A Divina Comédia, de Dante Alighieri Análise da obra A Comédia ...
A Divina Comédia, de Dante Alighieri Análise da obra A Comédia ...
A Divina Comédia, de Dante Alighieri Análise da obra A Comédia ...
You also want an ePaper? Increase the reach of your titles
YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.
existência <strong>da</strong> vi<strong>da</strong> eterna e naquela que seria a finali<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> nossa existência: a busca <strong>da</strong> união com<br />
Deus, por meio <strong>da</strong> purificação.<br />
No entanto, uma ambigüi<strong>da</strong><strong>de</strong> que marca to<strong>da</strong> a <strong>obra</strong> po<strong>de</strong> ser encontra<strong>da</strong> nas fontes <strong>de</strong> inspiração<br />
para o enredo: do VI canto do clássico Enei<strong>da</strong>, <strong>de</strong> autoria do poeta romano Virgílio, surge a temática<br />
<strong>de</strong> uma viagem ao pós-vi<strong>da</strong>. Da Bíblia, <strong>Dante</strong> extrai os dogmas católicos, tão presentes na <strong>obra</strong>. Da<br />
fusão <strong>de</strong> ambos os textos, cria-se, então, uma síntese <strong>da</strong> mentali<strong>da</strong><strong>de</strong> medieval - calca<strong>da</strong> na<br />
religiosi<strong>da</strong><strong>de</strong> -, ao mesmo tempo em que se vislumbra um anúncio <strong>da</strong> racionali<strong>da</strong><strong>de</strong>, <strong>da</strong> valorização<br />
do ser humano e do retorno aos mo<strong>de</strong>los greco-romanos, características essenciais do<br />
Renascimento.<br />
Tal conciliação entre fé e razão projeta-se fortemente sobre A <strong>Divina</strong> <strong>Comédia</strong>, à semelhança<br />
do que ocorre na suma filosófica <strong>de</strong> São Tomas <strong>de</strong> Aquino, contemporâneo <strong>de</strong> <strong>Dante</strong>. A visão <strong>de</strong><br />
universo apresenta<strong>da</strong> na <strong>obra</strong>, por sua vez, é empresta<strong>da</strong> <strong>de</strong> Aristóteles, outro gran<strong>de</strong> nome <strong>da</strong><br />
Antigüi<strong>da</strong><strong>de</strong> Clássica a influenciar o poeta.<br />
Também <strong>de</strong>staca-se no texto a duali<strong>da</strong><strong>de</strong> entre aceitação e crítica à Igreja. <strong>Dante</strong> exalta e<br />
justifica as crenças do Catolicismo, <strong>de</strong>fen<strong>de</strong>ndo, inclusive, a origem divina do po<strong>de</strong>r papal. No<br />
entanto, não hesita em con<strong>de</strong>nar diversos papas ao plano do Inferno, por consi<strong>de</strong>rá-los corruptores<br />
<strong>da</strong> fé cristã. O aparente conflito apenas reforça o sentido moralizante do livro, ao enfatizar a<br />
necessi<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> uma rígi<strong>da</strong> conduta ética.<br />
Estrutura<br />
A <strong>obra</strong> é estrutura<strong>da</strong> em 100 cantos, totalizando 14.233 versos. Ca<strong>da</strong> parte (Céu, Purgatório<br />
e Inferno) apresenta 33 cantos. O Inferno conta, ain<strong>da</strong>, com um canto introdutório, formando o<br />
número 100, múltiplo <strong>de</strong> 10, símbolo <strong>da</strong> perfeição (100 = a perfeição do perfeito).<br />
Ca<strong>da</strong> canto é composto <strong>de</strong> 130 a 140 versos em terça rima (versos divididos em grupos <strong>de</strong><br />
três).<br />
Na harmonia com os números 3, 7, 10 e seus múltiplos, aparecem os indícios do forte<br />
simbolismo <strong>da</strong> cultura medieval ou <strong>da</strong> <strong>de</strong>voção do autor à Santíssima Trin<strong>da</strong><strong>de</strong>. Essa harmonia<br />
<strong>de</strong>termina a métrica adota<strong>da</strong>, com versos hen<strong>de</strong>cassílabos (11 sílabas) e rimas no esquema ABA<br />
BCB, CDC... VZV (o verso central rima com os 1° e 3º do grupo seguinte). Tal estrutura <strong>de</strong>u origem<br />
ao chamado "terceto <strong>da</strong>ntesco", assim <strong>de</strong>nominado por ter sido <strong>Dante</strong> o primeiro a empregá-la.<br />
São muito discuti<strong>da</strong>s as <strong>da</strong>tas <strong>da</strong> composição do poema: muito provavelmente, <strong>Dante</strong><br />
começou-o por volta <strong>de</strong> 1307, para <strong>de</strong>pois nele trabalhar durante to<strong>da</strong> a sua vi<strong>da</strong>.<br />
O poema, no seu conjunto, é a história <strong>da</strong> conversão do pecador a Deus. O poeta tencionava<br />
fazer <strong>da</strong> <strong>Divina</strong> <strong>Comédia</strong> principalmente sua <strong>obra</strong> <strong>de</strong> doutrina e <strong>de</strong> edificação, uma "Suma" que<br />
compreen<strong>de</strong>sse o saber do seu tempo, <strong>da</strong> ciência à filosofia e à teologia. Por isso o poema é repleto<br />
<strong>de</strong> significados alegóricos e ain<strong>da</strong> morais. Assim, por exemplo, Virgílio, que cantou os i<strong>de</strong>ais <strong>de</strong> paz<br />
e justiça do Império Romano no tempo <strong>de</strong> Augusto, e que guia o poeta através do Inferno e do<br />
Purgatório, simboliza a razão integra<strong>da</strong> com a sabedoria moral, e é também a voz <strong>da</strong> própria<br />
consciência <strong>de</strong> <strong>Dante</strong>. Beatriz, a mulher ama<strong>da</strong> que o guia no Paraíso, é a sabedoria cristão<br />
ilumina<strong>da</strong> pela graça, a suprema sabedoria dos santos, a única que po<strong>de</strong> levar a Deus.<br />
Tudo no poema é perfeita construção alegórica, e nisto <strong>Dante</strong> limita-se a respeitar as regras<br />
do seu tempo: pois quantas não são <strong>de</strong> fato as <strong>obra</strong>s medievais que referem as viagens<br />
ultraterrenas, <strong>de</strong>vi<strong>da</strong>mente arquiteta<strong>da</strong>s para edificação do pecador? Só que, no poema <strong>da</strong>ntesco,<br />
há um sutil artifício que permite ao poeta encerrar nos seus cantos também a história do seu tempo.<br />
<strong>Dante</strong> imagina fazer uma viagem em 1300 e portanto refere naturalmente tudo quanto aconteceu<br />
antes <strong>de</strong>sta <strong>da</strong>ta; mas, reconhecendo aos mortos a capaci<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> prever o futuro, põe-nos a<br />
profetizar os acontecimentos públicos e particulares que não <strong>de</strong>seja <strong>de</strong>ixar em silêncio.<br />
Fruto <strong>de</strong> uma imaginação po<strong>de</strong>rosa e <strong>de</strong> uma capaci<strong>da</strong><strong>de</strong> narrativa aguça<strong>da</strong>, A <strong>Divina</strong><br />
<strong>Comédia</strong> encontra nos símbolos um valioso instrumento <strong>de</strong> expressão. A riqueza <strong>de</strong> alegorias,<br />
porém, além <strong>de</strong> constituir o caráter lírico e a beleza poética do livro, acaba por permitir<br />
interpretações diversas sobre o significado do texto. Ao menos quatro <strong>de</strong>las são amplamente<br />
reconheci<strong>da</strong>s:<br />
1. A literal, que consi<strong>de</strong>ra apenas a aventura <strong>de</strong> <strong>Dante</strong> pelos três reinos do pós-vi<strong>da</strong>.<br />
2. A alegórica, que <strong>de</strong>staca o sentido <strong>de</strong> purificação progressiva do espírito, ao longo <strong>da</strong> jorna<strong>da</strong><br />
rumo a Deus.