Poesias líricas - Biblioteca Virtual Miguel de Cervantes
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Quando eu morrer, não chorem minha morte,<br />
entreguem meu corpo à sepultura;<br />
pobre, sem pompas, sejam-lhe a mortalha<br />
os andrajos que <strong>de</strong>u-me a <strong>de</strong>sventura.<br />
Não mintam ao sepulcro apresentando<br />
um rico funeral d'aspecto nobre:<br />
como agora a zombar me dizem vivo,<br />
digam-me também morto -aí vai um pobre!<br />
De amigos hipócritas não quero<br />
públicas provas <strong>de</strong> afeição fingida;<br />
<strong>de</strong>ixem-me morto só, como <strong>de</strong>ixaram-me<br />
lutar contra a má sorte toda a vida.<br />
Outros prantos não quero, que não sejam<br />
esse pranto <strong>de</strong> fel amargurado<br />
<strong>de</strong> minha companheira <strong>de</strong> infortúnios,<br />
que me adora apesar <strong>de</strong> <strong>de</strong>sgraçado.<br />
O pranto, açucena <strong>de</strong> minh'alma,<br />
do coração sincero, d'alma sã,<br />
<strong>de</strong> um anjo que também sente meus males,<br />
<strong>de</strong> uma virgem que adoro como irmã.<br />
Tenho um jovem amigo, também quero<br />
que junte em minha Essa os prantos seus<br />
aos <strong>de</strong> um pobre ancião que perfilhou-me<br />
quando a filha entregou-me aos pés <strong>de</strong> Deus<br />
dos meus todos eu sei que terei preces,<br />
sauda<strong>de</strong>s, lágrimas também;<br />
que não tenho a lembrança <strong>de</strong> ofendê-los<br />
e sei quanta amiza<strong>de</strong> eles me têm.<br />
E tranqüilo, meu Deus, a vós me entrego,<br />
<strong>Poesias</strong> completas<br />
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