MYRIAN MUNIZ: UMA PEDAGOGA DO TEATRO - Unesp

e ela parou o ensaio e teve uma longa fala sobre o respeito ao teatro e ao ofício
do ator. Sempre que ele tentava se justificar, ela retrucava com um argumento
ainda mais forte e finalizou dizendo: “Se você quiser pode ir embora agora
mesmo. Aliás, eu não faço questão nenhuma que você fique!” Depois disso, o
ensaio transcorreu em um nível de tensão enorme, as indicações de cena foram
dadas aos berros e finalizamos as atividades às duas e meia da manhã. No dia
seguinte, deveríamos estar de volta às cinco da tarde, sem atrasos. Na hora
marcada, estávamos todos lá, inclusive o ator que chegou atrasado no dia
anterior, e ela já estava mais tranqüila. Antes que fosse para o Teatro Bibi
Ferreira, onde Porca miséria estava em cartaz, resolveu reunir todos os alunos-
atores no palco. Ao darmos as mãos para fazermos uma roda de conversa ela, por
acaso, estava ao meu lado e ao tocar minha mão, disse baixinho: “Desculpe por
ontem. Não era com você.” Percebi naquele instante, outras três grandes lições: A
primeira é que é preciso ter respeito e dedicação imensos ao fazer teatral; a
segunda é que, muitas vezes, a explosão pode ser necessária para apressar um
processo de aprendizagem que está emperrado e, por fim, a terceira, é que o bom
ator não é sempre o mais talentoso, mas sim aquele que é mais comprometido e
está disponível para o teatro. Cumprimos então uma pequena temporada de cinco
espetáculos, depois de um processo carregado de emoção. Coincidência ou não,
o espetáculo daquele ano tinha como título a seguinte frase de Lorca: A lua deixa
uma faca abandonada no ar.
Dando sequencia aos trabalhos, Nelson Rodrigues foi o autor escolhido
para o ano de 1994. Contamos, naquele ano, com a curadoria teórica de
Aguinaldo Ribeiro da Cunha, crítico teatral e primo em segundo grau de Myrian,
que planejou uma série de encontros sobre o dramaturgo: O escritor Ruy Castro,
que tinha publicado O anjo pornográfico, falou sobre a íntima relação entre a vida
e obra de Nelson, de como fatos ocorridos na sua família e trabalho encontravam
ressonância especular nas suas peças. A atriz Denise Weinberg, que estava em
cartaz com Vestido de noiva, interpretando a personagem Alaíde, também
participou dos encontros e nos contou da experiência de representar uma mesma
143