MYRIAN MUNIZ: UMA PEDAGOGA DO TEATRO - Unesp

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permitiu que Myrian aprofundasse seus estudos sobre Bertolt Brecht, iniciados na Escola de Arte Dramática e no Teatro de Arena, mas também a ajudou a sedimentar sua atuação futura como uma professora de teatro preocupada com o homem enquanto ser social. Em entrevista dada à pesquisadora Sandra Mantovani, ela revela sua admiração pela condução dada por Flávio naquele processo de ensaio e sua apreciação em relação ao formato final do espetáculo: Os ensaios foram na minha casa, Dona Tereza morava dentro de uma trincheira de sacos, ela morava numa trincheira, tinha um forno que acendia de verdade. A peça começava com Dona Tereza amassando o pão, muitas vezes na cozinha da minha casa amassei o pão com ela, pra ela aprender, aquela coisa da força, porque a Bety Chachamovitz 9 era uma judia loira, não estava acostumada a fazer pão, imagina, era uma intelectual, tinha que sovar, cobrir e crescia no fim, e tinha aquele cheiro de pão que vinha, ela abria o pão e comia junto com a vizinha. O cenário era uma trincheira de sacos, tinha uma mesa rústica, cadeiras, bancos, o forno, um assoalho de tábuas largas, e mais nada, no fim ela puxava a tábua do assoalho e ela tirava a espingarda de dentro, e descia pela platéia. Agora o que tinha de impressionante era um Cristo no fundo crucificado com uma máscara contra gases, as meninas entravam pela platéia, todas de preto, todas de luto, com aqueles turíbulos de igreja, ficava tudo cheio de fumaça, e aquele homem, Ray Charles, cantando aquela música americana, que emoção, era Brecht e tinha também emoção, tinha as duas coisas, agora era lindo quando o filho entrava morto, punham na frente, a roupa toda manchada, tudo feito de saco. (MANTOVANI, 2004, p. 35) Além dos trabalhos realizados no Arena e no TUSP, Myrian e Flávio ainda trabalharam juntos em Marta Saré, de Gianfrancesco Guarnieri e Edu Lobo - ela atuando e ele fazendo cenários e figurinos - e também nos espetáculos que ela dirigiu: as peças Dorotéia vai à guerra, de Carlos Alberto Ratton, e Boca molhada de paixão calada, de Leilah Assumpção, além dos shows musicais Festa – Encontro de gerações, com Isaurinha Garcia, Itamar Assumpção e Nana Caymmi e Por um beijo, com a cantora Célia, sendo ele responsável pela cenografia de todos e também pelo figurino do último. Flávio Império foi um artista que entendia, de maneira muito particular e sensível a verdadeira natureza do teatro (VARGAS, 2004, p.85) e em diversos 9 Bety Chachamovitz era aluna da USP e integrante do elenco do TUSP. 65
depoimentos depoimentos dados dados por por Myrian, Myrian, ele ele aparece aparece como como seu seu mestre. mestre. O O nome nome dele dele também era citado com grande frequência nos sete anos em que fui aluno do seu curso de formação de atores e cantores cantores, cantores que era ministrado na FUNARTE. Ela dizia que tinha aprendido “tudo sobre o teatro” com ele e que por isso é que ela dedicava dedicava a a ele ele todos todos os os espetáculos espetáculos que que realizava realizava com com seus seus alunos alunos-atores. Ela sempre afirmava que que, no teatro, temos os mestres mortos - Shakespeare, Pirandello, Lorca - e e temos temos também também os os mestres mestres vivos. vivos. Segundo Segundo a a atriz, atriz, enquanto enquanto viveu, viveu, Flávio Flávio foi foi seu seu mestre mestre e e mesmo mesmo depois depois de de morto morto continuou continuou a a influenciar influenciar seu seu trabalho. Myrian rian rian e e Flávio Flávio conviveram conviveram durante durante muitos muitos anos, anos, período período esse esse que que ela ela considerava considerava como como um um longo longo aprendizado, aprendizado, mas mas essa essa convivência, convivência, segundo segundo ela, ela, nem sempre foi pacífica: Flávio Império. Fonte: Livro Alfredo Mesquita: um grã-fino na contra mão, , de Marta Góes Ficava Ficava andando andando atrás atrás do do Flávio Flávio Império. Império. Ele Ele batia! batia! Me Me bateu bateu muitas muitas vezes! Eu não revidava. . Vou Vou bater bater no no mestre?! mestre?! Mestre Mestre que que bate bate é é chato! chato! Mestre Mestre sempre sempre tem tem muita muita sabedoria, sabedoria, batia, batia, batia, batia, xingava! xingava! Xingava! Xingava! Falava Falava que que estava estava exausto exausto de de trabalhar trabalhar com com gente gente ignorante! ignorante! Ele Ele falava: falava: ”Saiam ”Saiam da da minha minha frente!” frente!” Eu Eu saía! saía! Humildemente Humildemente saía. saía. Saía, Saía, ficava ficava quieta, ieta, depois depois voltava voltava e e ele ele pedia pedia desculpa. desculpa. Eu Eu desculpava, desculpava, porque porque imagine imagine se se eu eu não não ia ia desculpar! desculpar! Eu Eu fazia fazia cada cada coisa! coisa! Eu Eu fazia fazia coisas coisas muito muito levadas levadas e e ele ele ficava ficava de de saco saco cheio. cheio. E E eu eu era era muito muito ignorante! ignorante! Eu Eu não não sei sei como como é é que que ele ele me me aguentava! aguentava! Mas Mas ele ele me me agu aguentou! Ele me aguentou, aguentou, mas mas às às vezes, vezes, ele ele brigava brigava muito. muito. (JANUZELLI (JANUZELLI e JARDIM, 1999/2000) 66
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