(Brasil) - Reflexões sobre a vaidade dos homens - iPhi
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REFLEXÕES SÔBRE A VAIDADE DOS HOMENS<br />
tudo se move; por isso a firmeza é violenta, ao mesmo<br />
tempo que a inconstância é natural. Para sermos<br />
firmes, é-nos necessário força, porque temos que<br />
vencer a economia, e ordem, que não permite repouso<br />
em coisa alguma; para mudarmos a mesma natureza,<br />
nos inclina, e guia; semelhante a qualquer pêso, que<br />
sobe com violência, e desce por si mesmo. O<br />
movimento, e a mudança, de que depende o ser das<br />
coisas, também é princípio do fim delas; sem<br />
mudança, e movimento, nem se pode existir, nem<br />
acabar; a mesma origem da vida também é da morte a<br />
causa; por isso é tão certa a morte, é tão curta a vida;<br />
porque um e outro extremos nascem do mesmo modo,<br />
e se criam no mesmo berço.<br />
O amor é um influxo da beleza, por isso esta (104) raras<br />
vêzes anda solitária, e quase sempre a acompanha o amor:<br />
agradável mas louca companhia; apetecida, mas traidora<br />
felicidade! Compõe-se a formosura de uma certa modulação<br />
das partes; obra mais do acaso, que de um cuidado especial da<br />
natureza : mas porém deve admirar-se um instrumento, cujas<br />
cordas só produzem harmonia: assim é a for-mosura; e é<br />
pouco de estimar aquêle, de donde só resulta dissonância;<br />
assim é a fealdade. A formosura reside em uma forma<br />
exterior; o amor parece que é um efeito da vontade, ou do<br />
desejo; aquela mostra-se, porém êste esconde-se; êste é<br />
invisível, porém aquêle vê-se: a formosura pode dizer-se o<br />
como é, porém o amor não; porque quem o tem, sente sem<br />
saber o que, e quem o não tem, ainda o conhece menos.