(Brasil) - Reflexões sobre a vaidade dos homens - iPhi
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MATIAS AIRES RAMOS DA SILVA DE EÇA<br />
querer é culpa, essa culpa não é nossa, mas sim da<br />
formosura que nos move, e que nos prende. Que culpa<br />
pode ter a cera, por receber em si o caráter de uma<br />
imagem? O mármore que culpa tem, por conservar a<br />
forma que o artífice lhe deu? Que culpa tem o pano por<br />
servir de campo, ou de teatro às obscenidades do<br />
pincel 1 ? E finalmente, que culpa tem o ferro, por ser o<br />
instrumento <strong>dos</strong> golpes, e da morte? As coisas em si,<br />
são inocentes; o erro é exterior, e vem de fora: o mal<br />
parece que não nasce, nem se cria em nós, comunica-se<br />
a nós. Infelizmente o nosso coração, não é firme como<br />
o ferro, nem duro como a pedra; antes é mais tratável<br />
do que o pano, e mais brando do que a cera; é como<br />
uma lâmina original impolida, informe, e ainda sem<br />
configuração; e donde não há nem amor, nem ódio,<br />
nem culpa, nem merecimento, nem virtude, nem vício;<br />
mas é o donde tudo aquilo se põe, se faz, se introduz,<br />
se esconde.<br />
(113) Em todo o tempo prevaleceu nos <strong>homens</strong> o poder;<br />
êles arrogaram a si tôda a jurisdição legislativa: a<br />
sujeição em que ficaram as mulheres, foi a pena da sua<br />
primeira culpa. Aquela sujeição, que não devia exceder<br />
as regras da equidade, veio a de-generar-se em tirania,<br />
e a introduzir nelas uma espécie de escravidão. O<br />
ciúme <strong>dos</strong> <strong>homens</strong> fabricou os ferros, e a formosura<br />
das mulheres foi o crime original, que nunca puderam<br />
expiar, nem remir: a mesma formosura com que as<br />
dotou a natureza, lhes tirou a liberdade; alcançaram na<br />
beleza o maior favor, mas comprado por um custo<br />
imenso, isto é à custa da liberdade; ficaram sujeitas aos<br />
<strong>homens</strong> por fôrça, e os <strong>homens</strong> a elas por vontade.