Aleijadinho - Academia Brasileira de Letras
Aleijadinho - Academia Brasileira de Letras
Aleijadinho - Academia Brasileira de Letras
Create successful ePaper yourself
Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.
que lascava no eido.<br />
– O boi, então,<br />
só faltava comer na nossa mesa.<br />
– Ao borralho, as castanhas tu assavas...<br />
– O vento, o lume ou um madrugar no ventre<br />
fez-me indagar (a tua mão suspensa<br />
sobre o vaso <strong>de</strong> água-pé), o riso em mágoa:<br />
“E os miúdos, se vêm?”<br />
– E, assim, largamo-nos<br />
para o Porto, rumo ao mar. Velas, o medo,<br />
o enjôo e o galope vagaroso<br />
<strong>de</strong> um céu que clareava.<br />
– “Não temas, ó Maria”<br />
(ou por Ana me chamavam?),<br />
disseste, “não te ponhas pequenina”.<br />
– Não te falei na morte. Só pensava<br />
na tigela do caldo, on<strong>de</strong> boiavam<br />
a couve,<br />
o calor<br />
e a batata.<br />
– Neste país sem orvalho, os nossos pés<br />
rasgamos ainda mais no solo quente.<br />
– Passamos fome.<br />
– Roubamos<br />
gado e terras.<br />
– Crucificamos<br />
escravos,<br />
e por isso nos lembram.<br />
120<br />
Alberto da Costa e Silva