Manual do Budismo - Jardim do Dharma
Manual do Budismo - Jardim do Dharma Manual do Budismo - Jardim do Dharma
filosofia especulativa, mas descritiva. Com o objetivo de descrever os fenômenos o Abhidharma emprega dois métodos complementares: a análise e a investigação das relações, (ou condicionalidade) dos fenômenos. Os dois livros mais importantes do Abhidhamma são o Dhammasangani e o Patthana-pakarana. O Dhammasangani é a classificação da existência em três categorias últimas empíricas: Consciência (chita); Fatores mentais (cetasikas); e mentalidade-materialidade (nama-rupa). Nele é encontrada a análise sistemática dos agregados, Skhandhas, bases ou meios, ayatana, e elementos, dhatu. O Patthana-pakarana é o maior volume compreendendo seis partes. Nele é encontrado o modelo das relações condicionadas, uma das quatro principais aplicações da doutrina da origem dependente. Essas quatro aplicações são: As quatro nobres verdades Os doze elos da cadeia do vir a ser O modelo das relações condicionadas A lei de karma O Dhamasangani é em essência um livro que contém classificações e definições dos termos empregados no Abhidharma. Seu enfoque é analítico, dissecando e categorizando as experiências de acordo com os seus constituintes últimos ou dharmas. O Patthana usa o método da síntese e mostra como todos esses fenômenos estão relacionados e condicionados. O Abhidharma também pode ser considerado como uma sistematização das doutrinas contidas ou implícitas no Sutra Pitaka. Essas doutrinas são formuladas no Abhidharma numa linguagem mais precisa, estritamente filosófica ou verdadeiramente realista, descrevendo as funções e processos desprovidos dos conceitos convencionais e irreais que assumem a existência de um agente, de uma personalidade, de uma alma ou substância. Paramartha – a Realidade Última De acordo com a filosofia do Abhidharma existem dois tipos de realidade – a convencional, e a última. A realidade convencional é o referencial do pensamento conceitual comum e modos de expressão convencionais. Isto inclui entidades como seres vivos, pessoas, homem, mulher, animais e os objetos aparentemente estáveis que constituem o quadro que percebemos como sendo o mundo. O Abhidharma defende que essas noções em última análise não possuem validade, pois os objetos que elas representam não existem por si mesmos como realidades irredutíveis. A sua existência é puramente conceitual, não real. Eles são o produto de fabricações mentais, não realidades com uma substância inerente. A realidade última, por outro lado, são os dharmas: elementos irredutíveis da existência, as entidades últimas resultantes da correta análise da experiência. Esses elementos são o nível de redução mais elementar dos fenômenos passíveis de serem experimentados. São os verdadeiros constituintes da complexa multiplicidade das experiências. Nos sutras, em geral, o Buda analisa um ser ou indivíduo sob a forma de cinco tipos também conhecidos como os cinco agregados: matéria, sensação, percepção, formações mentais e consciência. No Abhidharma a realidade última é organizada em quatro categorias. As três primeiras – consciência, fatores mentais e matéria – abrangem toda a realidade condicionada. Os cinco agregados mencionados nos sutras se encaixam dentro desses três grupos. O agregado da consciência (viññana) está representado no Abhidhamma pela consciência, chitta, sendo que a palavra chitta em geral é empregada para se referir aos diferentes tipos de consciência que se diferenciam de acordo com os seus fatores mentais concomitantes. Os três agregados intermediários são incluídos no Abhidharma dentro do grupo de fatores mentais, os estados mentais que surgem juntamente com a consciência e que desempenham diferentes funções. O Abhidharma enumera 52 fatores mentais: os agregados da sensação e percepção são considerados cada um como um fator; o agregado das formações mentais, sankhara, é subdividido em 50 fatores 40
mentais. O agregado da matéria é idêntico ao grupo da matéria no Abhidhamma. No Abhidharma a matéria está dividida em 28 tipos de fenômenos materiais. A esses três tipos de realidade condicionada é adicionada uma quarta realidade que é incondicionada. Essa realidade que não está incluída nos cinco agregados é Nirvana, o estado de libertação final do sofrimento inerente aos estados condicionados. Portanto, no Abhidharma existem ao todo essas quatro realidades últimas: consciência, fatores mentais, matéria e Nirvana. Análise da Consciência Um dos principais componentes do Abhidharma é a análise e classificação da consciência. A mente humana, tão evanescente e tão elusiva, foi submetida a um escrutínio abrangente, meticuloso e imparcial. A abordagem adotada é de uma rigorosa fenomenologia que descarta a noção de que na mente pode ser encontrada qualquer tipo de unidade estática ou substância imanente. No entanto, essa psicologia tem um fundamento básico na ética e um propósito soteriológico que impede que a análise realista e não metafísica da mente acabe implicando em conclusões de materialismo ético ou amoralismo teórico e prático. O método de investigação empregado no Abhidharma é indutivo, estando baseado exclusivamente na observação introspectiva imparcial e sutil dos processos mentais. O Buda conseguiu reduzir o processo de cognição aos seus distintos momentos de consciência, que dada a sua sutileza e o seu caráter evanescente, não podem ser observados diretamente por uma mente que não esteja treinada em meditação. Na mente de cada ser ocorrem distintos tipos de estados mentais benéficos, hábeis ou saudáveis, e prejudiciais, inábeis ou insalubres. Cada estado mental saudável tem o seu correspondente oposto insalubre. Da mesma forma como as criaturas microscópicas numa gota d’água só se tornam visíveis com o uso de um microscópio, os processos acelerados e de curta duração da mente só são reconhecidos com o auxílio de um instrumento preciso para o escrutínio mental – uma mente aprimorada pelo treinamento metódico em meditação. O Abhidharma e o Mestre do Dharma Na tradição Theravada a familiaridade com o Abhidharma é considerado requisito indispensável para aqueles que querem ensinar o Dharma. As características do Abhidharma que são de particular importância para alguém que queira ensinar o Dharma são as seguintes: a organização sistemática do material doutrinário contido no Sutra Pitaka; o emprego do raciocínio metódico e ordenado; a definição precisa dos termos técnicos e suas delimitações; o tratamento de vários temas e situações da vida diária sob a perspectiva da realidade última, paramartha; a maestria do conteúdo doutrinário. O Conhecimento do Abhidharma é Indispensável? Freqüentemente surge a questão sobre a compreensão do Abhidharma, se ela é necessária para o completo entendimento do Dharma e para alcançar a libertação. Mesmo no Sutra Pitaka muitos métodos são ensinados como ‘portas’ para a compreensão e penetração das mesmas Quatro Nobres Verdades. Nem todas são necessárias para alcançar o objetivo último, Nirvana, nem todas são adequadas na sua totalidade para todos os tipos de indivíduos. Na verdade, o Buda ensinou diversas abordagens possíveis e deixou por conta dos seus discípulos fazerem as suas escolhas pessoais de acordo com as suas inclinações, circunstâncias e nível de maturidade. O mesmo princípio se aplica ao Abhidharma, quer seja no seu conjunto ou aspectos individuais. Talvez, a melhor explicação da relação entre o Abhidharma e os sutras tenha sido formulada pelo Venerável Pelene Vajiranana Mahathera nestes símiles: “O Abhidharma é como uma lente de aumento poderosa, mas a compreensão obtida dos sutras é o próprio olho, que realiza a ação de ver. Ou, o Abhidharma é como um frasco de remédio cujo rótulo contém uma análise exata e detalhada do medicamento; mas o conhecimento adquirido dos sutras é o medicamento em si, que por si só é capaz de curar a doença.” Abhidharmatha Sangaha Este trabalho, e em particular os compêndios da consciência, fatores mentais, matéria e processo cognitivo, estão baseados no Abhidharmattha Sangaha que é um livro escrito pelo Achariya 41
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mentais. O agrega<strong>do</strong> da matéria é idêntico ao grupo da matéria no Abhidhamma.<br />
No Abhidharma a matéria está dividida em 28 tipos de fenômenos materiais.<br />
A esses três tipos de realidade condicionada é adicionada uma quarta realidade que é incondicionada.<br />
Essa realidade que não está incluída nos cinco agrega<strong>do</strong>s é Nirvana, o esta<strong>do</strong> de libertação final <strong>do</strong><br />
sofrimento inerente aos esta<strong>do</strong>s condiciona<strong>do</strong>s.<br />
Portanto, no Abhidharma existem ao to<strong>do</strong> essas quatro realidades últimas: consciência, fatores<br />
mentais, matéria e Nirvana.<br />
Análise da Consciência<br />
Um <strong>do</strong>s principais componentes <strong>do</strong> Abhidharma é a análise e classificação da consciência. A mente<br />
humana, tão evanescente e tão elusiva, foi submetida a um escrutínio abrangente, meticuloso e<br />
imparcial. A abordagem a<strong>do</strong>tada é de uma rigorosa fenomenologia que descarta a noção de que na<br />
mente pode ser encontrada qualquer tipo de unidade estática ou substância imanente. No entanto, essa<br />
psicologia tem um fundamento básico na ética e um propósito soteriológico que impede que a análise<br />
realista e não metafísica da mente acabe implican<strong>do</strong> em conclusões de materialismo ético ou<br />
amoralismo teórico e prático. O méto<strong>do</strong> de investigação emprega<strong>do</strong> no Abhidharma é indutivo,<br />
estan<strong>do</strong> basea<strong>do</strong> exclusivamente na observação introspectiva imparcial e sutil <strong>do</strong>s processos mentais.<br />
O Buda conseguiu reduzir o processo de cognição aos seus distintos momentos de consciência, que<br />
dada a sua sutileza e o seu caráter evanescente, não podem ser observa<strong>do</strong>s diretamente por uma mente<br />
que não esteja treinada em meditação. Na mente de cada ser ocorrem distintos tipos de esta<strong>do</strong>s mentais<br />
benéficos, hábeis ou saudáveis, e prejudiciais, inábeis ou insalubres. Cada esta<strong>do</strong> mental saudável tem<br />
o seu correspondente oposto insalubre. Da mesma forma como as criaturas microscópicas numa gota<br />
d’água só se tornam visíveis com o uso de um microscópio, os processos acelera<strong>do</strong>s e de curta duração<br />
da mente só são reconheci<strong>do</strong>s com o auxílio de um instrumento preciso para o escrutínio mental – uma<br />
mente aprimorada pelo treinamento metódico em meditação.<br />
O Abhidharma e o Mestre <strong>do</strong> <strong>Dharma</strong><br />
Na tradição Theravada a familiaridade com o Abhidharma é considera<strong>do</strong> requisito indispensável para<br />
aqueles que querem ensinar o <strong>Dharma</strong>. As características <strong>do</strong> Abhidharma que são de particular<br />
importância para alguém que queira ensinar o <strong>Dharma</strong> são as seguintes: a organização sistemática <strong>do</strong><br />
material <strong>do</strong>utrinário conti<strong>do</strong> no Sutra Pitaka; o emprego <strong>do</strong> raciocínio metódico e ordena<strong>do</strong>; a<br />
definição precisa <strong>do</strong>s termos técnicos e suas delimitações; o tratamento de vários temas e situações da<br />
vida diária sob a perspectiva da realidade última, paramartha; a maestria <strong>do</strong> conteú<strong>do</strong> <strong>do</strong>utrinário.<br />
O Conhecimento <strong>do</strong> Abhidharma é Indispensável?<br />
Freqüentemente surge a questão sobre a compreensão <strong>do</strong> Abhidharma, se ela é necessária para o<br />
completo entendimento <strong>do</strong> <strong>Dharma</strong> e para alcançar a libertação. Mesmo no Sutra Pitaka muitos<br />
méto<strong>do</strong>s são ensina<strong>do</strong>s como ‘portas’ para a compreensão e penetração das mesmas Quatro Nobres<br />
Verdades. Nem todas são necessárias para alcançar o objetivo último, Nirvana, nem todas são<br />
adequadas na sua totalidade para to<strong>do</strong>s os tipos de indivíduos. Na verdade, o Buda ensinou diversas<br />
abordagens possíveis e deixou por conta <strong>do</strong>s seus discípulos fazerem as suas escolhas pessoais de<br />
acor<strong>do</strong> com as suas inclinações, circunstâncias e nível de maturidade.<br />
O mesmo princípio se aplica ao Abhidharma, quer seja no seu conjunto ou aspectos individuais.<br />
Talvez, a melhor explicação da relação entre o Abhidharma e os sutras tenha si<strong>do</strong> formulada pelo<br />
Venerável Pelene Vajiranana Mahathera nestes símiles: “O Abhidharma é como uma lente de aumento<br />
poderosa, mas a compreensão obtida <strong>do</strong>s sutras é o próprio olho, que realiza a ação de ver. Ou, o<br />
Abhidharma é como um frasco de remédio cujo rótulo contém uma análise exata e detalhada <strong>do</strong><br />
medicamento; mas o conhecimento adquiri<strong>do</strong> <strong>do</strong>s sutras é o medicamento em si, que por si só é capaz<br />
de curar a <strong>do</strong>ença.”<br />
Abhidharmatha Sangaha<br />
Este trabalho, e em particular os compêndios da consciência, fatores mentais, matéria e processo<br />
cognitivo, estão basea<strong>do</strong>s no Abhidharmattha Sangaha que é um livro escrito pelo Achariya<br />
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