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BOLETIM ARQUITETOS 229.indd - Ordem dos Arquitectos

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PROJETAR<br />

o saber<br />

ARQUITETÓNICO<br />

Muito se fala hoje de internacionalização. Não como o<br />

resultado de uma vontade própria e autónoma de experienciar<br />

novos horizontes — e já veremos no que a<br />

internacionalização consiste, para a arquitetura —, mas como<br />

uma saída possível para enfrentar os tempos difíceis que to<strong>dos</strong><br />

vamos vivendo. Não como um ato próprio e voluntário, mas<br />

como algo induzido ou provocado por crises mais ou menos<br />

agudas. Dedicar-nos à internacionalização como uma obrigação<br />

ou uma inevitabilidade é, desde logo, uma forma imperfeita<br />

e incorreta de a abordar. Ainda assim, se não nos sobrar<br />

outra forma de a empreender, contentemo-nos com esta oportunidade<br />

de projetar o (nosso) saber arquitetónico noutros<br />

contextos. Porque a internacionalização enriquece o arquiteto,<br />

ao mesmo tempo que faz jus à própria essência da arquitetura.<br />

Outras escalas<br />

Ao considerar alargar o território de intervenção profissional, ao<br />

prospetar desenvolver trabalho fora do horizonte corrente e rotineiro<br />

de empregabilidade, ao concretizar práticas profissionais no<br />

estrangeiro, o arquiteto está, em primeiro lugar, a alterar a escala<br />

— matéria tão relevante nesta profissão — do seu desempenho.<br />

Em primeiro lugar, porque integra, ele próprio, outro horizonte ou<br />

visão do espaço de oportunidades de trabalho.<br />

Depois, perante um desafio profissional concreto, porque absorve e<br />

apreende o contexto de forma diversa, porque incorpora e sumariza<br />

as condicionantes e preexistências de modo diferente. Porque necessariamente<br />

recorre a leitura(s) mais superficial(is) do território<br />

enquanto património físico e cultural, natural e construído, simplesmente<br />

porque não é conhecedor de toda a densidade e riqueza<br />

que o mesmo encerra, em termos culturais e históricos, sociais e de<br />

costumes, dimensões onde apenas recentemente “aterrou”. A perceção<br />

e descodificação, essencial para o exercício da profissão, torna-se,<br />

a to<strong>dos</strong> os títulos, mais sumária. Não quer dizer menos conseguida<br />

nem menos precisa, mas necessariamente mais sintética.<br />

Portanto, própria de uma outra escala.<br />

Há uma terceira alteração possível de escala a observar nos processos<br />

de internacionalização, que está ligada às oportunidades. Muitas<br />

vezes — mais frequentemente no estrangeiro que no contexto<br />

nacional —, as possibilidades de trabalho surgem em projetos ou<br />

intervenções de escala urbana, porque também são os merca<strong>dos</strong><br />

emergentes onde é mais urgente urbanizar. O salto para a escala da<br />

cidade é, portanto, relativamente mais comum em processos internacionais.<br />

São estes merca<strong>dos</strong> em crescimento acelerado que mais<br />

procuram o trabalho de profissionais estrangeiros, por manifesta<br />

falta de quadros nacionais. Hoje, tal ocorre, de modo generalizado,<br />

nos países da Ásia e África.<br />

Outras noções de tempo<br />

Há uma outra dimensão diversa, na internacionalização, que importa<br />

referir: a variável “tempo”. Os tempos de projetar e construir,<br />

mas sobretudo os tempos em que se processam as transformações<br />

urbanas, são outros. São processos que tendem a decorrer a ritmos<br />

muito mais acelera<strong>dos</strong>, de que o profissional de arquitetura e urbanismo<br />

tem de estar consciente e tem de ser conhecedor. Como céleres<br />

tendem a ser os processos de aprovação e contratualização, sobretudo<br />

nos merca<strong>dos</strong> asiáticos.<br />

As dinâmicas de construção e imobiliárias são também, porque “aceleradas”,<br />

muitas vezes sobrepostas à própria atividade projetual. E o<br />

arquiteto projeta — isso to<strong>dos</strong> sabemos — mas também gere a construção<br />

e, muitas vezes, é chamado a coordenar atividades paraimobiliárias.<br />

Complementaridade e polivalência no desempenho de funções<br />

são, assim, exigidas ao profissional de arquitetura. A sobreposição de<br />

funções, contrariamente ao que sucede nas sociedades “desenvolvidas”<br />

— ou pelo menos as que se regem pelos critérios de especialização<br />

das sociedades ocidentais —, fruto da aceleração <strong>dos</strong> tempos de mudança,<br />

desafia o arquiteto a desempenhos mais complexos.<br />

Outras culturas<br />

Internacionalizar pressupõe uma maior disponibilidade para incorporar,<br />

na atividade projetual ou em qualquer outra atividade<br />

profissional desenvolvida pelo arquiteto, componentes de cultura<br />

diversas das de origem ou da formação de base do arquiteto. O exercício<br />

da profissão é, assim, mais exigente e complexo, mas também,<br />

por isso, muito mais fecundo e enriquecedor. Aculturar é reconhecer<br />

origens e tradições outras, contextos e condicionantes específicas,<br />

próprias <strong>dos</strong> novos lugares e das novas geografias. Essenciais ao<br />

projeto, determinantes para o exercício da profissão.<br />

A incorporação da componente cultural e social é intrínseca à formação<br />

do arquiteto, e central na arquitetura. Por isso se dizia no início<br />

desta nota que não deveria ser por estarmos sob crise que procuramos<br />

na internacionalização um remédio para o desemprego. A<br />

dimensão plural, multicultural e universal é própria da arquitetura,<br />

e termos arquitetos a trabalhar em várias geografias, uma riqueza<br />

da arquitetura nacional.<br />

ROLANDO BORGES MARTINS, membro n.º 15586

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