 213930714. Até 25/07. 3ª a Sáb.<br />

das 11h às 20h. Inaugura 27/6 às 15h.


Pintura, Instalação.<br />

De Ama<strong>de</strong>o a Paula Rego,<br />

50 Anos <strong>de</strong> Arte Portuguesa<br />

(1910-1960)<br />

De vários autores.<br />

Lisboa. MNAC - Mu<strong>se</strong>u do Chiado. Rua Serpa Pinto,<br />

4. Tel.: 213432148. Até 30/10. 3ª a Dom. das 10h às<br />

18h.<br />

Pintura, Outros.<br />

Control Z<br />

De Yonamine.<br />

Lisboa. Cristina Guerra - Contem<strong>por</strong>ary Art. Rua<br />

Santo António à Estr<strong>ela</strong>, 33. Tel.: 213959559. Até<br />

19/09. 3ª a 6ª das 11h às 20h. Sáb. das 12h às 20h.<br />

Inaugura 2/7 às 22h.<br />

Ví<strong>de</strong>o, Instalação, Outros.<br />

Estranhos<br />

De Juan Manuel Castro Prieto.<br />

Lisboa. K Galeria. Rua da Vinha, 43A. Tel.:<br />

213431676. Até 31/07. 4ª a Sáb. das 15h às 20h.<br />

Fotografia.<br />

Continuam<br />

Aspectos da Colecção<br />

De António Areal, Manuel<br />

Cargaleiro, Armando Basto,<br />

Fernando Calhau, Michael<br />

Biberstein, Cristino da Silva, Pepe<br />

Diniz.<br />

Lisboa. Centro <strong>de</strong> Arte Mo<strong>de</strong>rna - José <strong>de</strong> Azeredo<br />

Perdigão. Rua Dr. Nicolau Bettencourt. Tel.:<br />

217823474. Até 30/08. 3ª a Dom. das 10h às 18h.<br />

Pintura, De<strong>se</strong>nho, Outros.<br />

A Colecção do CAM<br />

<strong>por</strong> Heimo Zobernig<br />

Lisboa. Centro <strong>de</strong> Arte Mo<strong>de</strong>rna - José <strong>de</strong> Azeredo<br />

Perdigão. Rua Dr. Nicolau Bettencourt. Tel.:<br />

217823474 . Até 30/08. 3ª a Dom. das 10h às 18h.<br />

Instalação, Pintura, Outros.<br />

Arriscar o Real<br />

De vários autores.<br />

Lisboa. Mu<strong>se</strong>u Colecção B<strong>era</strong>rdo. Praça do Império -<br />

Centro Cultural <strong>de</strong> Belém. Tel.: 213612878. Até 30/08.<br />

6ª das 10h às 22h (última admissão às 21h30). 2ª a<br />

5ª, Sáb. e Dom. das 10h às 19h (última admissão às<br />

18h30).<br />

Pintura, Outros.<br />

Dan Flavin na Colecção Panza<br />

De Dan Flavin.<br />

Lisboa. Mu<strong>se</strong>u Colecção B<strong>era</strong>rdo. Praça do Império -<br />

Centro Cultural <strong>de</strong> Belém. Tel.: 213612878. Até 30/08.<br />

6ª das 10h às 22h (última admissão às 21h30). 2ª a<br />

5ª, Sáb. e Dom. das 10h às 19h (última admissão às<br />

18h30).<br />

Instalação, Outros.<br />

Ombro a Ombro:<br />

Retratos Políticos<br />

Lisboa. MUDE - Mu<strong>se</strong>u do Design e da Moda. Rua<br />

Augusta 24. Tel.: 218886117. Até 13/09. 6ª e Sáb. das<br />

10h às 22h. 3ª a 5ª e Dom. das 10h às 20h.<br />

Design, Outros.<br />

Vermelho ou Azul/Red or Blue<br />

De Daan van Gol<strong>de</strong>n.<br />

Lisboa. Culturgest. Rua Arco do Cego - Edifício da<br />

CGD. Tel.: 217905155. Até 06/09. 2ª, 4ª, 5ª e 6ª<br />

das 11h às 19h (última admissão às 18h30). Sáb.,<br />

Dom. e Feriados das 14h às 20h (última admissão<br />

às 19h30).<br />

Pintura, Fotografia.<br />

Colecção #1 - Ana Jotta<br />

Lisboa. Culturgest. Rua Arco do Cego - Edifício da<br />

CGD. Tel.: 217905155. Até 06/09. 2ª, 4ª, 5ª e 6ª<br />

das 11h às 19h (última admissão às 18h30). Sáb.,<br />

Dom. e Feriados das 14h às 20h (última admissão<br />

às 19h30).<br />

Fotografia, Pintura, De<strong>se</strong>nho,<br />

Escultura, Outros.<br />

Colecção #2 - Francisco Tropa<br />

Lisboa. Culturgest. Rua Arco do Cego - Edifício da<br />

CGD. Tel.: 217905155. Até 06/09. 2ª, 4ª, 5ª e 6ª<br />

das 11h às 19h (última admissão às 18h30). Sáb.,<br />

Dom. e Feriados das 14h às 20h (última admissão<br />

às 19h30).<br />

Escultura, Ví<strong>de</strong>o.<br />

Paisagens Oblíquas<br />

De Lothar Baumgarten, Pedro<br />

Calapez, Alberto Carneiro, Tacita<br />

Dean, Caetano Dias, Alexandre<br />

Joly, Robert Frank, Hamish<br />

Fulton, Laurent Grasso, Andreas<br />

Gursky, David Hockney, Richard<br />

Long, Eric Poitevin, Yvan<br />

Salomone, Ida Tursic, Wilfried<br />

Mille.<br />

Faro. Mu<strong>se</strong>u <strong>Municipal</strong> <strong>de</strong> Faro. Largo Afonso III,<br />

14. Tel.: 289897400. 3ª a 6ª das 10h às 19h. Sáb. e<br />

Dom. das 11h às 18h (De 1/7 a 31/8 encerra às<br />

22h30, <strong>de</strong> 1/7 a 31/8 das 10h30 às 17h).<br />

Faro. Núcleo Mu<strong>se</strong>ológico do Brinquedo. Galeria<br />

<strong>Municipal</strong> Arco. Tel.: 289897400. Até 27/09. 3ª a<br />

Dom. das 10h30 às 17h. Allgarve 09.<br />

Instalação, Outros.<br />

A Luz, Por Dentro<br />

De Armanda Duarte, Filipa César,<br />

João Paulo Feliciano, Jorge<br />

Queiroz, José Pedro Croft, Luisa<br />

Cunha, Noronha da Costa, Ricardo<br />

Jacinto, Rui Toscano.<br />

Loulé. Quinta da Fonte da Pipa. R. Eça <strong>de</strong> Queiroz.<br />

Até 27/09. Sáb. das 10h às 23h. 3ª a 6ª e Dom. das<br />

15h às 23h. Allgarve 09.<br />

Instalação. Ví<strong>de</strong>o, Escultura, Som.<br />

Henri Fantin-Latour (1836-1904)<br />

Lisboa. Fundação e Mu<strong>se</strong>u Calouste Gulbenkian.<br />

Avenida <strong>de</strong> Berna, 45A. Tel.: 217823700. Até<br />

06/09. 3ª a. e Dom. das 10h às 18h.<br />

Pintura, De<strong>se</strong>nho.<br />

Tim<strong>ele</strong>ss Territories<br />

De Alfredo Jaar, Berni Searle,<br />

Daniel Canogar, Isaac Julien,<br />

Jennifer Steinkamp, entre outros.<br />

Loulé. Mina Campina <strong>de</strong> Cima. R. Quinta <strong>de</strong><br />

Betunes, 27. Até 29/08. 4ª a 6ª das 14h às 22h<br />

(última admissão às 21h05). Sáb. das 10h às 18h<br />

(última admissão às 16h25). Allgarve 09.<br />

Ví<strong>de</strong>o, Instalação, Outros.<br />

Ípsilon • Sexta-feira 26 Junho 2009 • 35


Teatro<br />

INTERVENÇÕES ARTÍSTICAS NO ESPAÇO<br />

DESTINATÁRIOS:<br />

PROGRAMADORES CULTURAIS, CURADORES E ARTISTAS<br />

RECEPÇÃO DE PROPOSTAS:<br />

ATÉ 30 DE SETEMBRO DE 2009<br />

Este projecto do Teatro da Trinda<strong>de</strong> tem como objectivo<br />

articular a arte teatral com as artes plásticas, digitais<br />

e performativas. O espaço Round the Corner <strong>de</strong>stina-<strong>se</strong><br />

ao acolhimento e fruição gratuita <strong>de</strong> novos projectos<br />

das mais diversas práticas artísticas contem<strong>por</strong>âneas<br />

(fotografia, pintura, <strong>de</strong><strong>se</strong>nho, som, ví<strong>de</strong>o, performance,<br />

instalação, etc.), incrementando e apoiando as práticas<br />

transdisciplinares exemplificadas pelo teatro, que <strong>se</strong>rve<br />

<strong>de</strong> plataforma a eventos <strong>de</strong> carácter diversificado.<br />

Propõe-<strong>se</strong> uma programação plural que partirá <strong>de</strong> diferentes<br />

olhares, garantindo simultaneamente a in<strong>de</strong>pendência<br />

e a multiplicida<strong>de</strong> dos pontos <strong>de</strong> vista. Para o<br />

efeito, convidamos programadores culturais, curadores<br />

e artistas a conceber, planear e produzir um conjunto <strong>de</strong><br />

exposições/acções, com uma duração não superior a<br />

três me<strong>se</strong>s, a realizar no período <strong>de</strong> Novembro <strong>de</strong> 2009<br />

a Novembro <strong>de</strong> 2010.<br />

INFORMAÇÕES:<br />

Largo da Trinda<strong>de</strong>, 7A | 1200-466 LISBOA<br />

Tel. 213 423 200 Fax 213 225 739<br />

E-mail: teatro.trinda<strong>de</strong>@inatel.pt | atorres@inatel.pt<br />

36 • Ípsilon • Sexta-feira 19 Junho 2009<br />

Teatro<br />

CD<br />

Daniel Jonas<br />

<strong>se</strong>questrou<br />

o teatro<br />

Reféns, a nova produção do<br />

Teatro Bruto, é a <strong>se</strong>gunda<br />

experiência dramatúrgica do<br />

poeta Daniel Jonas.<br />

Mariana Duarte<br />

Reféns<br />

De Daniel Jonas. Pelo Teatro Bruto.<br />

Encenação <strong>de</strong> Ana Luena. Com<br />

Mário Santos, Pedro Mendonça e<br />

Sílvia Silva.<br />

Porto. Fábrica Social/Fundação José Rodrigues. Rua<br />

da Fábrica Social. Tel.: 960211595 / 960039891. De<br />

4ª a sáb., às 22h. Até 11 <strong>de</strong> Julho. €5 e €7<br />

No ano passado assistimos a um<br />

atentado ao teatro em pleno Carlos<br />

É teatro, é para ouvir, em<br />

casa ou no iPod ou on<strong>de</strong> <strong>se</strong><br />

qui<strong>se</strong>r: os Artistas Unidos<br />

vão lançar a colecção <strong>de</strong><br />

CD’s “Teatro para ouvir”<br />

no dia 9 <strong>de</strong> Julho, no Festival<br />

<strong>de</strong> Teatro <strong>de</strong> Almada.<br />

“Carta aos Actores”, <strong>de</strong><br />

Alberto, quando o Teatro Bruto levou<br />

à cena “Nenhures”, o primeiro texto<br />

dramático do jovem poeta Daniel<br />

Jonas. Desta vez, o autor está mais<br />

brando, mas continua a arriscar.<br />

“Reféns”, a <strong>se</strong>gunda peça <strong>de</strong><br />

teatro <strong>de</strong> Daniel Jonas - também<br />

encomendada pelo Teatro Bruto e<br />

apre<strong>se</strong>ntada a partir <strong>de</strong> hoje na<br />

Fábrica Social/Fundação José<br />

Rodrigues - não pisa as convenções<br />

da dramaturgia, só lhe dá umas<br />

voltas. A lógica é a <strong>de</strong> <strong>se</strong>questro.<br />

“Quis explorar as r<strong>ela</strong>ções <strong>de</strong><br />

<strong>se</strong>questro inerentes ao teatro”, diz.<br />

Que <strong>se</strong> traduzem na “dificulda<strong>de</strong> dos<br />

actores em <strong>se</strong> <strong>de</strong>spirem dos papéis”,<br />

na vonta<strong>de</strong> do encenador que <strong>se</strong><br />

sobrepõe à “vonta<strong>de</strong> do<br />

dramaturgo”.<br />

Em “Reféns”, a montagem do<br />

cenário contribui também para o<br />

conceito <strong>de</strong> enclausuramento: “A luz<br />

da ribalta dá a <strong>se</strong>nsação <strong>de</strong> que<br />

estamos em cima do palco e não<br />

numa plateia; que os actores estão<br />

<strong>de</strong> vigia e fecharam a quarta<br />

pare<strong>de</strong>”, refere. Encerram-<strong>se</strong><br />

“actores, público e texto num<br />

espaço fechado”.<br />

Esta “carga <strong>de</strong> imobilismo” e o<br />

potencial <strong>de</strong> reflexão sobre a criação<br />

teatral estab<strong>ele</strong>cem paralelismos<br />

com “Nenhures”. Mas em “Reféns”<br />

há uma narrativa; as pessoas po<strong>de</strong>m<br />

sair do teatro “com a estória<br />

controlada”, garante Daniel Jonas.<br />

Bacigaluppi, um embaixador, e<br />

Lenore, uma activista política, são<br />

<strong>se</strong>questrados <strong>por</strong> um grupo<br />

Agenda<br />

Teatro<br />

Estreiam<br />

Caravan Cabaret<br />

Encenação: Marta Pazos. Com<br />

Aline Catarino, Marco Ferreira,<br />

Patrícia Vito, Paulo Troncão,<br />

Pedro Ramos, Rui Ramos, Sandra<br />

Serra, Susana Nunes, Susana<br />

Romão, Vânia Silva.<br />

Faro. Teatro <strong>Municipal</strong> <strong>de</strong> Faro. Horta das Figuras<br />

- EN125. Dia 02/07. 5ª às 22h. Tel.: 289888100. 5€<br />

a 10€.<br />

Oro8orO<br />

De Eduardo Dias. Encenação:<br />

Eduardo Dias. Com Eduardo Dias,<br />

Grazi<strong>ela</strong> Dias, José Lobo, Sara<br />

Costa.<br />

Palm<strong>ela</strong>. Teatro O Bando. Vale <strong>de</strong> Barris. De 02/07<br />

a 05/07. 5ª, 6ª e Sáb. às 21h30. Dom. às 17h. Tel.:<br />

212336850.<br />

A Tempesta<strong>de</strong><br />

De William Shakespeare.<br />

Encenação: Rui Mário. Com Filipe<br />

Araújo, Filipe Costa, Filipa Duarte,<br />

Flávio Tomé, Mário Trigo, Olavo<br />

Silva, Paulo Campos dos Reis,<br />

Rute Lizardo, Samuel Saraiva.<br />

Sintra. Quinta da Regaleira. Rua Barbosa du<br />

Bocage. De 02/07 a 13/09. 5ª, 6ª e Sáb. às 22h.<br />

Dom. às 21h. Tel.: 219106650<br />

Catavento<br />

De Graeme Pulleyn, H<strong>ele</strong>n<br />

Ainsworth. Encenação: Graeme<br />

Pulleyn.<br />

Braga. Rossio da Sé. . Dia 29/06. 2ª às 21h45.<br />

Mimarte - Festival <strong>de</strong> Teatro <strong>de</strong><br />

Braga.<br />

¬Mau ☆Medíocre ☆☆Razoável ☆☆☆Bom ☆☆☆☆Muito Bom ☆☆☆☆☆Exc<strong>ele</strong>nte<br />

Valère Novarina, <strong>por</strong> Jorge<br />

Silva Melo (que <strong>se</strong> po<strong>de</strong><br />

ver ao vivo em espectáculo,<br />

no festival) e “Um<br />

Homem Falido”, <strong>de</strong> David<br />

Lescot, <strong>por</strong> Sylvie Rocha,<br />

João Meir<strong>ele</strong>s e Américo<br />

Silva (que faz a direcção).<br />

“Reféns” explora o conceito <strong>de</strong> enclausuramento<br />

Cabaret Molotov<br />

Encenação: João Paulo Seara<br />

Cardoso. Com Edgard Fernan<strong>de</strong>s,<br />

Sara Henriques, Sérgio Rolo, Shirley<br />

Re<strong>se</strong>n<strong>de</strong> (instrumentista).<br />

Vila Nova <strong>de</strong> Famalicão. Casa das Artes <strong>de</strong> Vila Nova<br />

<strong>de</strong> Famalicão. Pq. <strong>de</strong> Sinçães. Dia 28/06. Dom. às<br />

21h30. Tel.: 252371297. 5€ e 4€ (estudantes).<br />

Iremos a Montecarlo<br />

De Criação Colectiva. Encenação:<br />

Gil Silva. Com Ad<strong>ela</strong>i<strong>de</strong> Fon<strong>se</strong>ca,<br />

António Guerreiro, Ricardo<br />

Mendonça, Sofia Pereira.<br />

Faro. Teatro <strong>Municipal</strong> <strong>de</strong> Faro. Horta das Figuras -<br />

EN125. Dia 27/06. Sáb. às 22h. Tel.: 289888100.<br />

A Gargalhada <strong>de</strong> Yorick<br />

De William Shakespeare.<br />

Encenação: André Gago. Com<br />

André Gago, Joaquim Nicolau.<br />

Vila Nova <strong>de</strong> Famalicão. Casa das Artes <strong>de</strong> Vila Nova<br />

<strong>de</strong> Famalicão. Pq. <strong>de</strong> Sinçães. Dia 27/06. Sáb. às<br />

21h30. Tel.: 252371297. 8€.<br />

Terra Interior<br />

Encenação: Nina Repas. Com<br />

Afonso Lagarto, Emanuel Arada,<br />

João <strong>de</strong> Brito, Luisa Kot<strong>se</strong>v, Maria<br />

Camões, Pedro Vieira, Rita Brito,<br />

Tomé Quirino.<br />

Lisboa. Teatro <strong>Municipal</strong> Maria Matos. Av. Frei<br />

Miguel Contreiras, 52. De 27/06 a 29/06. 2ª, Sáb. e<br />

Dom. às 21h30. Tel.: 218438801. entrada livre.<br />

Re<strong>se</strong>rva obrigatória: 218438801 (das 15h às 22h).<br />

De Homem Para Homem<br />

De Manfred Karge. Encenação:<br />

Carlos Alardo. Com Beatriz Batarda.<br />

Caldas da Rainha. Centro Cultural e Congressos das<br />

Caldas da Rainha. Rua Doutor Leonel Sotto Mayor.<br />

Dia 26/06. 6ª às 21h30. Tel.: 262889650. 12,5€<br />

Silenciador<br />

De Jacinto Lucas Pires.<br />

Encenação: Marcos Barbosa. Com<br />

Diana Sá, Emílio Gomes, Ivo<br />

Bastos.<br />

Aveiro. Teatro Aveiren<strong>se</strong>. Pç. República. Dia 26/06.<br />

6ª às 21h30. Tel.: 234400922. 10€ e 12€<br />

Porque é que não estás<br />

contente?<br />

De David Pereira Bastos.<br />

Encenação: Mónica Calle. Com<br />

Ana Ribeiro, Bernardo <strong>de</strong><br />

Almeida, David Pereira Bastos,<br />

Miguel Raposo, Sílvia Figueiredo.<br />

Lisboa. Casa Conveniente. Rua Nova do Carvalho,<br />

11 (ao Cais do Sodré). De 26/06 a 05/07. 2ª, 3ª, 4ª,<br />

5ª, 6ª, Sáb. e Dom. às 22h. Tel.: 964407007.<br />

10€ e 7,5€ (sujeitos a <strong>de</strong>scontos). Re<strong>se</strong>rvas:<br />

963511971/917705762.<br />

Continuam<br />

“A Caravana”<br />

A Caravana<br />

De Nuno Pino Custódio.<br />

Encenação: Nuno Pino Custódio.<br />

Com Carlos Pereira, Catarina<br />

Guerreiro, Nuno Nunes, Rui Silva,<br />

Yolanda Santos.<br />

Lisboa. Teatro Meridional. R. do Açucar, 64 -<br />

Poço do Bispo. Até 02/08. 4ª, 5ª, 6ª, Sáb. e<br />

Dom. às 22h00. Tel.: 218689245. 10€, 8€ e 5€<br />

PAULO PIMENTA


paramilitar <strong>de</strong> extremistas rebel<strong>de</strong>s<br />

ao regime <strong>de</strong> Aranda. Os dois<br />

constituem uma moeda <strong>de</strong> troca em<br />

negociações que têm como<br />

finalida<strong>de</strong> a libertação do cabecilha<br />

Salvador p<strong>ela</strong>s forças oficiais do<br />

governo.<br />

Daniel Jonas enveredou <strong>por</strong> uma<br />

adaptação realista, tendo como ba<strong>se</strong><br />

acontecimentos contem<strong>por</strong>âneos.<br />

“A i<strong>de</strong>ia para esta peça surgiu do<br />

conflito com as FARC (Forças<br />

Armadas Revolucionárias da<br />

Colômbia), <strong>de</strong> Ingrid Betancourt e<br />

Clara Rojas, que na altura<br />

engravidou <strong>de</strong> um guerrilheiro”,<br />

recorda o autor. “Estava a ler o<br />

PÚBLICO (precisamente!) e aquilo<br />

foi muito dramático para mim”: o<br />

<strong>de</strong>sabrochar do afecto num contexto<br />

“<strong>de</strong> horror”. Tal como Rojas, Lenore<br />

engravida <strong>de</strong> um guerrilheiro.<br />

Contudo, “Reféns” não quer<br />

trans<strong>por</strong> para o palco este inci<strong>de</strong>nte.<br />

Na verda<strong>de</strong>, os confrontos políticos<br />

não <strong>se</strong> <strong>de</strong>finem como o centro<br />

nevrálgico da acção, mas sim a<br />

dicotomia civilização/barbárie: a<br />

natureza animalesca <strong>de</strong> Bacigaluppi<br />

vai <strong>de</strong>spertando (no entanto, <strong>ele</strong><br />

pára no limite) enquanto o<br />

guerrilheiro P<strong>ela</strong>yo vai aspirando à<br />

civilida<strong>de</strong> do embaixador, no meio<br />

<strong>de</strong> provocações (“Afinal a <strong>por</strong>c<strong>ela</strong>na<br />

é chinesice”).<br />

Este “romance <strong>de</strong> formação” não<br />

ficou tão explícito como <strong>de</strong> início <strong>se</strong><br />

pretendia, não só <strong>por</strong>que o texto foi<br />

amputado em cerca <strong>de</strong> uma hora<br />

(Daniel Jonas quer a <strong>se</strong>gunda ronda,<br />

August: Osage County<br />

De Tracy Letts. Encenação:<br />

Fernanda Lapa. Com Adriano Luz,<br />

Ana Margarida Pereira, Filomena<br />

Caut<strong>ela</strong>, Isabel Medina, João Grosso,<br />

José Neves, Lia Gama, Luís Lucas,<br />

Manuel Coelho, Margarida Marinho,<br />

Marina Albuquerque, Mário<br />

Jacques, Paula Mora.<br />

Lisboa. Teatro Nacional D. Maria II. Pç. D. Pedro IV.<br />

Até 02/08. 4ª, 5ª, 6ª e Sáb. às 21h30. Dom. às 16h00.<br />

Tel.: 213250835.<br />

Na Solidão dos Campos<br />

<strong>de</strong> Algodão<br />

De Bernard-Marie Koltès.<br />

Encenação: José Peixoto. Com João<br />

Lagarto, Jorge Silva.<br />

Amadora. Espaço Cultural Recreios da Amadora.<br />

Avenida Santos Mattos, 2. Até 28/06. 3ª, 4ª, 5ª, 6ª e<br />

Sáb. às 21h30. Dom. às 16h00. Tel.: 214927315. 5€.<br />

Informações e re<strong>se</strong>rvas: 916648204 ou 218140825.<br />

Porque na Noite Terrena<br />

Sou Mais Fiel que um Cão<br />

Companhia: Teatro do Vestido.<br />

Lisboa. Teatro da Comuna. Pç. Espanha. Até 27/06.<br />

4ª, 5ª, 6ª e Sáb. às 22h00. Tel.: 217221770.<br />

Concerto à la Carte<br />

De Franz-Xavier<br />

Kroetz. Companhia:<br />

CTB - Companhia <strong>de</strong><br />

Teatro <strong>de</strong> Braga.<br />

Encenação: Rui<br />

Ma<strong>de</strong>ira. Com<br />

Ana Bustorff.<br />

Braga. Theatro Circo.<br />

Av. Liberda<strong>de</strong>, 697.<br />

Até 26/06. 3ª, 4ª, 5ª,<br />

6ª, Sáb. e Dom. às<br />

21h30. Tel.:<br />

“Concerto à la Carte”<br />

253203800.<br />

mas a encenadora, Ana Luena, diz<br />

que não há dinheiro) mas também<br />

<strong>por</strong>que <strong>se</strong>ria “<strong>de</strong>masiado óbvio”.<br />

“Um marxista-leninista (P<strong>ela</strong>yo)<br />

nunca <strong>se</strong> converteria e não é<br />

propriamente inculto”, indica<br />

Daniel.<br />

Apostou-<strong>se</strong> numa progressão para<br />

a alucinação, na qual P<strong>ela</strong>yo veste a<br />

p<strong>ele</strong> <strong>de</strong> um louco “tipo Kurtz do<br />

‘Coração das Trevas’, <strong>de</strong> Jo<strong>se</strong>ph<br />

Conrad”. Alguns dos momentos <strong>de</strong><br />

insanida<strong>de</strong> são repre<strong>se</strong>ntados <strong>por</strong><br />

intervenções musicais lancinantes,<br />

através da interpretação ao vivo <strong>de</strong><br />

Sérgio Martins e Rui Lima, dupla<br />

repescada da equipa <strong>de</strong> “Nenhures”<br />

(tal como os actores Mário Santos e<br />

Pedro Mendonça).<br />

Passar o texto <strong>de</strong> Daniel Jonas<br />

para o palco foi “difícil <strong>de</strong><br />

entranhar”, admite Ana Luena. “Mas<br />

foi motivador e resultou bem” - com<br />

“Nenhures” também foi assim, mas<br />

<strong>ele</strong>s “já nem <strong>se</strong> lembravam”.<br />

“Reféns” acabou <strong>por</strong> <strong>se</strong>r “a <strong>por</strong>ta<br />

perfeita para a abertura da<br />

programação 2009/2010 do Teatro<br />

Bruto”, sublinha Ana Luena. Agora<br />

instalada num novo espaço, a<br />

Fábrica Social/Fundação José<br />

Rodrigues - <strong>por</strong> isso, hoje a estreia é<br />

dupla -, a companhia organizou um<br />

ciclo cuja temática é o Monstro, “o<br />

lado feio que todos temos”, diz a<br />

encenadora.<br />

Este monstro vai <strong>se</strong>r alimentado<br />

com vários espectáculos: o próximo<br />

é em Dezembro, a partir <strong>de</strong> um texto<br />

<strong>de</strong> valter hugo mãe.<br />

Dança<br />

Estreiam<br />

Maiorca<br />

Companhia: Companhia Paulo<br />

Ribeiro. Coreografia: Paulo<br />

Ribeiro. Bailarino:Erika<br />

Gustamacchia, Gonçalo Lobato,<br />

Marta Cerqueira, Pedro Men<strong>de</strong>s,<br />

Romulus Neagu. Com Pedro<br />

Burmester (música ao vivo).<br />

Compositor: Chopin.<br />

Vi<strong>se</strong>u. Teatro Viriato. Lg. Mouzinho Albuquerque.<br />

De 02/07 a 03/07. 5ª e 6ª às 21h30. Tel.:<br />

232480110. 15€<br />

Inferno<br />

Companhia: Companhia Olga<br />

Roriz. De Olga Roriz (s<strong>ele</strong>cção<br />

musical), Olga Roriz (figurinos),<br />

José Avelino (arranjos musicais),<br />

Luis Madureira (direcção vocal).<br />

Coreografia: Olga Roriz. Bailarino:<br />

Catarina Câmara, Maria Cerveira,<br />

Sílvia Rijmer, Bruno Alexandre,<br />

Pedro Santiago Cal.<br />

Porto. Teatro Nacional São João. Pç. Batalha. Dia<br />

30/06. 3ª às 21h30. Tel.: 223401910. 7€ a 15€ (c/<br />

<strong>de</strong>scontos).<br />

Introdans:Slapstipstick<br />

Companhia: Introdans. De Roel<br />

Voorintholt (director artístico).<br />

Coreografia: Robert Battle, Inbal<br />

Pinto, Paul Lightfoot e Sol León,<br />

Hans van Manen.<br />

Sintra. Centro Cultural Olga Cadaval.<br />

Pç. Dr. Francisco Sá Carneiro. De 26/06<br />

a 27/06. 6ª e Sáb. às 21h30. Tel.: 219107110.15€ a<br />

20€ (c/ <strong>de</strong>scontos); 37,5€ (ciclo dança); 150€<br />

(festival).<br />

Informações e Re<strong>se</strong>rvas<br />

re<strong>se</strong>rvas@teatro-dmaria.pt<br />

Tel.: 21 325 08 35<br />

www.teatro-dmaria.pt<br />

Ticketline<br />

www.ticketline .pt | 707 234 234<br />

Ípsilon • Sexta-feira 19 Junho 2009 • 37


Livros<br />

MIKE SEGAR/REUTERS<br />

A primeira versão <strong>de</strong> “Veneza”<br />

foi escrita “ainda na pessoa<br />

<strong>de</strong> James Morris”, o que não<br />

aconteceu nas <strong>de</strong> 1974, 1983 e<br />

1993<br />

38 • Ípsilon • Sexta-feira 26 Junho 2009<br />

¬Mau ☆Medíocre ☆☆Razoável ☆☆☆Bom ☆☆☆☆Muito Bom ☆☆☆☆☆Exc<strong>ele</strong>nte<br />

Viagens<br />

Os enigmas<br />

<strong>de</strong> Veneza<br />

Numa escrita fluente capaz<br />

<strong>de</strong> cerzir informação<br />

prosaica com erudição<br />

histórica, a Veneza <strong>de</strong> Morris<br />

pe<strong>de</strong> meças a Ruskin e a<br />

Brodsky. Eduardo Pitta<br />

Veneza<br />

Jan Morris<br />

(tradução Raquel Mouta)<br />

Tinta da China, €21,90<br />

mmmmm<br />

É provável que o<br />

leitor comum sinta<br />

perplexida<strong>de</strong> face<br />

ao nome e à obra<br />

<strong>de</strong> Jan Morris, que<br />

nasceu (em 1926)<br />

James Humphrey<br />

Morris, estudou<br />

História em<br />

Oxford, frequentou a Aca<strong>de</strong>mia<br />

Militar <strong>de</strong> Sandhurst, combateu na II<br />

Guerra Mundial como oficial dos<br />

Lanceiros da Rainha, tornou-<strong>se</strong> um<br />

escritor famoso e, em 1972, mudou <strong>de</strong><br />

<strong>se</strong>xo, continuando a viver com a<br />

mulher que lhe <strong>de</strong>u cinco filhos (um<br />

d<strong>ele</strong>s é o poeta e músico Twm Morys).<br />

Nes<strong>se</strong> ano, atenta a nova i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong><br />

<strong>se</strong>xual, adoptou o nome <strong>de</strong> Jan Morris.<br />

Como nota Carlos Vaz Marques no<br />

prefácio <strong>de</strong> “Veneza”, cuja versão<br />

actualizada foi agora traduzida, “é<br />

qua<strong>se</strong> escandaloso [...] <strong>se</strong>r esta a<br />

primeira vez que o leitor tem a<br />

o<strong>por</strong>tunida<strong>de</strong> <strong>de</strong> encontrar o nome <strong>de</strong><br />

Jan Morris nas estantes das livrarias<br />

<strong>por</strong>tuguesas”. De facto.<br />

A obra é vasta: entre livros <strong>de</strong><br />

viagem (os mais aclamados), ensaios,<br />

cinco volumes <strong>de</strong> memórias, dois<br />

Butcher fez uma viagem perigosa e dolorosa <strong>de</strong> <strong>se</strong>is<br />

<strong>se</strong>manas e 3000 km. Não há registo <strong>de</strong> alguém a ter levado<br />

a cabo nas últimas décadas e não é difícil perceber <strong>por</strong>quê<br />

romances, uma colectânea <strong>de</strong> contos,<br />

uma biografia do almirante Jackie<br />

Fisher, recolhas <strong>de</strong> artigos, etc., Morris<br />

tem publicada meia centena <strong>de</strong><br />

títulos. Como introdução,<br />

recomendaria três: o excepcional<br />

“Veneza” (1960), o pungente r<strong>ela</strong>to<br />

autobiográfico <strong>de</strong> “Conundrum”<br />

(1974), e a trilogia “Pax Britannica”<br />

(1978), sobre as luzes e sombras do<br />

Império.<br />

A primeira versão <strong>de</strong> “Veneza” foi<br />

escrita “ainda na pessoa <strong>de</strong> James<br />

Morris”, o que não aconteceu nas <strong>de</strong><br />

1974, 1983 e 1993. Muita coisa mudou<br />

<strong>de</strong>s<strong>de</strong> 1945, ano da primeira visita,<br />

quando o então jovem oficial <strong>se</strong><br />

<strong>de</strong>ixou <strong>se</strong>duzir p<strong>ela</strong> “mistura <strong>de</strong><br />

tristeza e espectacularida<strong>de</strong>” da<br />

cida<strong>de</strong>, associando o perfil dos<br />

“palácios periclitantes” a um bando<br />

<strong>de</strong> “aristocratas inválidos que <strong>se</strong><br />

atrop<strong>ela</strong>m para apanhar ar fresco”. A<br />

escrita é fluente, capaz <strong>de</strong> cerzir<br />

informação prosaica com erudição<br />

histórica, <strong>se</strong>m com isso beliscar a<br />

melodia da fra<strong>se</strong>.<br />

Morris adverte que não <strong>se</strong> trata <strong>de</strong><br />

um livro <strong>de</strong> história, nem <strong>de</strong> um guia,<br />

nem <strong>se</strong>quer <strong>de</strong> uma re<strong>por</strong>tagem.<br />

Ignore os avisos. O índice remissivo<br />

contém todas as referências<br />

im<strong>por</strong>tantes, e uma cronologia entre<br />

421 e 1960 não <strong>de</strong>ixa nada <strong>de</strong> fora. O<br />

índice onomástico é precioso.<br />

Convém perceber que falamos <strong>de</strong> uma<br />

socieda<strong>de</strong> fechada: “Veneza nunca foi<br />

amada. Sempre esteve à parte,<br />

<strong>se</strong>mpre foi invejada, <strong>se</strong>mpre suspeita,<br />

<strong>se</strong>mpre temida. [...] Era o leão que<br />

caminhava sozinho.”<br />

O preâmbulo <strong>de</strong>talha as<br />

circunstâncias das sucessivas visitas<br />

<strong>de</strong> Morris, primeiro com “olhos<br />

jovens, especialmente <strong>se</strong>nsíveis aos<br />

estímulos da juventu<strong>de</strong>”, mais tar<strong>de</strong><br />

guiada p<strong>ela</strong> i<strong>de</strong>ia que guardava da<br />

cida<strong>de</strong>, em conflito aberto com a<br />

realida<strong>de</strong> do mundo contem<strong>por</strong>âneo:<br />

“apinhada, envelhecida e<br />

inconformista”. Depois a obra<br />

<strong>de</strong>sdobra-<strong>se</strong> em cinco partes: “Terra à<br />

Vista”, “Os Habitantes”, “A Cida<strong>de</strong>”,<br />

“A Laguna” e “O Embarque”. Cada<br />

uma d<strong>ela</strong>s nos leva pelo fio da história.<br />

Perpécias do quotidiano, <strong>de</strong>clinações<br />

dialectais, humores, mitos, equívocos,<br />

anedotário indígena, bricabraque,<br />

antigos ritos, nada escapa ao exaustivo<br />

“tour d’horizon”. Mesmo quem<br />

conheça Veneza surpreen<strong>de</strong>-<strong>se</strong> com o<br />

caudal e a minúcia do r<strong>ela</strong>to, não<br />

i<strong>se</strong>nto <strong>de</strong> malícia: “Veneza ficou meio<br />

louca nas décadas que anteced<strong>era</strong>m a<br />

sua queda [...] Actualmente... está<br />

r<strong>ela</strong>tivamente sóbria...”<br />

Morris ama Veneza mas não doura<br />

a pílula: “Em Veneza nunca <strong>se</strong> po<strong>de</strong><br />

ter muitas certezas. O estranho é que,<br />

apesar <strong>de</strong> a informação <strong>se</strong>r<br />

claramente incerta, quem nos informa<br />

é habitualmente dogmático [...] O<br />

ponto fraco do veneziano é <strong>de</strong>testar<br />

confessar a sua ignorância.” O<br />

passado histórico explica. Morris fala<br />

<strong>de</strong> doges e ladrões com mesmo àvonta<strong>de</strong><br />

com que nos familiariza com<br />

Ticiano. A chegada <strong>de</strong> Vasco da Gama<br />

à Índia pôs fim ao monopólio <strong>de</strong><br />

Veneza? Sabemos que sim. Não<br />

obstante, a cida<strong>de</strong> “manteve a<br />

jactância e a pompa, pre<strong>se</strong>rvando<br />

ainda hoje a sua reputação<br />

grandiosa”. Afinal, comerciar<br />

indiscriminadamente com cristãos e<br />

muçulmanos, fazendo tábua rasa das<br />

sanções papais, e <strong>de</strong> tratar os<br />

Cruzados como meros mercenários,<br />

não é para qualquer um. Não <strong>por</strong><br />

acaso, as gran<strong>de</strong>s potências do século<br />

XVI <strong>se</strong> uniram (em 1508, na Liga <strong>de</strong><br />

Cambrai) contra <strong>ela</strong>.<br />

Nenhum capítulo <strong>se</strong> ocupa <strong>de</strong> arte<br />

em <strong>se</strong>ntido estrito, <strong>por</strong>que a cida<strong>de</strong> é<br />

um mu<strong>se</strong>u vivo, nenhuma pedra ali<br />

está <strong>por</strong> acaso, e a mais inocente<br />

figura, <strong>se</strong> não for um Tiepolo ou um<br />

Guardi, po<strong>de</strong> <strong>se</strong>r que <strong>se</strong>ja Mantegna<br />

ou Antonello da Messina. De modo<br />

que não vale a pena enfatizar o óbvio.<br />

Bellini, Carpaccio, Tintoretto,<br />

Verone<strong>se</strong>, Canaletto, Longhi, Canova e<br />

muitos mais, têm, na narrativa,<br />

estatuto idêntico ao do povo anónimo.<br />

Isto, que num autor menos<br />

apetrechado daria azo a uma crónica<br />

<strong>de</strong> viagem, transforma-<strong>se</strong> nas mãos <strong>de</strong><br />

Morris numa obra que (estamos a falar<br />

<strong>de</strong> Veneza) <strong>se</strong> me<strong>de</strong> p<strong>ela</strong>s memoráveis<br />

bitolas <strong>de</strong> Ruskin e Brodsky.<br />

Não <strong>se</strong>i <strong>se</strong>, como exarou um comité<br />

<strong>de</strong> críticos consultados (em 2008)<br />

pelo “Times”, Jan Morris é ou não um<br />

dos mais im<strong>por</strong>tantes autores<br />

britânicos do pós-guerra. Sou avesso a<br />

es<strong>se</strong> tipo <strong>de</strong> classificações, as quais<br />

ten<strong>de</strong>m (não estou a dizer que <strong>se</strong>ja o<br />

caso) a <strong>de</strong>ixar-<strong>se</strong> contaminar <strong>por</strong><br />

razões exteriores à lit<strong>era</strong>tura. A minha<br />

única certeza é a da excepcional<br />

qualida<strong>de</strong> da sua escrita.<br />

No país do<br />

coração<br />

<strong>de</strong>stroçado<br />

Tim Butcher <strong>de</strong>cidiu repetir<br />

a célebre expedição <strong>de</strong> H.M.<br />

Stanley no rio Congo. Luís<br />

Maio<br />

Rio <strong>de</strong> Sangue<br />

Tim Butcher<br />

(tradução <strong>de</strong> Espa<strong>de</strong>iro Martins)<br />

Bertrand Editora, €18<br />

mmmmn<br />

A época da<br />

exploração <strong>de</strong> novas<br />

terras acabou,<br />

algures na primeira<br />

meta<strong>de</strong> do século<br />

XX. A lit<strong>era</strong>tura <strong>de</strong><br />

viagens que hoje <strong>se</strong><br />

promove sob essa<br />

ban<strong>de</strong>ira é, <strong>por</strong>tanto,<br />

nostalgia ou puro engodo. “Rio <strong>de</strong><br />

Sangue” <strong>de</strong> Tim Butcher con<strong>se</strong>gue, no<br />

entanto, a proeza <strong>de</strong> ensaiar um r<strong>ela</strong>to<br />

tão genuíno, empolgante e dramático<br />

quanto o dos míticos aventureiros do<br />

passado. O que só é possível <strong>por</strong>que<br />

Tim Butcher escolheu viajar no<br />

Congo, “o país mais assustador e<br />

mais atrasado à face da Terra”.<br />

Tim Butcher nasceu em 1967,<br />

estudou em Oxford e é jornalista do<br />

“Daily T<strong>ele</strong>graph” <strong>de</strong>s<strong>de</strong> 1990. Fez a<br />

cobertura <strong>de</strong> guerras na Croácia, na<br />

Bósnia, no Kosovo, na Serra Leoa e no<br />

Iraque, <strong>se</strong>ndo o actual<br />

correspon<strong>de</strong>nte <strong>de</strong>s<strong>se</strong> jornal em<br />

Jerusalém. Pelo meio, foi <strong>de</strong>stacado<br />

para África, on<strong>de</strong> cobriu a guerra no<br />

Congo, um conflito que <strong>de</strong>s<strong>de</strong> a sua<br />

eclosão em 1998 já terá provocado<br />

quatro milhões <strong>de</strong> mortos, apesar dos<br />

acordos <strong>de</strong> paz <strong>de</strong> 2002. Já <strong>se</strong> sabe que<br />

<strong>se</strong>r correspon<strong>de</strong>nte <strong>de</strong> guerra é uma<br />

profissão <strong>de</strong> alto risco, mas Butcher<br />

tinha chegado a um ponto da sua<br />

carreira em que tudo já não passava<br />

<strong>de</strong> rotina. “Queria abandonar a horda<br />

jornalística, encontrar um projecto<br />

que ao mesmo tempo me<br />

atemorizas<strong>se</strong> e me inspiras<strong>se</strong>.” Nes<strong>se</strong><br />

aspecto, como <strong>por</strong>ventura em<br />

nenhum outro, o Congo não<br />

<strong>de</strong>cepcionou o jornalista inglês.<br />

A ob<strong>se</strong>ssão <strong>de</strong> Butcher ganhou<br />

corpo ou um itinerário mais preciso,<br />

quando <strong>se</strong> <strong>de</strong>u conta que H.M. Stanley<br />

- autor da famosa saudação “É o<br />

Doutor Livingstone, imagino eu” -, foi<br />

como <strong>ele</strong> correspon<strong>de</strong>nte do<br />

“T<strong>ele</strong>graph” e nesta qualida<strong>de</strong><br />

resolveu “o último gran<strong>de</strong> mistério<br />

geográfico do continente africano”.<br />

Através <strong>de</strong> uma viagem épica, que<br />

<strong>de</strong>correu entre 1874 e 1877, Stanley foi<br />

o primeiro explorador a percorrer o<br />

traçado completo do Rio Congo. Mais<br />

do que isso, <strong>de</strong>fen<strong>de</strong> Butcher,<br />

inaugurou a história da África<br />

mo<strong>de</strong>rna, visto que a sua re<strong>por</strong>tagem<br />

criou um alvo para a ambição colonial<br />

do rei belga Leopoldo II que, <strong>por</strong> <strong>se</strong>u<br />

turno, levou outras potências<br />

europeias a reivindicarem o interior<br />

<strong>de</strong> África. É pelo menos esta a ca<strong>de</strong>ia<br />

<strong>de</strong> razões que o jornalista inglês<br />

invoca para aterrar no lago Tanganica<br />

em 2004, <strong>de</strong>cidido a <strong>se</strong>guir contra<br />

todas as advertências o traçado da<br />

expedição <strong>de</strong> Stanley até à foz<br />

atlântica do Congo.<br />

Uma viagem perigosa e dolorosa <strong>de</strong><br />

<strong>se</strong>is <strong>se</strong>manas e 3000 km. Não há<br />

registo <strong>de</strong> alguém a ter levado a cabo<br />

nas últimas décadas e não é difícil<br />

perceber <strong>por</strong>quê. Da infra-estrutura<br />

<strong>de</strong> comunicações fluviais e<br />

ferroviárias, eficiente e bem<br />

con<strong>se</strong>rvada da <strong>era</strong> colonial, nada<br />

resta. Dos cerca <strong>de</strong> 120 mil<br />

quilómetros <strong>de</strong> estradas que o Congo<br />

herdou, na in<strong>de</strong>pendência <strong>de</strong> 1960,<br />

restam menos <strong>de</strong> mil quilómetros, boa<br />

parte dos quais menos usados para o<br />

trânsito <strong>de</strong> veículos que para afiar<br />

facalhões. Butcher tem assim <strong>de</strong><br />

improvisar o <strong>se</strong>u caminho,<br />

socorrendo-<strong>se</strong> da boa vonta<strong>de</strong> <strong>de</strong><br />

estranhos, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> missionários a<br />

soldados da paz, passando <strong>por</strong><br />

industriais ligados ao po<strong>de</strong>r e mesmo<br />

rebel<strong>de</strong>s mercenários. Desloca-<strong>se</strong> <strong>de</strong><br />

motocicleta, piroga, batelão, jipe e até<br />

<strong>de</strong> helicóptero, <strong>se</strong>m nunca <strong>se</strong> <strong>de</strong>morar<br />

muito em parte alguma, sobretudo<br />

para evitar encontros <strong>de</strong>sagradáveis<br />

com os sanguinários rebel<strong>de</strong>s maimai,<br />

que não obe<strong>de</strong>cem a ninguém a<br />

não <strong>se</strong>r a <strong>ele</strong>s próprios.<br />

Fome, doença, miséria, violência,<br />

<strong>de</strong>struição e morte é tudo o que<br />

encontra num país gigantesco<br />

afundado no mais completo colapso,<br />

isto apesar ou justamente <strong>por</strong> causa<br />

dos <strong>se</strong>us imensos recursos naturais.<br />

Símbolos <strong>por</strong> excelência <strong>de</strong>ste<br />

<strong>de</strong>sastre são as pessoas que o autor<br />

vai cruzando pelo caminho:


Espaço<br />

Público<br />

Isabel<br />

Coutinho<br />

Este espaço vai <strong>se</strong>r<br />

<strong>se</strong>u. Que fi lme, peça <strong>de</strong><br />

teatro, livro, exposição,<br />

disco, álbum, canção,<br />

concerto, DVD viu e<br />

gostou tanto que lhe<br />

apeteceu escrever<br />

A juntar a isto só a<br />

loucura que é a compra<br />

dos bilhetes para<br />

assistir às conferências<br />

Blogue <strong>de</strong><br />

Marcelino Freire<br />

http://www.<br />

<strong>era</strong>odito.<br />

blogspot.com/<br />

Blogue <strong>de</strong> Flávio<br />

Moura<br />

http://<br />

fl aviormoura.<br />

wordpress.com/<br />

Flip - site ofi cial e<br />

Twitter<br />

http://www.fl ip.<br />

org.br/<br />

http://www.<br />

fl ipinha.org.br/<br />

http://twitter.<br />

com/fl ip2009<br />

Publish News<br />

http://www.<br />

publishnews.<br />

com.br<br />

Ciberescritas<br />

Em pulgas<br />

sobre <strong>ele</strong>, concordando<br />

ou não concordando<br />

com o que escrevemos?<br />

Envie-nos uma nota até<br />

500 caracteres para<br />

ipsilon@publico.pt. E<br />

nós <strong>de</strong>pois publicamos.<br />

AA Flip - a Festa Literária Internacional <strong>de</strong><br />

Paraty é hoje “uma das farras literárias mais<br />

animadas do país”, escrevia há <strong>se</strong>manas na<br />

“Folha <strong>de</strong> S. Paulo” o escritor Marcelino<br />

Freire, que <strong>de</strong>pois <strong>de</strong> ter lá ido a primeira vez<br />

nunca mais <strong>de</strong>ixou <strong>de</strong> ir. “Gosto disso, <strong>se</strong>mpre digo: a<br />

lit<strong>era</strong>tura associada ao ‘provolone’ [tipo <strong>de</strong> queijo], ao<br />

pastel e à batata frita”, escrevia Marcelino que na próxima<br />

edição que começa na quarta-feira e termina no domingo<br />

(<strong>de</strong> 1 a 5 <strong>de</strong> Julho) partilhará uma mesa com angolano<br />

Ondjaki. Defendia que eventos literários como a Flip (que<br />

partiu <strong>de</strong> uma i<strong>de</strong>ia da editora inglesa Liz Cal<strong>de</strong>r,<br />

fundadora da Bloomsbury) “humanizam a figura do<br />

escritor”: “O mesmo cara chato a quem você assiste numa<br />

palestra à tar<strong>de</strong>, po<strong>de</strong> encontrá-lo à noite, tropeçando,<br />

bêbado, p<strong>ela</strong>s esquinas bêbadas do local.”<br />

O <strong>por</strong>tuguês António Lobo Antunes é um dos<br />

convidados da edição <strong>de</strong>ste ano. O escritor que tem família<br />

do outro lado do Atlântico (o <strong>se</strong>u avô nasceu no Pará) já<br />

não vai ao Brasil <strong>de</strong>s<strong>de</strong> 1983. Numa entrevista intitulada<br />

“Um lobo a caminho”, que <strong>de</strong>u no início <strong>de</strong>ste mês pelo<br />

t<strong>ele</strong>fone a Suzana V<strong>ela</strong>sco, do jornal brasileiro “O Globo”,<br />

dis<strong>se</strong> que não quis saber qual <strong>era</strong> o tema da sua mesa,<br />

nem com quem a ia partilhar. Gosta <strong>de</strong> “surpresas”.<br />

<strong>Quando</strong> a jornalista lhe explicou que estará sozinho em<br />

cima do palco, o Prémio Camões 2007 respon<strong>de</strong>u-lhe: “Eu<br />

sozinho? Então eu me <strong>se</strong>nto<br />

‘embaixo’ da mesa.” Estes<br />

textos po<strong>de</strong>m <strong>se</strong>r lidos no site<br />

ofi cial da Flip.<br />

Isto promete. Em Paraty,<br />

como <strong>se</strong> percebe, tudo po<strong>de</strong><br />

acontecer. E já que estamos<br />

nestas histórias vale a pena<br />

lembrar aqu<strong>ela</strong> que Flávio<br />

Moura, o director da programação da festa literária <strong>de</strong>ste<br />

ano, escreveu no <strong>se</strong>u blogue. Lembrou-<strong>se</strong> d<strong>ela</strong> <strong>de</strong>pois <strong>de</strong><br />

<strong>se</strong> ter visto na situação <strong>de</strong> dar uma entrevista colectiva na<br />

conferência <strong>de</strong> imprensa do anúncio ofi cial da 7ª Festa<br />

Literária Internacional <strong>de</strong> Paraty, on<strong>de</strong> são esp<strong>era</strong>dos p<strong>ela</strong><br />

organização cerca <strong>de</strong> 25 mil visitantes. Contou <strong>ele</strong> que<br />

na Flip <strong>de</strong> 2003 organizaram uma entrevista colectiva<br />

com o escritor americano Don DeLillo. “Logo no começo<br />

da conversa, <strong>ele</strong> disparou: ‘Os Estados Unidos invadiram<br />

hoje o Irão’. Diante dos olhares <strong>de</strong> espanto, <strong>ele</strong> emendou:<br />

‘<strong>se</strong>mpre achei que entrevistas colectivas fos<strong>se</strong>m para<br />

anunciar eventos <strong>de</strong> gran<strong>de</strong> magnitu<strong>de</strong>. Então achei que<br />

<strong>de</strong>via inventar um’.”<br />

A juntar a isto só a loucura que é a compra dos bilhetes<br />

para assistir às conferências. Mesmo os jornalistas têm<br />

que comprar bilhetes e Ricardo Costa, da “Publish News”,<br />

escrevia há tempos: “Segunda-feira, 1/6. São 9h50 e<br />

pego o t<strong>ele</strong>fone preparado para a batalha da compra <strong>de</strong><br />

ingressos para a FLIP (Festa Literária Internacional <strong>de</strong><br />

Paraty). Surpresa! Fui atendido - atendimento automático,<br />

mas tudo bem - p<strong>ela</strong> Ingresso Rápido já na <strong>se</strong>gunda<br />

tentativa. E <strong>era</strong> o número 22 da fi la! Me empolguei, mas<br />

com o pé atrás - a experiência dos 90 minutos do ano<br />

passado ainda é viva. E não é que <strong>de</strong>u certo! Às 10h fui<br />

atendido e às 10h15 estava com os ingressos comprados<br />

e a transacção fi nalizada. Infelizmente não foi a mesma<br />

experiência do meu amigo José Luiz, que foi atendido<br />

rapidamente, mas logo a ligação caiu e <strong>de</strong>pois disso foi<br />

uma luta para con<strong>se</strong>guir os ingressos. Mas con<strong>se</strong>guiu.<br />

Maria Fernanda, outra amiga da qual também acompanhei<br />

a batalha teve pior sorte: a ligação caiu e só <strong>de</strong>pois <strong>de</strong><br />

muito tempo con<strong>se</strong>guiu novamente <strong>se</strong>r atendida; mas<br />

per<strong>de</strong>u todos os ingressos que já havia começado a<br />

comprar.(...) O que nos vale é que no site ofi cial da Flip<br />

há um espaço on<strong>de</strong> <strong>se</strong>rão transmitidos ao vivo os eventos<br />

através <strong>de</strong> um sistema <strong>de</strong> ví<strong>de</strong>o.”<br />

isabel.coutinho@publico.pt<br />

(Ciberescritas já é um blogue http://blogs.publico.pt/ciberescritas)<br />

Ípsilon • Sexta-feira 26 Junho 2009 • 39


Comunicação Social e Cultural<br />

Variantes: Comunicação Social / Jornalismo;<br />

Comunicação Cultural; Comunicação Digital;<br />

Comunicação Visual;<br />

Comunicação Organizacional<br />

Filosofia<br />

(Regime <strong>de</strong> e-learning) (NOVO)<br />

Línguas Estrangeiras Aplicadas<br />

Variantes: Tradução; R<strong>ela</strong>ções Empresariais<br />

Serviço Social<br />

Estudos Europeus (NOVO)<br />

(em parceria com o Instituto <strong>de</strong> Estudos Europeus<br />

da Universida<strong>de</strong> Católica Portuguesa)<br />

Contactos<br />

Faculda<strong>de</strong> <strong>de</strong> Ciências Humanas<br />

da Universida<strong>de</strong> Católica Portuguesa<br />

Palma <strong>de</strong> Cima 1649-023 Lisboa Tel: 217265692<br />

Email: direccaofch@fch.lisboa.ucp.pt<br />

www.fch.lisboa.ucp.pt<br />

40 • Ípsilon • Sexta-feira 26 Junho 2009<br />

Livros<br />

crianças <strong>de</strong> olhos esbugalhados<br />

p<strong>era</strong>nte o <strong>se</strong>u motociclo, <strong>por</strong>que na<br />

sua al<strong>de</strong>ia não há notícia da pre<strong>se</strong>nça<br />

<strong>de</strong> veículos motorizados <strong>de</strong>s<strong>de</strong> 1985;<br />

um velho chefe <strong>de</strong> estação que todos<br />

os dias <strong>se</strong> farda e vai marcar o ponto,<br />

apesar <strong>de</strong> ali não passar nenhum<br />

comboio há pelo menos <strong>se</strong>is anos;<br />

um ex-guia turístico local implora<br />

que leve o <strong>se</strong>u filho <strong>de</strong> quatro anos,<br />

consid<strong>era</strong>ndo que o estrangeiro é a<br />

sua única salvação.<br />

Se “Rio <strong>de</strong> Sangue” é uma<br />

re<strong>por</strong>tagem empenhada e<br />

penetrante, é também uma biografia<br />

bem documentada do país que hoje<br />

<strong>se</strong> chama República Democrática do<br />

Congo e que já foi Zaire, Congo Belga<br />

e Estado Livre do Congo. Butcher leu<br />

e r<strong>ele</strong>u a re<strong>por</strong>tagem <strong>de</strong> Stanley (o<br />

único livro que leva na bagagem) e<br />

boa parte da lit<strong>era</strong>tura produzida<br />

sobre o Congo <strong>de</strong>s<strong>de</strong> então, incluindo<br />

romances <strong>de</strong> Jo<strong>se</strong>ph Conrad, VS<br />

Naipul e Georges Simenon, assim<br />

como os diários <strong>de</strong> viagem da atriz<br />

Kathryn Hepburn aquando das<br />

filmagens <strong>de</strong> “Rainha Africana” e <strong>de</strong><br />

Che Guevara, respeitante à sua<br />

tentativa abortada <strong>de</strong> atentado a<br />

Mobutu em 1965.<br />

Esta pilha <strong>de</strong> leituras equacionada<br />

com <strong>de</strong>zenas <strong>de</strong> entrevistas e<br />

abundantes notas <strong>de</strong> re<strong>por</strong>tagem<br />

permitem ao jornalista inglês traçar<br />

um retrato actual do coração <strong>de</strong><br />

África, tão realista quanto paradoxal.<br />

O Congo surge uma anormalida<strong>de</strong> e<br />

uma aberração, um país “com mais<br />

passado do que futuro, um lugar on<strong>de</strong><br />

os ponteiros do relógio não giram<br />

para diante, mas para trás”. Butcher<br />

tem explicações e até receitas, que<br />

passam p<strong>ela</strong> <strong>de</strong>volução da sob<strong>era</strong>nia a<br />

um país que <strong>de</strong>s<strong>de</strong> o período colonial<br />

nunca mais voltou a gozar d<strong>ela</strong>s, mas<br />

suspeita e com razão da capacida<strong>de</strong><br />

dos congole<strong>se</strong>s para implementarem a<br />

prescrição. Como lhe diz um malaio<br />

da missão <strong>de</strong> paz das Nações Unidas,<br />

muito outros paí<strong>se</strong>s sofr<strong>era</strong>m<br />

idênticos traumas coloniais e<br />

<strong>se</strong>melhantes frustrações pósin<strong>de</strong>pendência,<br />

mal <strong>de</strong> uma forma ou<br />

<strong>de</strong> outra con<strong>se</strong>guiram dar a volta <strong>por</strong><br />

cima. O Congo não.<br />

Ensaio<br />

À escuta<br />

do som da<br />

escrita<br />

A canção da obra po<strong>de</strong><br />

surgir como metáfora que<br />

respon<strong>de</strong> “à alegoria musical<br />

herbertiana”. Manuel<br />

Gusmão<br />

A Canção da Obra<br />

Gustavo Rubim<br />

Textiverso, €15<br />

mmmmn<br />

De entre os universitários que fiz<strong>era</strong>m<br />

¬Mau ☆Medíocre ☆☆Razoável ☆☆☆Bom ☆☆☆☆Muito Bom ☆☆☆☆☆Exc<strong>ele</strong>nte<br />

Direito <strong>de</strong> resposta<br />

1. Na revista Ípsilon do jornal<br />

PÚBLICO <strong>de</strong> 5 <strong>de</strong> Junho <strong>de</strong> 2009,<br />

numa entrevista concedida à<br />

jornalista Alexandra Lucas Coelho, o<br />

escritor José Eduardo Agualusa<br />

<strong>de</strong>clara:<br />

“Nos livros que foram publicados<br />

[sobre os acontecimentos do 27 <strong>de</strong><br />

Maio] há uma série <strong>de</strong> escritores<br />

nomeados erradamente [como<br />

interrogadores responsáveis <strong>por</strong><br />

tortura]. Mas isso eu escrevi no<br />

Ípsilon, quando saiu o livro da Dalila<br />

[Mateus, “Purga em Angola”].<br />

Escrevi: este livro é im<strong>por</strong>tante mas<br />

entre os acusados <strong>se</strong>i que alguns não<br />

estiv<strong>era</strong>m pre<strong>se</strong>ntes nessas<br />

comissões [<strong>de</strong> interrogatório],<br />

concretamente o Luandino Vieira.<br />

Sei, <strong>por</strong>que pessoas ligadas ao<br />

processo me diss<strong>era</strong>m, mas não vivi<br />

o processo. A Dalila coloca outros<br />

nomes. Não me consi<strong>de</strong>ro a pessoa<br />

apta para dizer. Na <strong>se</strong>gunda edição<br />

<strong>ela</strong> corrige, retira o nome do<br />

Luandino, o nome do Ruy Duarte <strong>de</strong><br />

Carvalho também tinha sido<br />

confundido com o Rui <strong>de</strong> Carvalho,<br />

que foi director da t<strong>ele</strong>visão em<br />

Angola. Havia pequenos equívocos<br />

no livro que lhe retiravam<br />

legitimida<strong>de</strong>. Mas é um livro<br />

im<strong>por</strong>tante, e é preciso discutir<br />

abertamente. São tragédias<br />

humanas. Muitos dos filhos dizem<br />

que não querem vingança, querem<br />

saber o que aconteceu ao pai. Têm<br />

es<strong>se</strong> direito” [sublinhado a negrito<br />

nosso].<br />

2. A afirmação do escritor começava<br />

<strong>por</strong> <strong>se</strong>r falsa. Com efeito, na revista<br />

Ípsilon do Público <strong>de</strong> 29 <strong>de</strong> Fevereiro<br />

<strong>de</strong> 2008 José Eduardo Agualusa não<br />

escrev<strong>era</strong> o que diz, mas sim o que a<br />

<strong>se</strong>guir <strong>se</strong> transcreve:<br />

“O pre<strong>se</strong>nte livro [Holocausto em<br />

Angola], que recolhe apenas meta<strong>de</strong><br />

da informação contida nos tais<br />

quatro mil maços <strong>de</strong> tabaco,<br />

impressiona, como já dis<strong>se</strong>, pelo<br />

<strong>por</strong>menor. Cardoso Botelho, não <strong>se</strong><br />

limita a rev<strong>ela</strong>r os nomes dos<br />

principais responsáveis pelos crimes<br />

cometidos naqu<strong>ele</strong>s dias <strong>de</strong> horror -<br />

como fez, <strong>por</strong> vezes com<br />

incorrecções gravíssimas, Dalila<br />

Mateus, acusando erradamente<br />

algumas pessoas <strong>de</strong> terem sido<br />

envolvidas nos interrogatórios a<br />

presos políticos; <strong>ele</strong> dá o nome dos<br />

guardas, as matrículas dos carros que<br />

trans<strong>por</strong>tavam este ou aqu<strong>ele</strong> preso,<br />

os dias e as horas em que <strong>se</strong><br />

registaram as <strong>se</strong>ssões <strong>de</strong> tortura...”<br />

[sublinhado a negrito nosso].<br />

3. No entanto e para além <strong>de</strong>ste<br />

facto, o escritor José Eduardo<br />

Agualusa persistia numa série <strong>de</strong><br />

incorrecções que, como historiadora,<br />

não podia <strong>de</strong>ixar passar em branco.<br />

Assim:<br />

as suas provas <strong>de</strong><br />

doutoramento <strong>por</strong><br />

volta da mais<br />

recente (e já<br />

longínqua) viragem<br />

do século, Gustavo<br />

Rubim é, muito<br />

provavelmente, um<br />

dos mais<br />

interessantes ensaístas que em<br />

Portugal têm <strong>por</strong> território essa arte<br />

minoritária e, <strong>se</strong>gundo alguns<br />

4. Afirma terem sido “os escritores<br />

nomeados erradamante [como<br />

interrogadores responsáveis <strong>por</strong><br />

tortura]”, ou dito <strong>de</strong> outra maneira,<br />

terem sido “interrogadorestorturadores”,<br />

o que não<br />

correspon<strong>de</strong> à verda<strong>de</strong>. No livro<br />

“Purga em Angola”, os autores<br />

afirmam apenas que estes escritores<br />

tinham sido <strong>de</strong>signados para a<br />

chamada “Comissão das Lágrimas”,<br />

criada pelo Bureau Político do MPLA<br />

para s<strong>ele</strong>ccionar int<strong>ele</strong>ctuais presos<br />

no 27 <strong>de</strong> Maio. E como ressalta do<br />

livro, os membros <strong>de</strong>sta comissão<br />

(que variavam <strong>de</strong> <strong>se</strong>ssão para <strong>se</strong>ssão)<br />

interrogavam os <strong>de</strong>tidos e votavam,<br />

<strong>de</strong>pois, a sua entrega a militares e<br />

polícias, que, estes sim, os<br />

torturavam.<br />

5. O escritor afirma, ainda, que “Ruy<br />

Duarte <strong>de</strong> Carvalho também tinha<br />

sido confundido com Rui <strong>de</strong><br />

Carvalho, director da T<strong>ele</strong>visão”, o<br />

que é falso. Nos primeiros mil<br />

exemplares do livro, existiu uma<br />

confusão (mas nunca com Ruy<br />

Duarte <strong>de</strong> Carvalho), confusão que<br />

foi rectificada na reimpressão e nas<br />

edições <strong>se</strong>guintes. Na 3ª edição, a<br />

nota 381 da página 126 refere ainda:<br />

“Na 1ª edição <strong>de</strong>ste livro, existiu uma<br />

confusão entre os nomes <strong>de</strong> Rui <strong>de</strong><br />

Carvalho e do embaixador Rui<br />

Mingas, que nada tem a ver com esta<br />

Comissão”. Acresce que Rui <strong>de</strong><br />

Carvalho nunca foi Director da<br />

T<strong>ele</strong>visão, mas sim da Rádio.<br />

6. Afirma, ainda, José Eduardo<br />

Agualusa, que retirámos da<br />

Comissão o escritor Luandino Vieira,<br />

que <strong>se</strong>ria um dos “escritores<br />

nomeados erradamente [como<br />

interrogadores responsáveis <strong>por</strong><br />

tortura]”. Acontece que não<br />

nomeámos erradamente qualquer<br />

escritor. E não retiramos da<br />

Comissão o escritor José Vieira<br />

Mateus da Graça, lit<strong>era</strong>riamente<br />

conhecido <strong>por</strong> Luandino Vieira.<br />

Assinalando que, já em anterior<br />

esclarecimento, tínhamos citado o<br />

jornal “Folha 8” (16.06.2006), que<br />

consid<strong>era</strong>ra a recusa do prémio<br />

Camões pelo escritor como a única<br />

forma <strong>de</strong> “<strong>se</strong> reconciliar com um<br />

passado nebuloso”, , em que<br />

pertenc<strong>era</strong> à “famig<strong>era</strong>da Comissão<br />

das Lágrimas”. Sublinhámos, ainda,<br />

<strong>se</strong>r estranho imaginar que na<br />

referida Comissão estives<strong>se</strong> o<br />

director da Rádio [Rui <strong>de</strong> Carvalho],<br />

mas não o director da T<strong>ele</strong>visão (o<br />

próprio Luandino Vieira], afinal o<br />

primeiro responsável p<strong>ela</strong>s imagens<br />

e filmes que alimentaram a histeria<br />

colectiva.<br />

Lisboa, 2009-06-17<br />

Dalila Maria Evaristo dos Santos<br />

Cabrita Mateus<br />

indicadores e informantes,<br />

<strong>de</strong>scuidadamente moribunda, da<br />

poesia. Interessante, dis<strong>se</strong>, <strong>por</strong>que<br />

inteligente, informado, consciente dos<br />

<strong>de</strong>safios que escolhe e dos<br />

procedimentos com que lhes procura<br />

respon<strong>de</strong>r e<br />

imaginativamente<br />

rigoroso, ou <strong>se</strong>ja,<br />

dotado <strong>de</strong>ssa<br />

imaginação ao<br />

mesmo<br />

Gustavo Rubim é um d<br />

MIGUEL SILVA/ARQUIVO


MIGUEL SILVA/ARQUIVO<br />

tempo produtiva (e não m<strong>era</strong>mente<br />

reprodutiva) e rigorosa, necessária a<br />

quem <strong>se</strong> <strong>de</strong><strong>se</strong>ja um leitor e um<br />

ensaísta, mais do que um crítico.<br />

Este <strong>se</strong>u livro exemplifica as<br />

qualida<strong>de</strong>s do <strong>se</strong>u autor, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> logo<br />

na sua organização interna, que o<br />

prólogo e o texto da contracapa (<strong>de</strong><br />

clara responsabilida<strong>de</strong> autoral)<br />

apre<strong>se</strong>ntam e r<strong>ela</strong>cionam com a sua<br />

concepção da leitura e do ensaísmo,<br />

que pratica, como “arte <strong>de</strong> sublinhar”.<br />

Es<strong>se</strong> é, aliás, o título do <strong>se</strong>u anterior<br />

livro <strong>de</strong> ensaios, “A Arte <strong>de</strong><br />

Sublinhar” (2003), e que neste <strong>se</strong><br />

explicita, citando aqu<strong>ele</strong>: “Modo <strong>de</strong><br />

ler <strong>de</strong>dicado a ‘mexer’ nos textos e a<br />

‘interferir’ no ilusório sos<strong>se</strong>go das<br />

linhas impressas.” O livro organiza-<strong>se</strong>,<br />

então, “em dois conjuntos <strong>de</strong> quatro<br />

ensaios”, numa or<strong>de</strong>m que <strong>se</strong><br />

preten<strong>de</strong> não <strong>se</strong>r arbitrária. Em<br />

primeiro lugar, “leituras, quatro”,<br />

<strong>de</strong>pois, “Duas vezes <strong>se</strong>cundário”. O<br />

primeiro título, ao inverter a or<strong>de</strong>m<br />

normalizada das palavras, <strong>de</strong>staca ou<br />

sublinha o que <strong>de</strong> fundamental está<br />

em jogo: trata-<strong>se</strong> <strong>de</strong> leituras. O<br />

<strong>se</strong>gundo joga com o epíteto<br />

“<strong>se</strong>cundário” em expressões como<br />

“bibliografia <strong>se</strong>cundária”, indicando<br />

que são textos críticos, procedimentos<br />

e protocolos <strong>se</strong>us, que são aqui o <strong>se</strong>u<br />

objecto directo.<br />

Nas “leituras”, sublinhando um<br />

título, r<strong>ela</strong>cionando-o com outros e<br />

com os textos que intitulam, mexendo<br />

ou repondo em movimento uma<br />

figura da poesia num poema, Rubim<br />

procura escutar “a canção da obra”,<br />

que dará o título ao livro, mas que<br />

enquanto título da primeira das<br />

quatro leituras diz a tentativa <strong>de</strong> ler o<br />

título <strong>de</strong> Herberto Hel<strong>de</strong>r (HH) “ou o<br />

poema contínuo” na sua r<strong>ela</strong>ção com<br />

a obra completa.<br />

Depois, interroga-<strong>se</strong> sobre “o<br />

animal poético” (sobre a figura do<br />

poema como organismo, sobre o<br />

animal como o recalcado do humano),<br />

na obra <strong>de</strong> Eugénio <strong>de</strong> Andra<strong>de</strong> e<br />

perturba a recepção <strong>de</strong>ssa obra sob o<br />

signo da clarida<strong>de</strong> solar, do<br />

angelismo e da<br />

pureza da<br />

linguagem.<br />

Lerá a<br />

<strong>se</strong>guir um<br />

poema <strong>de</strong><br />

Ruy Belo,<br />

mostrando<br />

como<br />

ler é<br />

“r<strong>ele</strong>r”<br />

(ler não<br />

apenas<br />

outra vez,<br />

mas ler <strong>de</strong><br />

outra<br />

maneira)<br />

através do<br />

sublinhar dos<br />

valores <strong>de</strong><br />

<strong>se</strong>ntido da<br />

Internet<br />

m dos mais interessantes ensaístas <strong>de</strong> poesia<br />

Estamos online. Entre em<br />

www.ipsilon.pt. É o mesmo<br />

suplemento, é outro <strong>de</strong>safi o.<br />

Venha construir este site<br />

connosco.<br />

corr<strong>ela</strong>ção entre um homem singular<br />

e a morte que lhe está <strong>de</strong>stinada.<br />

Finalmente, escutará as condições <strong>de</strong><br />

possibilida<strong>de</strong> e as con<strong>se</strong>quências<br />

(efeitos) <strong>de</strong> uma “poética do<br />

fonógrafo” que, num soneto <strong>de</strong><br />

Camilo Pessanha, lhe permitem<br />

questionar a precedência da “phoné”,<br />

ou da voz sobre a escrita ou a grafia.<br />

O <strong>se</strong>gundo conjunto <strong>de</strong> textos,<br />

“Fantasmas do Livro” e “O Livro<br />

Incerto”, são ensaios que retomam o<br />

trabalho <strong>de</strong> Rubim à procura <strong>de</strong><br />

Camilo Pessanha e do <strong>se</strong>u “livro”, o<br />

que <strong>de</strong> várias formas o tem posto em<br />

movimento. “Áurea Crítica” lê<br />

“Século <strong>de</strong> Ouro”, antologia da<br />

poesia <strong>por</strong>tuguesa do séc. XX.<br />

“Elogio do Rodapé” é um exemplo<br />

concentrado do que po<strong>de</strong> <strong>se</strong>r o<br />

humor dum ensaísta.<br />

Gustavo Rubim tem, <strong>de</strong> várias<br />

formas, insistido na noção <strong>de</strong> escrita<br />

e no modo como na mo<strong>de</strong>rnida<strong>de</strong><br />

<strong>ela</strong> vem tornar obsoletas, subordinar<br />

e <strong>de</strong>sconstruir certas metáforas da<br />

voz. A “Canção da Obra” pareceria<br />

<strong>se</strong>r uma <strong>de</strong>ssas metáforas e, no<br />

quadro da poesia <strong>de</strong> HH, trans<strong>por</strong>tanos<br />

involuntariamente, <strong>se</strong>gundo o<br />

ensaísta, a “Ofício Cantante” (1967).<br />

Só que Rubim “mexe” na sua<br />

genealogia e provoca tais<br />

“interferências” que impe<strong>de</strong>m as<br />

rotinas da leitura. A canção da obra<br />

po<strong>de</strong> assim surgir como metáfora<br />

que respon<strong>de</strong> “à alegoria musical<br />

herbertiana”, <strong>de</strong> uma música que<br />

vem <strong>por</strong> exemplo do jazz, em que “a<br />

voz <strong>se</strong> vê como instrumento e, <strong>por</strong><br />

corolário, há canções on<strong>de</strong> nenhuma<br />

voz canta”. O “Oficio Cantante” é<br />

<strong>se</strong>mpre já escrita “<strong>por</strong>que, ‘música’<br />

ou ‘poema’, a obra ‘escreve-<strong>se</strong>’”.<br />

Nova “interferência” e Rubim associa<br />

a afirmação “Não há prosa”, <strong>de</strong> HH, a<br />

Mallarmé, on<strong>de</strong> o poema <strong>se</strong> podia<br />

figurar como “música” ou “sinfonia”<br />

em virtu<strong>de</strong> da “transposição para o<br />

Livro”, “da instrumentação” e “do<br />

conjunto das r<strong>ela</strong>ções existentes<br />

em tudo”.<br />

Entretanto, Rubim é claro:<br />

“Chamamos, <strong>por</strong>ém, canção da obra a<br />

outra coisa diferente do ‘ofício<br />

cantante’. A canção da obra traduz o<br />

efeito da obra como ‘ou o poema<br />

contínuo’, no ponto em que a obra,<br />

<strong>por</strong> sua vez, passa a traduzir o <strong>se</strong>ntido<br />

do nome <strong>de</strong> HH exactamente no<br />

mesmo lance em que <strong>se</strong> <strong>de</strong>signa a si<br />

mesma (18). [...] não só a assinatura<br />

assina a obra como a obra assina a<br />

assinatura” (19).<br />

E a leitura não sos<strong>se</strong>ga, passará<br />

ainda p<strong>ela</strong> interrogação daquilo que<br />

HH <strong>de</strong>signa em “Photomaton & Vox”,<br />

“impreterível ‘razão’ <strong>de</strong> autor” e que<br />

conduzirá Rubim ao “verídico”<br />

herbertiano. Ao chegar aí, encontra<br />

uma questão que é dupla: <strong>por</strong> um<br />

lado, a forma <strong>de</strong>safiadora como na<br />

obra <strong>de</strong> HH <strong>se</strong> afirma uma autorida<strong>de</strong><br />

que <strong>se</strong> furta “a qualquer juízo crítico”,<br />

<strong>por</strong> outro, a condição <strong>de</strong> “réplica”<br />

(resposta, fala <strong>de</strong> teatro, repetição) da<br />

leitura. Apanhado p<strong>ela</strong> vibração<br />

expansiva da obra, tornado<br />

<strong>se</strong>u replicante, o<br />

leitor é então “um<br />

cúmplice ...<br />

a<strong>de</strong>quado”<br />

(HH). E o<br />

último parágrafo do ensaio vale <strong>por</strong><br />

uma gno<strong>se</strong>ologia e uma ética da<br />

leitura: “A diferença é que como leitor,<br />

e <strong>por</strong> força da companhia <strong>de</strong><br />

fantasmas que me dão a i<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> que<br />

nunca na verda<strong>de</strong> estive só, me estaria<br />

<strong>se</strong>mpre vedada, ainda que o dis<strong>se</strong>s<strong>se</strong><br />

p<strong>ela</strong> primeira vez, a possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong><br />

dizer isso com a certeza absoluta <strong>de</strong><br />

que ‘isso’ não fos<strong>se</strong> apenas uma<br />

paráfra<strong>se</strong>” (32).<br />

<strong>Quando</strong> este ensaio foi escrito,<br />

coexistiam “Herberto Hel<strong>de</strong>r Ou o<br />

poema contínuo. Súmula” (2003), que<br />

<strong>era</strong> uma espécie <strong>de</strong> antologia e<br />

Herberto Hel<strong>de</strong>r, “Ou o Poema<br />

Contínuo” (2004) que <strong>era</strong> o livro que<br />

reunia a obra poética do autor; que <strong>se</strong><br />

chamara antes “Poesia Toda” e, antes<br />

ainda, “Ofício Cantante” (1967). Não é<br />

das coisas menores que <strong>se</strong> po<strong>de</strong>m<br />

dizer da “Canção da Obra” (2006), o<br />

dizer que o <strong>se</strong>u percurso sinuoso e<br />

obstinado nos prepara para<br />

enten<strong>de</strong>rmos a “impreterível razão <strong>de</strong><br />

autor” que <strong>se</strong> exprime quando<br />

Herberto Hel<strong>de</strong>r <strong>de</strong>signa a sua “poesia<br />

completa”, “Ofício cantante” (2009).<br />

Ficção<br />

História<br />

<strong>de</strong> cristal<br />

Nesta nov<strong>ela</strong>, a História é<br />

ficção <strong>por</strong>que somos nós<br />

que a fazemos, e não os <strong>se</strong>us<br />

protagonistas. Pedro Mexia<br />

Os Passos da Cruz<br />

Nuno Júdice<br />

Dom Quixote, €11,50<br />

mmmnn<br />

“A História insiste<br />

em <strong>de</strong>ixar as suas<br />

marcas nas nossas<br />

vidas, <strong>por</strong> muito que<br />

<strong>de</strong><strong>se</strong>jemos ignorá-la.<br />

Há épocas que<br />

trans<strong>por</strong>tam um<br />

peso <strong>de</strong><br />

interrogações que<br />

nos obrigam a não <strong>de</strong>sviar a atenção<br />

dos acontecimentos, tentando <strong>se</strong>guir<br />

passo a passo as transformações que<br />

<strong>de</strong>correm à nossa frente; até chegar<br />

es<strong>se</strong> dia em que <strong>de</strong>scobrimos, que,<br />

afinal, nada mudou, e que só as<br />

pessoas que ocupavam os lugares <strong>de</strong><br />

comando d<strong>era</strong>m o lugar a outras que,<br />

bem vistas as coisas, não são mais do<br />

que figurantes que repre<strong>se</strong>ntam (...) o<br />

mesmo papel (...)” (pág. 79).<br />

Eis uma espécie <strong>de</strong> “programa”<br />

<strong>de</strong>sta nov<strong>ela</strong> <strong>de</strong> Nuno Júdice, que<br />

prolonga temas da exc<strong>ele</strong>nte ficção<br />

autobiográfica “O Anjo da<br />

Tempesta<strong>de</strong>” (2004) e da estimulante<br />

reinvenção mítica “O Enigma <strong>de</strong><br />

Salomé” (2007). Tal como nessas duas<br />

obras, em “Os Passos da Cruz” trata-<strong>se</strong><br />

<strong>de</strong> cruzar épocas e imaginar<br />

personagens (sobretudo femininas),<br />

fazendo da imaginação uma chave da<br />

História.<br />

Nesta nov<strong>ela</strong>, Júdice prolonga temas <strong>de</strong><br />

“O Anjo da Tempesta<strong>de</strong>” <strong>de</strong> “O Enigma <strong>de</strong> Salomé”<br />

O que é <strong>de</strong> facto a História, como<br />

realida<strong>de</strong> e como disciplina?<br />

Investigação, documentação, tudo<br />

isso, mas a certa altura é impossível<br />

<strong>se</strong>guir a regra que impe<strong>de</strong> o<br />

“envolvimento” com o objecto <strong>de</strong><br />

estudo. É nes<strong>se</strong> momento que na<br />

verda<strong>de</strong> compreen<strong>de</strong>mos através do<br />

que imaginamos, que nos per<strong>de</strong>mos,<br />

fora do mundo, em imagens i<strong>de</strong>ais e<br />

<strong>de</strong>vaneios romanescos. A História é<br />

ficção <strong>por</strong>que “somos nós que a<br />

fazemos, e não os <strong>se</strong>us protagonistas”.<br />

Abdicando <strong>de</strong> todas as ingenuida<strong>de</strong>s<br />

do chamado “romance histórico”,<br />

Nuno Júdice escolheu uma<br />

personagem histórica pouco<br />

conhecida e escreveu uma ficção<br />

sucinta e reflexiva sobre estes temas.<br />

Essa figura é Antónia Margarida <strong>de</strong><br />

Castelo Branco (1652-1717), uma<br />

aristocrata que casou, <strong>de</strong>masiado<br />

jovem e contra sua vonta<strong>de</strong>, com Brás<br />

T<strong>ele</strong>s <strong>de</strong> Mene<strong>se</strong>s, fidalgo arruinado,<br />

<strong>de</strong>vasso e brutal, que apenas queria o<br />

dote da esposa. Depois <strong>de</strong> alguns anos<br />

<strong>de</strong> martírio conjugal, Antónia<br />

Margarida entrou para um convento e<br />

aí escreveu uma autobiografia <strong>de</strong>vota<br />

e barroca (conhecida como “Fiel e<br />

Verda<strong>de</strong>yra R<strong>ela</strong>ção”), que vai <strong>se</strong>ndo<br />

citada ao longo do texto [Margarida<br />

Gil levou a história ao cinema em<br />

1987]. O barroco é aliás es<strong>se</strong>ncial nesta<br />

nov<strong>ela</strong>; não <strong>por</strong>que o estilo <strong>de</strong> Júdice<br />

<strong>se</strong>ja barroco mas <strong>por</strong>que evoca a<br />

confusão <strong>de</strong> <strong>se</strong>ntimentos e o engenho<br />

retórico que <strong>se</strong> conjugavam numa<br />

“cristalização <strong>de</strong> imagens”, ou <strong>se</strong>ja,<br />

num mistério.<br />

A caminho da sua investigação, na<br />

estrada <strong>de</strong> Almeirim para Coruche, o<br />

narrador per<strong>de</strong>-<strong>se</strong>, fica <strong>se</strong>m gasolina,<br />

e na verda<strong>de</strong> per<strong>de</strong>-<strong>se</strong> também no<br />

tempo, e todas as personagens que<br />

encontra são <strong>se</strong>tecentistas, são o<br />

próprio Brás T<strong>ele</strong>s, que lhe dá boleia,<br />

e Antónia Margarida, que o <strong>se</strong>duz.<br />

Obcecado com o passado, o narrador<br />

per<strong>de</strong> a noção da realida<strong>de</strong>, está tão<br />

interessado no passado que é o<br />

passado que <strong>ele</strong> revive, o passado<br />

como ligação entre as épocas. Mais<br />

do que um investigador, torna-<strong>se</strong> um<br />

caçador <strong>de</strong> mitos, vive no “halo <strong>de</strong><br />

m<strong>ela</strong>ncolia” dos mundos<br />

<strong>de</strong>saparecidos, dos palácios em<br />

ruínas, dos valores antigos, da aura<br />

dos heróis.<br />

Ao longo da nov<strong>ela</strong>, <strong>ele</strong> tem dois<br />

contrapontos: uma jovem<br />

revolucionária, dos <strong>se</strong>us dias <strong>de</strong><br />

estudante, que acha que só interessam<br />

os gran<strong>de</strong>s movimentos <strong>de</strong> massas e<br />

não os dramas subjectivos; e uma<br />

historiadora, que o alerta para a<br />

dimensão romanceada da<br />

historiografia. Com estas<br />

personagens, Nuno Júdice volta às<br />

memórias da sua g<strong>era</strong>ção <strong>de</strong><br />

militantes dogmáticos, tão crentes na<br />

transformação colectiva como outrora<br />

<strong>se</strong> <strong>era</strong> crente na única e verda<strong>de</strong>ira<br />

religião. E ao mesmo tempo sugere<br />

que há uma irreparável patologia em<br />

todos aqu<strong>ele</strong>s para quem “a<br />

subjectivida<strong>de</strong> é um pecado burguês”.<br />

O narrador não ignora os jogos <strong>de</strong><br />

po<strong>de</strong>r, nomeadamente os do século<br />

que investiga, mas sabe que a<br />

subjectivida<strong>de</strong> e a <strong>se</strong>xualida<strong>de</strong> já<br />

então contavam muito, como na<br />

infame maquinação para <strong>de</strong><strong>por</strong> o rei<br />

Afonso VI, supostamente impotente.<br />

Incapaz <strong>de</strong> <strong>se</strong> distanciar do <strong>se</strong>u<br />

objecto <strong>de</strong> estudo, o narrador vive<br />

num limbo entre facto e ficção, vê<br />

todas as personagens, vivas e mortas,<br />

como duplos, emanações, entra num<br />

abismo barroco em que as imagens <strong>se</strong><br />

propagam como <strong>se</strong> espelhadas num<br />

cristal. E po<strong>de</strong> assim qua<strong>se</strong> amar e<br />

qua<strong>se</strong> compreen<strong>de</strong>r uma mulher<br />

morta há séculos, talvez com mais<br />

facilida<strong>de</strong> do que ama e compreen<strong>de</strong><br />

o mundo em que vive.<br />

Ípsilon • Sexta-feira 26 Junho 2009 • 41<br />

MIGUEL MADEIRA


Cinema<br />

42 • Ípsilon • Sexta-feira 26 Junho 2009<br />

Estreiam<br />

Simplesmente<br />

Coco<br />

Os anos “antes” do <strong>se</strong>u<br />

apelido <strong>se</strong> ter tornado no<br />

sinónimo da moda chique<br />

parisien<strong>se</strong>. Jorge Mourinha<br />

Coco avant Chanel<br />

Coco avant Chanel<br />

De Anne Fontaine,<br />

com Audrey Tautou, Benoît<br />

Poelvoor<strong>de</strong>, Alessandro Nivola. M/0<br />

MMMnn<br />

Lisboa: Castello Lopes - Londres: Sala 1: 5ª<br />

Domingo 2ª 3ª 4ª 14h, 16h30, 19h, 21h30 6ª<br />

Sábado 14h, 16h30, 19h, 21h30, 24h; CinemaCity<br />

Classic Alvala<strong>de</strong>: Sala 3: 5ª 2ª 3ª 4ª 14h, 16h10,<br />

18h40, 21h20 6ª 14h, 16h10, 18h40, 21h20, 23h40<br />

Sábado 11h45, 14h, 16h10, 18h40, 21h20, 23h40<br />

Domingo 11h45, 14h, 16h10, 18h40, 21h20; Me<strong>de</strong>ia<br />

Monumental: Sala 1: 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª<br />

4ª 13h20, 15h30, 17h40, 19h50, 22h, 00h15; UCI<br />

Cinemas - El Corte Inglés: Sala 14: 5ª 6ª Sábado 2ª<br />

3ª 4ª 14h15, 16h45, 19h15, 21h40, 00h10 Domingo<br />

11h30, 14h15, 16h45, 19h15, 21h40, 00h10; ZON<br />

Lusomundo Amoreiras: 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª<br />

3ª 4ª 12h50, 15h20, 18h, 21h45, 00h15; ZON<br />

Lusomundo CascaiShopping: 5ª 6ª Sábado<br />

Domingo 2ª 3ª 4ª 12h50, 15h25, 18h, 21h05, 23h30;<br />

Porto: Arrábida 20: Sala 13: 5ª 6ª Sábado<br />

Domingo 2ª 14h05, 16h40, 19h15, 21h55, 00h35 3ª<br />

4ª 16h40, 19h15, 21h55, 00h35; ZON Lusomundo<br />

Dolce Vita Porto: 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª<br />

13h20, 15h50, 18h45, 21h20, 23h50<br />

Quem esp<strong>era</strong>r do filme <strong>de</strong> Anne<br />

Fontaine (“Nathalie”) uma<br />

convencional biografia da estilista<br />

francesa Coco Chanel – ou <strong>se</strong>ja, uma<br />

espécie <strong>de</strong> “La Vie en Ro<strong>se</strong>” em<br />

versão alta-costura – po<strong>de</strong> <strong>de</strong>s<strong>de</strong> já<br />

tirar o cavalinho da chuva. “Coco<br />

Avant Chanel”, como o <strong>se</strong>u título<br />

(misteriosamente não traduzido<br />

para <strong>por</strong>tuguês...) explica,<br />

concentra-<strong>se</strong> nos anos “antes” do<br />

<strong>se</strong>u apelido <strong>se</strong> ter tornado no<br />

sinónimo da moda chique<br />

parisien<strong>se</strong>, em que a então ainda<br />

Gabrielle <strong>era</strong> costureira <strong>de</strong> província<br />

com aspirações a ve<strong>de</strong>ta da canção.<br />

O que <strong>se</strong> <strong>de</strong><strong>se</strong>nha, então, é muito<br />

mais um retrato <strong>de</strong> mulher disposta<br />

a tomar o <strong>se</strong>u <strong>de</strong>stino nas mãos,<br />

procurando fugir à rota que lhe fora<br />

traçada à nascença <strong>por</strong> uma<br />

socieda<strong>de</strong> francesa ainda muito<br />

arreigada às convenções sociais que<br />

ditavam o papel da mulher como<br />

mero <strong>ele</strong>mento <strong>de</strong>corativo.<br />

Esta Coco Chanel, habitada<br />

persuasivamente <strong>por</strong> Audrey Tautou<br />

(como “Amélie” vai longe!), está<br />

longe <strong>de</strong> <strong>se</strong>r uma mulher simpática<br />

ou idónea, mas é, felizmente, um <strong>se</strong>r<br />

humano – e o mérito maior do filme<br />

<strong>de</strong> Anne Fontaine, misto <strong>de</strong> “biopic”<br />

<strong>de</strong> câmara e triângulo romântico<br />

entre Gabrielle e os <strong>se</strong>us protectores,<br />

o cavaleiro aristocrata Etienne<br />

Balsan (um assombroso Benoît<br />

Poelvoor<strong>de</strong>) e o negociante inglês<br />

Arthur Capel, é o <strong>de</strong> estar muito<br />

mais interessada em pessoas do que<br />

em estereótipos, escapando com<br />

uma <strong>ele</strong>gância qua<strong>se</strong> ofensiva às<br />

armadilhas do “biopic” (mesmo que<br />

lhes dê no final uma cedência <strong>de</strong><br />

As estr<strong>ela</strong>s do público<br />

última hora que retira algum lustro<br />

ao projecto) e evitando com enorme<br />

“souples<strong>se</strong>” as tendências <strong>de</strong><br />

“audiovisual” <strong>de</strong> luxo.<br />

“Coco Avant Chanel” é um filme<br />

(que alívio!) e, sobretudo, um filme<br />

inteligente (que maravilha!). Uma<br />

surpresa.<br />

Transformers - Retaliação<br />

Transformers: Revenge<br />

of the Fallen<br />

De Michael Bay,<br />

com Megan Fox, Shia LaBeouf, John<br />

Turturro. M/0<br />

a<br />

Lisboa: Castello Lopes - Cascais Villa: Sala 1: 5ª 6ª<br />

2ª 3ª 4ª 15h40, 18h40, 21h40 Sábado Domingo<br />

12h40, 15h40, 18h40, 21h40; Castello Lopes - Loures<br />

Shopping: Sala 6: 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª<br />

4ª 15h20, 18h20, 21h20, 00h15; Castello Lopes -<br />

Loures Shopping: Sala 5: 5ª 6ª Sábado Domingo<br />

2ª 3ª 12h50, 15h50, 18h50, 21h50; CinemaCity<br />

Alegro Alfragi<strong>de</strong>: Cinemax: 5ª 6ª Sábado Domingo<br />

2ª 3ª 4ª 13h45, 16h35, 21h, 23h50; CinemaCity<br />

Alegro Alfragi<strong>de</strong>: Sala 2: 5ª 6ª Sábado Domingo<br />

2ª 3ª 21h20, 0010; CinemaCity Beloura<br />

Shopping: Cinemax: 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª<br />

4ª 13h30, 16h40, 21h, 23h50; CinemaCity Beloura<br />

Shopping: Sala 2: 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª<br />

21h30, 00h20; CinemaCity Campo Pequeno Praça<br />

<strong>de</strong> Touros: Sala 4: 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª<br />

4ª 14h, 16h50, 21h, 23h50; CinemaCity Campo<br />

Pequeno Praça <strong>de</strong> Touros: Sala 3: 5ª 6ª Sábado<br />

Domingo 2ª 3ª 17h30, 21h20, 00h10; Me<strong>de</strong>ia Fonte<br />

Nova: Sala 1: 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª<br />

14h30, 18h15, 21h30; Me<strong>de</strong>ia Monumental: Sala 4 -<br />

Jorge<br />

Mourinha<br />

Cine Teatro: 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª<br />

13h10, 16h, 18h50, 21h40, 00h30; UCI Cinemas - El<br />

Corte Inglés: Sala 9: 5ª 6ª Sábado 2ª 3ª 4ª 15h,<br />

18h15, 21h30, 00h25 Domingo 11h30, 15h, 18h15,<br />

21h30, 00h25; UCI Dolce Vita Tejo: Sala 2: 5ª 6ª<br />

Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 15h, 18h, 21h30,<br />

00h25; ZON Lusomundo Alvaláxia: 5ª 6ª Sábado<br />

Domingo 2ª 3ª 4ª 13h40, 16h50, 21h10,<br />

00h20; ZON Lusomundo Amoreiras: 5ª 6ª Sábado<br />

Domingo 2ª 3ª 4ª 14h, 17h30, 21h, 24h; ZON<br />

Lusomundo CascaiShopping: 5ª 6ª Sábado<br />

Domingo 2ª 3ª 4ª 13h10, 17h, 21h, 00h20; ZON<br />

Lusomundo Colombo: 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª<br />

3ª 4ª 13h, 16h30, 21h05, 00h25; ZON Lusomundo<br />

Colombo: 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 15h20,<br />

18h55, 22h30; ZON Lusomundo Dolce Vita<br />

Miraflores: 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 15h,<br />

18h30, 22h; ZON Lusomundo Odiv<strong>ela</strong>s Parque: 5ª<br />

6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 13h20, 16h30, 21h,<br />

00h15; ZON Lusomundo Oeiras Parque: 5ª 6ª<br />

Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 13h10, 16h30, 21h,<br />

00h20; ZON Lusomundo Oeiras Parque: 5ª 6ª<br />

Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 15h10, 18h30,<br />

21h50; ZON Lusomundo Torres Vedras: 5ª 6ª<br />

Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 13h30, 17h, 21h,<br />

00h15; ZON Lusomundo Vasco da Gama: 5ª 6ª<br />

Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 13h15, 15h20, 16h30,<br />

18h40, 21h, 21h55, 00h10; Castello Lopes - C. C.<br />

Jumbo: Sala 1: 5ª 6ª 2ª 3ª 4ª 15h40, 18h40, 21h40<br />

Sábado Domingo 12h40, 15h40, 18h40,<br />

21h40; Castello Lopes - Fórum Barreiro: Sala 1: 5ª<br />

2ª 3ª 4ª 15h40, 18h40, 21h40 6ª 15h40, 18h40,<br />

21h40, 23h50 Sábado 12h40, 15h40, 18h40, 21h40,<br />

23h50 Domingo 12h40, 15h40, 18h40,<br />

21h40; Castello Lopes - Rio Sul Shopping: Sala 2: 5ª<br />

6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 15h20, 18h20, 21h20,<br />

00h20; Castello Lopes - Rio Sul Shopping: Sala 4: 5ª<br />

6ª 2ª 3ª 15h50, 18h50, 21h50 Sábado Domingo<br />

12h50, 15h50, 18h50, 21h50; UCI Free<strong>por</strong>t: Sala 1: 5ª<br />

Domingo 2ª 3ª 15h15, 18h10, 21h30 6ª Sábado<br />

15h15, 18h10, 21h30, 00h20; ZON Lusomundo<br />

Almada Fórum: 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª<br />

13h35, 15h, 17h, 18h30, 21h, 22h, 00h15; ZON<br />

Lusomundo Fórum Montijo: 5ª 6ª Sábado<br />

Domingo 2ª 3ª 4ª 13h40, 17h30, 21h, 00h20<br />

Luís M.<br />

Oliveira<br />

Mário<br />

J. Torres<br />

Vasco<br />

Câmara<br />

Deixa-me Entrar mmmmn mmnnn mmmnn mmmnn<br />

Exterminador Implacável- A Salvação mmmnn mnnnn nnnnn nnnnn<br />

Cada um o <strong>se</strong>u Cinema nnnnn mmmnn mmmnn mmmnn<br />

Coco avant Chanel mmmnn nnnnn nnnnn nnnnn<br />

Um Conto <strong>de</strong> Natal mmmmn mmmnn mmnnn mmnnn<br />

Histórias <strong>de</strong> Caça<strong>de</strong>ira mmmmn mmmnn mmmnn mmmnn<br />

Ligações Perigosas mmmnn mmnnn mmmnn nnnnn<br />

A Ressaca mmnnn nnnnn mnnnn nnnnn<br />

Traidor mmmnn nnnnn mmnnn nnnnn<br />

Transformers A nnnnn nnnnn nnnnn<br />

Esta Coco Chanel é habitada persuasivamente <strong>por</strong> Audrey Tautou<br />

Porto: Arrábida 20: Sala 16: 5ª 6ª Sábado<br />

Domingo 2ª 3ª 4ª 15h15, 18h20, 21h30,<br />

00h40; Arrábida 20: Sala 1: 5ª 6ª Sábado<br />

Domingo 2ª 13h40, 16h35, 19h35, 22h35 3ª 16h35,<br />

19h35, 22h35; Cinemax - Cinema da Praça : Sala 1:<br />

5ª 2ª 3ª 4ª 15h30, 21h35 6ª 15h30, 21h35, 00h20<br />

Sábado 15h, 17h30, 21h35, 00h20 Domingo 15h,<br />

17h30, 21h35; Cinemax - Penafiel: Sala 2: 5ª 2ª 3ª<br />

4ª 15h30, 21h35 6ª 15h30, 21h35, 00h20 Sábado 15h,<br />

17h30, 21h35, 00h20 Domingo 15h, 17h30,<br />

21h35; Me<strong>de</strong>ia Cida<strong>de</strong> do Porto: Sala 1: 5ª 6ª<br />

Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 14h40, 18h30,<br />

21h45; ZON Lusomundo Dolce Vita Porto: 5ª 6ª<br />

Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 14h, 17h20, 21h,<br />

00h20; ZON Lusomundo GaiaShopping: 5ª<br />

Domingo 2ª 3ª 4ª 13h30, 17h50, 21h30 6ª Sábado<br />

13h30, 17h50, 21h30, 00h35; ZON Lusomundo<br />

MaiaShopping: 5ª Domingo 2ª 3ª 4ª 13h50,<br />

17h30, 21h 6ª Sábado 13h50, 17h30, 21h,<br />

00h20; ZON Lusomundo Marshopping: 5ª 6ª<br />

Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 13h30, 16h50, 21h20,<br />

00h30; ZON Lusomundo NorteShopping: 5ª 6ª<br />

Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 12h30, 13h50, 15h50,<br />

17h30, 19h10, 21h, 22h30, 00h35; ZON Lusomundo<br />

Parque Nascente: 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª<br />

4ª 14h10, 17h40, 21h10, 00h40; Castello Lopes - 8ª<br />

Avenida: Sala 1: 5ª 6ª 2ª 3ª 4ª 15h40, 18h40,<br />

21h40 Sábado Domingo 12h40, 15h40, 18h40, 21h40<br />

O primeiro “Transformers” tinha<br />

graça – pelo menos a graça “trash” e<br />

inane que po<strong>de</strong> ter um manga <strong>de</strong><br />

imagem real sobre robôs mutantes<br />

alienígenas à <strong>por</strong>rada uns com os<br />

outros. Mas há piadas que só têm<br />

graça contadas à primeira vez, e,<br />

como é habitual em Michael Bay,<br />

“Transformers-Retaliação” limita-<strong>se</strong><br />

a duplicar o original à saturação,<br />

com mais robôs mutantes<br />

alienígenas à <strong>por</strong>rada mas <strong>se</strong>m


<strong>se</strong>quer fingir que há uma história a<br />

contar, <strong>de</strong>ixando <strong>de</strong>scarnado o<br />

louvor às virtu<strong>de</strong>s das Forças<br />

Armadas americanas e o “product<br />

placement” <strong>de</strong>scarado (que já<br />

estavam no primeiro, é verda<strong>de</strong>).<br />

Não fos<strong>se</strong> John Turturro (<strong>de</strong> regresso<br />

com o <strong>se</strong>u <strong>de</strong>svairado da<br />

conspiração) e a coisa ainda <strong>se</strong>ria<br />

pior — on<strong>de</strong> o primeiro<br />

“Transformers” <strong>era</strong> um prazer<br />

culpado incon<strong>se</strong>quente, esta <strong>se</strong>qu<strong>ela</strong><br />

é um frete interminável feita a<br />

pensar nas receitas <strong>de</strong> bilheteira. E<br />

robôs mutantes alienígenas à<br />

<strong>por</strong>rada só têm graça até certo<br />

ponto. J. M.<br />

Continuam<br />

Ligações Perigosas<br />

State of Play<br />

De Kevin Macdonald,<br />

com Rus<strong>se</strong>ll Crowe, Ben Affleck,<br />

Rachel McAdams. M/12<br />

MMMnn<br />

Lisboa: Castello Lopes - Cascais Villa: Sala 5: 5ª 2ª<br />

3ª 4ª 16h, 18h50, 21h50 6ª 16h, 18h50, 21h50,<br />

00h30 Sábado 13h20, 16h, 18h50, 21h50, 00h30<br />

Domingo 13h20, 16h, 18h50, 21h50; Castello Lopes -<br />

Londres: Sala 2: 5ª Domingo 2ª 3ª 14h15, 16h45,<br />

19h15, 21h45 6ª Sábado 14h15, 16h45, 19h15, 21h45,<br />

00h15; Castello Lopes - Loures Shopping: Sala 2: 5ª<br />

6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 13h10, 16h, 18h30,<br />

21h30, 00h10; CinemaCity Alegro Alfragi<strong>de</strong>: Sala 3:<br />

5ª 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 13h30, 16h15,<br />

18h55, 21h35, 00h15; CinemaCity Beloura<br />

Shopping: Sala 3: 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª<br />

4ª 13h40, 16h20, 19h05, 21h45, 00h25; CinemaCity<br />

Campo Pequeno Praça <strong>de</strong> Touros: Sala 1: 5ª 6ª<br />

Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 13h55, 16h25, 19h,<br />

21h40, 00h15; Me<strong>de</strong>ia Saldanha Resi<strong>de</strong>nce: Sala 6:<br />

5ª 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 14h30, 17h,<br />

19h30, 22h, 00h30; UCI Cinemas - El Corte<br />

Inglés: Sala 12: 5ª 6ª Sábado 2ª 3ª 14h, 16h35,<br />

19h10, 21h45, 00h20 Domingo 11h30, 14h, 16h35,<br />

19h10, 21h45, 00h20; UCI Dolce Vita Tejo: Sala 4: 5ª<br />

6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 13h50, 16h25, 19h,<br />

21h35, 00h15; ZON Lusomundo Alvaláxia: 5ª 6ª<br />

Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 13h30, 16h15, 19h,<br />

21h45, 00h25; ZON Lusomundo Amoreiras: 5ª 6ª<br />

Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 13h, 15h50, 18h30,<br />

“LIgações Perigosas”<br />

¬Mau ☆Medíocre ☆☆Razoável ☆☆☆Bom ☆☆☆☆Muito Bom ☆☆☆☆☆Exc<strong>ele</strong>nte<br />

”Transformers”: interminável frete<br />

21h20, 00h10; ZON Lusomundo CascaiShopping: 5ª<br />

6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 12h40, 15h30,<br />

18h30, 21h20, 00h10; ZON Lusomundo Colombo: 5ª<br />

6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 12h45, 15h45, 18h40,<br />

21h25, 00h20; ZON Lusomundo Odiv<strong>ela</strong>s Parque: 5ª<br />

6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 12h50, 15h40,<br />

18h40, 21h35, 00h25; ZON Lusomundo Oeiras<br />

Parque: 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 12h35,<br />

15h25, 18h25, 21h20, 00h15; ZON Lusomundo Torres<br />

Vedras: 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 12h50,<br />

15h40, 18h30, 21h30, 00h30; ZON Lusomundo<br />

Vasco da Gama: 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª<br />

12h55, 15h40, 18h25, 21h25, 00h25; Castello Lopes -<br />

Fórum Barreiro: Sala 2: 5ª 2ª 3ª 4ª 15h30, 18h10,<br />

21h10 6ª 15h30, 18h10, 21h10, 24h Sábado 12h50,<br />

15h30, 18h10, 21h10, 24h Domingo 12h50, 15h30,<br />

18h10, 21h10; Castello Lopes - Rio Sul Shopping: Sala<br />

3: 5ª 6ª 2ª 3ª 4ª 15h40, 18h30, 21h10, 24h Sábado<br />

Domingo 13h, 15h40, 18h30, 21h10, 24h; UCI<br />

Free<strong>por</strong>t: Sala 3: 5ª 2ª 3ª 4ª 15h45, 18h30, 21h10<br />

6ª 15h45, 18h30, 21h10, 00h15 Sábado 13h15, 15h45,<br />

18h30, 21h10, 00h15 Domingo 13h15, 15h45, 18h30,<br />

21h10; ZON Lusomundo Almada Fórum: 5ª 6ª<br />

Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 12h50, 15h45, 18h40,<br />

21h30, 00h25; ZON Lusomundo Fórum Montijo: 5ª<br />

6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 12h50, 15h40,<br />

18h30, 21h20, 00h15<br />

Porto: Arrábida 20: Sala 20: 5ª 6ª Sábado<br />

Domingo 2ª 13h40, 16h20, 19h10, 22h, 00h50 3ª 4ª<br />

16h20, 19h10, 22h, 00h50; Me<strong>de</strong>ia Cida<strong>de</strong> do<br />

Porto: Sala 2: 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª<br />

14h, 16h35, 19h25, 22h; ZON Lusomundo Dolce Vita<br />

Porto: 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 12h50,<br />

15h30, 18h20, 21h10, 00h10 ; ZON Lusomundo<br />

GaiaShopping: 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª<br />

13h05, 16h, 19h, 22h ; ZON Lusomundo<br />

MaiaShopping: 5ª Domingo 2ª 3ª 4ª 14h10, 17h15,<br />

21h20 6ª Sábado 14h10, 17h15, 21h20, 00h15; ZON<br />

Lusomundo Marshopping: 5ª 6ª Sábado Domingo<br />

2ª 3ª 4ª 13h, 15h40, 18h40, 21h40, 00h25; ZON<br />

Lusomundo NorteShopping: 5ª 6ª Sábado<br />

Domingo 2ª 3ª 4ª 12h40, 15h40, 18h40, 21h50,<br />

00h50; ZON Lusomundo Parque Nascente: 5ª 6ª<br />

Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 12h40, 15h40, 18h30,<br />

21h20, 00h10<br />

Os filmes sobre os bastidores do<br />

jornalismo correm dois gran<strong>de</strong>s<br />

riscos: primeiro, tem que confrontar<strong>se</strong><br />

com uma longa e bem<br />

<strong>de</strong>limitada tradição<br />

cinematográfica, com obrasprimas<br />

absolutas como “O<br />

Gran<strong>de</strong> Escândalo” <strong>de</strong> Howard<br />

Hawks ou “Park Row” <strong>de</strong><br />

Samuel Fuller, e filmes bem<br />

construídos e <strong>de</strong> gran<strong>de</strong> âmbito<br />

mediático, como “Os Homens<br />

do Presi<strong>de</strong>nte”; <strong>se</strong>gundo, pe<strong>de</strong><strong>se</strong>-lhes<br />

uma<br />

actualização <strong>de</strong><br />

conceitos e <strong>de</strong><br />

métodos,<br />

reflectindo<br />

pre<strong>se</strong>ntes<br />

evoluções.<br />

“Ligações Perigosas”<br />

não inventa nada, não<br />

aspira a gran<strong>de</strong>s<br />

voos, mas arvora<br />

uma simpática<br />

<strong>de</strong>spretensão,<br />

uma<br />

simplicida<strong>de</strong> <strong>de</strong> processos que<br />

resulta eficaz, nomeadamente no<br />

modo como equilibra a sua matriz<br />

t<strong>ele</strong>visiva <strong>de</strong> origem com uma<br />

linguagem escorreita, e a tangente<br />

bastante bem estruturada com o<br />

“thriller”. Depois do <strong>de</strong>sinteressante<br />

“O Último Rei da Escócia”, Kevin<br />

MacDonald promete redimir-<strong>se</strong> e<br />

funcionar melhor <strong>de</strong>ntro da ficção<br />

industrial, com a <strong>se</strong>gurança formal<br />

<strong>de</strong> quem fez a mão no documentário.<br />

Mário Jorge Torres<br />

Histórias <strong>de</strong> Caça<strong>de</strong>iras<br />

Shotgun Stories<br />

De Jeff Nichols,<br />

com Michael Shannon, Douglas<br />

Ligon, Barlow Jacobs. M/12<br />

mmmnn<br />

Lisboa: Me<strong>de</strong>ia King: Sala 1: 5ª Domingo 3ª 4ª 14h,<br />

16h, 18h, 20h, 22h 6ª Sábado 2ª 14h, 16h, 18h, 20h,<br />

22h, 00h30; Me<strong>de</strong>ia Monumental: Sala 2: 5ª 6ª<br />

Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 13h40, 15h40, 17h40,<br />

19h40, 21h50, 24h<br />

Trata-<strong>se</strong> <strong>de</strong> um filme que causa<br />

estranheza e <strong>se</strong> vai entranhando, a<br />

pouco e pouco, no espectador: saga<br />

familiar, contaminação <strong>de</strong> géneros,<br />

numa zona híbrida e algo<br />

<strong>de</strong>sconfortável, entre o<br />

documentário e a ficção, possui a<br />

qualida<strong>de</strong> rara <strong>de</strong> conhecer<br />

exactamente os <strong>se</strong>us limites, os<br />

objectivos do <strong>se</strong>u discurso, os<br />

contornos poéticos da paisagem que<br />

faz habitar. Sem os complexos,<br />

Traumática passagem pelos confi ns do<br />

Arkansas: “Histórias da Caça<strong>de</strong>ira”<br />

silva!<strong>de</strong>signers<br />

SÃO<br />

LUIZ<br />

JUL~O9<br />

um<br />

espectáculo<br />

em duas partes<br />

e um convite<br />

para jantar<br />

ODISSEIA<br />

CABISBAIXA<br />

3 E 4 JUL<br />

SALA PRINCIPAL<br />

SEXTA E SÁBADO ÀS 18H30<br />

1ª PARTE: 18H30<br />

INTERVALO PARA JANTAR: 20H30<br />

2ª PARTE: 21H30<br />

M/12<br />

A REPOSIÇÃO DESTE ESPECTÁCULO É UMA CO-PRODUÇÃO SLTM ~ TEATRO DA GARAGEM<br />

O TEATRO DA GARAGEM É UMA ESTRUTURA APOIADA PELO MC/DGARTES,<br />

PELA CÂMARA MUNICIPAL DE LISBOA / EGEAC, EEM<br />

SÃO LUIZ TEATRO MUNICIPAL<br />

RUA ANTÓNIO MARIA CARDOSO, 38<br />

1200-027 LISBOA<br />

GERAL@TEATROSAOLUIZ.PT<br />

T: 213 257 640<br />

BILHETEIRA TODOS OS DIAS DAS 13H00 ÀS 20H00;<br />

T: 213 257 650; BILHETEIRA@TEATROSAOLUIZ.PT<br />

BILHETES À VENDA TAMBÉM EM WWW.TICKETLINE.PT,<br />

AGÊNCIA ALVALADE, LOJAS BLISS, FNAC E WORTEN,<br />

BULHOSA LIVREIROS E EL CORTE INGLÉS<br />

Ípsilon • Sexta-feira 26 Junho 2009 • 43<br />

WWW.TEATROSAOLUIZ.PT


Cinema<br />

nem as pretensões <strong>de</strong> muito do<br />

cinema in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>nte, “Histórias <strong>de</strong><br />

Caça<strong>de</strong>ira” não rejeita a construção<br />

<strong>de</strong> uma ap<strong>ela</strong>tiva história <strong>de</strong><br />

vingança, mas nunca faz da<br />

emulação <strong>de</strong> outras ficções o <strong>se</strong>u<br />

centro. Po<strong>de</strong> até preferir-<strong>se</strong> a maior<br />

crueza do olhar documental, mas a<br />

multiplicida<strong>de</strong> <strong>de</strong> registos as<strong>se</strong>nta<strong>se</strong>-lhe<br />

bem, e esta traumática<br />

passagem pelos confins do Arkansas<br />

é perturbantemente <strong>se</strong>dutora. E<br />

muito simples… M.J.T.<br />

A Ressaca<br />

The Hangover<br />

De Todd Phillips,<br />

com Bradley Cooper, Ed Helms,<br />

Zach Galifianakis. M/12<br />

mmnnn<br />

Lisboa: Castello Lopes - Cascais Villa: Sala 4: 5ª 2ª<br />

3ª 4ª 16h10, 18h30, 21h10 6ª 16h10, 18h30, 21h10,<br />

23h50 Sábado 13h30, 16h10, 18h30, 21h10, 23h50<br />

Domingo 13h30, 16h10, 18h30, 21h10; Castello Lopes<br />

- Loures Shopping: Sala 1: 5ª 6ª Sábado Domingo<br />

2ª 3ª 4ª 13h20, 15h40, 18h15, 21h40,<br />

23h50; CinemaCity Alegro Alfragi<strong>de</strong>: Sala 7: 5ª 6ª<br />

2ª 3ª 4ª 13h45, 15h45, 17h40, 19h35, 21h35, 23h40<br />

Sábado Domingo 11h50, 13h45, 15h45, 17h40, 19h35,<br />

21h35, 23h40; CinemaCity Beloura Shopping: Sala 1:<br />

5ª 6ª 2ª 3ª 4ª 13h55, 15h50, 17h45, 19h40, 21h35,<br />

44 • Ípsilon • Sexta-feira 26 Junho 2009<br />

23h30 Sábado Domingo 11h45, 13h55, 15h50, 17h45,<br />

19h40, 21h35, 23h30; Me<strong>de</strong>ia Saldanha<br />

Resi<strong>de</strong>nce: Sala 8: 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª<br />

4ª 13h40, 15h40, 17h40, 19h40, 21h40, 24h; UCI<br />

Cinemas - El Corte Inglés: Sala 13: 5ª 6ª Sábado 2ª<br />

3ª 14h25, 17h, 19h15, 22h, 00h30 Domingo 11h30,<br />

14h25, 17h, 19h15, 22h, 00h30; UCI Dolce Vita<br />

Tejo: Sala 3: 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 14h,<br />

16h, 18h, 20h, 22h, 24h; ZON Lusomundo Alvaláxia:<br />

5ª 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 13h55, 16h25,<br />

18h50, 21h20, 23h50; ZON Lusomundo<br />

CascaiShopping: 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª<br />

13h20, 15h50, 18h40, 21h10, 23h40; ZON<br />

Lusomundo Colombo: 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª<br />

3ª 4ª 13h15, 15h30, 18h15, 21h, 23h40; ZON<br />

Lusomundo Dolce Vita Miraflores: 5ª Domingo 2ª<br />

3ª 4ª 15h30, 18h30, 21h30 6ª Sábado 15h30, 18h30,<br />

21h30, 00h30; ZON Lusomundo Odiv<strong>ela</strong>s Parque:<br />

5ª 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 12h55,15h20,<br />

18h, 21h15, 23h45; ZON Lusomundo Oeiras Parque:<br />

5ª 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 13h, 15h50,<br />

18h40, 21h25, 00h10; ZON Lusomundo Torres<br />

Vedras: 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 13h45,<br />

16h15, 18h45, 21h15, 23h40; ZON Lusomundo Vasco<br />

da Gama: 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 13h05,<br />

15h30, 18h10, 21h40, 24h; Castello Lopes - C. C.<br />

Jumbo: Sala 3: 5ª 2ª 3ª 4ª 15h30, 18h10, 21h10 6ª<br />

15h30, 18h10, 21h10, 23h40 Sábado 13h10, 15h30,<br />

18h10, 21h10, 23h40 Domingo 13h10, 15h30, 18h10,<br />

21h10; Castello Lopes - Fórum Barreiro: Sala 4: 5ª<br />

2ª 3ª 4ª 15h50, 18h20, 21h50 6ª 15h50, 18h20,<br />

21h50, 00h10 Sábado 13h10, 15h50, 18h20, 21h50,<br />

00h10 Domingo 13h10, 15h50, 18h20,<br />

21h50; Castello Lopes - Rio Sul Shopping: Sala 1: 5ª<br />

6ª 2ª 3ª 4ª 16h, 18h40, 21h30, 23h50 Sábado<br />

Domingo 13h30, 16h, 18h40, 21h30, 23h50; UCI<br />

Free<strong>por</strong>t: Sala 5: 5ª 2ª 3ª 4ª 15h30, 17h35, 19h35,<br />

21h35 6ª 15h30, 17h35, 19h35, 21h35, 23h55 Sábado<br />

13h30, 15h30, 17h35, 19h35, 21h35, 23h55 Domingo<br />

13h30, 15h30, 17h35, 19h35, 21h35; ZON Lusomundo<br />

Anteestreia<br />

“A Ressaca”<br />

Almada Fórum: 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª<br />

13h10, 15h55, 18h20, 21h10, 23h45; ZON Lusomundo<br />

Fórum Montijo: 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª<br />

13h30, 15h50, 18h20, 21h30, 23h55<br />

Porto: Arrábida 20: Sala 15: 5ª 6ª Sábado<br />

Domingo 2ª 14h10, 16h45, 19h20, 21h45, 00h25 3ª<br />

16h45, 19h20, 21h45, 00h25; ZON Lusomundo Dolce<br />

Vita Porto: 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª<br />

13h50, 16h20, 18h50, 21h30, 24h; ZON Lusomundo<br />

GaiaShopping: 5ª Domingo 2ª 3ª 4ª 13h40,<br />

16h20, 19h10, 21h40 6ª Sábado 13h40, 16h20,<br />

19h10, 21h40, 00h30; ZON Lusomundo<br />

Marshopping: 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª<br />

13h20, 15h50, 18h20, 21h30, 00h10; ZON<br />

Lusomundo NorteShopping: 5ª 6ª Sábado<br />

Domingo 2ª 3ª 4ª 13h40, 16h30, 19h, 21h40,<br />

Agenda<br />

Sexta, 26<br />

Violência e Paixão<br />

Gruppo di Famiglia in un Interno<br />

De Luchino Visconti. Com Burt<br />

Lancaster, Helmut Berger, Silvana<br />

Mangano. 121 min.<br />

15h30 - Sala Félix Ribeiro<br />

O Amigo Americano<br />

Der Amerikanische Freund<br />

De Wim Wen<strong>de</strong>rs. Com Bruno<br />

Ganz, Dennis Hopper, Lisa<br />

Kreuzer. 123 min.<br />

19h - Sala Félix Ribeiro<br />

Opinião Pública + O Peregrino<br />

A Woman of Paris<br />

De Charles Chaplin. Com Adolphe<br />

Menjou, Carl Miller, Edna<br />

Purviance. 84 min. M12.<br />

19h30 - Sala Luís <strong>de</strong> Pina<br />

Beija-me. E A<strong>de</strong>us!<br />

Kiss Me Goodbye<br />

De Robert Mulligan.<br />

Com Sally Field,<br />

James Caan, Jeff<br />

Bridges. 101 min.<br />

21h30 - Sala Félix<br />

Ribeiro<br />

The Worst Woman in<br />

Paris?<br />

De Monta Bell. Com Benita Hume,<br />

Adolphe Menjou, Harvey<br />

Stephens. 78 min.<br />

22h - Sala Luís <strong>de</strong> Pina<br />

Sábado, 27<br />

Segunda-feira, às 21h30,<br />

A Escola da Noite (em<br />

colaboração com o Núcleo<br />

<strong>de</strong> Estados para a Paz e o<br />

Ob<strong>se</strong>rvatório sobre Género<br />

e Violência Armada do<br />

Centro <strong>de</strong> Estudos Sociais)<br />

acolhe no Teatro da Cerca<br />

<strong>de</strong> São Bernardo a anteestreia<br />

<strong>de</strong> “Luto como<br />

Mãe”, documentário, sobre<br />

violência armada urbana,<br />

<strong>de</strong> Luís Carlos Nasci-<br />

A Cida<strong>de</strong> Perdida<br />

Legend of the Lost<br />

De Henry Hathaway. Com John<br />

Wayne, Sophia Loren, Rossano<br />

Brazzi. 109 min.<br />

15h30 - Sala Félix Ribeiro<br />

Liliom<br />

00h25; ZON Lusomundo Parque Nascente: 5ª 6ª<br />

Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 13h10, 15h50, 18h40,<br />

21h30, 00h20; Castello Lopes - 8ª Avenida: Sala 2:<br />

5ª 2ª 3ª 4ª 16h, 18h50, 21h30 6ª 16h, 18h50,<br />

21h30, 23h50 Sábado 13h10, 16h, 18h50, 21h30,<br />

23h50 Domingo 13h10, 16h, 18h50, 21h30<br />

É a <strong>se</strong>gunda i<strong>de</strong>ia genial da comédia<br />

americana recente, <strong>de</strong>pois do “amor<br />

inevitável” <strong>de</strong> “Zack e Miri Fazem<br />

um Porno”: uma <strong>de</strong>spedida <strong>de</strong><br />

solteiro em Las Vegas da qual os três<br />

padrinhos ressacados não <strong>se</strong><br />

recordam e que têm <strong>de</strong> reconstruir<br />

Cinemateca Portuguesa R. Barata Salgueiro, 39 Lisboa. B213596200<br />

Fritz Lang,<br />

“Liliom”<br />

JEAN-PAUL PELISSIER/ REUTERS<br />

mento: histórias <strong>de</strong> sobreviventes,<br />

mães, irmãs e<br />

esposas, que perd<strong>era</strong>m<br />

os familiares em actos <strong>de</strong><br />

violência urbana no Rio <strong>de</strong><br />

Janeiro, cida<strong>de</strong> que é palco<br />

frequente <strong>de</strong> execuções<br />

sumárias cometidas <strong>por</strong><br />

agentes do Estado. Depois<br />

da exibição, <strong>de</strong>bate com o<br />

realizador. Entrada livre<br />

De Fritz Lang. Com Charles Boyer,<br />

Florelle, Mad<strong>ele</strong>ine Oz<strong>era</strong>y, Pierre<br />

Alcover. 120 min. M12.<br />

19h - Sala Félix Ribeiro<br />

A Ven<strong>de</strong><strong>de</strong>ira <strong>de</strong> Fósforos<br />

+ Charleston<br />

La Petite Marchan<strong>de</strong> d’Allumettes<br />

De Jean Renoir, Jean Té<strong>de</strong>sco. Com<br />

Catherine Hessling, Manuel Raaby,<br />

Jean Storm. 40 min.<br />

19h30 - Sala Luís <strong>de</strong> Pina<br />

F for Fake<br />

De Orson Welles. Com Clifford<br />

Irving, Elmyr <strong>de</strong> Hory, Jo<strong>se</strong>ph<br />

Cotten, Oja kodar, Orson Welles. 85<br />

min.<br />

21h30 - Sala Félix Ribeiro<br />

O Amor <strong>de</strong> Leão<br />

Lions Love<br />

De Agnès Varda. Com Peter<br />

Bogdanovich, Richard<br />

Bright, Carlos Clarens.<br />

110 min.<br />

22h - Sala Luís <strong>de</strong> Pina<br />

Segunda, 29<br />

Um, Dois, Três<br />

One, Two, Three<br />

De Billy Wil<strong>de</strong>r. Com Arlene<br />

Francis, Horst Buchholz, James<br />

Cagney, Lilo Pulver, Pam<strong>ela</strong> Tiffin,<br />

Red Buttons. 108 min.<br />

15h30 - Sala Félix Ribeiro<br />

Annie Hall<br />

De Woody Allen. Com Diane<br />

Keaton, Shelley Duval, Tony<br />

Roberts, Woody Allen. 94 min.<br />

19h - Sala Félix Ribeiro<br />

China’s Little Devils<br />

De Monta Bell. Com Harry<br />

Carey, Paul Kelly, ‘Ducky’ Louie. 74<br />

min.<br />

19h30 - Sala Luís <strong>de</strong> Pina<br />

“a posteriori” para perceber on<strong>de</strong><br />

está o noivo, <strong>por</strong>que é que há um<br />

tigre na casa <strong>de</strong> banho e <strong>de</strong> on<strong>de</strong><br />

veio o bebé no armário. E é também<br />

a <strong>se</strong>gunda i<strong>de</strong>ia genial <strong>de</strong>sperdiçada<br />

num filme que não lhe faz justiça –<br />

<strong>por</strong>que, <strong>de</strong>pois <strong>de</strong> um<br />

extraordinário começo, o guião <strong>de</strong><br />

Jon Lucas e Scott Moore vai<br />

per<strong>de</strong>ndo o gás e começa a<br />

“<strong>de</strong>spachar”, <strong>por</strong>que a percentagem<br />

<strong>de</strong> gagues magníficos é<br />

<strong>de</strong>scompensada <strong>por</strong> outros tantos<br />

mal enjorcados. Ainda assim, há<br />

momentos notáveis <strong>de</strong>ntro da<br />

estética da “comédia do<br />

<strong>de</strong>sconforto” (qua<strong>se</strong> todos<br />

envolvendo Zach Galifianakis, uma<br />

das novas <strong>se</strong>nsações da “stand-up<br />

comedy” americana) e uma i<strong>de</strong>ia tão<br />

forte que nem este filme con<strong>se</strong>gue<br />

afogar. J. M.<br />

Luchino Visconti, “Violência e<br />

Paixão” e “Os Malditos”<br />

The old place + L’’Origine<br />

du XXI Ème Siècle<br />

The Old Place<br />

De Anne-Marie Miéville, Jean-Luc<br />

Godard. 47 min.<br />

21h30 - Sala Félix Ribeiro<br />

Estrada <strong>de</strong> Fogo<br />

Streets of Fire<br />

De Walter Hill. Com Michael Paré,<br />

Diane Lane, Rick Moranis. 93 min.<br />

22h - Sala Luís <strong>de</strong> Pina<br />

Terça, 30<br />

A Vida É Um Romance<br />

La Vie Est Un Roman<br />

De Alain Resnais. Com G<strong>era</strong>ldine<br />

Chaplin, Ruggero Raimondi,<br />

Vittorio Gassman. 106 min.<br />

15h30 - Sala Félix Ribeiro<br />

O Homem Da Lua<br />

The Man in the Moon<br />

De Robert Mulligan. Com Gail<br />

Strickland, Mark Ry<strong>de</strong>ll, Sam<br />

Waterston, Tess Harper. 95 min.<br />

19h - Sala Félix Ribeiro<br />

A Carta<br />

The Letter<br />

De Jean <strong>de</strong> Limur. Com Jeanne<br />

Eagels, O.P. Heggie, Reginald<br />

Owen. 65 min.<br />

19h30 - Sala Luís <strong>de</strong> Pina<br />

Os Malditos<br />

La Caduta Degli Dei<br />

De Luchino Visconti. Com Dirk<br />

Bogar<strong>de</strong>, Helmut Griem, Ingrid<br />

Thulin. 155 min. M12.<br />

21h30 - Sala Félix Ribeiro<br />

Une Visite au Louvre + Cézanne<br />

Une Visite au Louvre<br />

De Danièle Huillet, Jean-Marie<br />

Straub. 95 min.<br />

22h - Sala Luís <strong>de</strong> Pina


DE 4 A 18 DE JULHO DE 2009<br />

Câmara <strong>Municipal</strong> <strong>de</strong> Almada | Companhia <strong>de</strong> Teatro <strong>de</strong> Almada<br />

Volksbühne (Berlim)<br />

Luc Bondy<br />

Edith Clever<br />

Matthias Langhoff<br />

André Wilms<br />

Teatro Nacional<br />

<strong>de</strong> Brux<strong>ela</strong>s<br />

Virgilio Sieni<br />

Teatro <strong>de</strong> Sátira<br />

<strong>de</strong> São Petersburgo<br />

Robert Cantarella<br />

Jacques Martial<br />

tg STAN<br />

Teatro en El Blanco (Chile)<br />

La Maravillosa (Argentina)<br />

Teatro Corsario<br />

Edith Clever em As criadas, <strong>de</strong> Genet<br />

André Wilms em Deus como paciente, <strong>de</strong> Lautréamont<br />

Compota russa pelo Teatro Sátira <strong>de</strong> São Petersburgo<br />

NOVE ESTREIAS ABSOLUTAS<br />

Artistas Unidos, Teatro Praga, Teatro Nacional D. Maria II, Oblivion, Ambar Filmes e Companhia <strong>de</strong> Teatro<br />

<strong>de</strong> Almada estreiam espectáculos no Festival. Participam também o Teatro da Cornucópia, Maria José<br />

Paschoal e Circolando.<br />

Espectáculos em Almada (Escola D. António da Costa, Teatro <strong>Municipal</strong> e Fórum Romeu Correia)<br />

e Lisboa (Teatro Nacional D. Maria II, Culturgest, São Luiz Teatro <strong>Municipal</strong> e Instituto Franco-Português).<br />

212 739 360 | www.ctalmada.pt


DVD<br />

46 • Ípsilon • Sexta-feira 26 Junho 2009<br />

Cinema<br />

O planeta<br />

vermelho<br />

Um dos mais insólitos títulos<br />

clássicos da cinematografia<br />

soviética dos anos 20. Serve<strong>se</strong><br />

da ficção científica para<br />

fazer um contraponto ao<br />

quotidiano moscovita e<br />

revolucionário da época.<br />

Luís Miguel Oliveira<br />

Aelita<br />

De Yakov Protazanov<br />

Divisa Filmes<br />

mmmmm<br />

Extras<br />

mmmnn<br />

“Aelita”, estreado<br />

em 1924, é<br />

certamente um<br />

dos mais insólitos<br />

<strong>de</strong> entre os títulos<br />

clássicos da<br />

cinematografia<br />

soviética dos anos<br />

20 (que são<br />

também, pelo<br />

menos os mais sonantes, qua<strong>se</strong> todos<br />

posteriores a <strong>ele</strong>). Serve-<strong>se</strong> da ficção<br />

científica - e <strong>de</strong> um planeta Marte<br />

digno <strong>de</strong> qualquer “space op<strong>era</strong>” -<br />

para fazer um contraponto ao<br />

quotidiano moscovita da época, e<br />

esta mistura <strong>de</strong> um realismo<br />

Um planeta Marte on<strong>de</strong> a revolução <strong>se</strong> rev<strong>ela</strong>, afi nal, impossível<br />

reconhecível com a mais pura<br />

fantasia foi algo <strong>de</strong> completamente<br />

inesp<strong>era</strong>do para os <strong>se</strong>us<br />

contem<strong>por</strong>âneos. Mas também diz<br />

alguma coisa sobre o “estado da<br />

Revolução”, que <strong>por</strong> esta altura vivia<br />

o tempo da “Nova Política<br />

Económica”. E o que diz diz com<br />

ambiguida<strong>de</strong>, ambiguida<strong>de</strong> suficiente<br />

para que o <strong>se</strong>u “<strong>se</strong>ntido” <strong>se</strong>ja ainda<br />

hoje discutido com intensida<strong>de</strong>, e<br />

para que, alguns anos mais tar<strong>de</strong> (já<br />

com Estaline), <strong>se</strong> tenha achado <strong>por</strong><br />

bem guardar o filme na prat<strong>ele</strong>ira.<br />

Esta história <strong>de</strong> dois <strong>de</strong>scontentes<br />

moscovitas (um engenheiro<br />

aborrecido com as dificulda<strong>de</strong>s da<br />

vida quotidiana e um<br />

“revolucionário” agastado com os<br />

impas<strong>se</strong>s e as imperfeições da<br />

Revolução) que <strong>se</strong> metem num<br />

foguetão com <strong>de</strong>stino a Marte para<br />

ajudar a libertar o planeta da tirania<br />

e, com proprieda<strong>de</strong> <strong>se</strong> po<strong>de</strong> dizê-lo,<br />

universalizar a Revolução (sonham<br />

com a “União das Repúblicas<br />

Socialistas <strong>de</strong> Marte”, como <strong>se</strong> lê<br />

num intertítulo), ba<strong>se</strong>ia-<strong>se</strong> numa<br />

nov<strong>ela</strong> <strong>de</strong> Alexey Tolstoi e foi uma<br />

gran<strong>de</strong> aposta dos estúdios<br />

Mezrabpom (o centro <strong>de</strong> produção<br />

cinematográfica <strong>de</strong> Moscovo),<br />

inclusive com direito a uma<br />

campanha promocional<br />

sofisticadíssima, como nos explica o<br />

mais significativo “extra” <strong>de</strong>sta<br />

edição. Marcou o regresso à URSS <strong>de</strong><br />

Yakov Protazanov (1881-1945), que<br />

fora um dos principais cineastas<br />

russos do período prérevolucionário<br />

mas nos anos a <strong>se</strong>guir<br />

a 1917 tinha preferido manter-<strong>se</strong><br />

distante, trabalhando em França e<br />

na Alemanha. Outros contributos <strong>de</strong><br />

peso <strong>era</strong>m os do argumentista Fedor<br />

Ozep (futuro cineasta e futuro<br />

exilado) e, no papel da marciana<br />

Rainha Aelita, e praticamente<br />

<strong>de</strong>scoberta <strong>por</strong> este filme, Yulia<br />

Solnt<strong>se</strong>va, que viria a <strong>se</strong>r mulher e<br />

colaboradora <strong>de</strong> Aleksandr<br />

Dovjenko. Para os cenários e guardaroupa<br />

<strong>de</strong> Marte, em verda<strong>de</strong>iro “potpourri”<br />

das mais im<strong>por</strong>tantes<br />

correntes estéticas da época, foi<br />

chamada a pintora Aleksandra<br />

Ekster. Os <strong>se</strong>us cenários, que terão<br />

dado alguma coisa a Fritz Lang para<br />

“Metropolis”, são ainda hoje<br />

espantosos. E mais ainda <strong>por</strong>que,<br />

como peça <strong>de</strong> arte “integrada”, o<br />

es<strong>se</strong>ncial <strong>de</strong> “Aelita” <strong>se</strong> joga na<br />

permanente oscilação entre o<br />

espaço moscovita (realística e qua<strong>se</strong><br />

naturalisticamente filmado) e os<br />

“décors” marcianos, que impõem<br />

um estilo <strong>de</strong> “mi<strong>se</strong>-en-scène”<br />

totalmente distinto, muito mais<br />

artificioso e, sobretudo, or<strong>de</strong>nado<br />

(ou não fos<strong>se</strong> o <strong>de</strong><strong>se</strong>nho <strong>de</strong> um<br />

regime totalitário, cuja coreografia<br />

da estratificação social parece, aliás,<br />

outra influência para “Metropolis”).<br />

Este planeta Marte on<strong>de</strong> a<br />

revolução <strong>se</strong> rev<strong>ela</strong>, afinal,<br />

impossível, é uma utopia, com<br />

certeza. Mas é uma utopia <strong>de</strong>stinada<br />

a valorizar, p<strong>ela</strong> comparação, o que<br />

<strong>se</strong> passa em Moscovo, ou uma<br />

metáfora para es<strong>se</strong>s primeiros anos<br />

da Revolução? O extra mais<br />

significativo, um <strong>de</strong>poimento do<br />

historiador russo Pavel Shepotnik,<br />

fornece todo o contexto e todas as<br />

pistas para que o espectador possa<br />

ver “Aelita” ligando-o aos meandros<br />

do <strong>se</strong>u momento histórico. O outro<br />

extra interessante é uma pequena<br />

montagem <strong>de</strong> estudos e <strong>de</strong><strong>se</strong>nhos<br />

feitos <strong>por</strong> Ekster para o filme.<br />

Que viva<br />

México<br />

Três Buñuel do período<br />

mexicano, mais o <strong>se</strong>u<br />

regresso a Espanha,<br />

mereciam melhor sorte que<br />

uma edição básica.<br />

Jorge Mourinha<br />

Caixa Luís Buñuel<br />

Monroe Stahr/Atalanta Filmes,<br />

exclusivo Fnac<br />

mmmmn<br />

Caixa<br />

mmnnn<br />

Internet<br />

Sem Extras<br />

O mestre<br />

espanhol Luís<br />

Buñuel (1900-<br />

1983), gran<strong>de</strong><br />

provocador<br />

surrealista que <strong>se</strong><br />

<strong>de</strong>liciava em<br />

trocar as voltas<br />

aos ob<strong>se</strong>rvadores,<br />

quer fos<strong>se</strong>m críticos ou<br />

espectadores, não está tão<br />

repre<strong>se</strong>ntado nas edições nacionais<br />

em DVD que <strong>se</strong> <strong>de</strong>va torcer o nariz<br />

quando surgem, <strong>de</strong> uma só<br />

as<strong>se</strong>ntada, quatro filmes <strong>se</strong>us. Uma<br />

vez avaliada esta caixa <strong>de</strong> quatro<br />

discos reunindo três títulos do<br />

período mexicano rodados entre<br />

1950 e 1954 à única longa-metragem<br />

que dirigiu na sua Espanha natal, no<br />

entanto, é inevitável torcer o nariz -<br />

e o que <strong>de</strong> outra maneira <strong>se</strong>ria digno<br />

<strong>de</strong> uma pontuação maior (ou mesmo<br />

máxima) cai nas três estr<strong>ela</strong>s <strong>por</strong><br />

questões práticas. Para quem<br />

reconhece o nome <strong>de</strong> Buñuel pelos<br />

clássicos que dirigiu na recta final da<br />

sua carreira (“B<strong>ela</strong> <strong>de</strong> Dia”, “O<br />

Charme Discreto da Burguesia”,<br />

“Es<strong>se</strong> Obscuro Objecto <strong>de</strong> De<strong>se</strong>jo”) e<br />

passou “ao lado” da maior parte da<br />

sua obra (que, é certo, ficou<br />

parcialmente inédita entre nós até<br />

ao 25 <strong>de</strong> Abril), a <strong>se</strong>nsação é que esta<br />

é uma edição <strong>de</strong> “<strong>se</strong>gunda escolha” -<br />

coisa que os quatro filmes <strong>se</strong><br />

encarregam <strong>de</strong> negar, embora a<br />

ausência total <strong>de</strong> contextualização,<br />

informação ou extras não aju<strong>de</strong> em<br />

nada.<br />

Contextualizemos, então. “Los<br />

Olvidados” (1950, o único <strong>de</strong>stes<br />

quatro filmes a não ter tido<br />

distribuição comercial entre nós) e<br />

“Viridiana” (1961, estreado apenas<br />

<strong>de</strong>pois do 25 <strong>de</strong> Abril) são as<br />

“balizas” do reconhecimento público<br />

e crítico <strong>de</strong>finitivo <strong>de</strong> Buñuel e<br />

também da controvérsia que o<br />

Estamos online. Entre em<br />

www.ipsilon.pt. É o mesmo<br />

suplemento, é outro <strong>de</strong>safi o.<br />

Venha construir este site<br />

connosco.<br />

ro<strong>de</strong>ou. “Los Olvidados”, rodado na<br />

Cida<strong>de</strong> do México com actores em<br />

gran<strong>de</strong> parte não profissionais e<br />

inspirado pelo quotidiano dos<br />

mendigos e dos meninos <strong>de</strong> rua<br />

<strong>de</strong>ixados à sua sorte, ganhou o<br />

prémio <strong>de</strong> realização em Cannes<br />

1951, foi integrado no movimento<br />

neo-realista da época e aclamado<br />

p<strong>ela</strong> crítica como uma obra-prima, e<br />

iniciou o processo <strong>de</strong> re<strong>de</strong>scoberta<br />

internacional do realizador. De uma<br />

mo<strong>de</strong>rnida<strong>de</strong> extraordinária no<br />

modo como recusa terminantemente<br />

edulcorar a brutalida<strong>de</strong> da vida nas<br />

ruas <strong>se</strong>m <strong>por</strong> isso fugir às regras<br />

clássicas do melodrama, é um filme<br />

apontado <strong>por</strong> muitos como atípico<br />

numa obra <strong>de</strong>dicada à sátira<br />

corrosiva da burguesia. No entanto, o<br />

<strong>se</strong>u olhar <strong>de</strong><strong>se</strong>ncantado e impiedoso<br />

sobre a natureza humana, qualquer<br />

que <strong>se</strong>ja a clas<strong>se</strong> social <strong>de</strong> on<strong>de</strong> vem,<br />

faz a ponte com a irrisão <strong>de</strong>vastadora<br />

<strong>de</strong> “Viridiana”, nascido <strong>de</strong> um<br />

convite do Gen<strong>era</strong>líssimo Franco<br />

para Buñuel, que <strong>se</strong> naturalizara<br />

mexicano, regressar a Espanha para<br />

fazer um filme em absoluta<br />

liberda<strong>de</strong>. O realizador aceitou o<br />

convite e respon<strong>de</strong>u-lhe com uma<br />

visão inflamatória da carida<strong>de</strong> cristã<br />

à volta <strong>de</strong> uma b<strong>ela</strong> noviça que<br />

<strong>de</strong>scobre como os ensinamentos<br />

religiosos caem em saco roto<br />

confrontados com o mundo real. A<br />

estrutura narrativa, que qua<strong>se</strong> <strong>se</strong><br />

diria nascida da conjugação <strong>de</strong> duas<br />

histórias <strong>se</strong>paradas, joga contra, mas<br />

não retira o valor ao que assume o<br />

papel <strong>de</strong> estimulante provocação<br />

anticlerical, <strong>de</strong>nunciada pelo<br />

Vaticano como herege e blasfema (ai<br />

aqu<strong>ela</strong> Última Ceia <strong>de</strong> mendigos...),<br />

que ganhou a Palma <strong>de</strong> Ouro em<br />

Cannes 1961, marcando a entrada <strong>de</strong><br />

Buñuel no panteão dos gran<strong>de</strong>s<br />

realizadores e dando o pontapé <strong>de</strong><br />

saída para a fa<strong>se</strong> mais aclamada e<br />

divulgada da sua carreira.<br />

Entre um e outro foram rodados<br />

os dois outros filmes da caixa:<br />

“Susana” (1951) e “O Monte dos<br />

Vendavais” (1954), respeitantes ao<br />

percurso <strong>de</strong> Buñuel como cineasta<br />

“comercial” <strong>de</strong>ntro da indústria<br />

mexicana, trabalhando <strong>de</strong>ntro da<br />

formatação rígida do melodrama. O<br />

cineasta diria mais tar<strong>de</strong> que foram<br />

estes filmes “alimentares” que<br />

realizou no México que o ensinaram<br />

a filmar, mas a sua marca <strong>de</strong> irrisão<br />

subversiva está visível a cada passo<br />

<strong>de</strong>stes dramalhões <strong>de</strong> faca e alguidar<br />

que cumprem à risca o “ca<strong>de</strong>rno <strong>de</strong><br />

encargos”. “O Monte dos Vendavais”<br />

é uma transposição para o México<br />

rural do romance <strong>de</strong> Emily Brontë<br />

sobre o amor impossível entre uma<br />

aristocrata rural e o órfão que foi<br />

criado como parte da família, que<br />

Buñuel <strong>de</strong><strong>se</strong>java adaptar <strong>de</strong>s<strong>de</strong> os<br />

<strong>se</strong>us tempos surrealistas e que<br />

transforma num melodrama<br />

wagneriano e claustrofóbico sobre o<br />

ódio <strong>de</strong> clas<strong>se</strong>s, qua<strong>se</strong> abstracto no<br />

modo como <strong>se</strong> concentra no<br />

pre<strong>se</strong>nte <strong>de</strong>stas r<strong>ela</strong>ções malsãs,<br />

coloridas <strong>por</strong> um passado que fica<br />

<strong>se</strong>mpre pouco explícito. Mas o<br />

glorioso “Susana”, história <strong>de</strong> uma<br />

fugitiva <strong>de</strong> um reformatório que é<br />

recolhida <strong>por</strong> uma família rural e


¬Mau ☆Medíocre ☆☆Razoável ☆☆☆Bom ☆☆☆☆Muito Bom ☆☆☆☆☆Exc<strong>ele</strong>nte<br />

Quatro discos reunindo três títulos do período mexicano<br />

rodados entre 1950 e 1954 e a longa que dirigiu<br />

na sua Espanha natal<br />

“Los Olvidados”<br />

introduz a tentação no <strong>se</strong>u <strong>se</strong>io, levalhe<br />

a palma: é uma grandiosa<br />

“woman’s picture” que os cineastas<br />

americanos da altura não teriam<br />

<strong>de</strong>s<strong>de</strong>nhado assinar, sobre uma<br />

mulher que <strong>se</strong> entrega <strong>de</strong> alma e<br />

coração ao <strong>se</strong>u <strong>de</strong>stino <strong>de</strong> víbora,<br />

partilhando com “O Monte dos<br />

Vendavais” um olhar <strong>de</strong> admiração<br />

p<strong>era</strong>nte a força das mulheres e a<br />

fraqueza dos homens, subvertendo a<br />

moral e os bons costumes cristãos<br />

logo com a cena inicial em<br />

que Susana diz “as cobras<br />

também são criaturas <strong>de</strong><br />

Deus”.<br />

A edição surge atribuída a<br />

um editor francês que<br />

<strong>de</strong>sconhecíamos, Monroe<br />

Stahr (o produtor <strong>de</strong> Hollywood<br />

criado <strong>por</strong> F. Scott Fitzg<strong>era</strong>ld no <strong>se</strong>u<br />

romance inacabado, “O Último<br />

Magnata”, que Robert <strong>de</strong> Niro<br />

interpretou na adaptação ao cinema<br />

AFP/DSK<br />

<strong>de</strong> Elia Kazan), mas,<br />

estranhamente, os DVDs<br />

individuais surgem com<br />

a chanc<strong>ela</strong> da Atalanta<br />

Filmes. As<br />

transcrições<br />

respeitam os formatos<br />

<strong>de</strong> origem, mas foram<br />

feitas a partir <strong>de</strong> cópias <strong>de</strong><br />

35mm claramente não<br />

restauradas e com alguma<br />

usura. O arranjo gráfico<br />

pobrezinho (apesar <strong>de</strong>, nos<br />

interiores, a reprodução<br />

dos cartazes <strong>de</strong> época <strong>se</strong>r<br />

um toque simpático) não<br />

fornece a mínima informação<br />

para lá das sinop<strong>se</strong>s dos<br />

quatro filmes, as legendagens<br />

são adaptadas, em três dos<br />

quatro filmes, <strong>de</strong> traduções<br />

brasileiras, e o único extra em<br />

toda a caixa é o final “feliz”<br />

alternativo <strong>de</strong> “Los Olvidados” -<br />

não <strong>de</strong>vemos <strong>de</strong>itar fora a<br />

o<strong>por</strong>tunida<strong>de</strong> <strong>de</strong> po<strong>de</strong>r <strong>de</strong>scobrir<br />

estes filmes, mas é difícil<br />

recomendar uma edição básica que<br />

<strong>se</strong>ria aceitável enquanto série<br />

económica mas que está a <strong>se</strong>r<br />

vendida a 55 euros.<br />

OFERTA DE UM 1 BILHETE SIMPLES<br />

aos primeiros 10 leitores que <strong>se</strong><br />

apre<strong>se</strong>ntem hoje com este ípsilon, na<br />

Loja do Público - Rua Viriato, 13 - Lisboa.<br />

Ípsilon • Sexta-feira 26 Junho 2009 • 47

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