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PREÇORECORDE_A tela OMágico,de<br />
Beatriz Milhazes,vendidaemumleilão<br />
por US$1,049 milhão.Foi omaior valor<br />
alcançadopor um artistabrasileirovivo<br />
QUAL OVALOR DA<br />
ARTE?<br />
136 época negócios março 2 010
OmeRcADO bRAsiLeiRODeARtecOntempORâneA nUncAesteVetãO AQUeciDO.<br />
OQUe DeteRminA AsAtUAis cifRAs AstROnômicAs DAs ObRAs, nO entAntO,<br />
nãOéApenAs sUAQUALiDADeintRínsecA. OtALentO eAORiginALiDADeDOs<br />
ARtistAs cOntAm, sim, mAs AReceitA De sUcessO incLUi AinDA pROmOçãO,<br />
mARketing ebOns ReLAciOnAmentOs pOR iVAn pADiLLA fOtOs RObeRtO WAgneR<br />
foto_reprodução; edição de imagem_artnet<br />
março 2 010 é poca negócios 137
eAtRizmiLhAzes éUmA cARiOcADecAbeLOs ReVOLtOs,VOz<br />
nasalada,meiotímida.Atualmente,éamaiorexpoentedaartecontemporâneabrasileira.SuatelaOMágico,pintadaem2001,foivendidaaumcolecionadorespanhol<br />
porUS$15 mil.Em2008,foicolocadanovamente àvenda<br />
numleilãodacasaSotheby’s de Nova York.Olance inicial eradeUS$ 350<br />
mil.Comsorte,poderiachegaraUS$700mil.Nofinal,acabouarrematada<br />
porUS$1,049milhão–umavalorizaçãode<strong>mais</strong>de6mil%emseteanos.Foi<br />
omaior montante já alcançadopor umaobradeumartistabrasileiro vivo.<br />
Acifra surpreende mas nãoé,nem de longe,umcaso isolado.O<br />
mercadobrasileirodeartecontemporâneaviveumaefervescênciasemprecedentes,com<br />
forteprojeçãointernacional.Emnovembro passado,aobra<br />
construtivista Relief,deSergio Camargo, falecido em 1990,foi vendidapor<br />
US$1,594milhões,tambémnaSotheby’s.Pinturas,esculturas,fotografiase<br />
instalaçõescomassinaturanacionalsãodestaquenosprincipaisleilõesefeirasdearteeganhamexposiçõesindividuaisnos<strong>mais</strong>importantesmuseus<br />
do mundo.Obrasde ErnestoNeto,VikMunizeAdrianaVarejãoalcançam<br />
atéUS$ 400mil.Nomes como CildoMeireles, Tunga, WaltercioCaldas,<br />
JoséResendeeRivaneNeuenschwandertambémdispensamapresentação.<br />
NotopodalistaestáBeatrizMilhazes,49anos.Deseuateliê,formado<br />
porduascasasnumaruaarborizadanoHorto,noRiodeJaneiro,elatentaexplicar,semfalsamodéstia,seusucesso:“Eutrouxeumanovidadenaáreada<br />
pintura”.Milhazesafirmaqueaartebrasileirasemprefoiconsistente,massó<br />
nosúltimosanosganhoudestaque,nopaísenoexterior,devidoaumaconjunçãodeeuforiadomercadofinanceiro,globalizaçãoebuscadeidentidadeprópria.“Nessemundosemfronteiras,asobrasprecisamterumsotaqueregional.Aoriginalidade,naartecontemporânea,valetantoquantoaqualidade.”<br />
Ninguémduvidadaoriginalidade edaqualidade de BeatrizMilhazes,donadeuma<br />
técnica apurada, reconhecidaaté porquemachasuas<br />
obrasrepetitivas.Seusdesenhoscoloridos,repletosdeformas geométricas,<br />
flores earabescos,com repertório queremeteaocarnavalemodernismo,são<br />
pintados em pedaçosdeplástico edepoisreunidosnatela, como<br />
numdecalque. Alguns trabalhos levamaté um anoparaser finalizados.<br />
Masseráqueaexplosãodaartecontemporânea,produzidaapartirdos<br />
anos 50,temexplicaçãoapenasnaqualidadeintrínsecadasobras?Certamentenão.Osaltospreçossedevemtambémaumjogodemarketing,divulgaçãoediferentesinteresses.Oscríticosecuradoresfiltramainformaçãoeinfluenciamopúblico.Osartistasaprendemdesdecedoprincípiosdaautopromoção.<br />
BEATRIZ MILHAZES_o nome<br />
<strong>mais</strong> badalado do momento naarte<br />
contemporânea brasileira não rece-<br />
beu um centavo pela venda recorde<br />
da tela OMágico, mas ganhou noto-<br />
riedade. nas casas internacionais de<br />
leilão, suas obras deixaramacategoria<br />
latin american epassaram para con-<br />
temporary. agora, Beatriz Milhazes<br />
disputaomesmo mercado de estrelas<br />
como damien Hirst. Sua produção é<br />
pequena, desete adez telas por ano.<br />
Foi uma orientação de Marcantônio<br />
Vilaça, omítico marchand brasileiro<br />
que aapadrinhou no início de carrei-<br />
ra. apouca oferta aumenta aprocura<br />
por suas obras.afila de compradores<br />
àespera deumquadro conta-se às<br />
centenas. Beatriz Milhazes fará este<br />
ano três exposições individuais inter-<br />
nacionais. na foto ao lado,ela aparece<br />
em frenteauma obraainda em produ-<br />
ção, em seu ateliê norio de Janeiro.<br />
Omercado de<br />
arte acompanhaa<br />
economia.Entre as<br />
décadasde50e70,<br />
oBrasilcresceu,<br />
assimcomosua<br />
produção artística.<br />
Nosanos80e<br />
90,aeconomia<br />
patinou, eótimos<br />
artistas só agora<br />
despontam<br />
138 época negócios março 2 010 foto_roBerto wagner<br />
>
ANOVA GERAÇÃO_Marcelo Ci-<br />
dade eMarinarheingantz(no ateliê de<br />
um amigo, na imagem ao lado) fazem<br />
partedeuma nova geraçãoque,desde<br />
ofimdagraduação, consegue se sus-<br />
tentar com arte.Marinachamouaaten-<br />
ção damídia ao montar omovimento<br />
coletivo 2000 e8ehoje faz parte da<br />
Fortes Vilaça,a<strong>mais</strong>internacionalizada<br />
das galerias brasileiras. Cidade foialu-<br />
no na faculdade do fotógrafo eduardo<br />
Brandão,que abriu, comelianaFinkels-<br />
tein, agaleria Vermelho, em2002.<br />
Comaproximidade proporcionada pe-<br />
las aulas,entrouparaagaleria. no ano<br />
em que se formou,vendeusua primeira<br />
obradeporte:18pinturas, distribuídas<br />
por 18 metros,paraacolecionadoraIsa-<br />
bellaprata.aobracustour$5mil.este<br />
ano, fará três exposições individuaise<br />
participará da Bienal de Carrara,naItá-<br />
lia.em2009, foiapontado pela revista<br />
Beaux Arts como um dos dez artistas<br />
jovens <strong>mais</strong> promissores do mundo.<br />
ERNESTO NETO_“a geração 80<br />
foi boa para muita gente, mas muitos<br />
se perderam pelo caminho”, diz ofa-<br />
lastrão ernestoneto, 45 anos, fazendo<br />
pose na praia do Leme, no rio de Ja-<br />
neiro. neto integrou uma célebremos-<br />
tracoletiva,emjulhode1984. “a luzé<br />
importante, mas tembrilhorápido.al-<br />
guns aproveitaram aoportunidade. o<br />
mercado gera recursos, eisso ébom.<br />
todo mundo pensa em dinheiro, éo<br />
nosso azeite social, mas não deve in-<br />
terferir na criação.”netoéumdos <strong>mais</strong><br />
bem-sucedidos artistas brasileiros.<br />
Suaproduçãoestá entre aescultura e<br />
ainstalação, comobras de lycraealgo-<br />
dão, emformas orgânicas que geram<br />
associações comocorpo.omarco em<br />
sua carreira foi aexposição naBienal<br />
de Veneza, a<strong>mais</strong>tradicional do mun-<br />
do, em2001. ainstalação interativa<br />
Navedenga,desua autoria, ocupa des-<br />
de janeiro uma sala inteira doMoMa.<br />
fotos_roBerto wagner<br />
><br />
Asgaleriasde arte,ascasasde leilão eoscolecionadorespromovem<br />
os criadoresefazem opreço flutuarusandocritérios nemsempremuito<br />
transparentes. Para muitos investidores,quadros eesculturastornaramse<br />
um ativofinanceiro – embora commuito <strong>mais</strong> valor estético eafetivo.<br />
Todasessasarticulaçõesnão teriam resultadoseoatual cenário<br />
econômiconão fossedos <strong>mais</strong> favoráveis.“Afórmula ésimples: quando<br />
aeconomiavai bem, omercado de arte vaibem”, afirma ocolecionador<br />
PedroBarbosa, ex-chefe de mercados emergentes do INGBank,hojeinvestidor<br />
independente. “Entreosanos50e70, oBrasilcresceu eaarte<br />
bombou.Nos anos 80 e90, quando aeconomiapatinou,surgiramexcelentes<br />
artistas,mas quesónesta década encontraramespaçonomercado.”<br />
Defato,algunsdosbrasileiros<strong>mais</strong>consagradoshoje,comoBeatriz<br />
Milhazes,ErnestoNeto,Leonilson,LedaCatundaeLuizZerbini,despontaramemjulhode1984,naexposiçãoComoVaiVocê,Geração80?,<br />
realizada<br />
na Escola de Artes do Parque Lage,noRio de Janeiro. Amostrarealizada<br />
por123 criadoresdetodoopaís, em plenaeuforia da redemocratização,<br />
contou comgrandevisitação emuito destaque na mídia. Porazar, também<br />
foramanosdeinflaçãogalopante erecessão. Aeconomia – econsequentementeomercado<br />
de arte –sóganharia estabilidade no finaldos anos 90.<br />
março 2 010 é poca negócios 141
Arelaçãoentreeconomiaforteearteéuniversal.Nãoporoutromotivo,<br />
aartechinesaéaque<strong>mais</strong>temsevalorizadonosúltimosanos.ParaPedroBarbosa,donodeumacervode200obras,ademandahojenomercadobrasileiro<br />
émaiordoqueaoferta.“Vousemprenasgalerias,massóencontroporcaria.<br />
Osartistasnãoestãodandocontadaprodução.Tenhoobrasquetriplicaram<br />
depreço”,afirmaBarbosa.Arecentecrisefinanceiraabaloutemporariamenteomercadodeartecomoumtodo–<strong>mais</strong>umfatorquefavoreceosprodutoresnacionais,<br />
quetêmpreçosumpouco <strong>mais</strong> acessíveis do que asestrelas<br />
defora.Osnúmeros,noentanto,jáapontamparaumaboarecuperação.As<br />
vendasdeartecontemporâneadaChristie’sedaSotheby’s,asduasprincipais<br />
casasdeleilãodomundo,alcançaramUS$80milhõessomenteemfevereiro<br />
desteano,umcrescimento de 255% emrelaçãoaomesmo períodode2009.<br />
Boapartedoscompradoresbrasileirosdeartevemdomercadofinanceiro.Issoaconteceporduasrazões.Aprimeira,<strong>mais</strong>evidente,éoaltopoderaquisitivodessepúblico.Asegundaestáligadaaumalógicadeoperaçãosemelhanteàqueosinvestidoresestãoacostumadosemseudiaadianosbancos.<br />
Antesdecomprar,elesprecisampesquisarmuito.Quantomaiororisco,maior<br />
olucro.Algunsapostamemnovostalentos.Seojovemartistanãoemplaca,<br />
oprejuízoépequeno.Comprarobrasdosmedalhõeséconsiderado<strong>mais</strong>seguro,masnessecasoéprecisoumcapitalmaiorenãoterpressaparavender.<br />
Todososcolecionadores repetemomesmo mantra:épreciso<br />
comprarpor gosto, enão de olho no retornofinanceiro.Mas édifícil pensarapenas<br />
em arte quando um quadro podevaler muito <strong>mais</strong> do que<br />
um apartamento. “Algumas pessoas têmpor hobby comprarlanchas,<br />
helicópteros ecarros”,afirmaocolecionador José OlympioPereira,diretor<br />
de investment bankingdoCreditSuisse. “Quanto vaivaler um<br />
carro, umalanchaouumhelicóptero dentro de um ou doisanos? Certamentemenos<br />
do quehoje. Já aboa arte só valorizacom otempo”, afirma.<br />
Olympiocircula porSão Pauloemuma BMWusada,com 8anos<br />
de idade. Nãotem lancha nemhelicóptero.Prefere comprarquadros eestá<br />
felizcomoinvestimento.Segundopessoaspróximas,seuacervo contacom<br />
cercademilobras.Acoleçãoestádivididaentrearesidência,acasadepraia<br />
eumapartamentode300metrosquadradosnocentrodeSãoPaulo.Oimóvelpertenceu<br />
ao mítico MarcantônioVilaça, omarchandque promoveu<br />
BeatrizMilhazes,Vik MunizeErnesto Neto nosanos90. Oapartamento<br />
foireformado após amorte de Vilaça, em 2000,eescolhido pelo respeito<br />
queonomedoantigodonoinspira.Lá, Olympiosereúne comcuradores<br />
ediretores de museus do mundointeiro em visita pelo Brasil.Sua coleção<br />
inclui modernistas, de José PancettiaAlfredo Volpi, maséfocadaemcontemporâneos,comoAntonio<br />
Dias,MiraSchendeleAmilcardeCastro.<br />
NoBrasil,ascoleçõesprivadasacabaramsuprindoumalacunados<br />
museus,emsua maioria carentes de acervo próprio. As peçasdeGilberto<br />
Chateaubriandestão no MAM do RiodeJaneiro.Eduardo Brandão, dono<br />
da GaleriaVermelho, cedeuquadros em comodato ao MAMde SãoPaulo.<br />
OempresárioBernardoPaz montou oInstituto Inhotim, nosarredores de<br />
BeloHorizonte,paraabrigarsuasesculturaseinstalações.ObanqueiroAlfredoSetubal,vice-presidente<br />
do Itaú Unibanco,éresponsável pelas aquisiçõesdeartecontemporâneadobanco.Acoleção<br />
começouaser formada<br />
logoapósafundaçãodainstituição,por OlavoSetubal,em1945.“Umaparticularidade<br />
do atualmercado de arte éque osetor privadohojetem muito<br />
<strong>mais</strong>poder”, afirmaFabioCypriano,críticodeartedojornalFolhadeS.Paulo.<br />
CILDO MEIRELES_“a relação<br />
com otrabalho deve ser dedor, não<br />
de cálculo”,afirma ocarioca Cildo Mei-<br />
reles, 61 anos, oartista brasileiro que<br />
<strong>mais</strong>perto se aproxima da unanimidade<br />
em termosderelevância.Meireleséum<br />
seguidordaarteconceitual,inaugura-<br />
da há um século por Marcel duchamp.<br />
nessa vertente, objetosdocotidiano se<br />
transformam em arte política.por sua<br />
própria natureza, espalhafatosaecon-<br />
testadora, trata-se de um estilofadado<br />
àautopromoção. Meireles senotabili-<br />
zounadécadade70aoescreverYanke-<br />
es, go Home em garrafas de Coca-Cola<br />
eestampar apergunta Quem Matou<br />
Herzog?, emreferência ao jornalista<br />
Vladimir Herzog, morto pela ditadura,<br />
em notas de1cruzeiro. recentemen-<br />
te, foi homenageado com uma retros-<br />
pectiva da carreira no new Museum<br />
de nova York eteve um documentário<br />
sobresua vida exibido na tate Modern<br />
de Londres. oMuseu da Chácara do<br />
Céu, em Santa teresa, onde Meireles<br />
posouparaafoto, abriga desde feverei-<br />
ro uma retrospectiva de suas gravuras.<br />
Acadaano são<br />
realizados no<br />
Brasil cercade<br />
dezgrandes leilões,<br />
quemovimentam<br />
R$ 40 milhões.<br />
Masnem sempre<br />
todososquadros<br />
emplacam.Alguns<br />
dependem de um<br />
empurrãozinho<br />
dosleiloeiros<br />
142 época negócios março 2 010 foto_roBerto wagner<br />
>
144 época negócios março 2 010
ALFREDO SETUBAL_oacervo<br />
do Itaú conta atualmente com cerca<br />
de 4mil peças, desde aera pré-co-<br />
lombiana.“todas em uso, distribuídas<br />
pelas paredesdas agênciasesedes de<br />
todo oBrasil”, afirma alfredo Setubal,<br />
vice-presidente eresponsável pelas<br />
aquisições de arte contemporânea<br />
do banco. as obras são também exi-<br />
bidas em exposições periódicas eaté<br />
emprestadas para mostrasemoutras<br />
instituições. Já acoleção própria de<br />
alfredo Setubal conta com cerca de<br />
milpeças.“Masaíprevalecemeu gos-<br />
to”, diz. de cada grande artista –como<br />
BeatrizMilhazes, tunga, waltercioCal-<br />
das, Lygia Clark –Setubal tem cinco<br />
ou seis obras. Sua favorita éadriana<br />
Varejão, autora da obra OChinês,que<br />
se vê ao fundo, na foto ao lado.emum<br />
leilão, uma pintura que tenha passa-<br />
do pelo acervo de um colecionador<br />
de renome pode ganhar um acrésci-<br />
mo de 5% a10% sobreseu valor final.<br />
JOSÉ OLYMPIO PEREIRA_al-<br />
guns colecionadores sãoconselheiros<br />
de museusimportantes eajudamain-<br />
dicar suas aquisições. ÉocasodeJosé<br />
olympio pereira, que tem assento no<br />
MoMa de nova York. nesses casos,<br />
podeacontecer um conflitodeinteres-<br />
ses. Quando um museudeporte com-<br />
prauma determinadaobra, oautor se<br />
valoriza. Se oconselheiroque indicoua<br />
aquisiçãotem outrasobras comames-<br />
ma assinatura, também saiganhando.<br />
olympio costuma emprestar suas te-<br />
las ainstituições. Quando oautor éum<br />
iniciante, gosta de se identificarcomo<br />
proprietário.ele sabe que comoécon-<br />
siderado um colecionador de renome,<br />
transfere prestígio ao artista. para a<br />
imagem desta reportagem, olympio<br />
fez questão deposar em frente àins-<br />
talação Facas, deCarmela gross. “É<br />
uma artista fabulosa, que não tem o<br />
reconhecimento que merece”,afirma.<br />
fotos_roBerto wagner<br />
><br />
Atéchegaràparededacasadeumcolecionador de renome, um artistaprecisa<br />
serbem trabalhadopor umaboa galeria. Márcia Fortes,uma<br />
mulher elegante,com fortesotaque carioca, éhojeagalerista <strong>mais</strong> bemsucedida<br />
do Brasil.Ela foirepresentante em Nova York de Marcantônio<br />
Vilaça. Quando omarchandmorreu, assumiusua galeria.Noportfólio<br />
da Fortes Vilaça estãomedalhõescomoBeatriz Milhazes,Ernesto Neto,<br />
AdrianaVarejão,VikMunizeNunoRamos.Márciaconta,emquatropassos,<br />
como ogalerista podeser determinante para osucesso de um artista:<br />
1_Orientando suaprodução, dandopalpitesaté nostemas de um quadro.<br />
2_Fazendouma seleçãoentre seus artistas para levá-los às feiras internacionais.<br />
Se agaleria conseguir vender as obrasexpostas, melhor ainda.<br />
3_Cavandomatériasemrevistasejornais,imprimindo catálogoseconvencendoumaeditora,comoaCosacNaify,<br />
apublicarmonografiasdeartistas.<br />
4_Emplacando obrasdoartista nas coleções permanentesdos museus,o<br />
quegeramuita exposição eaumenta suacotação.Paraisso, épreciso participardejantarescom<br />
curadoresealimentaronetwork duranteasfeiras.
AS GALERISTAS_Mais do que<br />
um espaço físico, asgalerias funcio-<br />
nam como agência de promoção do<br />
artista. pelo trabalho, ficam com me-<br />
tade do valor das obras vendidas. o<br />
trio formado por Luisa Strina, eliana<br />
FinkelsteineMárcia Fortes (nafotoao<br />
lado, daesquerda para adireita) res-<br />
ponde por boa parte dos medalhões<br />
brasileiros. Cada casa tem seu estilo.<br />
agaleriaVermelho,deelianaFinkels-<br />
tein com osócio eduardo Brandão,<br />
representa umelenco jovem (mas<br />
nem tanto),irreverenteedemuito im-<br />
pacto. Luisa Strina, uma das primei-<br />
ras galeristas brasileiras, prima pela<br />
tradição. aFortes Vilaça, de Márcia<br />
Fortes, possui os “blue chips”, gíria<br />
emprestada do sistema financeiro<br />
que designa, nomercado de arte, os<br />
artistas<strong>mais</strong>quentes, como as ações<br />
de empresas demaior renome. Cada<br />
galeriarepresentade30a40artistas.<br />
as <strong>mais</strong> conceituadas participam<br />
das melhores feiras internacionais<br />
de arte. São elas aart Basel, naSuí-<br />
ça, aart Basel de Miami eaFrieze de<br />
Londres e,emmenor escala, aar-<br />
mory Show denova York eaarco de<br />
Madri. agaleria paga pelo aluguel do<br />
estande até uS$ 100 mil efaz uma<br />
seleção das melhores obras de seis<br />
ou sete artistas. Com sorte, vende<br />
boa parte. assim, além dedivulgar<br />
os autores, ainda amortiza osgastos.<br />
Mas não basta vender. otipo de<br />
cliente faz toda adiferença. Éme-<br />
lhor que aobra váparar em uma ins-<br />
tituição, onde será apreciada pelos<br />
visitantes, do que na coleção deum<br />
anônimo. na última Frieze de Londres,<br />
Márcia Fortes queria vender para um<br />
museu aobra Motim, uma instala-<br />
ção deenormes peças de xadrez em<br />
seis metros de parede, deautoria de<br />
José damasceno. “Fiz reserva para<br />
vários colecionadores enquanto ten-<br />
tava convencer ocurador da Funda-<br />
ção LaCaixa alevar aobra”, afirma.<br />
deu certo. aobra foi comprada pela<br />
instituição espanhola por uS$ 76mil.<br />
><br />
146 época negócios março 2 010<br />
foto_roBerto wagner
março 2 010 é poca negócios 147
Asvendasfeitaspelasgaleriasconstituemomercado primário das<br />
artes. As casasdeleilãomovimentamochamado mercadosecundário.<br />
“Agaleria funcionacomouma concessionária,deondesaemosmodelos<br />
zero-quilômetro.Acasadeleilãoseria arevendedora de carros usados”,<br />
comparaJonesBergamin,oPeninha,presidente dacasade leilõesBolsade<br />
Arte. Peninhaéumhomem franzino edescontraído. Emmédia,realizade<br />
trêsacinco leilõespor ano. Éumdos dois leiloeiros <strong>mais</strong> reconhecidos no<br />
Brasil.OoutroéAloisioCravo,umsenhorbastanteformal.“Oleilãoéosistema<br />
<strong>mais</strong> justodevenda.Aqui,éomercado quem responde ao preço. Não<br />
temoscomosuperestimarvalores enem fabricar artistas”, afirma Cravo.<br />
Nãoébem assim. Umaboa vendaemumleilãovalorizaoartista.Mas<br />
se umaobraencalha, pode-se criarumburburinhoeasfuturas<br />
vendas daqueleautor talvez fiquem comprometidas. Eventualmente<br />
ocorre aprática daschamadasvendasfrias.Funcionaassim:quandoo<br />
leiloeiropercebe queumquadronão terá comprador, simula suavenda<br />
no atodoleilão. Depois,nasurdina,oferece omesmo quadro acolecionadoresque<br />
já haviam entradoemcontato emostradointeresse – porum<br />
valor menor. Asimulação mantém oprestígio da casa de leilõeseassegura<br />
avenda, oprincipal objetivo do leiloeiro. Portabela, favorece oartista.<br />
OS LEILOEIROS_nosleilões bra-<br />
sileiros não se serve <strong>mais</strong> uísque ou<br />
qualquer outra bebidaalcoólica, como<br />
costumava acontecer há alguns anos.<br />
“estamos todos <strong>mais</strong> profissionais”,<br />
afirma aloisio Cravo (à esquerda na<br />
foto). assim como Jones Bergamin,<br />
openinha, Cravo promove os leilões<br />
<strong>mais</strong> disputados deSão paulo. oslei-<br />
loeiros utilizam umjogo psicológico<br />
para alimentar adisputa. as obras são<br />
colocadas àvenda em consignação.<br />
ovalormínimoéacertadocom opro-<br />
prietário. uma tela com lance inicial<br />
de r$ 50 mil, no entanto, éoferecida<br />
por,digamos, r$ 35 mil. aoferta<strong>mais</strong><br />
baixa mexe com acobiça dos colecio-<br />
nadores eacirra aconcorrência. Seo<br />
lancenão chegar aosr$50mil preten-<br />
didos pelo dono,oquadroéretiradodo<br />
leilão.oleiloeiro costuma receber 5%<br />
sobre opreço da venda, mas tem de<br />
arcar com os custos dos eventos, mui-<br />
tosdelesrealizadosemhotéisdeluxo.<br />
AGNALDO FARIAS_Quem orga-<br />
niza exposições individuaisecoletivas<br />
para museusegalerias éocurador.Mas<br />
seupapel émaiordoque isso.“ocura-<br />
dor éumespectador qualificado, que<br />
define orecorte, cria visibilidade eor-<br />
ganiza aleituraparaopúblico”, dizag-<br />
naldo Farias,curador da 29ªBienal de<br />
Sãopaulo (nafoto, dentro da sede,no<br />
parque do Ibirapuera).oque não pode<br />
acontecer,segundo Farias,éconflitode<br />
interesses.“alguns profissionaistraba-<br />
lham ao mesmotempo para uma gale-<br />
riaeummuseu.podeacontecer de esse<br />
curador favorecerumartista da galeria<br />
para aqual presta serviços,por exem-<br />
plo, ao colocar uma obrasua no museu<br />
do qualtambém éfuncionário”, afirma.<br />
paraaprodutora cultural têra Queiroz,<br />
ocurador éuma espécie de “amortece-<br />
dor” entre oartista eagaleria. “o cura-<br />
dorentende asensibilidade do artista e<br />
fala alinguagem do mercado”, diztêra.<br />
148 época negócios março 2 010 fotos_roBerto wagner<br />
<<br />
>
CHARLES COSAC_todo artista<br />
sonhaemter uma monografia publica-<br />
da pela editoraCosac naify,reconheci-<br />
da pelo acabamentofino doslivrosque<br />
publica. aobrapodeser enviadacomo<br />
cartão de visita para um museu ou usa-<br />
da como catálogodeluxo. CharlesCo-<br />
sac, fundador da editora, éumhomem<br />
excêntrico.Moracom seus doispasto-<br />
res-alemães em um apartamento de<br />
1,2mil metros quadradosemSão pau-<br />
lo eusa túnicas que manda fazer sob<br />
medida.Éumcolecionadorderenome.<br />
asededaeditora está repletadequa-<br />
dros, muitos doamigo Siron Franco.<br />
dos cerca de 800 títulos publicados,<br />
260têm aartecomo tema.“Funciona-<br />
mos como uma galeria, promovendo<br />
artistas, mesmo com aproposta de<br />
ter lucro”, afirma Cassiano elek Ma-<br />
chado, diretor editorial. CharlesCosac<br />
só guarda uma frustração: “Fundei a<br />
editora para popularizar aarte, mas<br />
meu públicoéomesmo das galerias”.<br />
Omercado de<br />
arte já superou<br />
acrise financeira.<br />
As vendas das<br />
casasChristie’s<br />
eSotheby’s<br />
alcançaram<br />
US$80milhões<br />
em fevereiro – um<br />
crescimentode<br />
255% em relação<br />
ao anoanterior<br />
foto_roBerto wagner<br />
Nãohádados precisos sobreotamanho do mercadobrasileirode<br />
arte.Asgalerias nãodivulgam vendas nemreceita.Umtermômetrosão<br />
os leilõesdearte. No Brasil,acadaano,são realizadasemtorno de dezvendasdeporte,cadauma<br />
comuma oferta de 150a200 obras. Estima-seque<br />
emcadaleilão searrecadememtorno de R$4milhões.Somenteomercado<br />
secundário, portanto,movimentariaalgocomoR$40milhões. Osistema<br />
de vendas em galerias eleilões ésimilar ao dospaíseseuropeusedos<br />
EstadosUnidos. Oque muda, porenquanto, sãoascifras. No ranking do<br />
anopassado,dos 500 artistas que<strong>mais</strong>tiveram obrasvendidas, elaborado<br />
pela consultoriafrancesaArtPrice, aparecem apenas quatro brasileiros:Vik<br />
Muniz, BeatrizMilhazes,Adriana VarejãoeCildo Meireles.<br />
coletivo de resultados_Masquemestánotoponão temdoque reclamar.NoBrasil,<br />
devemfazer partedopelotão de elitepor volta de 30 artistas,com<br />
reconhecimento internacionalepatrimônioassegurado. Os<br />
jovensaprendemaindanafaculdadeque,paraingressarnesseseletoclube,<br />
nãobasta tertécnica apuradaeideias criativas. Autopromoçãoemarketing<br />
sãorequisitosindispensáveis. Anovageração de artistas éaprimeira<br />
queconsegueviver desdecedodesua obra,sem precisar recorrer abicos<br />
como monitoremexposiçõesoudar aulas em escolinhas para crianças.<br />
Duranteocurso de artesplásticasnaFaap, apaulistanaMarina<br />
Rheingantz,26anos, montou um grupodeoito pintores intitulado 2000<br />
e8.“Poucosalunosseinteressamhojepor pintura, amaioria fazvídeos<br />
einstalações.Achamos queseria umaforma de chamar aatenção para o<br />
nossotrabalho”,afirmaMarina. Ogrupo pediuacuradoria de um pintorderenome,<br />
PauloPasta,econseguiu montar duas exposições, em São<br />
PauloeemFlorianópolis. Jovens,bonitosetalentosos, foramtemadediversas<br />
reportagens.Depoisdisso,todos entraram para grandesgalerias.<br />
Organizarummovimento coletivo temsemostrado, na arte contemporânea,<br />
umaexcelente ferramenta de marketing. Os YoungBritish<br />
Artists,formado porestudantesdoGoldsmithsCollege,emLondres,fizerambarulhoaomontaraclássicaexposição<br />
Freeze, em 1988. Nosanos<br />
seguintes, forampresençaconstante na mídiadecelebridades. Omaior<br />
expoentedessa turmaéDamien Hirst,que,com seus tubarões mergulhados<br />
em formol,tornou-se oartista vivo <strong>mais</strong> bempagodomundo.<br />
Numuniverso paralelo, outros artistas conseguem projeçãonacional<br />
etêmboa avaliação da crítica, exposiçõesemmuseuseobras em<br />
coleções renomadas, mas não chegam de fato ao estrelato. Sergio Fingermann,57anos,<br />
éumpintorbem-conceituado, mas quenão aparece<br />
em colunas sociaisedurante quase duas décadasesteveforadocircuito<br />
dasgalerias.Fingermann acha queamudança de posturaéuma<br />
questãodeidade. “Soudeumtempo em queosartistassepreocupavam<br />
com a transmissão da experiência artística e se formavam em ateliês.<br />
As universidadesatendem auma necessidade de espetáculo”,afirma.<br />
Para Fingermann, adiferença entre asgerações transparece<br />
nas primeiraspalavrasdeuma conversa. “Ovocabuláriomudou,e<br />
isso émuito simbólico. Antes, os artistas perguntavamuns aosoutros:<br />
‘você temtrabalhado?’. Hoje, apergunta quesefaz é: ‘você temproduzido?’.”<br />
Sim, eles têmproduzido.Evez poroutra ainda criamarte.<br />
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março 2 010 é poca negócios 151