A Arte Cavalheiresca do Arqueiro Zen (Eugen Herrigel - Webnode
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Dia após dia ficava cada vez mais fácil levar a cabo, sem<br />
esforço, as sugestões técnicas que eram propostas, mas<br />
devíamos também ser capazes de ter inspirações<br />
próprias, indispensáveis para nosso enriquecimento interior.<br />
Assim, por exemplo, a mão que guia o pincel, no exato<br />
momento que o espírito começa a elaborar as formas, já<br />
encontrou, juntamente com esse, a idéia que pretendem<br />
realizar: o aluno, por causa disso, não sabe se o "autor" da<br />
obra é a mão ou o espírito. Mas para que isso possa ocorrer,<br />
quer dizer, para que o trabalho se espiritualize, se faz<br />
necessária a concentração de todas as energias físicas ou<br />
psíquicas, tal como na arte <strong>do</strong>s arqueiros. Em nenhuma<br />
circunstância, como veremos nos exemplos seguintes, é<br />
possível prescindirmos da concentração.<br />
Um pintor que trabalha com tinta nanquim senta diante<br />
<strong>do</strong>s seus alunos. Examina os pincéis e arruma-os<br />
pausadamente. À sua frente, sobre uma esteira, está<br />
estendida uma longa e estreita tira de papel. Finalmente,<br />
depois de haver permaneci<strong>do</strong> durante longos momentos em<br />
profunda concentração, cria, com traços rápi<strong>do</strong>s e precisos,<br />
uma imagem que, não necessitan<strong>do</strong> de nenhuma correção,<br />
serve de modelo aos seus alunos.<br />
Um mestre de arranjos florais começa a aula desatan<strong>do</strong><br />
cuida<strong>do</strong>samente a fita que mantém as flores e os ramos uni<strong>do</strong>s<br />
e, depois de enrolá-la com esmero, deposita-a de la<strong>do</strong>. Em<br />
seguida, examina cada um <strong>do</strong>s ramos, escolhe os que lhe<br />
parecem melhor, curva-os atentamente, dan<strong>do</strong>-lhes a forma<br />
segun<strong>do</strong> o papel que irão desempenhar no conjunto, e<br />
finalmente coloca-os num vaso previamente escolhi<strong>do</strong>.<br />
Contemplan<strong>do</strong> o resulta<strong>do</strong>, dir-se-á que o mestre adivinhou os<br />
obscuros sonhos da natureza.<br />
Nesses <strong>do</strong>is casos, aos quais me limito, os mestres se<br />
comportam como se estivessem sozinhos. Não dirigem<br />
nenhum olhar e nenhuma palavra aos seus alunos.<br />
Compenetra<strong>do</strong>s e serenos, executam as operações<br />
preliminares; absorvem-se no ato de plasmar e formar,<br />
processo que, desde os primeiros gestos iniciais, até que dêem<br />
por acabada a obra, parece um gesto único, sem etapas,<br />
conti<strong>do</strong> em si mesmo. Com efeito, sua força expressiva é tão<br />
grande que impressiona o especta<strong>do</strong>r como se fosse um<br />
quadro 11<br />
11. Não é por outra razão que a psicologia da Gesta/t dá tanta importância ao<br />
zen-budismo e à teoria taoísta <strong>do</strong> wu-wei (vontade passiva, vazio pleno). Os<br />
gestalt-terapeutas, a exemplo <strong>do</strong> "mestre" Frederick Perls, levam seus pacientes a<br />
fecharem a Gesta/t, isto é, a uma visão integrada da sua circunstância, sem a perda <strong>do</strong>s<br />
detalhes, bem como a fertilizarem o vazio (sunyata), impedin<strong>do</strong> que ele cresça e se<br />
intrometa na vontade, impedin<strong>do</strong> que ocorra aquilo que os zen-budistas chamam de<br />
obscurecimento da mente. (N. <strong>do</strong> T.)<br />
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