Revista SAPERJ 143.indd
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após a morte do pai. O protagonista se afasta da relação<br />
conturbada com os outros membros da família e<br />
mergulha em um isolamento geográfico e psicológico.<br />
Ao mesmo tempo, ele empreende a busca pela verdade<br />
no caso da morte do avô, o misterioso Gaudério,<br />
que teria sido assassinado décadas antes na mesma<br />
Garopaba, na época apenas uma vila de pescadores.<br />
Sempre acompanhado por Beta, cadela do falecido<br />
pai, o professor esquadrinha as lacunas do pouco<br />
que lhe é revelado, a contragosto, pelos moradores<br />
mais antigos da cidade. Portador de uma condição<br />
neurológica congênita que o obriga a interagir com as<br />
outras pessoas de modo peculiar, ele estabelece relações<br />
com alguns moradores: uma garçonete e seu filho<br />
pequeno, os alunos da natação, um budista histriônico,<br />
a secretária de uma agência turística de passeios. E, aos<br />
poucos, vai reunindo as peças que talvez lhe permitam<br />
entender melhor a própria história.<br />
Crítica – Mario Sérgio Conti publicou uma excelente<br />
matéria na revista “Piauí” (nº 74, novembro). Ele foi a<br />
Garopaba e fez um retrato do autor e da cidade. Vale a<br />
pena citá-lo.<br />
“Com 33 anos, Galera tem altura média, talhe de<br />
atleta, cabelo e barba castanhos e tatuagem no braço.<br />
Estava de camiseta verde-escura, sandália de dedo<br />
e calção preto. O cotidiano que viveu em Garopaba<br />
começava muitas vezes por tomar café, descer a escada<br />
das rochas na frente do apartamento e entrar no mar.<br />
Nos dias mais frios, vestia roupa de neoprene para cair<br />
na água.<br />
Nadava ao longo de galpões de barcos de pesca e de<br />
bancas onde a garoupa, a tainha e o polvo são estripados<br />
e vendidos. Dos restaurantes Duna’s, Setenta e Sete,<br />
Aconchego e Al Andaluz. Da Tropical Modas e da Padaria<br />
Santos. Da Pousada da Praia e da Acqua-Viva. Nadava<br />
até o ponto onde rareiam as construções costeiras e<br />
desaparece a algaravia de nomes. Então retornava. Ao<br />
todo, percorria cerca de 4 quilômetros, a depender do<br />
capricho de correntes, ventos, maré e ondas.<br />
Comia algo e saía de bicicleta – que ele chama de<br />
bike –, percorria a cidade e ia a praias mais distantes.<br />
De volta ao apartamento, lia o que estivesse à mão. Ou<br />
fazia anotações para o romance que pretendia escrever<br />
(uma delas dizia: ‘Barba Ensopada de Sangue. Um bom<br />
título. Mas para o quê?’). Ou traduzia, o seu ganha-pão.<br />
Foi publicado há pouco um livro do americano David<br />
Foster Wallace, no qual traduziu alguns ensaios, cujo<br />
título largado e indeterminado capta a frouxidão de seu<br />
dia a dia em Garopaba: ‘Ficando Longe do Fato de Já<br />
Estar Meio que Longe de Tudo’.<br />
Galera me explicou que em Garopaba há na verdade<br />
duas cidades no mesmo lugar. Uma existe de março a<br />
dezembro. É um vilarejo pacato, de gente remota e de<br />
poucas palavras. Até as crianças das escolas públicas,<br />
vestindo uniformes azuis e brancos impecáveis, andam<br />
pelas ruas em fila dupla sem fazer algazarra.<br />
Janeiro Fevereiro 2013 - P&M - 39