A Arte Cavalheiresca do Arqueiro Zen (Eugen Herrigel - Webnode
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mestre, segun<strong>do</strong> o qual deveríamos praticá-lo única e<br />
exclusivamente com um recolhimento libera<strong>do</strong>r. Analisan<strong>do</strong><br />
todas as possibilidades que pudessem explicar meus<br />
fracassos, cheguei à conclusão de que eles não se deviam à<br />
causa apontada pelo mestre, ou seja, à minha incapacidade de<br />
liberar-me de toda intenção e <strong>do</strong> meu próprio eu, mas porque<br />
os de<strong>do</strong>s da mão direita prendiam o polegar com firmeza<br />
excessiva. Quanto mais eu esperava o disparo, tanto mais eu<br />
os apertava sem querer, espasmodicamente. Eis aqui o ponto<br />
onde devo concentrar meus esforços, pensei. Eu havia<br />
encontra<strong>do</strong> uma solução simples e plausível para o problema.<br />
Se, uma vez estira<strong>do</strong> o arco, eu soltasse cuida<strong>do</strong>sa e<br />
lentamente os de<strong>do</strong>s que prendiam o polegar, chegaria o<br />
momento em que este, liberta<strong>do</strong>, seria arranca<strong>do</strong><br />
automaticamente da sua posição. O tiro, dispara<strong>do</strong> de maneira<br />
fulminante, "cairia como a neve acumulada na folha de bambu".<br />
Esse descobrimento me convenceu, sobretu<strong>do</strong> por sua grande<br />
afinidade com a técnica <strong>do</strong> tiro de fuzil, segun<strong>do</strong> a qual o<br />
indica<strong>do</strong>r <strong>do</strong>bra-se lentamente, até que uma pressão<br />
insignificante vence a última resistência.<br />
Eu me convencera de que estava no caminho certo,<br />
porque quase to<strong>do</strong>s os tiros, pelo menos assim parecia, saíam<br />
de maneira suave e imprevista. Porém, eu não atentava para o<br />
reverso da medalha: para obter êxito, eu dirigia toda a minha<br />
atenção para a mão direita. Consolava-me a perspectiva de<br />
que essa solução técnica chegaria a ser, pouco a pouco, tão<br />
familiar que dispensaria toda atenção. Algum dia, graças a ela,<br />
me seria possível soltar<br />
o tiro inconscientemente, permanecen<strong>do</strong> esqueci<strong>do</strong> de mim<br />
mesmo, na maior tensão. Assim, também nesse caso, a<br />
técnica se espiritualizaria. Cada vez mais confiante nessa<br />
descoberta, não dei ouvi<strong>do</strong>s às objeções de minha mulher e<br />
senti, por fim, a tranqüila sensação de ter da<strong>do</strong> um decisivo<br />
passo à frente.<br />
Ao se iniciarem as aulas, o primeiro tiro já me pareceu<br />
excelente. Desprendeu-se suave e sem esforço. O mestre me<br />
olhou por um momento e, hesitante, como quem não crê no<br />
que está ven<strong>do</strong>, ordenou: "Mais uma vez, por favor!" O<br />
segun<strong>do</strong> tiro me pareceu superar o primeiro. Então, sem dizer<br />
uma única palavra, o mestre se aproximou, tomou o arco das<br />
minhas mãos e, dan<strong>do</strong>-me as costas, sentou-se numa<br />
almofada. Compreendi o que isso significava e retirei-me.<br />
o dia seguinte, o mestre, por intermédio <strong>do</strong> professor<br />
Komachiya, avisava-me de que se recusava a continuar<br />
com suas lições porque eu o havia engana<strong>do</strong>.<br />
Entristeci<strong>do</strong> por essa interpretação <strong>do</strong> mestre, expliquei ao<br />
seu<br />
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