BOLETIM ARQUITETOS 229.indd - Ordem dos Arquitectos
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28.29<br />
PODERÁ A<br />
INTERNACIONALIZAÇÃO<br />
DA ARQUITECTURA<br />
PORTUGUESA<br />
ser benéfica para<br />
MOÇAMBIQUE?<br />
Honra-me tanto quanto me aflige tratar de um tema<br />
para o qual não tenho nem competência nem experiência<br />
reconhecidas: a internacionalização da arquitectura<br />
portuguesa. É assim imbuído de um certo aventureirismo,<br />
mas com todo o sentido de responsabilidade, que tentarei<br />
comentar o assunto. Talvez porque a minha experiência internacional<br />
como arquitecto é quase não existente, resumindo-se a<br />
pequenas intervenções em meia dúzia de países diferentes, que<br />
agora não vem ao caso, e ainda por cima sem ter tido a possibilidade<br />
de efectuar o chamado follow up, dado que as mesmas se<br />
basearam no uso <strong>dos</strong> correios e de rudimentares tecnologias de<br />
comunicação existentes à época, há cerca de dez anos.<br />
Rogo portanto que entendam algo parecido com o politicamente<br />
incorrecto, como um mero uso da liberdade de expressão a que to<strong>dos</strong><br />
temos direito, e nunca vinculada a qualquer corrente de opinião<br />
institucional ou de outra índole.<br />
Creio que se espera de mim, não uma intervenção no abstrato da<br />
internacionalização da arquitectura portuguesa, mas sim no concreto<br />
da sua ligação às oportunidades que se propalam existirem no<br />
país que melhor conheço, Moçambique, pelo que apresento alguns<br />
elementos de contextualização:<br />
> O país tem um potencial invejável e gente extremamente afável,<br />
mas prevalece prenhe em desafios liga<strong>dos</strong> à escolaridade, à productividade<br />
e às assimetrias entre pessoas e regiões.<br />
> A terra permanece propriedade do Estado e não é transaccionável,<br />
não servindo portanto como colateral para o acesso ao crédito.<br />
> A economia caracteriza-se por um elevado grau de informalidade,<br />
falta de padronização de processos e procedimentos, excesso<br />
relativo de quadros qualifica<strong>dos</strong> em contraste com a falta de<br />
técnicos especializa<strong>dos</strong> e vocaciona<strong>dos</strong> para a produção.<br />
> Constata-se, de facto, uma ocorrência de grandes investimentos<br />
imobiliários, turísticos e industriais ao abrigo de projectos<br />
de investimento directo estrangeiro. No entanto, os investidores<br />
vêm para Moçambique com todo o pacote de consultorias já<br />
contratadas nos países de origem, não sobrando nada relevante<br />
por fazer, sobretudo respeitante à arquitectura. Este tipo de investimentos,<br />
podem, no entanto, constituir oportunidades para<br />
a internacionalização de arquitectos, e sobretudo empresas, que<br />
consigam entrar na cadeia de valor <strong>dos</strong> grandes investimentos<br />
estrangeiros.<br />
> As PMEs não chegam a gerar mais de 5% <strong>dos</strong> empregos formais,<br />
e quiçá outros 5% serão gera<strong>dos</strong> pelo Estado. Com este pano<br />
de fundo, a situação <strong>dos</strong> arquitectos locais não é muito diferente e<br />
em 2008, segundo uma pesquisa da UEM – Faculdade de Arquitectura<br />
PF, quando havia cerca de 300 arquitectos em Moçambique,<br />
apenas cerca de 10% destes viviam exclusivamente de arquitectura.<br />
> O procurement do Estado, presentemente, não protege explicitamente<br />
o conteúdo local, e muito menos os profissionais liberais ou<br />
empresários locais, pelo que qualquer estrangeiro que faça uso da<br />
(extrema) facilidade de registar empresa se torna potencialmente<br />
elegível. Importa no entanto realçar que o procurement é muito<br />
competitivo, e os candidatos vin<strong>dos</strong> de fora podem-se decepcionar<br />
com as verbas disponíveis para o pagamento de honorários, em<br />
nada comparáveis com as que se praticam em Portugal e noutros<br />
países.<br />
> Cerca de um terço da população moçambicana, que é o dobro<br />
da portuguesa, vive nas cidades, no entanto três quartos <strong>dos</strong> urbanitas<br />
habitam em bairros informais, os chama<strong>dos</strong> bairros de<br />
lata. Neste contexto e para mitigar o problema, o Estado em 2010<br />
propunha-se promover a construção de (apenas) 100 mil novos<br />
fogos de habitação social e demarcar 300 mil parcelas de terreno<br />
num período de cinco anos. Por outro lado, e, de acordo com<br />
um distinto economista conhecedor da banca em Moçambique,<br />
em 2006 apenas cerca de 45.409 (23%) <strong>dos</strong> trabalhadores assalaria<strong>dos</strong><br />
ganhava acima <strong>dos</strong> US$ 550 por mês, aproximadamente<br />
o salário mínimo em Portugal, o que poderá ilustrar o potencial<br />
poder de compra da classe média local, e servir de indicador de