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A Arte Cavalheiresca do Arqueiro Zen (Eugen Herrigel - Webnode

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sentir a influência <strong>do</strong> <strong>Zen</strong> sobre a arte <strong>do</strong> tiro com arco? Eu não<br />

conseguia determinar a relação que existia entre a expectativa<br />

livre de intenção e o disparo da flecha, no momento de liberar a<br />

tensão. Mas por que antecipar com o pensamento o que só a<br />

experiência pode ensinar? Já não era tempo de afastar tão<br />

estéril propensão? Quantas vezes eu havia inveja<strong>do</strong> os<br />

numerosos discípulos <strong>do</strong> mestre que, como crianças, se<br />

deixavam tomar pela mão para que ele os guiasse... Como<br />

devem ser felizes as pessoas que assim agem... Esse<br />

comportamento não conduz à indiferença, nem à paralisia<br />

espiritual. Afinal, as crianças não costumam fazer inúmeras<br />

perguntas?<br />

Durante a aula seguinte, sofri uma grande decepção, pois<br />

o mestre insistia em continuar com os mesmos exercícios:<br />

estirar o arco, mantê-lo tensiona<strong>do</strong>, disparar a flecha. Por mais<br />

que ele me encorajasse, eu estava desanima<strong>do</strong>. Seguin<strong>do</strong><br />

suas instruções, eu procurava não ceder à tensão, mas<br />

superá-la, como se a natureza <strong>do</strong> arco não tivesse limite algum,<br />

e esperava com paciência e afinco que, no ato <strong>do</strong> disparo, a<br />

tensão se consumasse e se resolvesse de vez. Em vão. Eu<br />

perdia to<strong>do</strong>s os tiros: artificiais, tremi<strong>do</strong>s, desvia<strong>do</strong>s. Quan<strong>do</strong><br />

chegou o momento a partir <strong>do</strong> qual a continuação desses<br />

exercícios se mostrava não só inútil, como perigosa (porque<br />

cada vez mais aumentava o pressentimento <strong>do</strong> fracasso), o<br />

mestre decidiu iniciar uma etapa completamente nova. "De<br />

agora em diante", advertiu-nos, "devem começar a se<br />

concentrar durante o caminho para as aulas, sem prestar<br />

atenção em nada e em ninguém, como se no mun<strong>do</strong> inteiro<br />

exis-<br />

tisse apenas uma única coisa importante e real o tiro com<br />

arco."<br />

O mestre decompôs em seções diferentes o caminho da<br />

libertação de si mesmo, cada uma das quais deven<strong>do</strong> ser<br />

atentamente praticada. Suas breves e delicadas insinuações<br />

continuavam, pois para executar tais exercícios é suficiente<br />

que o aluno compreenda, e às vezes apenas vislumbre, o que<br />

se espera dele. Não é necessário recorrer-se às tradicionais e<br />

nítidas distinções metafóricas. É provável que elas, oriundas<br />

de uma prática centenária, penetrem em nós com maior<br />

profundidade <strong>do</strong> que o nosso conhecimento cuida<strong>do</strong>samente<br />

elabora<strong>do</strong>. O primeiro passo já havia si<strong>do</strong> da<strong>do</strong>: graças a ele<br />

chegáramos ao relaxamento corporal, sem o que não é<br />

possível estirar-se o arco adequadamente. Porém, para que o<br />

tiro ocorra de forma apropriada, o relaxamento físico tem que<br />

se entrelaçar com o relaxamento psico-espiritual, com a<br />

finalidade, não só de agilizar, como de liberar o espírito. Temos<br />

que ser ágeis para alcançar a liberdade e livres para recuperar<br />

a agilidade primordial. Essa agilidade primordial é diferente de<br />

tu<strong>do</strong> o que se entende vulgarmente por agilidade mental.<br />

Entre o esta<strong>do</strong> de relaxamento psíquico de um la<strong>do</strong> e o<br />

da liberdade espiritual de outro, existe uma diferença de nível<br />

que o ato de respirar, por si só, não pode compensar. Para<br />

perdermos o eu, é necessário cortarmos todas as amarras,<br />

sejam quais forem, para que a alma, submergida em si mesma,<br />

recupere to<strong>do</strong> o poder da sua indizível origem.<br />

Não conseguiremos fechar a porta <strong>do</strong>s senti<strong>do</strong>s atra-<br />

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