Heresias na Idade Média - UEM
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Revista Brasileira de História das Religiões. ANPUH, Ano II, n. 6, Fev. 2010 - ISSN 1983-2850<br />
http://www.dhi.uem.br/gtreligiao - Artigos<br />
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como os discursos que saem vitoriosos e as forças que se agrupam em torno do<br />
Papado. Mas é <strong>na</strong>s duas últimas décadas do século XII que assistiremos a uma<br />
verdadeira explosão de novas formas de religiosidade que os círculos eclesiásticos<br />
ligados à Reforma Gregoria<strong>na</strong> se apressarão em desig<strong>na</strong>r como movimentos<br />
heréticos. Então, já estaremos ple<strong>na</strong>mente em um mundo onde a heresia passa a<br />
ser tratada pelos seus próprios contemporâneos como fenômeno coletivo. Além dos<br />
cátaros, adquirem expressão novos grupos que seriam considerados heréticos. Os<br />
valdenses, por exemplo, constituem um movimento origi<strong>na</strong>do por um mercador<br />
lionês que manda traduzir o Evangelho e que, por não conseguir obter a autorização<br />
da Igreja, resolve pregar assim mesmo. Os patarinos, ou “humilhados”,<br />
correspondem a uma seita de leigos que decidem praticar uma vida apostólica<br />
radical. Os passagini formam um grupo que é apresentado nos tratados da época<br />
como “cristãos judaizantes”. Os ar<strong>na</strong>ldistas merecem toda a segunda parte de um<br />
tratado que principia escrevendo sobre a heresia dos cátaros (Zerner, 1999, p.512).<br />
Todos estes grupos denunciam o novo traço daqueles que seriam enquadrados<br />
como movimentos heréticos: além de terem atingido uma dimensão coletiva que<br />
impressio<strong>na</strong>rá os seus contemporâneos, eles questio<strong>na</strong>m diretamente o papel da<br />
Igreja de linha papal como única alter<strong>na</strong>tiva religiosa ou até mesmo como instituição<br />
eclesiástica a ser reconhecida.<br />
Datarão desta época tratados anti-heréticos importantes. Só no sul da Gália,<br />
que se estava abrindo como espaço privilegiado para novas formas de religiosidade,<br />
registram-se <strong>na</strong> última década do século XII três tratados importantes, entre eles um<br />
tratado de procedência monástica denomi<strong>na</strong>do Contra valdenses e contra arianos.<br />
Muito surpreendente, mas também bastante sintomático, é o Líber antiheresis escrito<br />
por um Valdense – reavivando a atrás discutida idéia de que estar em heresia<br />
depende do ponto de vista. Já a Summa quatripartita, atribuída a Alain de Lille,<br />
começa por atacar o dualismo cátaro, em seguida opõe-se à heresia valdense ao<br />
mesmo tempo em que registra o ponto de vista eclesiástico oficial sobre a confissão<br />
e outras temáticas, e encerra-se por fim com um exame da questão dos judeus e<br />
sarracenos – portanto voltando-se para um âmbito exterior ao universo cristão.<br />
Particularmente significativas são as fontes anti-heréticas que surgem no<br />
entrecruzamento dos direitos eclesiásticos e temporais, possibilitando uma aliança<br />
entre os projetos do Papado e o projeto político do Imperador. Já em 1184 a<br />
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