perfis da mulher na literatura brasileira: uma leitura ... - Itaporanga.net
perfis da mulher na literatura brasileira: uma leitura ... - Itaporanga.net
perfis da mulher na literatura brasileira: uma leitura ... - Itaporanga.net
You also want an ePaper? Increase the reach of your titles
YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.
há no fi<strong>na</strong>l do romance, ratificando <strong>uma</strong> postura conservadora de Alencar, para<br />
neutralizar a significação explosiva desse casamento dentro dos paradigmas sociais <strong>da</strong><br />
época, <strong>uma</strong> remissão do marido, para que o amor legitime a negociata, e principalmente<br />
tirar <strong>da</strong> <strong>mulher</strong> o poder, e devolvê-lo a quem o possui por direito, <strong>uma</strong> vez instituindo<br />
pela política social e familiar domi<strong>na</strong>nte: “ Pois bem, agora ajoelho-me a teus pés,<br />
Fer<strong>na</strong>ndo, e suplico-te que aceites meu amor, este amor que nunca deixou de ser teu...”<br />
( p. 199 )<br />
Já Machado de Assis, que tinha um pé <strong>na</strong> pobreza e outro <strong>na</strong><br />
classe domi<strong>na</strong>nte, vai criar um imaginário feminino n<strong>uma</strong> latitude frontalmente oposta a<br />
de Alencar, explorando os comportamentos ambíguos e dissimulados <strong>da</strong> <strong>mulher</strong>, através<br />
de um ponto de vista cínico e irônico, bem como instigar as artimanhas econômicas<br />
camufla<strong>da</strong>s pelo matrimônio, n<strong>uma</strong> lucidez crítica diante <strong>da</strong>s pretensões e contradições<br />
do projeto emancipatório <strong>da</strong> <strong>na</strong>cio<strong>na</strong>li<strong>da</strong>de burguesa, num contexto arcaico de um<br />
Brasil oitocentista. Nas entrelinhas desse discurso irônico temos o adultério feminino<br />
como ponto chave <strong>da</strong> crítica à socie<strong>da</strong>de aristocrata, flagra<strong>da</strong> em sua hipocrisia e<br />
ganância, onde a razão cética revela a força demolidora <strong>da</strong> crítica social.<br />
Machado foi um perti<strong>na</strong>z e paciente desconstrutor de mitos.<br />
To<strong>da</strong> a sua força criadora esteve sempre volta<strong>da</strong> para a análise e desmistificação dos<br />
arquétipos criados pelos ficcionistas românticos. Ele percebia, no imaginário desses<br />
poetas, que os <strong>perfis</strong> femininos estavam ali para cimentar e consoli<strong>da</strong>r determi<strong>na</strong><strong>da</strong>s<br />
expectativas sociais, políticas e familiares, com as quais ele não concor<strong>da</strong>va. Portanto,<br />
ele logo tratou de descer a <strong>mulher</strong> do trono i<strong>na</strong>cessível onde fora coloca<strong>da</strong>, trazendo-a<br />
para a reali<strong>da</strong>de do cotidiano, tis<strong>na</strong>ndo a sua decanta<strong>da</strong> pureza <strong>na</strong> pequenez dos pecados<br />
de ca<strong>da</strong> dia.<br />
Portanto, Machado de Assis emprestou à figura femini<strong>na</strong> um<br />
papel relevante <strong>na</strong> ação <strong>na</strong>rrativa. Elas são fortes e objetivas, logo, capazes de conduzir<br />
a ação, até mesmo sem a presença do herói masculino, tor<strong>na</strong>ndo-se então heroí<strong>na</strong>.<br />
O imaginário feminino de Machado de Assis não construiu um<br />
mundo de baca<strong>na</strong>is, nem um antro de perdições; ape<strong>na</strong>s nos ofereceu <strong>mulher</strong>es de carne<br />
e osso, capazes de assumir um corpo e os desejos dele constitutivos, assim ele se mostra<br />
contra tudo que lhe pareça falso e cediço e parte para <strong>uma</strong> crítica radical dos valores que<br />
sustentavam a ideologia domi<strong>na</strong>nte.<br />
As <strong>mulher</strong>es, em Machado de Assis, são freqüentemente<br />
misteriosas, sensuais enigmáticas, sedutoras, dissimula<strong>da</strong>s, interesseiras, adúlteras e<br />
dota<strong>da</strong>s de grande senso de percepção, capazes de manipular psicologicamente, o mais<br />
astuto dos homens, como podemos constatar facilmente em alguns contos como:<br />
“ Ela estava ain<strong>da</strong> bonita e fasci<strong>na</strong>nte; as maneiras eram<br />
fi<strong>na</strong>s e meigas, mas evidentemente de empréstimo, acompanha<strong>da</strong>s de <strong>uma</strong>s atitudes e<br />
gestos , cujo intuito latente era atrair-me e arrastar-me.” ( Primas de sapucaia )<br />
“ Camilo quis sinceramente fugir, mas já não pôde. Rita,<br />
como <strong>uma</strong> serpente, foi-se acercando dele, envolvendo-o todo, fez-lhe estalar os ossos<br />
num espasmo,e pingou-lhe o veneno <strong>na</strong> boca. Ele ficou atordoado e subjugado.<br />
Vexame, susto, remorsos, desejos, tudo sentiu de mistura...” ( A Cartomante )<br />
“ {...} Os braços merecem um período. Eram belos, e a<br />
primeira noites que os levou nus a um baile, não creio que houvesse iguais <strong>na</strong> ci<strong>da</strong>de,<br />
nem os seus leitora, que eram então de meni<strong>na</strong>, se eram <strong>na</strong>scidos, mas provavelmente<br />
estariam ain<strong>da</strong> no mármore...” ( A deseja<strong>da</strong> <strong>da</strong>s gentes )<br />
“ Sofia sorriu, agitou o leque e recebeu em cheio o olhar<br />
de um dos secretários. Muitos eram os que a fitavam quando ela ia à Câmara, mas os