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Julho/Setembro de 2007 - Ano 4 - Nº 8 - Ministério Público do ...

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10<br />

Fábula mo<strong>de</strong>rna<br />

o Lau<strong>do</strong> <strong>do</strong> Veterinário foi suficiente<br />

para ratificar a con<strong>de</strong>nação.<br />

Conclusão: a con<strong>de</strong>nação <strong>do</strong> bom<br />

homem foi mantida com relação às<br />

marcas <strong>do</strong> cavalo, porém ele foi<br />

absolvi<strong>do</strong> por ter marca<strong>do</strong> a mulher.<br />

Não explicaram os Supremos porque a<br />

palavra <strong>do</strong> Veterinário, que jamais foi<br />

ratificada pelo Perito <strong>do</strong> Rei, foi julgada<br />

válida, ao contrário da palavra <strong>do</strong><br />

Médico.<br />

Moral: Se o cavalo o irritar,<br />

bata na mulher!<br />

Essa fábula não é invenção. Os<br />

fatos são verídicos, ocorri<strong>do</strong>s na<br />

Comarca <strong>de</strong> Garibaldi (RS). O recurso<br />

<strong>do</strong> con<strong>de</strong>na<strong>do</strong> foi julga<strong>do</strong> pela Turma<br />

Recursal <strong>do</strong>s Juiza<strong>do</strong>s Criminais <strong>de</strong><br />

Porto Alegre no dia 18 <strong>de</strong> <strong>de</strong>zembro<br />

<strong>de</strong> 2006 (Processo n° 71000911602),<br />

com o resulta<strong>do</strong> acima relata<strong>do</strong>.<br />

Em pleno Século 21, o "direito marital<br />

<strong>de</strong> correção das mulheres" ainda é<br />

largamente reconheci<strong>do</strong>. A consi<strong>de</strong>ra-<br />

ção <strong>de</strong> que a violência <strong>do</strong>méstica é<br />

insignificante e <strong>de</strong> menor potencial<br />

ofensivo, constitui-se em imunida<strong>de</strong><br />

total aos agressores e um incentivo perverso<br />

e covar<strong>de</strong> à violência.<br />

Os animais <strong>de</strong>nomina<strong>do</strong>s irracionais,<br />

porém, têm mais garantias, porque seus<br />

agressores fatalmente são investiga<strong>do</strong>s,<br />

processa<strong>do</strong>s e puni<strong>do</strong>s, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> que<br />

<strong>de</strong>scobertos. As vítimas <strong>de</strong> violência<br />

<strong>do</strong>méstica, geralmente mulheres, crianças,<br />

<strong>de</strong>ficientes e i<strong>do</strong>sos, não têm a<br />

mesma sorte. Mesmo quan<strong>do</strong> <strong>de</strong>nunciam<br />

a agressão, assistem impotentes ao<br />

arquivamento liminar <strong>de</strong> sua indignação.<br />

Com efeito, mais <strong>de</strong> 90% <strong>de</strong> todas as<br />

ocorrências registradas no país são<br />

encerradas rapidamente sob pretexto <strong>de</strong><br />

manutenção da "paz" e "harmonia" no<br />

lar. As vítimas são incentivadas a "<strong>de</strong>sistir<br />

da ação" a to<strong>do</strong> custo. Quan<strong>do</strong> não<br />

<strong>de</strong>sistem, a Justiça, com o beneplácito<br />

<strong>do</strong> <strong>Ministério</strong> <strong>Público</strong>, trata <strong>de</strong> "presumir"<br />

que o melhor é encerrar o caso. É<br />

como se a impunida<strong>de</strong> fosse um "favor"<br />

concedi<strong>do</strong> às vítimas. E a Justiça fica<br />

MPDFT em revista<br />

premiada com a redução drástica <strong>de</strong><br />

processos, po<strong>de</strong>n<strong>do</strong> cuidar <strong>de</strong> assuntos<br />

que consi<strong>de</strong>ra "mais importantes". Tal<br />

situação é realida<strong>de</strong> não só no Rio<br />

Gran<strong>de</strong> <strong>do</strong> Sul, mas em to<strong>do</strong> o país,<br />

inclusive no Distrito Fe<strong>de</strong>ral.<br />

É curioso como a lenta evolução <strong>do</strong><br />

reconhecimento <strong>do</strong>s direitos <strong>do</strong>s animais<br />

(<strong>de</strong>nomina<strong>do</strong>s irracionais) é ainda mais<br />

influente que a <strong>do</strong>s direitos das mulheres.<br />

A Lei nº 11.340/06, <strong>de</strong>nominada<br />

Maria da Penha – instituída para prevenir,<br />

punir e erradicar a violência <strong>do</strong>méstica –,<br />

veio para tentar mudar o quadro.<br />

Determinou a investigação, o processamento<br />

e a punição <strong>do</strong>s agressores, os<br />

quais po<strong>de</strong>m ser <strong>de</strong>nuncia<strong>do</strong>s por qualquer<br />

pessoa, não apenas pelas vítimas, e<br />

<strong>de</strong>vem ser presos em flagrante. Não<br />

po<strong>de</strong>m as vítimas "retirar a queixa" nos<br />

crimes <strong>de</strong> lesão corporal, fican<strong>do</strong> elas<br />

liberadas da humilhação <strong>de</strong> "implorar"<br />

atuação estatal, que passou a ser obrigatória<br />

e <strong>de</strong> interesse público. Não estão<br />

mais sujeitas, portanto, às represálias e<br />

intimidações para "aliviar" a acusação, tão<br />

comuns após o registro <strong>de</strong> uma ocorrência<br />

policial, diminuin<strong>do</strong>, assim, sua vulnerabilida<strong>de</strong><br />

perante os familiares.<br />

A nova Lei busca "tranqüilizar" os<br />

agressores, os quais sabem que a<br />

atuação repressiva não é mais vonta<strong>de</strong><br />

das vítimas, mas <strong>de</strong>ver <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong>.<br />

Assim, o controle físico ou emocional<br />

das vítimas não será mais garantia <strong>de</strong><br />

sua impunida<strong>de</strong>. Previu a Lei, ainda,<br />

atuação multidisciplinar, mediante a<br />

con<strong>de</strong>nação <strong>do</strong>s agressores a participarem<br />

<strong>de</strong> "programas <strong>de</strong> recuperação<br />

e reeducação".<br />

A resistência à nova Lei ainda é<br />

gran<strong>de</strong> e obstinada. Mas acreditamos<br />

que, num futuro bem próximo, talvez<br />

ainda na próxima geração, o reconhecimento<br />

<strong>do</strong>s Direitos Humanos mais<br />

elementares não encontrem dificulda<strong>de</strong>s<br />

insuperáveis nas discriminações<br />

e preconceitos tradicionais. E que não<br />

precisemos, outra vez mais, invocar a<br />

Lei Protetora <strong>do</strong>s Animais para <strong>de</strong>fen<strong>de</strong>r<br />

o ser humano.

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