A Arte Cavalheiresca do Arqueiro Zen (Eugen Herrigel - Webnode
A Arte Cavalheiresca do Arqueiro Zen (Eugen Herrigel - Webnode
A Arte Cavalheiresca do Arqueiro Zen (Eugen Herrigel - Webnode
Create successful ePaper yourself
Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.
mais forte, até que eu não pude evitar de colocá-la para o<br />
mestre:<br />
"Não é possível ocorrer que o senhor, depois de dezenas<br />
de anos de prática, maneje o arco de uma maneira intencional,<br />
mas com a segurança de um sonâmbulo, de tal maneira que o<br />
senhor tenha-se torna<strong>do</strong> incapaz de errar, mesmo que não<br />
tenha aponta<strong>do</strong> conscientemente para o alvo?"<br />
Acostuma<strong>do</strong> às minhas cansativas perguntas, o mestre<br />
balançou a cabeça depois de um silêncio meditativo:<br />
"Não vou negar que possa estar fazen<strong>do</strong> algo pareci<strong>do</strong><br />
com o que o senhor sugere. Coloco-me à frente <strong>do</strong> alvo, logo<br />
tenho que vê-lo, embora não me fixe nele intencionalmente.<br />
Por outro la<strong>do</strong>, sei que vê-lo não é suficiente, que isso nada<br />
decide ou explica, pois eu o vejo como se não o estivesse<br />
ven<strong>do</strong>."<br />
Foi então que me escapou a seguinte observação:<br />
"Se é assim, nada impede que o senhor acerte o alvo<br />
com os olhos venda<strong>do</strong>s."<br />
O mestre me dirigiu um olhar que me fez sentir que eu o<br />
tivesse ofendi<strong>do</strong>, e em seguida me disse: "Eu o espero à<br />
noite."<br />
entei-me numa almofada, diante <strong>do</strong> mestre que, em<br />
silêncio, me ofereceu chá. Permanecemos assim durante<br />
longos momentos. O único ruí<strong>do</strong> que se ouvia era o <strong>do</strong> vapor da<br />
água ferven<strong>do</strong> na chaleira. Por fim, o mestre se levantou e fez<br />
sinal para que eu o acompanhasse. O local <strong>do</strong>s exercícios<br />
estava feericamente ilumina<strong>do</strong>. O mestre me pediu para fixar<br />
uma haste de incenso, longa e delgada como uma agulha de<br />
tricotar, na areia diante <strong>do</strong> alvo. Porém, o local onde ele se<br />
encontrava não estava ilumina<strong>do</strong> pelas lâmpadas elétricas,<br />
mas pela pálida incandescência da vela delgada, que lhe<br />
mostrava apenas os contornos. O mestre dançou a cerimônia.<br />
Sua primeira flecha partiu da intensa claridade em direção da<br />
noite profunda. Pelo ruí<strong>do</strong> <strong>do</strong> impacto, percebi que atingira o<br />
alvo, o que também ocorreu com o segun<strong>do</strong> tiro. Quan<strong>do</strong><br />
acendi a lâmpada que iluminava o alvo constatei, estupefacto,<br />
que não só a primeira flecha acertara o centro <strong>do</strong> alvo, como a<br />
segunda também o havia atingi<strong>do</strong>, tão rente à primeira, que lhe<br />
cortara um pedaço, no senti<strong>do</strong> <strong>do</strong> com-<br />
70 71<br />
S