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PERFIS DA MULHER NA LITERATURA BRASILEIRA: UMA LEITURA<br />

INTERTEXTUAL DA IDENTIDADE FEMININA<br />

FRANCISCA VÃNIA ROCHA NÓBREGA – PROLING/ UFPB<br />

Considerando o que Antônio Cândido nos aponta como caminho para a<br />

análise literária, levando-se em conta o texto e o contexto, <strong>uma</strong> vez que os fatores<br />

externos, que compõem o social se integram aos fatores internos <strong>da</strong> obra, estu<strong>da</strong>remos<br />

alguns <strong>perfis</strong> femininos do imaginário de José de Alencar e Machado de Assis,<br />

observando o papel <strong>da</strong> ideologia social e familiar domi<strong>na</strong>nte.<br />

No mundo imaginário <strong>da</strong> <strong>literatura</strong> <strong>brasileira</strong> a <strong>mulher</strong> apresenta-se sempre<br />

multifaceta<strong>da</strong>, mutante e contraditória. Assim, a identi<strong>da</strong>de femini<strong>na</strong> foi sendo<br />

construí<strong>da</strong> e desconstruí<strong>da</strong> <strong>na</strong>s teias dos mais variados romances, perpetuando ou<br />

destruindo preconceitos e estereótipos, promovendo então, <strong>uma</strong> <strong>leitura</strong> clara <strong>da</strong> cultura<br />

<strong>brasileira</strong>, seja através do viés social, familiar ou religioso, os quais podemos a<strong>na</strong>lisar,<br />

neste trabalho, através dos olhares masculinos de José de Alencar e de Machado de<br />

Assis.<br />

Nessa construção literária <strong>da</strong> figura <strong>da</strong> <strong>mulher</strong>, percebemos muitas vezes, a<br />

estabilização do imaginário que hierarquizou os valores masculinos e inscreveu às<br />

<strong>mulher</strong>es a resig<strong>na</strong>ção e a passivi<strong>da</strong>de diante <strong>da</strong> opressão social e <strong>da</strong> familiar, de<br />

estruturas profun<strong>da</strong>mente patriarcais, e em outros momentos, criou um perfil feminino<br />

com caracteres baseados <strong>na</strong> coragem, <strong>na</strong> força, <strong>na</strong> inteligência, <strong>na</strong> astúcia, e <strong>na</strong><br />

dissimulação, entre outros caracteres intrigantes, retratando assim, <strong>uma</strong> <strong>mulher</strong> prática,<br />

com perso<strong>na</strong>li<strong>da</strong>de forte e marcante.<br />

José de Alencar cria um imaginário feminino a partir de seu ponto de<br />

vista de pessoa bem <strong>na</strong>sci<strong>da</strong>, com profun<strong>da</strong>s raízes <strong>na</strong> aristocracia, portanto ele se<br />

dirigiu às <strong>mulher</strong>es, seguindo a ideologia patriarcal oitocentista, que determi<strong>na</strong>va <strong>uma</strong><br />

conduta apropria<strong>da</strong> para as <strong>mulher</strong>es e outra para os homens, com o intuito de e<strong>na</strong>ltecer<br />

as quali<strong>da</strong>des femini<strong>na</strong>s: fragili<strong>da</strong>de, virgin<strong>da</strong>de, submissão, extrema sensibili<strong>da</strong>de,<br />

resig<strong>na</strong>ção, fideli<strong>da</strong>de e amorosa materni<strong>da</strong>de. Elementos estes, que serviam de<br />

argumentos para impor à <strong>mulher</strong> um papel secundário em relação ao homem, tentando<br />

<strong>na</strong>turalizar e limitar o papel <strong>da</strong> <strong>mulher</strong> com os cui<strong>da</strong>dos com os outros, retratando-a no<br />

universo doméstico, colocando o casamento e a materni<strong>da</strong>de como elementos<br />

obrigatórios e essenciais à vi<strong>da</strong> <strong>da</strong>s <strong>mulher</strong>es, como podemos observar nesse trecho do<br />

romance Senhora:<br />

“Se vinha a falar-se de sua moléstia que fazia rápidos progressos,<br />

dizia Emília à filha:<br />

_ O que me aflige é não ver-te casa<strong>da</strong>. Mais <strong>na</strong><strong>da</strong>.<br />

Quando lembrava que o dinheiro deixado por Pedro Camargo e a<br />

esmola do fazendeiro haviam de acabar-se um dia, ficando elas <strong>na</strong> indigência, acudia a<br />

viúva:<br />

_ Ah! Se eu te visse casa<strong>da</strong>! ( p. 80 )<br />

A <strong>literatura</strong> canônica foi representando a figura femini<strong>na</strong> num papel de<br />

dependência, não tendo ela ação principal dentro <strong>da</strong> <strong>na</strong>rrativa, a qual é pratica<strong>da</strong> pelo<br />

homem (o herói ), constituído de nobreza de caráter e força física. Ou seja, o imaginário<br />

masculino, criou, <strong>na</strong> tentativa de explicar a formação e a configuração do cosmo e do<br />

ser h<strong>uma</strong>no mortal, sexuado e cultural, um perfil feminino com menor capaci<strong>da</strong>de de<br />

raciocínio e maior emotivi<strong>da</strong>de.<br />

Assim, José de Alencar foi criando um imaginário feminino onde a<br />

<strong>mulher</strong> é representa<strong>da</strong> com graciosi<strong>da</strong>de e delicadeza, ficando muitas vezes, entre o


angelical e o h<strong>uma</strong>no. Ora vista como um anjo, ora vista como um ser fisicamente<br />

concreto. A <strong>mulher</strong> era vista como um ser elevado, possuidor de atrativos espirituais<br />

enobrecedores.<br />

Em Senhora, temos inicialmente o seguinte perfil de Aurélia Camargo: “<br />

Há anos raiou no céu fluminense <strong>uma</strong> nova estrela. Desde o momento de sua ascensão<br />

ninguém lhe disputou o cetro; foi proclama<strong>da</strong> a rainha dos salões. Tornou-se a deusa<br />

dos bailes; a musa dos poetas e o ídolo dos noivos em disponibili<strong>da</strong>de. Era rica e<br />

formosa. Duas opulências que se realçam como a flor em vaso de alabastro; dois<br />

esplendores que se refletem como o raio de sol no prisma do diamante.” ( p. 19)<br />

Em contraparti<strong>da</strong>, em outras passagens do romance temos um outro perfil<br />

de Aurélia: a sagaz, de ar provocador, com <strong>uma</strong> expressão cheia de desdém, apesar dos<br />

seus 18 anos, que contrastam com <strong>uma</strong> beleza impecável e <strong>uma</strong> expressão sere<strong>na</strong>: “<br />

Aurélia, com sagaci<strong>da</strong>de admirável em sua i<strong>da</strong>de, avaliou <strong>da</strong> situação difícil em que se<br />

achava, e dos perigos que a ameaçavam. Daí provinha a expressão cheia de desdém e<br />

um certo ar provocador, que eriçavam a sua beleza...” ( p. 20 )<br />

Conseqüentemente esse perfil de Aurélia Camargo é de rebeldia, pois ela<br />

demonstrava ir contra o que era imposto às <strong>mulher</strong>es no período Imperial, ou seja, as<br />

<strong>mulher</strong>es <strong>brasileira</strong>s eram submissas ao poder <strong>da</strong>s leis sociais e familiares, valendo<br />

ape<strong>na</strong>s pelo dote que possuíam, em detrimento <strong>da</strong> hegemonia masculi<strong>na</strong> domi<strong>na</strong>nte. Por<br />

tanto, Aurélia Camargo ia também contra as convenções morais vigentes, rompendo as<br />

tradições onde a <strong>mulher</strong> não tem voz e nem vez, tendo como mais um exemplo dessa<br />

estrutura social patriarcal, a apresentação de D. Firmi<strong>na</strong> como mãe de encomen<strong>da</strong> para<br />

acompanhar Aurélia <strong>na</strong> socie<strong>da</strong>de, ape<strong>na</strong>s para “condescender” com os escrúpulos <strong>da</strong><br />

socie<strong>da</strong>de <strong>brasileira</strong>. Socie<strong>da</strong>de essa onde a <strong>mulher</strong> era prepara<strong>da</strong> unicamente para o<br />

casamento, sem direitos a opi<strong>na</strong>r e a escolher diante <strong>da</strong>s exigências sociais e familiares.<br />

Diante dessa reali<strong>da</strong>de social surge Aurélia Camargo, com um perfil<br />

feminino de emancipação, configurando-se com <strong>uma</strong> postura masculi<strong>na</strong>, pois escolhe<br />

seu marido, praticamente comprando-o com seu dote, sendo assim, autônoma, do<strong>na</strong> de<br />

seus atos, rege liderança sobre seus bens e família.<br />

A obra é intitula<strong>da</strong> de senhora porque Aurélia é do<strong>na</strong> do seu destino, não<br />

se deixando domi<strong>na</strong>r pelo poder social <strong>da</strong> época, bem como pela posição masculiniza<strong>da</strong><br />

que ela assume diante <strong>da</strong> vi<strong>da</strong>, apresentando <strong>uma</strong> postura diferencia<strong>da</strong> <strong>da</strong>s <strong>mulher</strong>es<br />

burguesas do século XIX, burlando regras e convenções.<br />

Assim, José de Alencar acrescenta algo mais ao estereótipo <strong>da</strong><br />

“<strong>mulher</strong>-anjo”, como podemos perceber <strong>na</strong> seguinte passagem do romance: “ operavase<br />

nela <strong>uma</strong> revolução. O princípio vital <strong>da</strong> <strong>mulher</strong> abando<strong>na</strong>va seu foco <strong>na</strong>tural, o<br />

coração, para concentrar-se no cérebro, onde residem as facul<strong>da</strong>des especulativas do<br />

homem. Era realmente para causar pasmo aos estranhos e susto a um tutor a<br />

perspicácia com que essa moça de dezoito anos apreciava as questões mais<br />

complica<strong>da</strong>s, o perfeito conhecimento que mostrava dos negócios; e a facili<strong>da</strong>de com<br />

que fazia, muitas vezes de memória, qualquer operação aritmética por muito difícil e<br />

intrinca<strong>da</strong> que fosse.” ( p. 30<br />

Desde muito cedo Aurélia Camargo descobriu que o dinheiro<br />

gover<strong>na</strong>va o mundo e submetia a <strong>mulher</strong> quase à escravidão, devido ao exemplo que<br />

tinha de sua mãe: “Sua família me repele, Emília, porque sou pobre e não posso contar<br />

com a herança de meu pai – disse o estu<strong>da</strong>nte a primeira vez que encontrou a<br />

<strong>na</strong>mora<strong>da</strong>...”(p. 75 )<br />

Nesse universo de rebeldia, consegue Aurélia, fazer do sacramento do<br />

casamento, <strong>uma</strong> ver<strong>da</strong>deira negociata, o que <strong>na</strong> ver<strong>da</strong>de acontecia com os casamentos<br />

arranjados, haja vista sido tratado como <strong>uma</strong> transação comercial corriqueira, porém,


há no fi<strong>na</strong>l do romance, ratificando <strong>uma</strong> postura conservadora de Alencar, para<br />

neutralizar a significação explosiva desse casamento dentro dos paradigmas sociais <strong>da</strong><br />

época, <strong>uma</strong> remissão do marido, para que o amor legitime a negociata, e principalmente<br />

tirar <strong>da</strong> <strong>mulher</strong> o poder, e devolvê-lo a quem o possui por direito, <strong>uma</strong> vez instituindo<br />

pela política social e familiar domi<strong>na</strong>nte: “ Pois bem, agora ajoelho-me a teus pés,<br />

Fer<strong>na</strong>ndo, e suplico-te que aceites meu amor, este amor que nunca deixou de ser teu...”<br />

( p. 199 )<br />

Já Machado de Assis, que tinha um pé <strong>na</strong> pobreza e outro <strong>na</strong><br />

classe domi<strong>na</strong>nte, vai criar um imaginário feminino n<strong>uma</strong> latitude frontalmente oposta a<br />

de Alencar, explorando os comportamentos ambíguos e dissimulados <strong>da</strong> <strong>mulher</strong>, através<br />

de um ponto de vista cínico e irônico, bem como instigar as artimanhas econômicas<br />

camufla<strong>da</strong>s pelo matrimônio, n<strong>uma</strong> lucidez crítica diante <strong>da</strong>s pretensões e contradições<br />

do projeto emancipatório <strong>da</strong> <strong>na</strong>cio<strong>na</strong>li<strong>da</strong>de burguesa, num contexto arcaico de um<br />

Brasil oitocentista. Nas entrelinhas desse discurso irônico temos o adultério feminino<br />

como ponto chave <strong>da</strong> crítica à socie<strong>da</strong>de aristocrata, flagra<strong>da</strong> em sua hipocrisia e<br />

ganância, onde a razão cética revela a força demolidora <strong>da</strong> crítica social.<br />

Machado foi um perti<strong>na</strong>z e paciente desconstrutor de mitos.<br />

To<strong>da</strong> a sua força criadora esteve sempre volta<strong>da</strong> para a análise e desmistificação dos<br />

arquétipos criados pelos ficcionistas românticos. Ele percebia, no imaginário desses<br />

poetas, que os <strong>perfis</strong> femininos estavam ali para cimentar e consoli<strong>da</strong>r determi<strong>na</strong><strong>da</strong>s<br />

expectativas sociais, políticas e familiares, com as quais ele não concor<strong>da</strong>va. Portanto,<br />

ele logo tratou de descer a <strong>mulher</strong> do trono i<strong>na</strong>cessível onde fora coloca<strong>da</strong>, trazendo-a<br />

para a reali<strong>da</strong>de do cotidiano, tis<strong>na</strong>ndo a sua decanta<strong>da</strong> pureza <strong>na</strong> pequenez dos pecados<br />

de ca<strong>da</strong> dia.<br />

Portanto, Machado de Assis emprestou à figura femini<strong>na</strong> um<br />

papel relevante <strong>na</strong> ação <strong>na</strong>rrativa. Elas são fortes e objetivas, logo, capazes de conduzir<br />

a ação, até mesmo sem a presença do herói masculino, tor<strong>na</strong>ndo-se então heroí<strong>na</strong>.<br />

O imaginário feminino de Machado de Assis não construiu um<br />

mundo de baca<strong>na</strong>is, nem um antro de perdições; ape<strong>na</strong>s nos ofereceu <strong>mulher</strong>es de carne<br />

e osso, capazes de assumir um corpo e os desejos dele constitutivos, assim ele se mostra<br />

contra tudo que lhe pareça falso e cediço e parte para <strong>uma</strong> crítica radical dos valores que<br />

sustentavam a ideologia domi<strong>na</strong>nte.<br />

As <strong>mulher</strong>es, em Machado de Assis, são freqüentemente<br />

misteriosas, sensuais enigmáticas, sedutoras, dissimula<strong>da</strong>s, interesseiras, adúlteras e<br />

dota<strong>da</strong>s de grande senso de percepção, capazes de manipular psicologicamente, o mais<br />

astuto dos homens, como podemos constatar facilmente em alguns contos como:<br />

“ Ela estava ain<strong>da</strong> bonita e fasci<strong>na</strong>nte; as maneiras eram<br />

fi<strong>na</strong>s e meigas, mas evidentemente de empréstimo, acompanha<strong>da</strong>s de <strong>uma</strong>s atitudes e<br />

gestos , cujo intuito latente era atrair-me e arrastar-me.” ( Primas de sapucaia )<br />

“ Camilo quis sinceramente fugir, mas já não pôde. Rita,<br />

como <strong>uma</strong> serpente, foi-se acercando dele, envolvendo-o todo, fez-lhe estalar os ossos<br />

num espasmo,e pingou-lhe o veneno <strong>na</strong> boca. Ele ficou atordoado e subjugado.<br />

Vexame, susto, remorsos, desejos, tudo sentiu de mistura...” ( A Cartomante )<br />

“ {...} Os braços merecem um período. Eram belos, e a<br />

primeira noites que os levou nus a um baile, não creio que houvesse iguais <strong>na</strong> ci<strong>da</strong>de,<br />

nem os seus leitora, que eram então de meni<strong>na</strong>, se eram <strong>na</strong>scidos, mas provavelmente<br />

estariam ain<strong>da</strong> no mármore...” ( A deseja<strong>da</strong> <strong>da</strong>s gentes )<br />

“ Sofia sorriu, agitou o leque e recebeu em cheio o olhar<br />

de um dos secretários. Muitos eram os que a fitavam quando ela ia à Câmara, mas os


do tal secretário tinham <strong>uma</strong> expressão mais especial, cáli<strong>da</strong> e suplicante.” ( Capítulo<br />

dos chapéus )<br />

“ Um dos convivas, o Leandrinho , autor do brinde, dizia com<br />

os olhos, _ não com a boca,_ e dizia-o de um modo austucioso, que o mellhor doce<br />

eram as faces de Eulália, doce moreno, corado {... } ( D. Benedita )<br />

E assim foi que machado de Assis foi construindo seu<br />

imaginário feminino, tanto nos contos como nos romances, como podemos perceber em:<br />

Memórias póst<strong>uma</strong>s de Brás Cubas, Dom Casmurro e Quincas Borba:<br />

“ Não basta ver <strong>uma</strong> <strong>mulher</strong> para a conhecer, é preciso ouvi-la<br />

também; ain<strong>da</strong> que muitas vezes baste ouvi-la para não a conhecer jamais.” (<br />

Memórias Póst<strong>uma</strong>s de Brás Cubas )<br />

“ Olhos de ressaca? Vá, de ressaca. È o que me dá idéia <strong>da</strong>quela<br />

feição nova. Trazia um não sei que fluido misterioso e enérgico, <strong>uma</strong> força que<br />

arrastava para dentro, como a vaga que se retira <strong>da</strong> praia, nos dias de ressaca.” (<br />

Dom Casmurro)<br />

Vejamos agora o perfil feminino de Capitu: Bentinho mostravase<br />

ingênuo em relação à esperteza de Capitu, deixando-se levar por ela. “ Capitu<br />

refletia. A reflexão não era cousa rara nela, e conheciam-se as ocasiões pelo apertado<br />

do olhos” ( cap. XVIII, p. 93); “{...} aos catorze anos tinha idéias já atrevi<strong>da</strong>s” (cap.<br />

XVIII, p. 94); “ Capitu era Capitu, isto é, <strong>uma</strong> criatura mui particular, mais <strong>mulher</strong> do<br />

que eu era homem” ( cap. XXXI, p. 111), “ A cabeça <strong>da</strong> minha amiga sabia pensar<br />

claro e depressa” ( cap.XLVIII, p. 138), ou a melhor <strong>da</strong>s definições:“ Olhos de ciga<strong>na</strong><br />

oblíqua e dissimula<strong>da</strong>”, bem como “olhos de ressaca”. Bentinho viu neles “um fluído<br />

misterioso e energético, <strong>uma</strong> força que arrastava para dentro como a vaga que se retira<br />

<strong>da</strong>s praias nos dias de ressaca.” (cap. XXXII, p. 114)<br />

Machado de Assis construiu Capitu como <strong>uma</strong> peque<strong>na</strong> burguesa<br />

inteligente, ambiciosa, delica<strong>da</strong> e sedutora, porém acrescentou-lhe um perfil feminino<br />

complicado, graças aos seguintes caracteres: curiosi<strong>da</strong>de intelectual, gosto pela<br />

aritmética, talento fi<strong>na</strong>nceiro e capaci<strong>da</strong>de de abstração. Portanto, quali<strong>da</strong>des essas<br />

convencio<strong>na</strong>lmente associa<strong>da</strong>s à mente masculi<strong>na</strong>, e não quali<strong>da</strong>des aquiescentemente<br />

femini<strong>na</strong>s. Capitu, além de apresentar um comportamento incerto e ambíguo, de quem<br />

tem sempre o álibi inquietante <strong>da</strong> dúvi<strong>da</strong>, oferecia também ao interlocutor, um perfil<br />

marcado pela dissimulação: Capitu levantou o olhar, sem levantar os olhos.” ( cap.<br />

CXXI. p.223)<br />

Bibliografia:<br />

ALENCAR, José de. Senhora. Ed. Moder<strong>na</strong>, São Paulo, 1997<br />

BAGNO, Marcos, Machado de Assis para principiantes, Ed. Ática, São Paulo,<br />

1998.<br />

CANDIDO, Antonio. Literatura e socie<strong>da</strong>de: estudos de teoria e história literária..<br />

7ª São Paulo: Ed. Nacio<strong>na</strong>l, 1985<br />

ASSIS, Machado de. Dom Casmurro. Ed. Moder<strong>na</strong>, São Paulo, 1997<br />

MELO, Hildete Pereira de & LASTRES, hele<strong>na</strong> M. Martins, “Brasil – Gênero,<br />

Tecnologia e Inovação – Um olhar feminino”, Rio de Janeiro, UNESCO,2003, mimeo.<br />

COELHO, Nelly Novais. 500 anos de presença <strong>da</strong> <strong>mulher</strong> <strong>na</strong> <strong>literatura</strong>, em<br />

Portugal e no Brasil _ A <strong>literatura</strong> como memória e cultura. São Paulo: Petrópolis, 2000.

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